Revista Brasileira de Educação do Campo
Brazilian Journal of Rural Education
ARTIGO/ARTICLE/ARTÍCULO
DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e10278
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
1
Este conteúdo utiliza a Licença Creative Commons Attribution 4.0 International License
Open Access. This content is licensed under a Creative Commons attribution-type BY
Educação do Campo na conjuntura da pandemia:
alcances, impactos e desafios
Tatiane Novais Brito
1
, Marinalva Nunes Fernandes
2
, Jaime de Jesus Santana
3
1, 2, 3
Universidade do Estado da Bahia UNEB. Departamento de Ciências Humanas (DCH). Avenida Contorno, S./N., São
José. Caetité - BA. Brasil.
Autor para correspondência/Author for correspondence: tatianenovais9@gmail.com
RESUMO. Este artigo pretende analisar questões intrínsecas à
Educação do Campo do município de Ibiassucê - BA, que
atende as etapas Educação Infantil e Fundamental I, no contexto
da pandemia de COVID-19, uma vez que o ensino passou a ser
mediado por tecnologias devido às medidas de distanciamento
social. A pesquisa tem como objetivos: compreender como tem
ocorrido o Ensino Remoto nas escolas do campo de Ibiassucê -
BA; examinar de que forma questões históricas e sociais se
desdobram dentro do contexto escolar; debater pontos do Ensino
Remoto presentes no cotidiano familiar e docente que refletem
no processo de ensino aprendizagem; elencar problemáticas do
ensino mediado pelas tecnologias digitais na Educação do
Campo. Para tanto, utilizou-se abordagem qualitativa, valendo-
se de questionário para levantamento de dados, permitindo
identificar as seguintes questões: o alcance ineficaz dessa forma
de ensino, sendo este de acesso não democrático; os desafios
que professoras/es, familiares e gestoras/es enfrentam ao
tentarem conciliar a atual conjuntura com o Ensino Remoto sem
suporte técnico e formação específica, impactando no alcance de
aprendizagens significativas e em sua saúde física e mental;
questões metodológicas que são necessárias para efetivação do
processo de ensino aprendizagem; impactos que as questões
sociais têm provocado nas famílias em situações vulneráveis.
Palavras-chave: Pandemia, Covid-19, Educação do Campo,
Ensino Remoto, Impactos Sociais.
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
2
Rural Education in the pandemic setting: range, impacts
and challenges
ABSTRACT. This article intends to analyze issues in Rural
Education in the municipality of Ibiassucê - BA, which provides
the stages of Early Childhood and Elementary Education, in the
context of the COVID-19 pandemic, hence learning has become
technology-mediated due to social distancing measures. The
research aims to understand how Remote Teaching has taken
place in rural schools in Ibiassucê, to examine how historical
and social problems are unfolded in the school context, to debate
Remote Teaching points present in the family and in the
teaching routine which reflect on the teaching-learning process
and to list issues of teaching mediated by digital technologies in
Rural Education. In order to fulfill these objectives, a qualitative
approach was adopted, using a questionnaire for data collection,
allowing to identify issues pertinent to education in the current
conjuncture, such as: the inefficient range of this learning
method, having non-democratic access; the challenges that
teachers, families and managers face in order to get by the
current circumstances with Remote Teaching, without technical
support and specific education, which has an impact in the range
of meaningful learning provided and their physical and mental
health; methodological issues necessary to establish the
teaching-learning process; impacts that social issues have on
vulnerable families.
Keywords: Pandemic Covid-19, Rural Education, Remote
Education, Social Impacts.
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
3
Educación de Campo en el entorno de la pandemia:
alcance, impactos y desafíos
RESUMEN. Este artículo pretende analizar temas pertinentes a
la Educación Rural en Ibiassucê, atendiendo etapas de
Educación Infantil y Primaria, en el contexto de la pandemia de
COVID-19, ya que la enseñanza comenzó a ser mediada por
tecnologías por medidas de alejamiento social. La investigación
pretende: comprender cómo se ha producido la enseñanza
remota en las escuelas del campo de Ibiassucê; examinar cómo
se desarrollan cuestiones históricas y sociales en el contexto
escolar; debatir puntos de enseñanza remota presentes en la
familia y en la docencia que reflejan en el proceso de enseñanza-
aprendizaje; listar problemas de enseñanza mediada por
herramientas digitales en la educación rural. Cumpliendo estos
propósitos se utilizó un enfoque cualitativo, utilizándose un
cuestionario para recolección de datos, que permitió identificar
estos aspectos: alcance ineficaz de esta forma de enseñanza,
antidemocrática; los retos a los que se enfrentan docentes,
familias y gestores al intentar conciliar la situación actual con la
Educación Remota sin apoyo técnico y formación específica,
impactando en el logro de aprendizajes significativos y en su
salud física y mental; cuestiones metodológicas que son
necesarias para efectuar el proceso de enseñanza; impactos que
las cuestiones sociales han tenido en familias en situaciones
vulnerables.
Palabras clave: Pandemia, Covid-19, Educación Rural,
Educación Remota, Impactos Sociales.
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
4
Introdução
Esta produção partiu da necessidade
de analisar e discutir questões que estão
presentes na Educação do Campo mediada
pelas tecnologias digitais frente ao
contexto da pandemia de COVID-19. Para
tanto, se propõe a pesquisar o seguinte
problema: “Como tem ocorrido o Ensino
Remoto mediado por tecnologias digitais
no município de Ibiassucê - BA e quais os
impactos do atual contexto no âmbito
educacional e social nos sujeitos
envolvidos?”. O momento tem sido
permeado por grandes desafios, como
problemas sanitários que estão levando a
morte de milhares de cidadãos,
principalmente daqueles que dispõem de
poucos recursos financeiros e acesso aos
serviços públicos, escancarando a
profundeza das desigualdades sociais, em
consequência da deficiência dos sistemas
políticos e do modo capitalista que está
intrínseco em toda a conjuntura social.
A educação presencial pública
brasileira foi afetada pelas circunstâncias,
em virtude das medidas de saúde pública
para preservação da vida, fazendo-se
necessário a suspensão das aulas. A vida
da população sem dúvidas deve ser
sobreposta a toda e qualquer questão. No
entanto, é preciso considerar que essa
mudança de hábitos e realidades afetou as
pessoas de modos diferentes.
Ao tempo que alguns dispõem do
privilégio de se manter em distanciamento
social com todas as suas necessidades
supridas e com um Ensino Remoto (forma
de ensino praticada atualmente frente ao
caráter emergencial de manter as
atividades escolares com o distanciamento
social, tem se utilizado a tecnologia digital
como meio para envio de atividades) de
qualidade, existem espaços que têm lutado
para manter o vínculo escolar de forma
democrática e inclusiva, embora as
condições estruturais não permitam que
esse processo ocorra sem grandes impactos
e problemáticas. Isso porque muitos
professores e professoras e alunos e alunas
não têm conseguido acesso às plataformas
de ensino, ou, quando conseguem, é em
meio a situações adversas. Dentre os
ambientes que atravessam esse período, de
forma complexa, está o campo.
Nesse sentido, a pesquisa tem como
objetivos: i) compreender como tem
ocorrido o Ensino Remoto nas escolas do
campo de Ibiassucê - BA; ii) examinar de
que forma questões históricas e sociais se
desdobram dentro do contexto escolar; iii)
debater pontos do Ensino Remoto
presentes no cotidiano familiar e docente
que refletem no processo de ensino
aprendizagem; iv) elencar problemáticas
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
5
do ensino mediado pelas tecnologias
digitais na Educação do Campo.
