Revista Brasileira de Educação do Campo
Brazilian Journal of Rural Education
ARTIGO/ARTICLE/ARTÍCULO
DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e12970
Tocantinópolis/Brasil
v. 6
e12970
10.20873/uft.rbec.e12970
2021
ISSN: 2525-4863
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Licenciatura em Educação do Campo da Universidade do
Estado da Bahia (UNEB): arte e reflexões sobre o
trabalho pedagógico de egressos(as)
Maria Jucilene Lima Ferreira
1
, Lídia Barreto da Silva
2
, Gilselia Macedo Cardoso Freitas
3
1,
2
Universidade do Estado da Bahia - UNEB. Departamento de educação - Campus XIV. Avenida Luís Eduardo Magalhães,
988, Jaqueira. Conceição do Coité - BA. Brasil.
3
Universidade Federal do Recôncavo Baiano - UFRB.
Autor para correspondência/Author for correspondence: mjferreira@uneb.br
RESUMO. A formação de educadoras(es) do campo assume,
atualmente, a centralidade do debate acerca dos fundamentos
teórico-metodológicos que propiciam processos educativos de
perspectiva emancipadora. Assim, o artigo indaga acerca do
lugar que a arte ocupa no trabalho docente de egressas(os) da
licenciatura em Educação do Campo, da Universidade do Estado
da Bahia (UNEB). Objetiva-se discutir concepções e princípios
da formação de educadoras(es), no curso de licenciatura em
Educação do Campo e as contribuições da arte nesse processo
formativo, para a análise crítica do lugar que a arte ocupa no
trabalho docente de egressos (as). A metodologia ancora-se no
materialismo histórico dialético. Tomou-se como referência para
análise o projeto de reconhecimento do curso, dados da pesquisa
realizada em 2018 e a aplicação de um questionário, pela
plataforma digital Google Forms (2021). Os resultados apontam
que a arte está presente no trabalho pedagógico de egressas(os),
assim como assume lugar de destaque. Conclui-se apontando as
atividades artísticas como alternativa teórico- metodológica para
a formação de educadoras(es) do campo e para o trabalho
pedagógico que realizam.
Palavras-chave: licenciatura em educação do campo, arte,
egressos, formação.
Ferreira, M. J. L., Silva, L. B., & Freitas, G. M. C. (2021). Licenciatura em Educação do Campo da Universidade do Estado da Bahia (UNEB): arte e
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Rural Education Degree of the Universidade do Estado
da Bahia (UNEB): art and reflections on the pedagogical
work of graduates
ABSTRACT. The training of rural educators currently assumes
the centrality of the debate on the theoretical-methodological
foundations that provide educational processes with an
emancipatory perspective. So, the article inquire about the place
that art occupies in the teaching work of graduates of the degree
in Rural Education, at the University of the State of Bahia
(UNEB). The objective is to discuss conceptions and principles
of the training of Educators, in the degree course in Rural
Education and the contributions of art in this formative process,
for the critical analysis of the place that art occupies in the
teaching work of graduates. The methodology is anchored in
dialectical historical materialism. The course recognition
project, research data carried out in 2018 and the application of
a questionnaire, by the Google forms digital platform, were used
as reference. The results show that art is present in the
pedagogical work of graduates, as well as assuming a prominent
place. It concludes by pointing to artistic activities as a
theoretical-methodological alternative for the training of rural
educators and for the pedagogical work they carry out.
Keywords: degree in rural education, art, graduates, training.
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Grado en Educación del Campo, en la Universidad del
Estado del Bahia (UNEB): arte y reflexiones sobre la obra
pedagógica de egressos(as)
RESUMEN. La formación de los educadores en el campo
asume, actualmente, la centralidad del debate sobre los
fundamentos teórico-metodológicos que dotan los procesos
educativos de una perspectiva emancipadora. Entonces, lo
artículo indaga-se sobre el lugar que ocupa el arte en la labor
docente de los egresados de la carrera de Educación Rural, en la
Universidad del Estado de Bahía (UNEB). El objetivo es
discutir concepciones y principios de la formación de
Educadores, en la carrera de Educación Rural y los aportes del
arte en este proceso formativo. La metodología adoptada es lo
materialismo histórico dialéctico. Los instrumentos para el
análisis son el proyecto de reconocimiento del curso, los datos
de la investigación realizada en 2018 y la aplicación de un
cuestionario, por la plataforma digital Google forms (2021). Los
resultados muestran que el arte está presente en la labor
pedagógico de los egresados. Se concluye señalando las
actividades artísticas como una alternativa teórico-
metodológica para la formación del (los) educador (as) en el
campo y para la labor pedagógica que realizan.
Palabras clave: licenciatura en educación rural, arte, egresados,
formación.
