Revista Brasileira de Educação do Campo
Brazilian Journal of Rural Education
ARTIGO/ARTICLE/ARTÍCULO
DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e12966
Tocantinópolis/Brasil
v. 6
e12966
10.20873/uft.rbec.e12966
2021
ISSN: 2525-4863
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A organicidade dos egressos(as) da Licenciatura em
Educação do Campo: uma construção em percurso
Brenda Santos de Sousa
1
, Stephanie Oliveira Augusto
2
, Jonhnatan dos Santos Barbosa
3
, Erivelton
Nascimento de Souza
4
, Frederik Moreira dos Santos
5
1, 3
Universidade Federal da Bahia - UFBA. Programa de Pós-Graduação em Ensino, Filosofia e História das Ciências.
Faculdade de Educação da UFBA. Avenida Reitor Miguel Calmon, s/n- Canela. Salvador - BA. Brasil.
2
Universidade Estadual
de Santa Cruz - UESC.
4
Universidade Estadual de Feira de Santana - UEFS.
5
Universidade Federal do Recôncavo da Bahia -
UFRB.
Autor para correspondência/Author for correspondence: brendasantos.bs978@gmail.com
RESUMO. O presente ensaio tem por objetivo apresentar um
relato de experiência em torno das estratégias de auto-
organização de professores egressos(as) da Licenciatura em
Educação do Campo na Universidade Federal do Recôncavo da
Bahia. Para tal, fizemos uma revisão bibliográfica das principais
referências da área de Educação do Campo sobre egressos/as
articulando com nossas próprias vivências. Assim, emolduramos
nosso estudo a partir da abordagem por meio de escrevivências,
termo cunhado por Conceição Evaristo. Como resultado,
evidenciamos a importância da organicidade em prol da
superação dos desafios enfrentados por professores recém-
formados em um curso contra-hegemônico. A pesquisa nos
levou a compreender a necessidade de articulação permanente,
ampliando e fortalecendo a rede de personalidades que
constituem a Educação do Campo.
Palavras-chave: auto-organização, recém-formados, LEdoC.
Sousa, B. S., Augusto, S. O., Barbosa, J. S., Souza, E. N., & Santos, F. M. (2021). A organicidade dos egressos(as) da Licenciatura em Educação do Campo:
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The organicity of newcomer teachers who have a major in
Education for the Countryside: a construction in progress
ABSTRACT. This essay aims to present an experience report
on the self-organization strategies of teachers who have a major
in Education for the countryside in the Federal University of
Recôncavo da Bahia. Thus, we carried out a bibliographical
review of the preeminent academic references in the Rural
Education for the countryside that study newcomer teacher.
Additionally, we articulate the outcome of this research
evidence with our own experiences. So, we framed our study by
the living-and-writing (escrevivências) approach, a term coined
by Conceição Evaristo. As a result, we highlight the importance
to overcome the challenges faced by newcomer teacher in a
counter-hegemonic course the search defends the need for
permanent articulation, expanding and strengthening the
network of people that constitute the Education for the
countryside.
Keywords: self-organization, newly graduate, LEdoC
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La organicidad de los egresados de la Grado en Educación
de Campo: una construcción en curso
RESUMEN. Este ensayo tiene como objetivo presentar un
informe de experiencia sobre las estrategias de auto
organización de los docentes egresados de la Licenciatura en
Educación Rural de la Universidad Federal de Recôncavo da
Bahia. Para ello, realizamos una revisión bibliográfica de las
principales referencias en el campo de la Educación Rural sobre
egresados articulando nuestras propias experiencias. Así,
enmarcamos nuestro estudio desde el enfoque a través de los
escritos, término acuñado por Conceição Evaristo. Como
resultado, destacamos la importancia de la organicidad para
superar los desafíos que enfrentan los docentes recién graduados
en un curso contra hegemónico. La investigación nos llevó a
comprender la necesidad de una articulación permanente,
ampliando y fortaleciendo la red de personalidades que
conforman la Educación Rural.
Palabras clave: auto organización, recién graduado, LEdoC.
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Introdução
Historicamente o campo brasileiro
tem sido destituído da garantia de direitos
fundamentais, especialmente da educação
de qualidade. No desenrolar da construção
social, política e econômica do país, o
projeto de desenvolvimento oferecido a
esse espaço foi demarcado pela alta
concentração fundiária, propulsora das
desigualdades sociais (Maia, 2015) e
exploração dos recursos naturais. As
populações camponesas nesse cenário
apenas eram vistas como mão de obra em
potencial a serviço do mercado
agroexportador.