Na busca por suprir os objetivos da
pesquisa, inicialmente será apresentado por
meio do referencial teórico o contexto
geral da pandemia no Brasil e suas
implicações na educação, destacando
pontos que perpassam as questões sociais
e, para concluir essa seção, será
apresentado um tópico contextualizando a
educação do campo no cenário da
pandemia. A seguir, será apresentada a
metodologia, com abordagem qualitativa e
fazendo o uso do instrumento questionário
para a coleta de dados. A análise e
discussão dos resultados está dividida em
três subseções, primeiramente será
apresentada a contextualização geral das
escolas do campo pesquisadas, em
conjunto com a apresentação das
metodologias e recursos utilizados no
Ensino Remoto do campo, destacando-se
os pontos positivos e negativos elencados
pelos sujeitos da pesquisa. Logo após,
apresentamos uma abordagem sob a
perspectiva dos pais. Para concluir as
reflexões acerca da temática proposta pelos
pesquisadores, serão, por fim, expostas as
considerações finais.
Contexto geral da pandemia no Brasil e
suas implicações na educação
O contexto atual é abordado de
forma sintética, apenas com o intuito de
compreender as problemáticas que
permeiam a educação nesse cenário. De
acordo com as informações disponíveis no
site do Ministério da Saúde, em 1937 os
primeiros coronavírus humanos foram
isolados, mas em 1965 o vírus foi
referenciado como coronavírus, em virtude
do seu perfil na microscopia,
assemelhando a uma coroa (Ministério da
Saúde, 2020).
O agente patogênico foi descoberto
em dezembro de 2019, após registros de
casos na China. O agente, nomeado SARS-
CoV-2, provoca a doença chamada de
COVID-19, que apresenta um quadro
clínico com várias infecções
assintomáticas e quadros respiratórios
graves (Ministério da Saúde, 2020).
O primeiro caso no Brasil é
divulgado pelo Ministério da Saúde em 25
de fevereiro de 2020, desde então foram
registrados aproximadamente 888.271
casos, com 43.959 vítimas fatais até a data
de 15/06/2020 (Ministério da Saúde,
2020). Nesse contexto, muitas medidas de
enfrentamento tiveram que ser tomadas,
entre elas a suspensão das aulas presenciais
da educação básica e superior em todo o
país e reorientações das formas de
organização das aulas, por meio de
medidas provisórias, pareceres e
resoluções emitidas pelo Conselho
Nacional e Educação (CNE), decretos
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
6
estaduais e municipais, como medida
sanitária para conter o número de
infectados, zelando, dessa forma, pelas
comunidades escolares e familiares.
A Medida Provisória - MP nº. 934 de
de Abril de 2020 (Brasil, 2020, p. 1)
estabelece as normas que deverão ser
adotadas no ano letivo de 2020, devido às
medidas de enfrentamento à pandemia de
COVID-19:
Art. O estabelecimento de ensino
de educação básica fica dispensado,
em caráter excepcional, da
obrigatoriedade de observância ao
mínimo de dias de efetivo trabalho
escolar, nos termos do disposto no
inciso I do caput e no § do art. 24
e no inciso II do caput do art. 31 da
Lei 9.394, de 20 de dezembro de
1996, desde que cumprida à carga
horária mínima anual estabelecida
nos referidos dispositivos,
observadas as normas a serem
editadas pelos respectivos sistemas
de ensino. (Brasil, 2020, p. 1).
Foram emitidos também alguns
pareceres como, O parecer CNE/CP
15/2020, aprovado em 6 de outubro de
2020 que versa sobre as Diretrizes
Nacionais para a implementação dos
dispositivos da Lei nº 14.040, de 18 de
agosto de 2020, que estabelece normas
educacionais excepcionais a serem
adotadas durante o estado de calamidade
pública reconhecido pelo Decreto
Legislativo 6, de 20 de março de 2020.
E o Parecer CNE/CP 5/2020, aprovado
em 28 de abril de 2020 que Reorganiza o
Calendário Escolar elencando a
possibilidade de cômputo de atividades não
presenciais para fins de cumprimento da
carga horária mínima anual, em razão da
Pandemia da COVID-19. É importante
mencionar que para além desses, outros
dispositivos legais foram emitidos e
adotados que esta pesquisa não elenca em
virtude de sua abrangência.
Como apontam a MP e os pareceres,
devido à necessidade de manter o vínculo
escolar com as famílias, o cumprimento
das atividades curriculares, e as
disposições presentes na Base Nacional
Comum Curricular (BNCC), entre outras
questões, as instituições de ensino têm
buscado realizar atividades remotas
mediadas pelas tecnologias digitais.
A pandemia, questões sociais e impactos
no cenário educacional
Para falar de Ensino Remoto, acesso
às tecnologias digitais, problemáticas e
resultados que estão imersos no atual
contexto, é preciso mencionar questões
sociais que estão diretamente ligadas ao
processo de ensino e aprendizagem, pois
muitas desigualdades foram claramente
expostas nesse momento, evidenciando
desigualdades e outros problemas que
assolam a sociedade há muito tempo. A
Associação Brasileira de Saúde Coletiva
(ABRASCO, 2020) teceu algumas
reflexões no Grupo Temático Educação
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
7
Popular e Saúde promovido pela
Associação Nacional de Pós-Graduação e
Pesquisa em Educação (ANPED): no atual
modelo de desenvolvimento e acumulação
de riquezas, altamente excludente, ter
acesso a uma saúde de qualidade está
diretamente ligado à garantia de melhores
condições de vida e trabalho. Essa questão
também se estende à educação, pois a
condição para aprender está diretamente
ligada ao acesso mínimo a bens e serviços.
A ABRASCO (2020) enfatizou que,
com a pandemia, as desigualdades e
iniquidades impostas e reforçadas pelo
capitalismo foram evidenciadas, pois a
COVID-19, de forma incisiva e rápida,
forçou transformações nos modos de viver
que se manifestam de formas diferenciadas
nos grupos vulnerabilizados.
A ABRASCO (2020, webpage)
ainda traz uma grande problemática do
atual contexto, questionando: “como
aproveitar esse momento para estabelecer
novos paradigmas de saúde e educação,
que não sejam culpabilizadores e
prescritivos?” Dessa forma, a ABRASCO
não desvincula a crise sanitária atual das
questões sociais, políticas e de saúde
pública que afligiam boa parte da
população, refletindo, em específico, sobre
a educação e as escolas públicas do país,
que atendem alunos que pertencem em
grande parte aos grupos socialmente
marginalizados pelo sistema neoliberal.
Sobre o assunto, a ABRASCO
(2020, webpage) coloca: “os produtos do
desenvolvimento científico, tecnológico e
de inovação, em raras ocasiões, resultam
em políticas públicas que melhoram ou são
incorporadas à vida da maioria das
pessoas”. Isto evidencia os abismos entre
as classes sociais no Brasil, pois ao mesmo
tempo em que as escolas privadas dispõem
de tecnologias (plataformas de ensino,
conexão com a internet, aparelhos
eficientes) e condições propícias para
atender à comunidade escolar em meio ao
distanciamento social, as crianças, jovens e
adultos das escolas públicas estão lutando
pela sobrevivência juntamente aos seus
pares, com recursos tecnológicos
limitados.
Nesse contexto, uma pesquisa
denominada “A situação dos professores
no Brasil durante a pandemia”, realizada
entre os dias 16 e 28 de maio pela Revista
Nova Escola, obteve 9.557 respostas,
sendo 8.121 (85,7%) delas de
professores/as da Educação Básica, aponta
que a “falta de equipamentos eletrônicos
entre os estudantes limita o acesso não
às tarefas, mas também, ao contato com os
professores”. (Nova Escola, 2020, p. 6). A
análise dos dados dessa pesquisa chegou à
conclusão de que “a participação das
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
8
famílias e dos alunos é uma grande questão
no Ensino Remoto, seja por falta de
engajamento, seja de acesso à internet e
infraestrutura” (Nova Escola, 2020, p. 19).
Por outro lado, os docentes se viram
num cenário em que seus espaços
domiciliares se transformaram em sala de
aula, inclusive com a responsabilidade da
manutenção de todos os custos. Em artigo
publicado por Souza, et al. (2020, s./p.),
destacam que:
Para aqueles docentes que não
tinham formação ou familiaridade
com tais tecnologias, tal instrumento
foi montado com o apoio de
familiares ou colegas. Os elementos e
a experiência que compõem o
processo de trabalho docente
presencial precisaram, portanto, ser
readaptados a essa nova realidade,
que não se trata de uma mera
transposição da atividade, antes
modulada no ambiente de sala de
aula em contato direto com os
aluno(a)s, que passou a ser realizada
integralmente em meio digital. Em
termos concretos, a atividade de
trabalho, o objeto e os seus meios
precisaram ser redefinidos num curto
espaço de tempo, sendo os próprios
docentes responsáveis por esse
processo.