Ferreira, M. J. L., Silva, L. B., & Freitas, G. M. C. (2021). Licenciatura em Educação do Campo da Universidade do Estado da Bahia (UNEB): arte e
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Introdução
Desde o golpe parlamentar de abril
de 2016, que destituiu Dilma Rousseff do
cargo de presidenta da República do
Brasil, a educação do país tem sido foco
de amplas reformas, pelo Ministério da
Educação, que significam, sobretudo, o
avanço das políticas neoliberais sobre a
educação básica e o ensino superior. A
Base Nacional Comum Curricular
(BNCC, 2018) e a Base Nacional Comum
para Formação Inicial de Professores da
Educação Básica (BNC - Formação,
2019) são exemplos de documentos que
se constituem como projetos de
educação/formação para o país, sob a
lógica do capital/mercado, que disputam
o currículo escolar e, por conseguinte, os
fundamentos teórico-metodológicos para
a formação de crianças, jovens, adultos e
profissionais da educação.
A BNCC e a BNC-Formação
apresentam-se como padronização e
engessamento formativo. Ou seja, a
política de educação do país sob a retórica
da aprendizagem essencial e da formação
integral (a qual inclui dez competências)
regula os processos formativos e os limita
ao conteúdo aleatório e ao ativismo
pedagógico. “A universalização das
políticas não pode significar
homogeneização, especialmente, no
campo do currículo escolar, onde o
diálogo com as especificidades
socioculturais é fundamental para
qualificar a práxis” (Sena, 2019, p. 20).
Na contramão dessa perspectiva
hegemônica de educação, o projeto de
Educação do Campo, protagonizado pelos
Movimentos Sociais Populares do Campo
e a perspectiva crítico emancipadora para
a formação de educadoras e educadores
do campo, disputam processos educativos
que se articulam a uma compreensão de
Campo, de Educação e de Política Pública
como tríade indissociável. Trata-se de um
projeto educativo que parte da realidade
social concreta da vida e da reprodução
da vida no campo e se lança ao
conhecimento universal, pelo processo de
elaboração de bases teóricas para retornar
à realidade munidos de leituras críticas
necessárias à participação dos sujeitos
nessa realidade/no mundo, com vistas à
sua transformação.
No que diz respeito,
especificamente, à formação de
educadoras/educadores do campo essa
prerrogativa de criticidade e de práxis se
amplia e se faz elementar, na medida em
que a docência é o exercício didático-
pedagógico que materializa, a partir de
âncoras teórico- práticas, o projeto de
formação. Entende-se o projeto de
Educação do Campo e da formação de
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Educadoras/es como mola propulsora dos
processos educativos na escola. No caso
da Licenciatura em Educação do Campo,
ofertada no período de 2010 a 2015, no
Departamento de Educação, Campus XIII
Itaberaba-BA, da Universidade do
Estado da Bahia, os processos educativos
tomaram como referência a arte. Ou seja,
buscou-se ao longo do processo de
formação dar centralidade à concepção de
arte, ao estudo teórico-prático da arte,
traduzindo a conexão entre processos
educativos da formação docente e do
trabalho pedagógico na Escola do Campo.
Daí que este artigo se desenvolve
focalizando a seguinte indagação: Qual o
lugar que a arte ocupa no trabalho
pedagógico de egressas/os do curso de
Licenciatura em Educação do Campo, da
Universidade do Estado da Bahia -
UNEB? Objetivamos, sobretudo, discutir
concepções e princípios da formação de
educadoras/es, no curso de Licenciatura
em Educação do Campo, bem como as
contribuições da arte nesse processo
formativo, tendo em vista a análise crítica
acerca do lugar que a arte ocupa no
trabalho pedagógico de egressas/os em
seus campos de atuação. Quanto aos
caminhos metodológicos, a pesquisa filia-
se epistemologicamente ao materialismo
histórico dialético. Trata-se de um
trabalho que, ao mesmo tempo em que se
percorre a investigação, envolve-se
diretamente com o objeto de estudo, na
relação indissociável com esse objeto.
Utilizou-se nos procedimentos
metodológicos da revisão de literatura;
pesquisa documental, indagando o Projeto
Político Pedagógico do curso; e
questionário aplicado pela plataforma
virtual Google Forms, contendo 13
questões abertas e 8 questões fechadas. O
link foi enviado a 17 egressos (com os
quais se mantém contato) e foram
recebidas 17 respostas.
Para tanto, o desenvolvimento do
artigo se organiza em três partes:
inicialmente encontra-se a abordagem
histórica do curso de Licenciatura em
Educação do Campo, apontando
percursos da sua implantação e
concepções do projeto político
pedagógico. Na sequência apresentam-se
apontamentos das práticas curriculares
desenvolvidas durante o curso,
focalizando a Arte como princípio
fundante para processos formativos e para
a compreensão da práxis educativa e
criadora nas Escolas do Campo.
A Licenciatura em Educação do
Campo - Códigos e Linguagens e
Matemática na UNEB: contornos da
sua materialidade
Iniciamos a escrita desse tópico
com a frase de Paulo Freire (2016),
Ferreira, M. J. L., Silva, L. B., & Freitas, G. M. C. (2021). Licenciatura em Educação do Campo da Universidade do Estado da Bahia (UNEB): arte e
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quando da comemoração do seu
centenário: “Ninguém liberta ninguém,
ninguém se liberta sozinho: os homens se
libertam em comunhão”, a qual expressa
o sentido que perseguimos durante o
processo de materialidade do curso de
Licenciatura em Educação do Campo -
Códigos e Linguagens e Matemática na
Universidade do Estado da Bahia -
UNEB.