Dentre o contexto da Revolução
Verde, o primeiro projeto de educação
voltada ao espaço agrário surge com o
propósito de instrumentalizar a mão de
obra para lidar com o processo de
modernização, projeto esse conhecido
como Educação Rural, ou Ruralismo
Pedagógico, que visava fixar os sujeitos no
campo e adequá-los ao modelo de
produção capitalista (Santos & Paludo,
2020).
A Educação do Campo nasce nos
seios dos movimentos sociais para
contrapor essa realidade extremamente
desigual do campo brasileiro. Enquanto um
projeto contra-hegemônico, a Educação do
Campo se caracteriza principalmente a
partir da reivindicação de uma educação
contextualizada, considerando o espaço de
construção de saberes, de produção de
cultura, trabalho e de relações sociais desse
lugar (Ribeiro, 2012; Lima & Lima, 2016;
Lima & Fernandes, 2018).
Diversos legados foram
conquistados nessa conjectura, hoje
balizados legalmente, como os cursos de
Licenciatura em Educação do Campo
(LEdoC) que se encontram espalhados em
diversas instituições pelo Brasil. De acordo
com um censo realizado em 2017,
existem 44 cursos, em cinco regiões
brasileiras, abrangendo 19 estados (Leal,
Dias & Camargos, 2019), sendo a primeira
turma piloto desenvolvida na Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG), com o
curso de Pedagogia da Terra (2005-2009).
Posteriormente, a experiência se estendeu a
outros quatro projetos-pilotos, a própria
UFMG e três outras instituições:
Universidade de Brasília (UnB),
Universidade Federal do Sergipe (UFS) e
Universidade Federal da Bahia (UFBA)
(Leal, Dias & Camargos, 2019). Com base
nessas experiências, em 2012, o Ministério
da Educação (MEC) promulgou um edital
permitindo que outras instituições
ofereçam cursos a partir do Edital
Procampo nº 02 de 2012 (Leal, Dias &
Camargos, 2019; Molina, 2015).
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De acordo com Molina (2015), uma
das principais características da LEdoC é a
modalidade da alternância, como uma
possibilidade de manter o constante
vínculo entre o espaço da academia em
concomitância àqueles das comunidades de
origem dos estudantes e a matriz curricular
que leva em conta, sobretudo, o eixo de
formação sócio-política. Outra
característica que precisamos destacar,
portanto, é a consideração da organicidade
como uma estratégia que fortalece e
prioriza o protagonismo dos sujeitos no
contexto educacional e social (Caldart,
2004).
A organicidade incorporada na
LEdoC é inspirada nas práticas dos
movimentos sociais de luta pela terra e nas
teorias da auto-organização da escola do
trabalho (Begnami & Antunes-Rocha,
2019). Dessa forma, desde o princípio, a
Educação do Campo reivindica que o
processo de formação docente deva
priorizar a formação humana dos
educadores para que eles se coloquem
enquanto agentes participativos na
construção de um novo projeto de
desenvolvimento para o país e para o
campo (Molina & Hage, 2015).
Diante disso, compreendemos que
um egresso/a deste curso mantém a
responsabilidade de continuar se
mobilizando para além dos muros da
escola e da universidade. Alguns estudos
(Brito, 2017; Carmo, 2019; Santos, 2018;
Prado & Silva, 2020; Molina & Pereira,
2021) ao analisar dimensões acerca dos
egressos/as em Educação do Campo de
vários estados, têm apontado semelhanças
em muitos aspectos, especialmente sobre o
perfil que, em sua ampla maioria,
continuam possuindo vinculação com o
campo, bem como ampla participação em
movimentos sociais e/ou sindicais.
Apesar dos referidos trabalhos
apresentarem muitas variáveis positivas em
relação à função social da Educação do
Campo, o que é um importante indicativo
da consolidação desse projeto e dos
retornos para a sociedade, alguns desafios
trazidos caracterizam a necessidade da
auto-organização desses professores
recém-diplomados. Brito (2017), por
exemplo, ao mapear os egressos/as em
Educação do Campo da Universidade de
Brasília (UNB), demonstram o número
expressivo de professores que não estão
atuando como licenciados em Educação do
Campo, apesar da grande maioria se
encontrar inserida no mundo do trabalho.
Além disso, segundo Brito (2017), a
formação multidisciplinar e a dificuldade
de superar a fragmentação do
conhecimento também é um desafio
encarado pelos egressos/as investigados
em seus estudos, a autora evidencia então a
Sousa, B. S., Augusto, S. O., Barbosa, J. S., Souza, E. N., & Santos, F. M. (2021). A organicidade dos egressos(as) da Licenciatura em Educação do Campo:
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necessidade de aprofundamento de
pesquisas que pautem a formação
multidisciplinar. Considerando o exposto é
que levantamos o seguinte questionamento,
a saber: De que maneira os egressos(as) em
Educação do Campo têm se auto-
organizado visando à superação de
desafios postos a professores recém-
formados em um curso contra-
hegemônico?