Isso evidencia que, não somente o
aluno, mas o professor passou a enfrentar
novos desafios. Além de se tornar
responsável pelas despesas e manutenção
dos equipamentos usados para aula, ainda
tem o fator “familiaridade” com o acesso a
tais recursos, que também pesam no
processo de ensino e aprendizagem.
Para além das questões que têm
afetado o desenvolvimento das atividades
no contexto familiar, é necessário destacar
de que forma os professores têm
atravessado esse momento. A citada
pesquisa realizada pela Nova Escola
identificou que “mais da metade (51,1%)
dos professores relatam não ter recebido
formação de suas redes ou mantenedores
para trabalhar” (Nova Escola, 2020, p. 16),
destacando que “38,8% dos profissionais
afirmaram estar muito preparados para
lidar com as ferramentas digitais. E 11,5%
declararam estar nada ou pouco preparados
para a realidade atual de ensino” (Nova
Escola, 2020, p. 17). Nesse cenário, os/as
pesquisados/as destacaram como principais
preocupações: garantir o acesso à
tecnologia de todas as pessoas envolvidas
no processo de ensino aprendizagem
(famílias e professores/as), acompanhar a
aprendizagem dos/as alunos/as, orientar as
famílias para realizar as atividades
juntamente com as crianças, e planejar as
atividades para serem mediadas a
distância. Avaliando “30% como ruim ou
péssima, 27% como boa e apenas 5%
atribuem nota 9 e 10 para o Ensino
Remoto”. (Nova Escola, 2020, p. 12).
Nesse sentido, fatores como: estresse
com a condição de ter que aprender rápido
para adequar o planejamento, risco de
contaminação, insegurança no que diz
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
9
respeito ao futuro, aumento no tempo de
planejamento das aulas e de dedicação aos
alunos, sensação de não estar dando conta
de todas as demandas profissionais,
familiares e domésticas, não
reconhecimento por parte das famílias e
gestores foram algumas das questões
apontadas como o motivo do adoecimento
dos/das professore/as. Os dados apontam
que “28% avaliam a saúde emocional
como péssima ou ruim, 30% como
razoável”. (Nova Escola, 2020, p. 14).
O documento “Resumo de política:
Covid-19 e a necessidade de ação em
saúde mental”, emitido pela Organização
das Nações Unidas (ONU) também aponta
sobre os impactos que o cenário atual tem
provocado na vida das pessoas afirmando
que, a pandemia pode causar sérios
impactos na saúde mental das pessoas.
Estima-se que, em todos os cantos do
mundo, a tensão gerada por essa nova
rotina de trabalho cria um cenário de
angustia devido ao medo das
consequências do vírus na própria saúde e
de seus familiares. Afora isto, informações
imprecisas e frequentes sobre o vírus, bem
como suas implicações, geram sentimento
de insegurança sobre o futuro (United
Nations, 2020). Desse modo, as
conjunturas familiares e as condições de
trabalho que fragilizam a saúde dos/das
professores/as impactam diretamente no
desenvolvimento das atividades remotas e
no alcance de bons resultados, sendo
necessário desenhar políticas públicas e
ações pedagógicas que corroborem para
suavização dos impactos causados.
A educação do campo no contexto da
pandemia
Frente à crise e distanciamento social
que atingiu a humanidade, as escolas e
famílias tiveram que começar a lidar com o
Ensino Remoto enfrentando alguns
desafios nessa mediação, pois muitas delas
não possuem aparato tecnológico ou
condições básicas para realizá-lo. E o
campo está entre a parcela da população
que se deparou com essa situação sem estar
minimamente preparado para tal.
A Pesquisa TIC Educação 2018,
realizada pelo Comitê Gestor da Internet
no Brasil (CGI.br, 2019) divulgou que
43% das escolas do campo não tem acesso
à internet, sendo que 24% delas apontam
para o alto custo da conexão. Esse dado
ilustra a dificuldade de acesso nesses
espaços, se estendendo para as residências
dos alunos.
Isso significa que esses estudantes
ficam de fora da estratégia do Ensino
Remoto. De acordo com Cunha, Silva e
Silva (2020, p. 33) “... os alunos que não
dispõem de aparelhos celulares que operem
com eficiência os navegadores, aplicativos
e plataformas utilizadas para o ensino
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
10
remoto, não conseguirão acompanhar a
contento.” Salientam ainda que as famílias
que não possuem aparelhos suficientes
para a conexão de todos que precisam,
também podem não conseguir acompanhar
esse ensino. Outro fator observado pelos
autores é que “Há ainda uma parte
significativa dos usuários que o acesso à
internet se por meio do
compartilhamento com domicílios
vizinhos. Situação que determina uma
fragilidade na condição de incluído digital,
preso à iminência constante de ser
excluído.” Pode-se inferir, portanto, que na
realidade de estudantes de escola pública
no interior do Nordeste essa conjuntura é
potencializada pelos fatores
socioeconômicos.
Em uma matéria produzida por
Cunha (2020) para a Revista Educação, o
autor destaca a questão de que nem todos
os municípios possuem aparato
tecnológico para oferecer Ensino Remoto,
para além dos professores não possuírem
formação adequada para ministrar aulas
virtuais. Outro ponto abordado é sobre a
adesão discente às aulas online, pois são
softwares em sua maioria produzidos para
funcionarem em computadores, ambiente
acessado atualmente por apenas 57% da
população brasileira. Cunha (2020)
menciona que, segundo o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE) boa parte da geração Z (pessoas
nascidas do ano de 1997 em diante) nunca
ligaram um computador, e expõe ainda
outro dado: 97% dos brasileiros acessam
internet pelo celular.
Cunha (2020) pontua, também, sobre
a desigualdade enorme entre os sistemas
públicos e privados de ensino da educação
básica, afirmando que, enquanto alunos das
instituições particulares aprendem
utilizando inúmeros recursos e estratégias
combinadas, como aulas ao vivo e/ou
gravadas, disponibilização de tarefas,
acompanhamentos e sessões em grupos
reduzidos para sanar as dúvidas, parte dos
alunos das escolas públicas se quer têm
acesso à internet.
Outra relação que se desdobra dentro
desse contexto são as relações de gênero.
Segundo Lima (2020), que cita dados do
IBGE, em uma produção para o Nexo
Jornal, as mulheres se dedicam em média
18,5 horas semanais aos afazeres
domésticos e cuidados com os familiares,
em contrapartida, os homens gastam 10,3
horas semanais nas mesmas atividades.
Isso revela a desigualdade na distribuição
das tarefas domésticas em virtude de
relações patriarcais consolidadas
historicamente. No enfrentamento da
pandemia, essas questões se
intensificaram. Lima (2020) afirma que,
com a suspensão de aulas presenciais e
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
11
com a necessidade de as famílias
permanecerem em casa, mais
responsabilidades foram direcionadas às
mulheres.
Em boa parte dos casos, são as
mulheres que cuidam das crianças e
consequentemente auxiliam em seus
deveres de casa, e assim o Ensino Remoto
potencializa sua sobrecarga. As mulheres
do campo sofrem com o peso da cultura
machista, sexista e patriarcal
materializadas pela cultura, divisão sexual
do trabalho e tradições, como afirma
Saffioti (2005, p. 71): “... A desigualdade,
longe de ser natural, é posta pela tradição
cultural, pelas estruturas de poder, pelos
agentes envolvidos na trama de relações
sociais.”. Nesse sentido, ele propõe que as
relações entre mulheres e homens, a
desigualdade de gênero, não ocorre de
forma gratuita, e sim construída com
frequência. Essa desigualdade é mantida de
forma estrutural por homens e mulheres,
dado que foi algo naturalizado socialmente
e estas “... reproduzem o patriarcado e se
tornam peças importantes na sua
reprodução e continuidade, por meio,
sobretudo, da educação dos filhos e filhas”.