Nosso entendimento, ao reunir o
coletivo de professores e professoras,
lideranças dos movimentos sociais do
campo na Bahia e técnicos para a feitura
do curso é que trazíamos as sementes das
tantas experiências dos cursos do
Programa Nacional de Educação na
Reforma Agrária-PRONERA na UNEB,
sobretudo os intensos debates na
construção da Educação do Campo,
forjados na luta por uma educação
emancipadora e libertadora.
Do conjunto das ações da UNEB,
certamente os cursos, desde a
alfabetização ao ensino superior do
PRONERA, fincaram as raízes de um
processo dialógico molhado pela
articulação constante com os movimentos
sociais populares do campo. Nos
ininterruptos encontros, intercalados pela
produção do conhecimento acerca da
educação do campo, avançávamos para o
atendimento aos editais que nos
possibilitavam alcançar os sujeitos do
campo nas suas diversas demandas por
educação. Trazer a materialidade do curso
de Licenciatura em Educação do Campo é
contar com essa base constituída na
práxis voltada para a reflexão e ação dos
cursos de educação do campo na UNEB,
desenvolvidas através de convênios com
o PRONERA. De acordo com o Projeto
de Reconhecimento do Curso (2019)
“Como desdobramentos internos desse
envolvimento com o PRONERA, foram
criados vários cursos superiores voltados
para acampados e assentados de Reforma
Agrária, remanescentes de quilombos e
toda a população campesina” (p. 95).
Na esteira do acúmulo das
experiências, a elaboração do Projeto
Político Pedagógico da Licenciatura em
Educação do Campo contou com a
participação de várias mãos, educadores e
educadoras do campo, envolvendo um
total de 27 pessoas, entre professores,
técnicos e lideranças dos movimentos
sociais populares do campo. A equipe de
sistematização foi coordenada pelo Profº
Drº Antônio Dias Nascimento, em razão
da demanda por esse curso ser
direcionada a ele, através de um pedido
da central da Federação dos
Trabalhadores e Trabalhadoras na
Agricultura no Estado da Bahia (FETAG-
BA), com a participação da equipe do
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Núcleo em Educação do Campo, da Pró-
Reitoria de Extensão (PROEX) e da Pró-
Reitoria de Ensino de Graduação
(PROGRAD).
Dessa maneira, em atendimento ao
Edital 02, de 23 de abril de 2008, da
Secretaria de Educação Continuada,
Alfabetização e Diversidade e Inclusão
(SECADI) e, mediante sua aprovação, a
Licenciatura em Educação do Campo, da
Universidade do Estado da Bahia, foi
criada e autorizada pela Resolução
CONSU 937/2012, para funcionar em
turma única, no Departamento de
Educação de Itaberaba. O curso é oriundo
do Convênio 742.012/2008, firmado
entre a UNEB e o Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação (FNDE),
com a interveniência do Ministério da
Educação (MEC), através da Secretaria
da Educação Continuada, Alfabetização,
Diversidade e Inclusão (SECADI).
Conforme o Projeto de
Reconhecimento (2019) do referido
curso, a UNEB é caracterizada pela sua
multicampia, organizada em
... 24 campi e 29 Departamentos, a
UNEB hoje está presente em
grande parte do território baiano,
em áreas geoeconômicas de
influência, de modo a beneficiar
um universo maior da população
baiana, seja através dos seus
cursos de oferta contínua de
graduação, cursos de oferta
especial de graduação (programas
especiais), cursos de pós-
graduação, projetos de pesquisa e
de extensão. (p. 11).
Ainda, segundo o mesmo
documento, essa “... estrutura multicampi
adotada pela UNEB possibilita a
implantação de novos cursos e Campi
Universitários em regiões com baixos
indicadores sociais que demandam
políticas governamentais pautadas em
ações de caráter educativo ...” (2019,
p.11). Essa característica coloca a
universidade no patamar de vanguarda
frente ao fortalecimento de interiorização
da educação superior cumprindo sua
principal missão. A multicampia da
UNEB e a procedência dos
sujeitos/candidatos a estudantes ser de
diferentes regiões da Bahia foram razões
determinantes na realização do mesmo.
O campus indicado para acolher o
curso foi o Departamento de Educação -
Campus XIII, localizado em Itaberaba-
BA, Portal da Chapada Diamantina, a
partir do diálogo com os movimentos
sociais envolvidos, quais sejam:
Movimento do/as Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais Sem Terra (MST);
Movimento de Luta pela Terra (MLT);
Federação dos Trabalhadores na
Agricultura no Estado da Bahia (FETAG-
BA); Federação dos Trabalhadores na
Agricultura Familiar no Estado da Bahia
(FETRAF-BA); Movimento dos
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Trabalhador/as, Assentado/as,
Acampado/as e Quilombolas (CETA) e
Fundação de Apoio aos Trabalhadores/as
Rurais e Agricultores/as Familiares da
Região do Sisal e Semiárido (FATRES);
Escolas de Família Agrícola; como
também o Fórum Estadual de Educação
do Campo.
Assim, o Departamento de
Itaberaba - Campus XIII ofereceu o curso
Licenciatura em Educação do Campo
PROCAMPO, com habilitação em
docência multidisciplinar nas áreas de
Linguagens e Códigos e Ciências da
Natureza e Matemática.