Diante disso, entendendo o
histórico de surgimento referente aos
embates sociais e políticos envolvidos na
consolidação da Educação do Campo, seu
processo de construção e nas experiências
vivenciadas no bojo desse curso, temos
refletido sobre o sentido e a importância da
organicidade estimulada durante o
percurso. Nessa trajetória, experienciamos
a construção de uma prática coletiva e,
enquanto egressos/as, buscamos construir
estratégias para nos manter vinculados a
este projeto político-educacional e a
repensá-lo constantemente em nossa práxis
pedagógica.
Desse modo, cientes que nossas
reflexões têm ressoado na prática e que, ao
mesmo tempo, é necessário não nos
atermos apenas às nossas singularidades, o
que pretendemos aqui, parafraseando
Lukács (1970) de uma maneira bastante
própria, é esboçar tecituras que vão da
particularidade à universalidade, mas que
também faz o caminho contrário. Por isso
mesmo, este ensaio tem como objetivo
apresentar um relato de experiência em
torno das estratégias de auto-organização
de professores egressos(as) da licenciatura
em Educação do Campo da Universidade
Federal do Recôncavo da Bahia.
Esperamos, com isso, contribuir com
práticas de auto-organização dos
egressos/as, inspirados no princípio da
organicidade fomentada pelos movimentos
sociais.
Metodologia
Este ensaio tem como objetivo
apresentar um relato de experiência em
torno de estratégias de auto-organização de
professores egressos/as da LEdoC. Para tal,
seguimos inspirados no modelo de
pesquisa “ensaio teórico” (Meneghetti,
2011), em que tecemos o fio condutor da
análise das principais referências da área
de Educação do Campo sobre os
egressos/as com o outro fio constituído
pela articulação de nossas próprias
vivências. Temporalmente nos situamos a
partir da vigência do decreto 7352 do
ano de 2010 que versa sobre a Política de
Educação do Campo e o Programa
Nacional de Educação na Reforma Agrária
Pronera.
Ao considerar nossas experiências
neste estudo, nos inspiramos nas
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escrevivências de Conceição Evaristo, pois
esta nos permite redigir o fio narrativo de
nossas vivências, demonstrando o lugar de
potência de vozes por vezes silenciadas e
subalternizadas, com um toque de poesia.
Segundo Oliveira (2009), uma importante
característica desse tipo de abordagem é a
dimensão estética da construção retórica e
a representação do corpo como ato de
resistência. Nesse sentido, nas próprias
palavras de Conceição Evaristo, escreviver
é “escrever, viver, se ver” (Evaristo, 2020),
portanto, significa narrar vivências
particulares, mas que, ao mesmo tempo,
representam experiências coletivas.
Assim, o ensaio se subdivide, a partir
daqui, em duas seções mais as
Considerações Finais. Na seção seguinte,
“Escrevivendo a organicidade durante a
Licenciatura em Educação do Campo”,
relatamos algumas de nossas experiências
enquanto egressos/as da graduação em
Educação do Campo em torno da auto-
organização. na seção “Egressos/as da
Educação do Campo e a organicidade:
esboçando tentativas de práticas da
organicidade”, fizemos um panorama de
algumas pesquisas que retratam dimensões
acerca do perfil de professores recém-
formados na LEdoC, bem como
possibilidades e estratégias de auto-
organização. Por fim, nas Considerações
Finais, apresentamos as implicações do
presente estudo.
Escrevivendo a organicidade durante a
Licenciatura em Educação do Campo
Semanas depois chegaram as
primeiras nuvens de chuva, e da
terra subia um frescor que os
trabalhadores chamavam de ventura.
Diziam que poderíamos cavar um
pouquinho o barro seco para sentir
que a umidade iria chegar, para
sentir a terra mais fria. Era sinal de
que o tempo de estiagem estava
findando. (Junior, p. 94, 2019)
Quem é nordestino, que vive no
campo e do campo, sabe a maravilha que é
sentir os sintomas de chegada da chuva
depois de um longo período de estiagem. O
cheiro de terra molhada, o barulho das
gotas enchendo os baldes na goteira e a
delícia de sentir a ansiedade de, como
diriam os mais velhos e as mais velhas, ver
os riachos sangrarem. Essa sensação é
incomensurável para quem vive na cidade
que, por vezes, nota a chuva se precisar
sair de suas caixas de aço e concreto.