(Siqueira, 2014, p. 24).
Os impactos das relações de gênero
consolidadas ao decorrer da história
também afetam as professoras que estão
atuando nesse cenário. Ficou evidenciado
na pesquisa realizada pela Nova Escola
que 85% dessa categoria profissional é
composta por mulheres, e no relato dessas
ficaram explícitas “preocupações advindas
da dupla jornada, como a dificuldade de
conciliar as atividades domésticas com as
profissionais e de acompanhar e apoiar os
estudos dos filhos em idade escolar”.
(Nova Escola, 2020, p. 6)
Destaca-se, também, que tem sido
um grande desafio para as mães das
crianças que residem e estudam no campo
acompanharem a realização das atividades,
pois sentem dificuldades para
compreenderem o que é para ser feito e
como explicar e auxiliar seus/suas
filhos/as. Marques (2019), em sua tese de
doutorado, que versa sobre acesso e
permanência de jovens mulheres que
residem na zona rural à universidade,
aponta o fato que mulheres rurais
envolvidas na pesquisa
... experimentaram condições
juvenis muito diferentes das que
suas filhas vivem. Para as mães,
conforme relato das filhas, não
havia muitas opções de trabalho,
escolarização, acesso à
informação e tecnologia quando
jovens. Assim, casaram-se muito
cedo e estudaram muito pouco
(somente uma das mães
biológicas chegou a concluir a
série, hoje denominada ano do
Ensino Fundamental. As demais
cursaram no máximo até a
série, atualmente denominada
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
12
ano do Ensino Fundamental).
(Marques, 2019, p. 92).
Marques (2019) discorre que talvez
esses fatores contribuam para que as mães
se esforcem e valorizem tanto a educação
de seus filhos. Em um passado muito
próximo, o campo não oferecia Ensino
Fundamental e Médio, e as políticas
públicas não asseguravam o acesso às
escolas localizadas na cidade. Para
crianças e jovens terem acesso a essas
etapas, deveriam optar por migrarem para
estudarem ou permanecerem no campo, no
entanto, “ficar ou sair não é simplesmente
uma escolha a bel-prazer dos jovens, mas
uma difícil decisão permeada por
condicionantes estruturais sobre as quais os
jovens individualmente não conseguem
incidir no sentido de superá-las”. (Molina,
2015, p. 15).
É pertinente refletir se a Educação do
Campo tem conseguido de alguma forma
alcançar os alunos e seu propósito com o
Ensino Remoto, não desconsiderando
questões sociais, culturais e políticas, pois
o cumprimento curricular deve estar
atrelado às questões humanas, dialogando
com o que Arroyo, Caldart e Molina (2011,
p. 53) entendem por Educação do Campo
“... aquela que trabalha os interesses, a
política, a cultura, e a economia dos
diversos grupos de trabalhadores e
trabalhadoras do campo...”, visando
produzir conhecimentos, valores e
tecnologias em uma perspectiva de
desenvolvimento social e igualitário desses
povos. Claramente, o contexto é outro:
estamos vivendo um momento que tem
provocado grandes impactos, entretanto,
independentemente do momento, a
educação pública deve cumprir sua função
social visando à formação humana.
As colocações feitas não conseguem
abarcar todas as problemáticas inseridas
nesse contexto, sendo estas algumas
primeiras provocações, visando debater e
compreender questões que têm feito parte
do cotidiano de alunos/as da educação
básica pública, em específico na Educação
do Campo.
Metodologia
A pesquisa possui uma abordagem
qualitativa em vertentes que se apoiam nas
ideias marxistas que, de acordo Triviños
(1987), analisam a realidade de forma mais
complexa, buscando causas e
consequências dos fenômenos e como estes
implicam na construção humana.
No que diz respeito à postura dos
pesquisadores, a pesquisa pautou-se em
estratégias metodológicas que
possibilitassem flexibilidade na ação
investigativa, “porque não existe nada mais
complexo que desvendar os propósitos
ocultos ou manifestos dos comportamentos
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
13
dos indivíduos e das funções das
instituições de determinada realidade
cultural e social”. (Triviños, 1987, p. 124).
Assim, essa postura exigiu-nos uma
imersão na realidade estudada de forma
disciplinada e orientada. Para Triviños
(1987, pp. 121-122) “o pesquisador não
fica fora da realidade que estuda, à
margem dela, dos fenômenos aos quais
procura captar seus significados e
compreender”, pois “o meio, com suas
características físicas e sociais, imprime
aos sujeitos traços peculiares que são
desvendados à luz do entendimento dos
significados que ele estabelece.” Uma vez
que ações que fujam esse princípio “criam
situações artificiais que falsificam a
realidade, levam a engano, a elaborar
postulados não adequados, às
interpretações equivocadas”. (Trivinõs,
1987, p. 122).
Em virtude do distanciamento social,
visando alcançar o maior número de
pessoas na pesquisa, utilizou-se
questionário com sete questões, sendo este
aplicado por meio do Google Forms
(formulário online) com o corpo gestor e
docente que atende a Educação do Campo
do Município de Ibiassucê - BA. Para
mediar o acesso, foi criado um grupo de
whatsapp com todos os pesquisados, em
seguida, foram expostos os objetivos da
pesquisa e solicitou-se que os participantes
respondessem ao questionário
disponibilizado por meio do link de acesso.
O questionário aplicado aos pais/mães
foram enviado via whatsapp, entretanto, de
forma individual, com três perguntas
expostas na mesma plataforma, visando
simplificar o processo em virtude de
algumas dificuldades de acesso e não
familiarização com o Google Forms,
permitindo também respostas em áudios
por conhecer as dificuldades de muitos em
relação à escrita.
Marconi e Lakatos (2003, p. 201)
definem questionário como “um
instrumento de coleta de dados, constituído
por uma série ordenada de perguntas, que
devem ser respondidas por escrito e sem a
presença do entrevistador”, ao tempo que
Gil (1999, p. 128) conceitua de forma mais
ampla, “como a cnica de investigação
composta por um número mais ou menos
elevado de questões apresentadas por
escrito às pessoas, tendo por objetivo o
conhecimento de opiniões, crenças,
sentimentos, interesses, expectativas,
situações vivenciadas etc.”.
Gil (1999) também ressalta os pontos
positivos do uso do questionário enquanto
opção metodológica, sendo alguns deles:
alcançar um número elevado de pessoas,
garantia do anonimato, flexibilidade para
que as pessoas respondam no momento
mais conveniente, não expõe os
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
14
pesquisados a possibilidades de serem
influenciados pelo pesquisador.
Nessa perspectiva, considera-se
primordial o cuidado com alguns aspectos
na elaboração das perguntas, pautando-se
em pressupostos que Gil (1999) coloca
como fundamentais, como, por exemplo,
perguntas claras, objetivas e precisas,
possibilitando apenas uma única
interpretação, não sugerindo respostas,
referindo-se a uma ideia por vez.
Gil (1999) classifica as perguntas de
um questionário como abertas, fechadas e
dependentes. Para alcançar os objetivos
propostos pela pesquisa optou-se pelas
questões abertas, segundo o autor, estas
dão liberdade ilimitada para os informantes
exporem suas respostas, podendo utilizar
sua própria linguagem, não influenciando
com respostas pré-estabelecidas pelo
pesquisador, uma vez que ele escreverá de
forma livre o que lhe vier à mente.
Frente às questões contextuais, a
abordagem qualitativa por meio do
instrumento questionário ofereceu
possibilidades de contemplar os objetivos
da pesquisa, permitindo fidedignidade e
confiabilidade quanto aos dados coletados.
Para analisá-los, os pesquisados foram
denominados de acordo com a posição que
ocupam na vida das crianças, seguida de
letras do alfabeto de acordo a ordem
cronológica das respostas recebidas,
assegurando o anonimato de suas
identidades.