O curso visou formar professores
para Educação Básica, nos anos
finais do Ensino Fundamental e
Ensino Médio em consonância à
realidade social e cultural
específica das populações que
trabalham e vivem do campo, na
diversidade de ações pedagógicas
necessárias para concretizá-la
como direito humano e como
ferramenta de desenvolvimento
social. (Projeto de
Reconhecimento, 2019, p. 9).
O curso foi implantado na
modalidade de “Turma Especial” de
Licenciatura em Educação do Campo
com habilitação em docência
multidisciplinar em Códigos e
Linguagens e Ciência da Natureza e
Matemática, com a oferta de 60 (sessenta)
vagas. Porém, iniciou com 50 (cinquenta)
discentes, por razões específicas
diretamente ligadas às vontades
individuais, e finalizou suas ações com 42
(quarenta e dois) estudantes. A estrutura
do curso está fundamentada de forma
teórico-metodológica com os princípios e
concepções da Educação do Campo, de
acordo com o Projeto de Reconhecimento
do Curso (2019), quais sejam:
1)
Princípios filosóficos da
Educação do Campo;
2)
Pedagogia da Alternância
como aquela adequada à Educação
do Campo, no que diz respeito aos
tempos educativos nas comunidades
como efetivos tempos escolares; e
3)
Experiências educativas dessa
modalidade pedagógica.
Do ponto de vista da concepção
do curso, este “... baseou-se no
princípio de que a produção do
conhecimento se materializa do modo
mais significativo se esta garantir a inter-
relação de práticas e saberes oriundos
das vivências socioculturais dos sujeitos
autores ...” (Projeto de Reconhecimento
do Curso, 2019, p. 107), em diálogo
com as matrizes
pedagógicas da
Educação do Campo, em consonância às
especificidades dos povos do campo. Já o
regime de alternância do curso se
operacionalizou através do Tempo Escola
(TE) e Tempo Comunidade (TC),
respeitando as características de cada
componente. A alternância dos tempos
educativos teóricos contempla a
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perspectiva do PROCAMPO quando
explicita sua estratégia pedagógica no
sentido de garantir o cumprimento da
carga horária do curso e potencializa a
tríade da própria universidade na
indissociabilidade entre ensino, pesquisa,
extensão. Os distintos tempos educativos,
Tempo Escola e Tempo Comunidade,
articulam os saberes científicos e os
saberes das comunidades através das
atividades de matriz interdisciplinar
elaboradas pelos professores dos
componentes curriculares de cada
semestre letivo. Importante destacar a
operacionalização entre os tempos
educativos do ponto de vista didático-
pedagógico, conforme explicita o Projeto
de Reconhecimento do Curso (2019).
O Tempo Comunidade é o período
em que os estudantes, ao
retornarem para suas respectivas
localidades, desenvolvem
atividades orientadas pelos
professores no decorrer do TE e
fazem dialogar a vivência do seu
cotidiano com os conteúdos
ministrados, na perspectiva da
práxis. É uma das estratégias
importante e reconhecida na
Educação do Campo, pois, garante
ao trabalhador e trabalhadora do
campo, o acesso à educação (em
qualquer nível) sem abandonar o
trabalho da produção, sua
comunidade, seus vínculos
afetivos, simbólicos e produtivos.
(p. 104).
Em suma, o curso de Licenciatura
em Educação do Campo com habilitação
em docência multidisciplinar em Códigos
e Linguagens e Ciência da Natureza e
Matemática revelou no seu fazimento que
é possível que os homens se libertem em
comunhão”, sobretudo no enfrentamento
às contradições e tensões ocorridas no seu
percurso formativo.
O documento que serviu de base
para a escrita dos contornos da
materialidade do curso aponta os limites e
as potencialidades da Licenciatura através
dos detalhes impressos em cada linha e na
leitura das entrelinhas, na cuidadosa
escrita de não deixar escapar as
subjetividades que marcaram a trajetória
de jovens, adultos e idosos, via os sonhos
que sonharam juntos por transformação
social, da educação que liberta e da
materialidade da luta dos Sem Terra.
Arte e processos formativos no curso de
licenciatura em Educação do Campo
Neste tópico nos ocuparemos em
discutir sobre como as práticas artísticas
se revelaram nos distintos processos
formativos e em que a arte contribuiu
para fortalecer a emancipação dos
licenciados e das licenciadas do curso de
Licenciatura em Educação do Campo da
UNEB.
Para tanto, selecionamos algumas
atividades que se destacaram
sobremaneira durante o curso. Um dos
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critérios de escolha usado tem como base
a parceria com docentes do curso que
ministraram aulas em componentes
curriculares que não eram da área
específica de artes; outro aspecto foi o
caráter inovador das atividades propostas,
a exemplo da produção teatral com base
no livro Vidas Secas de Graciliano
Ramos, onde os/as estudantes deveriam
reproduzir o livro todo sem cortes, mas
dividido em equipes. Esta ação foi
possível com a ajuda de todos/as os/as
educandos/as mesmo os que não
cursavam a habilitação de códigos
linguagens; também observamos e
selecionamos a prática da mística durante
o curso, com destaque para as que
aconteceram durante os Seminários de
Articulação do Tempo Escola e Tempo
Comunidade.