Em nossa trajetória, durante o curso
da Educação do Campo, partilhamos com
outros sujeitos que entendem a alegria de
sentir a chegada da chuva, a construção do
entendimento entre os aspectos biológicos,
químicos e físicos da existência da seca no
semiárido do Nordeste, mas também os
aspectos históricos, políticos e sociais da
falta de pão na mesa durante a estiagem
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que nossos avós, pais e alguns de nós
vivenciamos.
Alguns destes autores vieram da
terra dos diamantes, mais especificamente
da cidade das grutas (Iraquara-Ba),
desbravar o território do Portal do Sertão,
através do campus novo da Universidade
Federal do Recôncavo da Bahia, também
chamado de CETENS (Centro de Ciências
Tecnologia em Energia e
Sustentabilidade).
Em uma cidade distante de casa, sem
dinheiro e sem moradia, cada um trouxe na
bagagem a aspiração de transformar o seu
futuro, o que não era muito diferente da
realidade de outros ledoquianos pelo
Brasil. Sobre isso, Hage, Silva e Brito
(2016), por exemplo, ao desenvolver um
estudo sobre os desafios da consolidação
da Educação do Campo, no Pará, relataram
as dificuldades de permanência dos
estudantes em detrimento da distância das
suas comunidades de origem e o espaço da
universidade.
Apesar disso, nos primeiros
semestres foi até fácil, fora a saudade de
casa, tinha refeição, tinha acomodação,
tinha bolsa. Logo depois, as dificuldades
foram aparecendo, e com algumas
canetadas acabaram com o Pronera
i
,
reduziram o Programa Bolsa
Permanência
ii
, congelaram os
investimentos em educação e saúde por
vinte anos
iii
. É golpe! E agora como é que
“se forma”?
ainda que se discutir como as
políticas públicas voltadas à Educação do
Campo têm sofrido vários ataques desde o
golpe da presidenta democraticamente
eleita, Dilma Rousseff (Mitidiero &
Feliciano, 2018). De pra cá,
presenciamos a intensificação do desmonte
da Educação do Campo a partir do avanço
da agenda neoliberal no Brasil. Cujas
medidas incluíram a pulverização da
Secretaria de Educação Continuada,
Alfabetização, Diversidade e Inclusão
(SECADI), inviabilização do PRONERA e
fragilização das políticas de Reforma
Agrária (Bicalho, Macedo & Rodrigues,
2021).
Molina (2015) nos fornece uma
importante análise sobre como é
possível compreender as políticas públicas
articuladas à dimensão dos direitos, do
estado e dos movimentos sociais. Nesse
sentido, é a partir dos tensionamentos entre
as forças no contexto social que o Estado
irá agir para conceber determinada política
pública. Afinal, a Educação do Campo
nasce como demanda dos movimentos
sociais, mas também em um cenário com
interesses antagônicos vinculados ao
paradigma do capitalismo agrário (Lima &
Fernandes, 2018).
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Determinado aspecto nos revela que
mesmo com alguns avanços a mobilização
constante se faz necessária, especialmente
no cenário de desmontes e retrocessos.
Temos visto que apesar do acesso à
educação ser um direito universal, para
quem pertence aos grupos historicamente
marginalizados a sua negação se pela
criação de uma série de contingências,
principalmente os de permanência nas
instituições de ensino.
Em nosso caso, como filhas e filhos
de agricultores, existir e resistir em um
ambiente acadêmico é uma luta diária, a
caminhada é árdua durante todo processo.
Para conseguirmos prosseguir no curso,
após os cortes e congelamentos de gastos
destinados a educação em 2016 e sob
ameaça de fechamento da nossa
universidade por falta de repasse da verba
pública, acampar, por meio do movimento
Ocupa CETENS
iv
, e ocupar espaços
ociosos no campus da universidade foi a
estratégia de luta que utilizamos.
Nossas reivindicações eram em
busca de políticas de permanência
estudantil. Acampar na universidade,
vender rifa, se manifestar, ir para as ruas:
“TIRA A MÃO DA MINHA FEDERAL”,
esse foi o resultado. Apesar de não termos
êxito no cenário da política nacional, pois
foi aprovado o congelamento de gastos,
como legado dessas batalhas travadas,
conquistamos uma residência Universitária
na instituição e uma casa estudantil através
do apoio municipal, aqui nos reportamos,
especificamente, à Iraquara- BA.
Conquista essa, graças às parcerias entre
estudantes e Sindicato dos Trabalhadores
Rurais Agricultores e Agricultoras
Familiares de Iraquara- Bahia.
É importante perceber que em nossa
trajetória a organicidade foi vivenciada de
maneira bastante orgânica, especialmente
quando nos deparamos com situações que
nos eram exigidos uma auto-organização.