Como qualquer instrumento, este
também apresenta suas limitações, como o
não alcance das famílias que não possuem
acesso ou habilidades com as tecnologias,
ou aqueles que não sabem ler e escrever,
ponto que, certamente, nos impossibilitou a
aquisição de dados fundamentais frente à
questão pesquisada. Entretanto, esse fato
perpassa fatores sociais que não foram
desconsiderados na pesquisa, que busca
contemplá-los de outras formas, como a
análise de respostas dos docentes que
evidenciavam como essas famílias m
sido afligidas, assim como relatos via
whatsapp por meio de áudios respondendo
às perguntas como lhes era possível.
Contextualização geral das escolas do
campo pesquisadas
A pesquisa foi realizada no
município de Ibiassucê - BA, que, de
acordo as informações mais recentes
dispostas no site do IBGE (2017), possui
aproximadamente 10.062 habitantes. As
escolas que atendem o Ensino
Fundamental são dez, distribuídas na zona
urbana e zona rural. O quadro docente é
composto por 78 professores que atendem
1245 alunos/as, o que equivale a uma taxa
de escolarização de 98,5% entre os alunos
de 6 a 14 anos de idade.
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
15
O Índice de Desenvolvimento da
Educação Básica (IDEB) nos anos iniciais
do Ensino Fundamental apontado em 2017
é de 6,0 pontos de modo geral, incluindo
todas as escolas do município. Segundo o
Atlas de Desenvolvimento Humano do
Brasil (2010), 4.706 habitantes residem na
zona urbana e 5.356 na rural.
É importante frisar que a pesquisa
teve foco nas escolas que estão localizadas
no campo e que oferecem Educação
Infantil e Ensino Fundamental I, com
participação de 100% das diretoras que as
atendem e aproximadamente 46% dos
educadores e educadoras que atuam na
docência (destaca-se que todas as pessoas
que atuam em sala de aula e que
responderam à pesquisa foram mulheres).
Conforme os dados coletados no
questionário aplicado para as quatro
diretoras que gerem as seis escolas do
campo pesquisadas, foi contabilizado o
atendimento a aproximadamente duzentos
e quarenta e um alunos de diversas
localidades rurais que pertencem à Pré-
Escola e aos anos iniciais do Ensino
Fundamental, de acordo as informações
coletadas não foi possível especificar a
quantidade exata de alunos de cada etapa e
quantas turmas possuem cada uma delas.
As seis instituições possuem um total de
dezesseis turmas, sendo que algumas
turmas são multisseriadas. O corpo docente
que atende essas seis escolas é composto
por 26 professoras, lotadas nas unidades
escolares de acordo com as necessidades
de organização e atendimento.
Em relação ao perfil socioeconômico
do público que as escolas atendem, 66,6%
dos docentes pesquisados responderam que
pertencem à classe baixa, 25% declararam
que os alunos pertencem à classe baixa ou
média e 8,3% que seus alunos pertencem à
classe média, como evidenciam as
respostas abaixo:
Os alunos são filhos de trabalhadores
de setores privados e trabalhadores
informais. (Professora C)
Alunos de baixa renda, familiares
que trabalham, a maioria na roça e as
mães em casa de família. (Professora
E)
Maioria baixa renda, beneficiária do
programa bolsa família. (Professora
G)
Uma parte classe média e outra
classe baixa. (Professora I)
A maioria classe média. (Professora
L)
As condições socioeconômicas
atingem negativamente a possibilidade de
acesso às tecnologias que permitam o uso
de softwares, plataformas e aplicativos que
podem dar suporte ao Ensino Remoto.
Um percentual significativo das
crianças que frequentam as escolas do
campo possui acesso à internet, algo
positivo frente ao contexto atual.
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
16
Entretanto, isso não lhes assegura a
realização das atividades diárias, ver
Figura 1. Salientamos que, do total dos
docentes que responderam ao questionário,
11 dos 12 pesquisados registraram o
percentual das crianças que possuem
acesso à internet e que apresentam uma
rotina de estudos para atividades.
Figura 1 - Apresentação de dados de duas perguntas com respostas em porcentagem de acordo a solicitação no
questionário.
Fonte: Dados da pesquisa (2020).
A diferença entre o número de
crianças que possuem acesso à internet e os
que realizam tarefas escolares diariamente
expõe algumas problemáticas dessa forma
de ensino. Observa-se que alunos que
possuem acesso à internet, não realizam as
atividades em sua totalidade evidenciando
que o acesso não garante o cumprimento
destas, uma vez que é necessário outras
condições para que isso ocorra como,
acompanhamento, local propício, bem
estar físico e mental, entre outras questões.
É possível identificar que a Turma B os
alunos não possuem acesso diário, mas
realiza as atividades diariamente, de
acordo as professoras pesquisadas estes se
deslocam para casa de vizinhos que
possuem internet ou utilizam a rede móvel
algumas vezes por semana para acessar
todas as atividades, realizando-as e
enviando novamente, como as professoras
fazem o acompanhamento semanal ao final
da semana esses alunos conseguem ter um
saldo total de realização das atividades.
As professoras, A, E e F, que
responderam o questionamento a respeito
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
17
das dificuldades relatadas pelas crianças
sinalizaram os seguintes problemas:
A falta do contato direto entre
professor/aluno e aluno/aluno.
(Professora A)
Sentem dificuldade em realizar as
atividades com os pais, sinalizam a
preferência de realizarem as mesmas
em sala de aula com a professora.”
(Professora E)
A falta da escola e do contato direto
entre professor/aluno, dificuldade em
entender algumas atividades que são
propostas. (Professora F)
A partir do relato das professoras,
colaboradoras da pesquisa, outro fator que
inibe ou dificulta o aprendizado, mediado
pelas tecnologias, é o fato de muitas mães
serem as responsáveis pelos trabalhos
domésticos, algumas trabalham fora e
majoritariamente são elas as responsáveis
por auxiliarem nas lições escolares. Esse
fato desvela relações de gênero e a luta das
mulheres pelo sustento e manutenção da
família.
A falta de familiaridade com o uso
do celular, em razão de esses com acesso à
internet terem chegado recentemente ao
campo, dificuldades com a leitura, o
compartilhamento de celulares de pessoas
próximas, pois parte das famílias não
possui condições financeiras para
aquisição de aparelhos de celulares
próprios, e a internet com baixa qualidade
limita o acesso a links, vídeos e imagens
(recursos utilizados frequentemente nas
mediações) dificultando ainda mais a
eficácia do Ensino Remoto. Problemas
relatados pelas colaboradoras, a exemplo
da professora K, “As queixas é que nem
todos alunos possuem internet além do
mais tem que usar o celular dos pais ou de
terceiros.”
A realidade apresentada não é
exclusiva dos alunos de Ibiassucê, a
desigualdade no Brasil é histórica e
estrutural. As reformas ocorridas mudam
alguns aspectos do panorama educacional
sem alterar a estrutura perversa da
concentração de renda da elite brasileira
que mantém a grande massa distante do
acesso aos bens econômicos, sociais,
culturais, “submergida na precária
sobrevivência e com seus direitos
elementares mutilados” (Frigotto, 2011, p.
237).
Existem outras questões que tornam
o Ensino Remoto inviável para alguns,
como as dificuldades para a compreensão
das atividades, devido à carência na
formação escolar, desmotivação por parte
das crianças uma vez que estão vivendo
um momento atípico de distanciamento
social dos amigos, colegas de escola e
professores, problemas pessoais e
específicos presentes no contexto familiar,
dentre outros que afetam suas vidas e suas
vivências enquanto crianças.
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
18
Metodologias e recursos utilizados no
ensino remoto do campo
As professoras, ao serem
questionados acerca das metodologias que
têm sido utilizadas para alcançar o maior
número de alunos/as possível, responderam
que, como ferramenta para enviar as
atividades, utilizam o aplicativo whatsapp.
Por meio desse aplicativo, disponibilizam
vídeo aulas, algumas produzidas pelas
próprias educadoras, vídeos retirados da
internet de acordo a temática que estiverem
trabalhando, links, textos e imagens.