As atividades descritas a seguir
foram desenvolvidas em módulos
diferentes não seguindo uma sequência,
também nem todas foram de componentes
curriculares que tinham o tempo
comunidade previsto na matriz curricular
do Projeto Pedagógico de Curso.
Algumas foram solicitadas em um
módulo e os resultados socializados no
módulo seguinte, nesse caso,
dialogaremos com as ações dos
Seminários de Articulação Tempo
Escola/Tempo Comunidade.
Identidade e território no fazer do pano
pedagógico
A partir da necessidade de
socialização das atividades de pesquisa
realizadas durante o tempo comunidade
do primeiro módulo do curso surgiu a
ideia de fazer um Seminário com o tema
“Notícias do Mundo de Lá”. Essa ideia
casaria direitinho, pois o curso era
composto por representantes de 21
municípios da Bahia e a diversidade era
muito grande e queríamos uma proposta
que pudesse contemplar essa diversidade.
Foi então que, inspiradas pela música
“Encontros e Despedidas” de Milton
Nascimento e Fernando Brant,
reproduzida na voz de Maria Rita,
propomos a confecção de um pano
pedagógico coletivo onde cada grupo
deveria, através da imagem, dar notícias
do lugar onde viviam e produziam seu
lugar de vida, pois a plataforma dessa
estação é a vida desse meu lugar, é a vida
desse meu lugar, é a vida...
Para tanto fomos buscar aporte
teórico na Arte Naif (segundo Haddad e
Morbin, 2009, palavra francesa que
significa “natural”, “ingênuo” ou
“primitivo”; pintura que é produzida por
artistas sem formação culta no campo da
arte, muitos considerados autodidatas,
pois aprenderam sozinhos sua técnica e
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não seguem regras nem tendências
artísticas); em alguns artistas como Pedro
Munhoz, com a música Canção da Terra;
e nas produções dos artistas populares
Antônio Poteiro, Silvio Jessé e Henri
Rousseau. A proposta ser pautada nesta
arte foi intencional para fazê-los entender,
na prática, que arte pode ser feita por
todas as pessoas, sejam elas com
formação acadêmica ou não, com
domínio da técnica ou não, e que pode ser
feita de maneira a não ficar presa ao
rigor da técnica e dos padrões
estabelecidos pela academia clássica
erudita, pois compreendemos que a arte
é a atividade humana que consiste em um
homem comunicar conscientemente a
outros, por certos sinais exteriores, os
sentimentos que vivenciou, e os outros
serem contaminados desses sentimentos e
também os experimentar” (Tolstoi, 2002,
p. 15).
Corroboramos com a afirmação do
autor, pois entendemos que o fazer
artístico faz parte da natureza humana e
não deve ser posto como algo
inalcançável ou próprio de determinados
grupos de pessoas ou lugares. A arte para
os Sem Terra significa
Eis o conceito que formulamos
pela experiência do caminhar
político que deu rumo a nosso
destino. A arte é a interpretação do
mundo em que vivemos e a
projeção do mundo que queremos.
É uma mistura de realidade com a
intuição, de um futuro que almeja
vir a ser. Artistas são aqueles que
sempre estão à frente na
interpretação e aceitação dos
desafios eu, enfrentados, movem a
história. Desta maneira, sem terra,
ultrapassa a condição social para
tornar-se realidade sócio-artística,
que cava na consciência de cada
um, o aterro para edificar a nova
história cheia de belezas. Sem ela
a luta não vinga, pois não atrai
energia para alimentar-se e
fortalecer-se (Bogo, 2002, p. 138-
139).
Os Sem Terra têm consciência de
que todos os símbolos que envolvem a
luta tem relação com a arte, ainda que
alguns tenham pensado durante as aulas
que não sabiam produzir arte ou que não
entendiam nada sobre o assunto,
buscávamos refletir de forma a retomar a
consciência do fazer artístico tendo como
base artística teórica as produções dos
próprios campesinos.
A produção da colcha de retalhos
proporcionou aos/as educando/as terem
contato com a História da Arte, assim
como com a história de vida dos artistas
selecionados, sua inserção nos
movimentos artísticos e, logicamente,
articular o conhecimento popular com o
conhecimento científico. Ainda
direcionou o grupo a um olhar
diferenciado sobre a produção artística e
as concepções de Educação do Campo.
O grande painel da vida simples,
singular e cheia de saberes dos povos do
Ferreira, M. J. L., Silva, L. B., & Freitas, G. M. C. (2021). Licenciatura em Educação do Campo da Universidade do Estado da Bahia (UNEB): arte e
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campo nos ensinou, e ainda ensina, que
em “cada saber tem um jeito de ser”, ou
seja, simbolicamente temos os modos de
expressão do camponês, como: marcha de
luta pela reforma agrária; escolas de
família agrícola; assentamentos e
acampamentos da reforma agrária;
festejos; escolas do campo; paisagens do
campo; produção agrícola; comunidades
rurais; movimentos sociais e sindicais do
campo; todos com seus respectivos
fundamentos sócio-políticos.