Muito embora, houvesse resistência e
dificuldade em compreender o que de fato
era a organicidade e qual sentido ela
ganharia na matriz curricular.
Nesse sentido, cabe destacar que o
curso de Licenciatura em Educação do
Campo é organizado através da pedagogia
da alternância em períodos denominados
Tempo Universidade (TU) e Tempo
Comunidade (TC). Os tempos formativos
apesar de ocorrer em dois cenários
distintos, na universidade e na comunidade
de origem dos estudantes, perfaz um
percurso formativo integrado uma vez que
os conhecimentos que são balizados em
cada um dos Tempos necessitam estar
amplamente em diálogo. De acordo com
Begnami e Antunes-Rocha (2019), a
organicidade é um elemento central no
processo educativo da LEdoC se
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considerarmos, principalmente, a
necessidade de autonomia dos educandos
que exige a pedagogia da alternância.
Para nós que viemos do ensino
tradicional, caracterizado por
desconsiderar totalmente as comunidades
ao redor da escola e as nossas identidades
enquanto camponeses, inicialmente foi
custoso perceber, parafraseando Begnami e
Antunes-Rocha (2019), a organicidade
enquanto um eixo basilar nessa formação
docente.
Após um hiato no meio do percurso
de nossa formação, o tempo dedicado à
organicidade nos planejamentos do Tempo
Universidade retornou sem qualquer
resistência por parte dos professores e das
representações discentes. Este retorno foi
fruto da reivindicação dos estudantes e
professores do curso que iniciaram um
movimento apoiado pelos gestores da
coordenação do curso, naquele período,
para que voltasse a inseri-la no
planejamento semestral.
Em grande medida, entendíamos a
organicidade apenas sob a percepção do
espaço reservado no fluxograma das aulas
no Tempo Universidade. Este espaço que
considerávamos “vagos” era de costume
destinar a atualizar a matéria acumulada. À
vista disso, durante vários momentos, a
importância da organicidade era
questionada sob a justificativa de que esta
não era verdadeiramente apropriada pelos
discentes. Inclusive, muitos destes
reivindicavam que se não houvesse o
espaço da organicidade, se reduziria os
dias do Tempo Universidade e,
consequentemente, se diminuiria o tempo
longe de suas famílias, o que de fato era
mais doloroso.
Ao que parece, para nós, não foi
possível compreender a organicidade
somente dentro das paredes da sala de aula
da universidade, apesar de este ter sido um
importante espaço para a intensificação da
nossa angústia ao entender o porquê das
mazelas sociais que vivenciamos
atualmente, através dos momentos
dedicados às análises de conjuntura.
Sobretudo, apenas perceber essa realidade,
em uma perspectiva contemplativa não é
suficiente para que os sujeitos
compreendam a participação coletiva como
um verdadeiro princípio democrático e de
transformação.
Por exemplo, uma das autoras vem
do município mais negro do Brasil
v
,
chamado Antônio Cardoso, de uma
comunidade remanescente de quilombo,
não sabia o que era ser quilombola.
Descobriu sua negritude na Universidade,
nas aulas do componente Educação para as
Relações Étnico-raciais, ela entendeu que o
Brasil não foi "descoberto" tampouco que
seus ancestrais são escravos, enquanto uma
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condição existencialista como costumavam
contar. Mas, foi principalmente
percebendo outros corpos negros que
buscavam reafirmar a sua identidade
através da aceitação de seus traços
negróides e seus cabelos crespos. Nesse
ponto, é preciso destacar como a história
do povo afro-brasileiro é suprimida e
sistematicamente descaracterizada,
concordamos com Evaristo (2009), ao
apontar que na literatura canônica nenhum
negro é associado à gênese do Brasil,
somos vistos apenas enquanto um corpo
escravo. Por isso que entender a
autoavaliação de si mesmo e conseguir
analisar aquilo que o sistema conseguiu
adulterar em nós, é um ato político
importante (Berth, 2018).
Foi nesse cenário que em conjunto a
outras pessoas engajadas fundamos o
primeiro coletivo de estudantes negros e
quilombolas da Universidade Federal do
Recôncavo da Bahia, por nome “Coletivo
de Estudantes Negros e Quilombolas Maria
Felipa de Oliveira”. Além disso, as duas
autoras do gênero feminino, mediante aos
casos de assédio no campus da
universidade, juntou-se com outras
mulheres (cis e trans), fundando o
“Coletivo de Mulheres Tereza de
Benguela” que tem o objetivo de lutar
contra as opressões na perspectiva do
feminismo negro.