Com base nos enunciados da
pesquisa, fica evidente que se tem utilizado
ao máximo o aplicativo whatsapp para as
atividades remotas, buscando fazer
diferentes abordagens na tentativa de
auxiliar aos discentes e familiares, com
ligações, chamadas de áudio e vídeo para
auxiliar em suas dúvidas e dificuldades.
Isso caracteriza a luta dos profissionais da
educação em construir situações de
aprendizagens frente às adversidades em
que a escola pública está imersa
historicamente, que foram expostas com
mais intensidade no atual momento.
Expõe, também, os professores a
três bases discursivas centrais: a
meritocracia, a vitimização e o
individualismo”, pois “as concepções
relativas ao constructo do professor como
processos de experiências pedagógicas
individuais passam a ser referências sobre
seus avanços, retrocessos, fracassos e
responsabilidades formativas”. (Souza &
Juliasz, 2020, p. 13). A fala da Professora
K, apresentada a seguir, ratifica a
preocupação dos estudiosos
As metodologias são de modo a
oferecer aos alunos uma melhor
compreensão. Sendo sugeridos
leituras, exibição e análise de vídeos
educativos de acordo com a temática
abordada e com o nível dos alunos
áudios; análises e realização de
atividades a partir de imagens da
internet, notícias, entrevista com
alguém da família etc. (Professora K)
É notável que, majoritariamente, as
crianças acessam a internet por meio dos
aparelhos de celular, utilizando aplicativos
que não exigem aparelhos com bons
sistemas operacionais, desse modo,
podemos vincular essa questão a fatores
socioeconômicos dos alunos e suas
famílias, consequentemente, esse público
não possui acesso a plataformas específicas
de ensino. Isso enfatiza os abismos
presentes entre a educação pública e
privada no país, uma vez que as escolas
públicas não estão munidas de recursos e
preparação profissional para ministrarem o
Ensino Remoto, ao tempo em que as
escolas privadas utilizam tecnologias
avançadas para auxiliarem nos métodos
presenciais e, ao se depararem com a
situação presente, o seu uso foi
intensificado. Os fatos aqui mencionados
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
19
corroboram dados de pesquisas discutidas
anteriormente, que colocam que boa parte
da população não tem acesso a
computadores, embora estas sejam as
ferramentas propícias para executarem
softwares que possibilitem acesso às
plataformas de aulas online.
As diretoras também relataram como
tem sido o acompanhamento das atividades
mediadas pelas tecnologias, duas delas
apresentaram narrações positivas frente ao
contexto, demonstrando que a comunidade
escolar tem unido forças para manter o
vínculo com a escola, disponibilizando
atividades e orientações de acordo com o
que é possível, alcançando, assim,
resultados definidos como satisfatórios.
Como menciona Souza e Juliasz
(2020, p. 14) as ações individualizadas, por
mais importantes que sejam remetem a
indivíduos e quando não acontece a
contento são culpabilizados pelo insucesso.
Do isolamento do constructo social
emerge o isolamento de sua condição
social de existência e, por sua vez,
consolida-se o discurso da culpabilidade”.
A educação como prática social, direito
constitucional, é política pública, as
gestoras em nenhum momento fazem
referência a um plano de investimento para
as escolas do campo enfrentarem as
dificuldades de conectividade dos
discentes, tampouco a formação para os
professores utilizarem a tecnologia no
processo de mediação pedagógica. Buscam
individualmente resolver o problema,
“tento acompanhar da melhor maneira
possível, analisando as atividades, as
propostas, o empenho dos professores”
(Diretora A). “Faço parte do grupo de cada
turma e acompanho diariamente as
atividades desenvolvidas pelos nossos
alunos” (Diretora D).
Freire (2001, p. 259), em uma carta
direcionada aos professores chama atenção
para que a responsabilidade ética, política
e profissional do ensinante lhe coloca o
dever de se preparar, de se capacitar, de se
formar antes mesmo de iniciar sua
atividade docente”. Qual a política de
formação docente foi implantada pela
Secretaria Municipal de Educação para que
os professores pudessem se preparar para o
exercício das aulas remotas?
É importante ressaltar que a busca
por formação continuada deve ser
viabilizada pelos órgãos públicos. Os
educadores são submetidos a cargas
horárias exaustivas com baixos salários, e
isso certamente impede muitos educadores
de se aperfeiçoarem de outras formas, com
novas abordagens, e, em casos que estes
possuem esses conhecimentos e
conseguem lidar bem com as Tecnologias
da Informação e Comunicação (TIC), as
escolas não dispõem de recursos para essa
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
20
prática, assim como parte das crianças,
adolescentes e adultos que pertencem à
escola pública.
O relato das colaboradas da pesquisa,
Diretora D e as Professoras C, D e G,
demonstram outro cenário que os
profissionais envolvidos no Ensino
Remoto têm vivenciado, a ausência de
rotina quanto aos horários, uma vez que
estes ficam disponíveis nos três turnos para
que consigam alcançar o máximo de
discentes e famílias, em razão da
disponibilidade das mães, pais e crianças,
pois são horários variáveis dependendo de
fatores como, tempo e acesso à internet,
tendo assim, suas cargas horárias de
trabalho instáveis e, algumas vezes,
maiores do que o previsto.
São muitos os cenários descortinados
a partir dos relatos das professoras, o
tempo na ação docente, a proletarização e
precarização do trabalho docente, que não
conseguiremos analisa-los nesse artigo,
mas nos instigam a continuar as reflexões
sobre a condição docente que atuam nas
escolas do campo, principalmente no
período pandêmico. Todavia, destacamos
uma importante observação feita por
Pochmann (2011, pp. 191-192):
Com a possibilidade de realização do
trabalho imaterial em praticamente
qualquer local ou a qualquer horário,
as jornadas laborais aumentam
rapidamente, pois não há, controles
para além do próprio local de
trabalho ... Com o computador, a
internet, o celular, entre outros
instrumentos que derivam dos
avanços técnico-científicos, o
trabalho volta assumir maior parcela
de tempo de vida do ser humano.
Para além das questões mencionadas,
ao lidarem com métodos que utilizam as
tecnologias como meio de acesso, as
professoras A, B, E, H, I e L expõem
outros problemas, como a dificuldade dos
familiares e crianças em acompanharem as
atividades, sendo apontados
“descompromisso”, “não compreensão do
papel familiar”, entre outros. Mais uma vez
responsabiliza-se o indivíduo por não
atingir o objetivo almejado.
Entretanto, frente às informações
coletadas e experiências enquanto docentes
da Educação do Campo, vivenciando esse
processo junto às famílias e o corpo
docente, apontamos a necessidade de
compreender as questões sociais que estão
intrínsecas no contexto para analisar de
forma profunda os motivos que justificam
o fato de algumas famílias, mesmo com
acesso à internet, não estarem conseguindo
gerenciar as atividades e dar um retorno
aos professores
Um olhar sob a perspectiva dos pais
O questionário aplicado aos
familiares foi disponibilizado via whatsapp
com três perguntas, uma indagando se o
ensino mediado pelas tecnologias tem
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
21
contribuído com a aprendizagem dos
filhos/as, a segunda questionando sobre as
dificuldades encontradas para fazerem o
acompanhamento das atividades, e a
terceira sobre as dificuldades que os seus
descendentes têm encontrado. Parte das
mães que responderam às perguntas o
fizeram por meio de áudio, compilando
todas as respostas em um único relato que
foi transcrito de forma fidedigna pelos
pesquisadores.
É válido salientar que, do total de 16
participantes, 15 foram mães, deixando
subentendido em seus relatos e falas que
acompanham seus filhos, isso revela que
na atual conjuntura o acompanhamento nas
atividades escolares é majoritariamente
feito pelas mulheres.
É perceptível o sentimento de
gratidão aos professores e professoras e à
escola, por parte das mães, não evidenciam
grandes insatisfações, valorizam as práticas
que estão sendo desenvolvidas, “as
explicações da professora são bastante
esclarecedoras ela tira as dúvidas da minha
filha e assim ela aprende cada vez mais!”
