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e seus modos de vida, e de como concebem quem são os que vivem no campo e os que vivem
na cidade no contexto da globalização, a fim de compreender como as representações
identitárias implicam na Educação do Campo.
Um limite de(s)marcado? A referência ao campo ao longo dos tempos
Segundo Williams (2011), historicamente, a dicotomia campo-cidade se constituiu
como produto do modelo de produção capitalista que apregoou a ideia de que o campo era um
fornecedor que abastecia os centros urbanos, que, por sua vez, eram caracterizados pela
centralização do poder e pela burocratização de serviços e de acesso à riqueza. Devido a isso,
ao campo era destinada a referência ao passado, e à cidade, a referência ao futuro.
Na literatura, as referências ao campo, como analisa o autor, também contribuíram para
a acentuação e naturalização dessa visão, visto que nas obras literárias dos séculos passados
eram empregadas terminologias relativas aos espaços rurais que desempenharam a função de
criadoras de distinções sociais, como “lavra” e “pastoreia”, termos jamais empregados na
referência aos espaços urbanos.
Em consonância com o que define Hannerz (1997) acerca do que é um limite –
obstáculos e descontinuidades, linha clara de demarcação do que está dentro e do que está
fora –, observa-se, através das análises de Williams (2011), que os discursos e as
representações referentes ao campo construídos historicamente apresentaram-se (e deixaram
resquícios) como limite segregativo dos que tinham acesso ao capital e dos que a ele serviam.
Entretanto, na contemporaneidade, essa referência ao campo começa a se modificar,
afinal, com a expansão da globalização e o estabelecimento de regras homogêneas de entrada
para o mundo global, os espaços rurais começam a vivenciar uma espécie de desmarcação do
limite imposto pela história, com a entrada de novas tecnologias e formas de produção, o
aumento da escolaridade, a ampliação de comércio e a prestação de serviços, ou seja, com os
elementos que são considerados como as facilidades da vida urbana.
Inevitavelmente, os modi vivendi e operandi dos espaços rurais foram modificados com
e pela globalização, e as referências ao campo, consequentemente, também. Além dos
elementos tecnológicos, todos os elementos considerados periféricos, que antes estavam nas
periferias dos centros urbanos, passam a fazer parte do cotidiano e dos modos de vida das
pessoas do campo. Dessa forma, as representações românticas, regionalistas e voltadas para as
condições do meio antrópico direcionadas ao campo observadas por Williams (2011) agora
conflitam com as representações que nascem do hibridismo cultural.