E foi assim que as lutas históricas
pelo acesso à terra, à educação, pelo direito
de plantar, colher, pelo legado da formação
dos quilombos, nos inspiraram a
compreender o sentido da organicidade na
Educação do Campo e a nos colocar em
movimento. É como uma vez escreveu
Bordenave (1994, p. 74) “A participação é
uma vivência coletiva e não individual, de
modo que somente se pode aprender na
práxis grupal. Parece que se aprende a
participar, participando”. E esta
coletividade não envolve somente os
nossos pares discentes, a parceria e apoio
do corpo técnico e docente foi
fundamental, pois tempo e espaço
formalmente reservados na universidade
são preciosos e dependem de vontade
política e do projeto de universidade que
todos tenham em suas mentes e corações, e
isso se aplica tanto a quem detém as
chaves de metal quanto àqueles que
possuem as chaves imateriais e simbólicas
outorgadas pelo poder representativo. Foi
dessa maneira que conseguimos concluir o
curso, graças ao aprofundamento reflexivo,
à união e às parcerias que nos permitiram
entender a importância da organicidade
para buscar superar as contingências que
atravessam nossos corpos a partir do nosso
lugar social. Mas, e agora, depois que “se
forma”, como é o mundo aqui fora? Muitos
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se perguntariam: O que acontece quando
saímos da caverna do dragão
vi
?
Egressos/as da Educação do Campo e a
organicidade: esboçando tentativas de
práticas da organicidade
A voz de minha bisavó ecoou criança
nos porões do navio ... A voz de
minha filha recolhe em si a fala e o
ato. O ontem o hoje o agora. Na
voz de minha filha se fará ouvir a
ressonância O eco da vida-liberdade.
(Evaristo, p. 10, 2008)
Conforme nos apresentamos,
defendemos a importância da auto-
organização de professores recém-
formados em Educação do Campo,
especialmente porque partilhamos da dor e
da delícia que é ser formado em um curso
contra-hegemônico. Assim, como
buscamos que nossas reflexões também
ressoem na prática, desenvolvemos
algumas estratégias de auto-organização,
muito embora ainda julguemos a
necessidade de ampliação e
aprofundamento das mesmas.
Ainda assim, consideramos que
algumas questões necessitam ser
explicitadas para a fluidez do debate.
Portanto, em termos conceituais adotamos
a definição de organicidade abordada por
Araújo (2014), que a compreende como
uma forma de auto-organização dos
educandos através da:
relação estabelecida entre as
diferentes instâncias na condução de
um processo organizativo/formativo.
É o elo entre as definições e
encaminhamentos de uma dada
organização, garantindo que estes
não fiquem centralizados em uma
pessoa ou grupo, ao qual seja
incumbida a (ir)responsabilidade nas
tomadas de decisões que são
coletivas. (Araújo, 2014, p. 38).
Dessa maneira, na Licenciatura em
Educação do Campo a prática da
organicidade é também um instrumento de
mobilização democrática coletiva a partir
do momento em que o protagonismo dos
estudantes é fundamental na proposta do
curso. De acordo com Begnami e Antunes-
Rocha (2019), a organicidade adotada na
Educação do Campo tem bases na
Pedagogia Socialista, especialmente na
escola do trabalho de Moisey
Mikhaylovich Pistrak. Ainda segundo os
autores, a auto-organização seria um dos
pilares importantes para que os sujeitos no
ambiente escolar possam desenvolver sua
autonomia e se manterem proativos na
participação social. Isso reverbera no fato
de que esta formação vai para além dos
espaços escolares, principalmente por fazer
parte de uma conquista reivindicada
através de um projeto de vida e de
educação protagonizado pela classe
trabalhadora camponesa (Lima &
Fernandes, 2018).
Posto que seja de conhecimento que
a formação do professor tende a continuar
enquanto perdurar a sua docência e que,
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por isso, não é um contrassenso falar em
organicidade dos egressos/as da LEdoC,
ainda avaliamos ser importante elencar que
entendemos a relevância da organicidade
nesse cenário por dois fatores, quais sejam:
1) necessidade dos professores recém-
formados se manterem vinculados à
Educação do Campo e comprometidos com
a construção desse projeto 2) a
organicidade como uma ferramenta de luta
por superação de desafios impostos a
Educação do Campo.
Na esteira do aprofundamento deste
debate, alguns estudos (Brito, 2017;
Carmo, 2019; Santos, 2018; Prado & Silva,
2020) ao analisarem dimensões acerca dos
egressos/as da Educação do Campo em
diferentes estados, têm apontado
semelhanças sobre o perfil dos egressos,
que em sua ampla maioria continuam
possuindo ligação com o campo, assim
como a participação em movimentos
sociais, a exemplo de associações
comunitárias, movimentos sindicais e/ou
cooperativas.