Afirma a Mãe M. Outras mães também
ressaltaram o papel fundamental do
professor nessa mediação.
Sabemos que viemos de um
processo histórico de negação da Educação
do Campo, o acesso a esse direito, ainda
que precário remonta ao final do século
XX, o que explica os poucos anos de
escolaridade da população campesina.
As mães explicitam a dificuldade
para compreenderem as lições, uma vez
que os residentes do campo em um passado
muito próximo não tinham acesso a níveis
mais avançados de ensino. Quando era
possível, estes frequentavam apenas o
fundamental I, pois precisavam ajudar seus
familiares na roça ou nas atividades
domésticas. Aqueles/as que queriam
avançar nos estudos teriam que se deslocar
para os centros urbanos e isso exigia
recursos e suporte, sendo esta uma
realidade inviável para muitos. Posto isto,
é possível compreender os obstáculos que
as famílias estão enfrentando para ajudar
seus descendentes nas atividades. Além
disso, o uso da internet e de celulares é
algo recente, implicando na dificuldade de
manuseio por parte das mães e alunos, em
alguns casos isso se soma ao pouco
domínio de leitura e escrita dos que estão
envolvidos no processo.
O que as mães dos alunos das
escolas do campo de Ibiassucê estão
fazendo, nesse momento atípico que a
humanidade atravessa, é o que Freire
(1998, p. 10) anuncia no seu livro
Pedagogia da Esperança ao afirmar que, a
esperança é necessidade ontológica; a
desesperança, esperança que, perdendo o
endereço, se torna distorção da necessidade
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
22
ontológica”. “... mais graças a Deus tudo a
gente vai habitando vai pegando o hábito
...”; “hoje eu não entendo muito mas o que
posso fazer por ele eu faço”; eu também
estudei pouco mais assim devagar a gente
vai dando pra ensinar e também vai tendo
ajuda das outras pessoas também que
sabem um pouco, devagarzinho a gente vai
indo.” Com as suas formas esperançosas de
acreditarem que os filhos vão aprender, as
mães vão dando suas contribuições para os
filhos fazerem essa travessia.
A Mãe P revela outra faceta do
Ensino Remoto, a dificuldade de
acompanhar pedagogicamente os filhos
que possuem transtornos, como ela
menciona abaixo o Transtorno do Déficit
de Atenção com Hiperatividade (TDAH).
Ele é também, assim, uma criança
agitada que ele (pausa) é complicado
ensinar, porque ele é muito agitado,
não fica quieto, é o tempo inteiro
levantando. A professora mesmo sabe
como é difícil, é o tempo inteiro eu
chamando atenção dele colocando pra
sentar. Ele tem muita dificuldade,
assim parece que cada dia que passa
ele parece que vai esquecendo mais as
coisas que ele aprendeu. Então ele
precisa fazer um tratamento, mas por
conta dessa pandemia ficou difícil para
a gente levar ele no médico, mas
quando tudo isso passar eu vou ...
(Mãe P, áudio whatsapp)
Fazendo uma contextualização
sucinta, de acordo Ghigiarelli (2016, p. 18)
“As crianças com TDAH apresentam
maior dificuldade para aprendizagem
principalmente por dificuldades nas suas
habilidades organizacionais, capacidades
de linguagem expressiva e/ou controle
motor fino ou grosso”, necessitando de
acompanhamento de neuropediatras,
psicólogos e psicopedagogos para que o
processo de ensino aprendizagem ocorra de
forma satisfatória. Esse caso alude a outros
que possuem necessidade de
acompanhamento específico, o que
possivelmente tem sido um grande desafio
para os familiares e crianças que passam
por situações parecidas.
As famílias que têm recebido as
atividades impressas ou as que não estão
recebendo por falta de acesso
(correspondem a aproximadamente 5,6%,
de acordo as informações coletadas) não
conseguiram ser alcançadas para
responderem aos questionários por falta do
recurso tecnológico necessário para
estabelecer essa conexão em virtude do
distanciamento social. Isso ratifica a
dificuldade de acesso à informação e o
empecilho de ouvir aqueles que estão à
margem do processo.
Considerações finais
Frente às bases teóricas discutidas e a
análise dos dados coletados, explicitamos a
necessidade de debater e compreender
como esse momento tem atravessado
diferentes espaços e contextos. O Ensino
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
23
Remoto na Educação do Campo se
apresentou como possibilidade de manter o
vínculo escolar, dando continuidade às
atividades. Embora existam pontos
satisfatórios nessa conjuntura educacional,
como foi elencado pelas/os pesquisadas/os,
como manutenção do aprendizado e
aproximação familiar, é necessário
compreender como se tem dado esse
processo.
Os dados da pesquisa revelam que as
crianças atendidas advêm em grande parte
de famílias com acesso a bens e recursos
financeiros mínimos, o que interfere
diretamente no alcance dos objetivos do
Ensino Remoto. Os fatores sociais e
históricos colaboram para que essa
situação seja mais custosa para alguns. No
cenário educacional, é perceptível a
disparidade entre realidades, nos levando
às reflexões sobre as desigualdades sociais
e a não democratização da educação de
qualidade para todos.
É preciso mencionar o papel
fundamental dos/as profissionais da
educação para manterem o processo de
ensino aprendizagem frente a todas essas
questões. Ainda que não tenham sido
preparados para lidar com o Ensino
Remoto, os educadores/as têm buscado
explorar de inúmeras formas os poucos
recursos disponíveis, lutando para
democratizar ao máximo o acesso às
atividades, não medindo esforços e nem
força de trabalho para se alcançar os
melhores resultados possíveis. Entretanto,
não se pode romantizar estes aspectos, pois
vivemos uma realidade histórica de
desvalorização profissional e atuação em
cenários adversos que precarizam a
educação.
É importante mencionar, também,
que as famílias têm desempenhado um
papel fundamental na realização das
atividades escolares, lidando com inúmeros
desafios, tais como dificuldade nas
orientações; acesso limitado à internet;
aparelhos celulares ineficazes para
desempenhar a função de ferramenta
educacional, e buscando de todas as
maneiras possíveis não permitir que suas
crianças fiquem à margem do processo.
Isto desvela inúmeras questões nas quais o
campo está imerso, se fazendo urgente e
necessário problematizar e lutar por mais
justiça social.
Por fim, evidenciamos o apreço pela
luta dos/das profissionais que atuam no
campo, assim como pelos/as residentes
desse espaço frente à situação caótica que
o país tem vivenciado, uma vez que a
incansável busca por um ensino de
qualidade tem possibilitado alcances
significativos para estes espaços. No
entanto, é necessário apontar também a
necessidade de um olhar sensível e não
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
24
normalizador frente às realidades do
campo e as questões atuais, principalmente
aquelas relacionadas à pandemia de
COVID-19, dado que o campo ainda vive
sob muita luta, com consequências
históricas e desigualdades sociais.
Referências
Associação Brasileira de Saúde Coletiva.
(2020). Educação Popular em tempos de
pandemia: todas as certezas são
provisórias|GT 06. Recuperado de:
http://www.anped.org.br/news/educacao-
popular-em-tempos-de-pandemia-todas-
certezas-sao-provisorias-gt-06
Atlas de Desenvolvimento Humano do
Brasil. (2010). Ibiassucê - BA. Recuperado
de:
http://atlasbrasil.org.br/2013/pt/perfil_m/ib
iassuc%C3%AA_ba
Arroyo, M. G., Caldart, R. S., & Molina
M. C. M. (Orgs.). (2011). Por uma
Educação do Campo (5. ed.). Vozes.
Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística. (2017). Brasil/Bahia/Ibiassucê.
Recuperado de:
https://cidades.ibge.gov.br/brasil/ba/ibiassu
ce/panorama
Ministério da Saúde. (2020). Coronavírus -
Covid19. Sobre a doença. Recuperado de:
https://coronavirus.saude.gov.br/sobre-a-
doenca#o-que-e-covid.