Essa colcha tornou-se para o grupo
um símbolo que representa a turma da
Licenciatura em Educação do Campo na
UNEB, nas dimensões política, cultural,
econômica, social e de luta pela Educação
do Campo. Passou a ser usada como
símbolo quase que obrigatório nos
eventos acadêmicos dos/as
licenciando/as, nas místicas de abertura e
em várias atividades em comunidades.
Salientamos que, após a confecção dessa
colcha de retalhos, outras foram
confeccionadas em outras Universidades;
em programas e projetos que os/as
educandos são bolsistas ou não; assim
como nos movimentos sociais populares
de luta pela terra; em atividades
religiosas; sendo que até hoje realizamos
essa atividade na Educação do Campo,
para nossa inteira satisfação.
Figura 1 - Colcha de retalhos produzida pelos/as educandos/as da LECampo/UNEB 2013.
Fonte: Foto de Lídia Barreto da Silva.
Outro aspecto que merece destaque foi
o fazer no coletivo, ou seja, para que a colcha
fosse confeccionada, todos deveriam
costurar juntos, e ao mesmo tempo, o que
exigiu agrupamento e cumplicidade para
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dar conta de uma tarefa com dia e hora
para ficar pronta.
Os corpos militantes
Outra atividade que
selecionamos para compor esse artigo
foi a que aconteceu em parceria entre as
docentes dos componentes curriculares
Literatura Brasileira e Fundamentos das
Artes Cênicas, sendo que ambos
compõem a habilitação de Códigos e
Linguagens.
As docentes desses componentes
solicitaram uma atividade de
dramatização do livro Vidas Secas, de
Graciliano Ramos, com o seguinte
roteiro: cada capítulo deveria ser
representado por uma equipe; estudo dos
aspectos regionais e sociais presentes no
texto; planejamento do cenário e
figurino e divulgação da apresentação
teatral.
Esse roteiro foi seguido a rigor pela
turma, mas, para que fosse possível a
montagem da peça e apresentação,
novamente a turma se tornou uma só, pois
os/as educando/as da habilitação de
Ciências da Natureza e Matemática
participaram ativamente da atividade
como um todo, o que reforça o caráter de
coletividade tão preservado pelo/as
educandos/as militantes deste Curso.
Durante as aulas de Fundamentos das
Artes Cênicas vários jogos teatrais
ajudaram a trabalhar a dicção, expressão
facial e corporal e posicionamento em
cena e no tablado. Conforme as figuras 2
e 3 apresentadas abaixo:
Figura 2 - Jogos Teatrais.
Fonte: Foto de Lídia Barreto da Silva
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Figura 3 - Jogos Teatrais.
Fonte: Foto de Lídia Barreto da Silva.
O teatro como linguagem artística
tem a capacidade de “proporcionar às
populações a possibilidade de
expressarem o mundo de acordo com seus
valores, dando voz às suas múltiplas
identidades” (Miranda & Franzoni, 2016,
p. 199), denúncias, protestos e toda forma
de luta. O artista se posiciona através de
sua arte e se coloca como veículo crítico a
toda forma de opressão e desigualdade.
Sobre essa questão Canda (2010)
apresenta o pensamento de Boal, quando
diz
Boal acreditava que o teatro,
enquanto ação humana, é um tipo
de atividade carregada de cunho
político, não sendo neutra, por
isso, os artistas que assumem sua
discordância com o mundo que
conhecemos não devem
desenvolver um processo artístico
que confirme ou reforce a
desigualdade social (p. 42).
Vivenciar, juntos com os/as
estudantes, essa atividade nos fez
reafirmar a importância da produção
artística no processo formativo de futuros
professores e de como a linguagem
artística do teatro pode proporcionar
reflexões no campo político, críticas às
condições sociais e econômicas de um
país e de um povo, assim como
posicionamentos de enfrentamento frente
ao sofrimento principalmente da classe
trabalhadora rural.
Mística para alimentar a luta
Durante os anos de duração do
curso, a mística esteve sempre presente
em todas as atividades: nas aulas, nos
seminários, na ocupação do
Departamento de Educação, nas
atividades fora da sala de aula, enfim, no
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cotidiano formativo do/as educando/as
militantes, porque a mística para o
militante deve exercer
...um papel fundamental, em
termos individuais e coletivo, nas
lutas de massa, nas comemorações
e celebrações, nas alegrias, nas
derrotas e nas vitórias. Tem o
papel de nos animar, de nos
revigorar para novas e maiores
lutas. De nos unir e fortalecer.
Tem o papel de nos
consistência ideológica em nosso
trabalho do dia-a-dia. Queremos
que essa prática contagie todos os
militantes do MST. Queremos que
ela seja exercida em todos os
setores, instâncias, escolas,
cooperativas, acampamentos,
assentamentos. Da mesma forma,
queremos que ela seja exercitada
por outras organizações que m
os mesmos ideais e propósito de
construir uma sociedade socialista
(Bogo, Boff & Pelloso, 1998, p.
05).
A mística ocupou lugar de
destaque, era planejada com
compromisso e a partir de uma motivação
para os que frequentaram o curso.