Contudo, mesmo que os referidos
trabalhos apresentem muitas variáveis
positivas em relação à função social da
Educação do Campo, o que é um
importante indicativo da consolidação
desse projeto e dos retornos para a
sociedade, alguns desafios trazidos
concretizam a necessidade da auto-
organização desses novos professores.
Brito (2017), Lima e Fernandes (2018),
Prado e Silva (2020) e Molina e Pereira
(2021), por exemplo, em seus estudos têm
apresentado algumas dificuldades de
inserção no mundo do trabalho de
egressos/as em Educação do Campo na sua
área de atuação. Apesar de não ser uma
realidade homogênea como apontou
Molina e Pereira (2021), ainda existem
dificuldades de reconhecimento do curso e
da formação por área de conhecimento,
pelas Secretarias de Educação, situação
que é comum a diversos estados. Por outro
lado, Brito (2017) e Ângelo (2020)
demonstram como as tensões causadas,
especialmente pelos licenciados, em torno
da luta pelo reconhecimento da LEdoC
pelos poderes públicos têm trazido
conquistas concretas.
Em nosso cenário, a dificuldade de
lecionar na área de atuação também tem
sido um obstáculo, frequentemente, ainda
durante a graduação as portas das escolas
do campo das comunidades eram abertas
para todo o tipo de participação, o que
inclui estágios e desenvolvimentos de
projetos de pesquisa e extensão. A partir da
conclusão do curso as únicas portas de
entrada na educação básica são através de
processos seletivos que além de escassos, a
ampla maioria dos editais no estado da
Bahia e em municípios baianos não tem
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reconhecido a Licenciatura em Educação
do Campo.
Assim, a estratégia que utilizamos
para contribuir com a Educação do Campo
e continuar em processo de formação foi
apostar na pós-graduação. Em uma
pesquisa, Carmo (2019) demonstra que
grande parte dos egressos em Educação do
Campo do Vale do Jequitinhonha, no
período recortado pelo estudo, estão em
outros processos de formação após a
conclusão do curso. No nosso caso,
encontramos na formação continuada um
meio possível para continuar os estudos,
mantendo os anseios de que ela é a chave
para a transformação da formação escolar e
visando garantir o sustento por meio de
bolsas de fomento à pesquisa na pós-
graduação.
Por meio desta realidade, nos
unimos em prol de construir um coletivo
de egressos/as com vistas a desenvolver
um grupo colaborativo de auto-
organização, objetivando uma maior
participação sócio-política para lutar pela
consolidação da Educação do Campo nos
territórios e o aperfeiçoamento da práxis
pedagógica. Algumas experiências
vivenciadas trouxeram uma amostragem
do quão benéfica pode ser tal proposta. A
primeira delas foi a partir da constatação
da relevância da escrita coletiva nessa
realidade de pesquisadores e na
importância de nos mantermos ligados aos
movimentos sociais.
Nesse sentido, uma das ações do
coletivo é o compartilhamento de todo e
qualquer evento ligado à Educação do
Campo no plano nacional e estadual e
outras áreas afins como: Educação, Ensino
de Ciências, Educação em Ciências,
Educação Matemática e Movimentos
Sociais. O intuito dessa ação é buscar em
alguma medida, através da participação e
da escrita colaborativa divulgar a Educação
do Campo e contribuir com os debates
atuais. O que corrobora com a necessidade
do fomento de novas pesquisas que tenham
como foco especialmente o trabalho
pedagógico dos professores. De acordo
com Ferreira e Molina (2014), as principais
transformações a serem buscadas no
âmbito da produção de conhecimento é a
construção de práticas pedagógicas
capazes de trazer para dentro da sala de
aula as condições de reprodução material
da vida no campo. O que também precisa
ser vinculada ao aprofundamento da
compreensão de problemas atuais
articulados aos conhecimentos científicos
historicamente acumulados pela sociedade
(Ferreira & Molina, 2014; Melo, 2020).
Além disso, segundo Brito (2017), a
formação multidisciplinar e a dificuldade
de superar a fragmentação do
conhecimento também é um problema
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encarado pelos egressos/as investigados
em seus estudos, a autora evidencia a
necessidade de aprofundamento de
pesquisas que pautem a formação
multidisciplinar.
Neste coletivo buscamos auxiliar
outros sujeitos a participarem de processos
seletivos para a Educação do Campo e
cursos de pós-graduação. Outra estratégia
que surge dessa organização e da
vinculação a movimentos sindicais é a
atuação junto aos municípios para a
consolidação da Educação do Campo nos
territórios. Adentramos as diretorias
sindicais, temos participado de comissões
de organização da juventude no Portal do
Sertão, em Feira de Santana, e de uma
comissão para reivindicar uma diretoria da
Educação do Campo integrada à Secretaria
de Educação do município de Iraquara-
Bahia. Esta última reivindicação, em
processo de discussão do projeto junto a
prefeitura municipal, tem alcançado
sinalizações positivas.