Ministério da Saúde. (2020). COVID 19.
Painel Coronavírus. Recuperado de:
https://covid.saude.gov.br
Medida provisória n. 934, de 1 de abril de
2020. (2020). Estabelece normas
excepcionais sobre o ano letivo da
educação básica e do ensino superior
decorrentes das medidas para
enfrentamento da situação de emergência
de saúde pública de que trata a Lei
13.979, de 6 de fevereiro de 2020. Diário
Oficial da União.
http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visu
aliza/index.jsp?jornal=600&pagina=1&dat
a=01/04/2020&totalArquivos=1.htm
Comitê Gestor da Internet no Brasil.
(2019). Pesquisa sobre o uso das
tecnologias de informação e comunicação
nas escolas brasileiras. CETIC.
Recuperado de: https://cetic.br/noticia/tic-
educacao-2018-cresce-interesse-dos-
professores-sobre-o-uso-das-tecnologias-
em-atividades-educacionais/
Cunha, L. F. F., Silva, A. S., & Silva, A. P.
(2020). O ensino remoto no Brasil em
tempos de pandemia: diálogos acerca da
qualidade e do direito e acesso à
educação. Revista Com Censo: Estudos
Educacionais do Distrito Federal, 7(3),
27-37.
Cunha. P. A. (2020). A pandemia e os
impactos irreversíveis na educação. Revista
Educação. Recuperado de:
https://revistaeducacao.com.br/2020/04/15/
pandemia-educacao-impactos/
Freire. P. (2011). Carta de Paulo Freire aos
professores. Estudos Avançados.
Freire. P. (1988). Pedagogia da Esperança
um reencontro com a Pedagogia do
oprimido. (5ª ed.). São Paulo: Paz e Terra.
Frigotto. G. (2011). Os circuitos da
história e o balanço da educação no
Brasil na primeira década do século
XXI. Revista Brasileira de Educação,
16(46), 235-254.
https://doi.org/10.1590/S1413-
24782011000100013
Ghigiarelli. D. F. (2016). TDAH e o
processo de aprendizagem. Associação
Brasileira do Déficit de Atenção (ABDA).
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
25
Recuperado de: https://tdah.org.br/tdah-e-
o-processo-de-aprendizagem/
Gil, A. C. (1999). Métodos e técnicas de
pesquisa social (5. ed.). Atlas.
Lima, J. (202). Quais os impactos da
pandemia sobre as mulheres. Nexo Jornal.
Recuperado de:
https://www.nexojornal.com.br/expresso/2
020/03/24/Quais-os-impactos-da-
pandemia-sobre-as-mulheres
Marconi, M. A., & Lakatos, E. M. (2003).
Fundamentos de metodologia científica (5.
ed.). Atlas.
Marques, T. G. (2019). Um na roça -
outro na cidade: experiência de acesso e
permanência de jovens mulheres da roça
na Universidade do estado da Bahia
(UNEB) (Tese de Doutorado).
Universidade Federal de Minas Gerais,
Belo Horizonte. Recuperado de:
https://repositorio.ufmg.br/bitstream/1843/
BUOS-
BBPFV2/1/tese___tatyanne__impress_o_.
pdf
Molina, M. C. (2015). Juventudes do
campo. Autêntica.
Nova Escola. (2020). A situação dos
professores no Brasil durante a pandemia.
Recuperado em:
https://novaescola.org.br/conteudo/19386/q
ual-e-a-situacao-dos-professores-
brasileiros-durante-a-
pandemia#:~:text=RETRATOS%20DA%2
0QUARENTENA&text=*A%20pesquisa
%20A%20situa%C3%A7%C3%A3o%20d
os,de%20professores%20da%20Educa%C
3%A7%C3%A3o%20B%C3%A1sica
Parecer CNE/CP 5/2020, 28 de abril de
2020. Estabelece a reorganização do
Calendário Escolar e da possibilidade de
cômputo de atividades não presenciais para
fins de cumprimento da carga horária
mínima anual, em razão da Pandemia da
COVID-19. Ministério da Educação.
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=
com_docman&view=download&alias=145
011-pcp005-20&category_slug=marco-
2020-pdf&Itemid=30192.htm
Parecer CNE/CP 15/2020, 6 de outubro
de 2020. (2020). Estabelece Diretrizes
Nacionais para a implementação dos
dispositivos da Lei nº 14.040, de 18 de
agosto de 2020. Ministério da Educação.
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=
com_docman&view=download&alias=160
391-pcp015-20&category_slug=outubro-
2020-pdf&Itemid=30192.htm
Pochamann. M. (2011). O trabalho no
Brasil pós-neoliberal. Brasília: Liber
Livros.
Saffioti, H. (2005). Gênero, patriarcado,
violência. Perseu Abramo.
Siqueira, A. E. S. S. (2014).
Empoderamento de mulheres agricultoras:
possibilidades e limites de um projeto de
desenvolvimento rural no Semiárido
Baiano (Dissertação de Mestrado).
Universidade Federal da Bahia, Salvador.
Souza, J. G., de & Juliasz. P. C. S. (2020).
Geografia: Ensino e Formação de
Professores. Marília, São Paulo: Lutas
Anticapital.
Souza, K. R., Santos, G. B. Rodrigues, A.,
M. S. Felix, E. G. Gomes, L., Rocha, G. L.,
... Peixoto, R. B. (2021). Trabalho remoto,
saúde docente e greve virtual em cenário
de pandemia. Trabalho, Educação e
Saúde, 19(1), 1-14.
https://doi.org/10.1590/1981-7746-
sol00309
Teixeira, L. (2018). 66% dos professores já
precisaram se afastar por problemas de
saúde. Nova Escola. Recuperado de:
https://novaescola.org.br/conteudo/12302/p
esquisa-indica-que-66-dos-professores-ja-
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020). Educação do Campo na conjuntura da pandemia: alcances, impactos e
desafios...
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e10278
10.20873/uft.rbec.e10278
2020
ISSN: 2525-4863
26
precisaram-se-afastar-devido-a-problemas-
de-saude
Triviños, A. N. S. (1987). Introdução à
pesquisa em ciências sociais: a pesquisa
qualitativa em educação. São Paulo: Atlas.
United Nations. (2020). United Nations:
Policy Brief: COVID-19 and the need for
action on mental health. Recuperado
de: https://unsdg.un.org/sites/default/files/2
020-05/UN-Policy-Brief-COVID-19-and-
mental-health.pdf
Informações do artigo / Article Information
Recebido em : 11/08/2020
Aprovado em: 24/11/2020
Publicado em: 16/12/2020
Received on August 11th, 2020
Accepted on November 24th, 2020
Published on December, 16th, 2020
Contribuições no artigo: Os autores foram os
responsáveis por todas as etapas e resultados da
pesquisa, a saber: elaboração, análise e interpretação dos
dados; escrita e revisão do conteúdo do manuscrito
e; aprovação da versão final publicada.
Author Contributions: The author were responsible for
the designing, delineating, analyzing and interpreting the
data, production of the manuscript, critical revision of the
content and approval of the final version published.
Conflitos de interesse: Os autores declararam não haver
nenhum conflito de interesse referente a este artigo.
Conflict of Interest: None reported.
Orcid
Tatiane Novais Brito
http://orcid.org/0000-0002-6005-6765
Jaime de Jesus Santana
http://orcid.org/0000-0003-4878-7909
Marinalva Nunes Fernandes
http://orcid.org/0000-0001-8200-5101
Como citar este artigo / How to cite this article
APA
Brito, T. N., Santana, J. J., & Fernandes, M. N. (2020).
Educação do Campo na conjuntura da pandemia:
alcances, impactos e desafios. Rev. Bras. Educ. Camp., 5,
e10278. http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e10278
ABNT
BRITO, T. N.; SANTANA, J. J.; FERNANDES, M. N.
Educação do Campo na conjuntura da pandemia:
alcances, impactos e desafios. Rev. Bras. Educ. Camp.,
Tocantinópolis, v. 5, e10278, 2020.
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e10278