“Pensar a mística”, como a comissão
responsável se referia ao processo de
fazimento da mesma, era a primeira tarefa
a ser realizada, pois exigia de todos/as
os/as envolvidos/as o compromisso com o
que iriam vivenciar durante esse “ato
cultural”, como é chamada por alguns
militantes.
Vários elementos compõem o “ato
cultural”: é a bandeira do movimento
“que aparece com grande destaque em
todas as manifestações do Movimento”; o
Hino do Movimento dos Sem Terra e as
músicas e poesias que dão o tom e ditam
o compasso de cada militante. Outros
símbolos “como o facão, a foice, a enxada
e os frutos do trabalho tornaram-se
presente no cotidiano da luta,
representando a resistência e a identidade
dos sem-terra” (Morissawa, 2001, p. 210),
todos esses elementos com seus
significados e ainda Os pés descalços ou
em sandálias, o chapéu de palha do
camponês, a panela de barro no fogo são
também representações presentes em
esculturas e pinturas de grandes artistas
apoiadores do Movimento” (Morissawa,
2001, p. 210).
No fazer da mística uma
diversidade de mbolos muito
significativa. Durante o processo de fazer
e apresentar a mística tudo pode se tornar
símbolo, vai depender do contexto, do
que se quer abordar, do que se quer
alcançar com os presentes, sejam
docentes, estudantes, trabalhadores, todos
que estiverem no movimento de
construção de uma sociedade igualitária.
As figuras 4 e 5 abaixo representam de
forma imagética o que queremos escrever
nessas linhas:
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Figura 4 - Mística 1: Seminário de Articulação TE/TC: Notícias do Mundo de Lá 2013.
Fonte: Foto de Lídia Barreto da Silva.
A mística é arte de dizer, gritar
através dos gestos e da composição
estética. Os/as educandos/as se revelaram
cantores, atores, dançarinos, poetas,
músicos, figurinistas, tudo fruto de uma
prática que começou antes mesmo de
adentrarem ao curso e que se aperfeiçoou
e potencializou o gosto pela arte. Arte de
um lutador do povo. Esta constatação nos
remete a Frederico (2013), que assim
escreveu:
Liberta das “impurezas” do
cotidiano, a arte revela uma
realidade mais profunda e
verdadeira. Como manifestação
sensível do Espírito, ela exerce uma
função mediadora unindo o
meramente sensível e o inteligível,
o finito e o infinito, o subjetivo e
objetivo, a natureza prisioneira de si
mesma e a liberdade do pensamento
(p. 29).
E também nas palavras de um dos
educandos que frequentou esse curso:
Em todos os lugares se é
necessário ter a arte presente ela se
faz mover e desenvolve no ser
humano o gosto pela criatividade e
o modo de pensar atuando assim a
liberdade de expressão no tempo
escola e seminário a arte foi os
meus pés no chão me incentivando
a participar pela satisfação causada
em aprender e ter a capacidade
criadora (Padre Josimo Tavares).
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Figura 5 - Nascidos da terra para por ela lutar.
Fonte: Foto de Lídia Barreto da Silva.
Fazer este registro a respeito das
atividades artísticas representa uma
revisitação às vivências educacionais e
artísticas protagonizadas pelos/as
estudantes da LECampo. A memória
pode ter deixado escapar outras tantas
experiências relevantes, além do espaço
deste artigo. Consideramos significativo
registrar, fazendo uso das palavras de
Eduardo Galeano,que “a memória
guardará o que vale a pena. A memória
sabe de mim mais que eu; e ela não perde
o que merece ser salvo”.
Assim, para além dos processos
formativos no curso de Licenciatura em
Educação do Campo do DEDC XIII,
veremos a seguir reflexões em torno da
formação e do lugar que a arte tem
ocupado na atuação profissional dos
egressos e egressas que responderam o
questionário aplicado.
O trabalho pedagógico de egressas e
egressos do Curso de Licenciatura em
Educação do Campo da UNEB:
refletindo sobre o lugar que a arte
ocupa
O trabalho pedagógico é aquele
que se realiza no âmbito da sala de aula e
da ambiência escolar como totalidade.
Trata-se de atividades realizadas pela
docência, com vistas à realização de
processos formativos da escola ou de
outros espaços educativos. O trabalho
pedagógico nas Escolas do Campo ou em
outros espaços educativos dos territórios
rurais é fundamental para a materialidade
do Projeto de Educação do Campo, na
medida em que é por ele que os processos
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de ensino e de aprendizagem ocorrem. Ou
seja, pelo trabalho pedagógico se realiza
um determinado projeto de educação e
suas relações com a sociedade e a
humanização das pessoas.
Ao trabalho pedagógico recaem,
também, os vínculos intrínsecos aos
processos de formação da docência e aos
pressupostos teórico-metodológicos dessa
formação. Nesse sentido, conforme
anunciado anteriormente, os processos
formativos do curso de Licenciatura em
Educação do Campo tomaram como
referência elementos da arte,
vislumbrando sua compreensão e
possibilidades de processos educativos de
perspectiva crítico emancipadora.