Para além dessas experiências locais,
algumas iniciativas de auto-organização de
egressos/as também têm surgido em outras
regiões. Neste sentido, tivemos o prazer
em participar do Webinário “Vivências e
Saberes na Formação em Educação do
Campo: com a palavra egressas/os das
Ledocs” coordenado pelo professor José
Guilherme Franco Gonzaga da
Universidade dos Pampas, em que ao nos
conectar com professores egressos/as da
Licenciatura em Educação do Campo de
diversas regiões do Brasil, tivemos como
encaminhamento a organização para a
realização do I Encontro de Egressas/os da
Licenciatura em Educação do Campo do
Brasil.
Considerando o exposto,
compreendemos que os caminhos para a
transformação da escola e a promoção da
docência coletiva também passa pela
organicidade, concordamos com Caldart
(2004), ao estabelecer que a organicidade é
o motor da coletividade, o que nos traz
fundamentos empíricos para fugir dos
individualismos tão incentivados em uma
sociedade capitalista.
Considerações finais
Neste ensaio apresentamos um relato
de experiência em torno de estratégias de
auto-organização de professores
egressos/as da LEdoC. Os fizemos por
meio das nossas escrevivências em torno
da prática da organicidade durante o curso
de Licenciatura em Educação do Campo na
Universidade Federal do Recôncavo da
Bahia, articuladas aos estudos que
abordam a atual conjuntura dos recém
formados em Educação do Campo pelo
Brasil.
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Ao apresentar nossas escrevivências,
demostramos como a organicidade é
necessária para a efetiva participação
democrática, luta por garantia de direitos,
transformação social e ampla consolidação
da Educação do Campo. Entendemos que
uma série de desafios são enfrentados por
ledoquianos de todo o país, especialmente
no atual cenário de retrocessos e perca de
direitos que vivenciamos com o avanço do
projeto ultraliberal no Brasil. Cujos
desafios vão ao encontro da redução de
políticas públicas específicas para a
Educação do Campo, dificuldades de
inserção no mundo do trabalho na área de
formação e superação do ensino em uma
perspectiva fragmentada. Assim, diante do
problema de pesquisa apresentado neste
estudo, conjecturamos que estratégias de
auto-organização têm existido,
especialmente através do constante vínculo
aos movimentos sociais do campo
mantidas pelos egressos. Em nosso
contexto, através da iniciativa do coletivo
de egressos/as temos buscado exercitar a
escrita colaborativa e o desenvolvimento
de ões voltadas ao fortalecimento da
Educação do Campo em nossos territórios
juntamente aos movimentos sindicais.
Diante disso, reconhecemos que
iniciativas de auto-organização de
egressos/as devem se somar às lutas pela
concretização da Educação do Campo,
especialmente no âmbito de
implementação e continuação de políticas
públicas garantidas, ampliando e
fortalecendo a rede de seres sociais que
fazem a Educação do Campo.
Agradecimentos
Os autores agradecem ao Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq) pelo apoio financeiro
recebido por meio das bolsas.
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Ver:
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corta-bolsas-de-estudo-de-indigenas-e-
quilombolas/.
iii
Ver PEC 55/2016, recuperado de:
https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materia
s/-/materia/127337
iv
Ver página virtual do movimento, recuperado de:
https://www.facebook.com/ocupacetens
v
Município mais negro do Brasil: O município de
Antônio Cardoso possui o maior percentual de
pessoas que se declaram negras entre os municípios
brasileiros, segundo o último censo do IBGE.
recuperado de:
https://cidades.ibge.gov.br/brasil/ba/antonio-
cardoso/pesquisa/23/24248
vi
Apelido dado pelos estudantes à UFRB, fazendo
referencia a um desenho animado da década de 80.
Informações do Artigo / Article Information
Recebido em : 30/10/2021
Aprovado em: 12/10/2021
Publicado em: 13/11/2021
Received on August 30th, 2021
Accepted on October 12th, 2021
Published on November, 13th, 2021
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responsáveis por todas as etapas e resultados da
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dados; escrita e revisão do conteúdo do manuscrito
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& Santos, F. M. (2021). A organicidade dos egressos(as)
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SOUSA, B. S.; AUGUSTO, S. O.; BARBOSA, J. S.;
SOUZA, E. N.; SANTOS, F. M. A organicidade dos
egressos(as) da Licenciatura em Educação do Campo:
uma construção em percurso. Rev. Bras. Educ. Camp.,
Tocantinópolis, v. 6, e12966, 2021.
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