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qualidade, adequada às particularidades culturais dos povos indígenas e às necessidades de
interlocução com as escolas não-indígenas, só será realmente eficaz se conduzida por
professores índios que devem, para tanto, ter acesso a cursos de formação inicial e
continuada, especialmente planejados para o trato com as pedagogias indígenas. (Mec,
1998, p. 60, grifo nosso).
Conforme ressaltam Alencar (2018) e Faustino (2006), a elaboração do RCNEI se deu
pautada no que Tubino (2005, p. 91) denominou de “[...] visão axiológica da
interculturalidade e de um universalismo abstrato”, alinhada a uma perspectiva de
interculturalidade funcional. Isto é, compatível ao modelo de desenvolvimento neoliberal que
orientava as reformas nos sistemas educacionais e as ações dos estados nacionais latino
americanos desde o início da década de 1990. As políticas neoliberais reconhecem a
diversidade cultural e linguística, pregam uma educação para a tolerância e o respeito, mas
não questionam os fatores que produzem a desigualdade social, econômica e política dos
grupos sociais que são minorizados e têm suas culturas e línguas deslegitimadas nos estados
nacionais, o que inviabiliza o verdadeiro diálogo intercultural (Tubino, 2005a, p. 05).
A noção de interculturalidade assume, pois, um papel central na construção da
educação escolar indígena, uma vez que a escola se apresenta como um espaço potencial de
reflexão crítica sobre o processo de colonização dos povos indígenas e de promoção dos
diálogos interculturais. Segundo Tubino (2005) o conceito de interculturalidade foi
introduzido no debate sobre educação escolar indígena bilíngue por volta dos anos de 1970 a
partir da experiência de um projeto de educação intercultural e revitalização da língua Baré
conduzido por Mosonyi e Gonzáles Ñañez (1975).
Ao discurso pessimista da época, que vislumbrava a extinção das sociedades indígenas
em decorrência do contato com as sociedades nacionais na América Latina, esses autores
afirmavam que a sobrevivência das sociedades indígenas ocorreria por meio da relação
intercultural na convivência com a sociedade majoritária. Caracterizavam, pois, a
interculturalidade como a “manutenção do quadro de referência da cultura original, mas
fortalecida e atualizada pela inserção seletiva de configurações socioculturais procedentes de
sociedades majoritárias, geralmente nacionais” (Mosonyi & Gonzáles Ñañez, 1975, p. 307).
A introdução do conceito de interculturalidade no debate sobre as políticas estatais de
educação escolar indígena na América Latina se apresentou como uma alternativa crítica às
políticas educacionais vigentes na segunda metade do século XX, posto que evidenciava as
relações de poder entre as sociedades nacionais e as sociedades indígenas. Essas últimas