A análise dos questionários
aplicados evidenciou que dentre os
respondentes, participantes da pesquisa,
82,4% estão vinculados a movimentos
sociais populares do campo, que são
Movimentos de Trabalhadores
Acampados, Assentados e Quilombolas
do Estado da Bahia (CETA), Movimento
dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
(MST); e Associação de Escolas e
Comunidades de Família Agrícolas da
Bahia (AECOFABA). Esse dado atualiza
que se encontra em voga a
intencionalidade dos movimentos acerca
da formação e qualificação de militantes,
sobretudo aqueles que atuam em Escolas
do Campo. Ou seja,
Na medida em que os
Movimentos Sociais Populares do
Campo compreendem a educação
e o conhecimento escolar como
força motriz na luta pela Reforma
Agrária Popular fazem suas
reivindicações por formação
inicial e continuada, em nível
superior, para educadoras e
educadores do campo sob a
perspectiva crítica e política tanto
para os processos de formação
quanto para os aprendizados e
exercícios da docência. (Ferreira,
Carvalho & Bogo, 2021, p. 25).
Por seu turno, tanto a Escola do
Campo quanto os demais espaços em que
ocorrem processos educativos dos
territórios rurais são disputados pela
classe trabalhadora camponesa, de modo
não a garantir o direito social à
educação, mas uma formação aos povos
campesinos, ancorada na perspectiva
crítica, emancipadora e politicamente
definida em favor do projeto histórico e
da luta social, protagonizada pelos
Movimentos Sociais, Sindicais e
Populares do Campo. Registre-se ainda
que a intencionalidade é o intenso
processo de formação continuada, em
nível de pós-graduação e, por isso
mesmo, 52% dos respondentes (09
pessoas) se encontram com o curso de
Especialização lato sensu concluído e
17,6% (03 pessoas) se encontram
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cursando esse nível de ensino, como
mostra o gráfico da Figura 6.
Figura 6 - Participação dos respondentes da pesquisa em cursos de especialização lato sensu.
Fonte: Questionário Google (agosto/2021).
A formação continuada, para quem
atua no âmbito da educação, é condição
elementar para a perspectiva crítica de
educação que se pretenda realizar como
afirma o Mestre Paulo Freire (2016)
“teoria sem prática é blá, blá, blá
(teoricismo) e prática sem teoria é
ativismo pedagógico.” Nesse sentido é
que se considera que a formação
continuada possibilita o equilíbrio
necessário, pelo exercício da práxis, para
os processos de ensino e aprendizagem.
Verifica-se no gráfico da Figura 6 que um
número significativo de egressos, mais de
50% dos respondentes concluíram a
especialização e, portanto, se encontram
em um processo avançado de atuação
profissional em educação e formação
continuada.
Figura 7 - Número de respondentes da pesquisa que atuam em educação.
Fonte: Questionário Google (agosto/2021).
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Essa prerrogativa interliga-se com
outra informação importante identificada
no questionário, ao juntarmos os
percentuais de atuação em escolas 47%
(08 pessoas) das egressas que estão
exercendo a docência, como mostra o
gráfico da Figura 8.
A docência é o trabalho do
professor e neste os profissionais
desempenham um conjunto de funções
que se estendem para além da tarefa de
ministrar aulas, inclui o ensino, mas não
se restringe a ele, então, processos
educativos podem ocorrer também em
espaços distintos da escola o
escolares definidos como
"...possibilidades do inusitado, do
diferente, da autonomia reivindicada para
desenvolver o trabalho formativo
‘desinteressado’, mas intencionalmente
planejado, organizado e propositivo para
o enfrentamento da força do capital sobre
os direitos sociais, a natureza, o trabalho"
(Carvalho & Ferreira, 2020, p. 18- 19).
No gráfico da Figura 8 verifica-se a
diversificação do campo de atuação dos
respondentes do questionário, assim como
a relação entre a educação e atuação
profissional:
Figura 8 - Diversificação do campo de atuação dos respondentes da pesquisa.
Fonte: Questionário Google (agosto/2021).
Esse dado representa que dentre as 17
pessoas participantes da pesquisa 10
encontram- se envolvidas com a área de
Educação. Ademais, provoca a reflexão
da importância da Licenciatura em
Educação do Campo, pois a
especificidade dessa formação orienta a
atuação profissional de Educadoras e
Educadores em Escolas do Campo, mas
também em Secretarias de Educação,
Setores de Educação de Movimentos
Sociais Populares do Campo, a exemplo,
do CETA e do MST.
Ao questionarmos sobre a
modalidade de ensino ou campo
específico de atuação foram encontradas
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as seguintes respostas, conforme o gráfico na
Figura 9:
Figura 9 - Modalidade de ensino ou campo específico de atuação.
Fonte: Questionário Google (agosto/2021).
Assim, evidencia-se que na atuação
profissional uma predominância da
Educação Básica, rede pública, em
territórios rurais. Nesses aspectos, chama-
nos a atenção que esta atuação está se
dando com pessoas oriundas de
comunidades camponesas, com pessoas
que foram excluídas do tempo regular de
sua escolarização, por exemplo a
modalidade EJA e também em espaços da
gestão escolar (conselhos e colegiados).
Esse dado tanto exige a rigorosidade e
densidade teórica dos processos
formativos, quanto os egressos e egressas
são chamados, pela importância dos
cargos que ocupam, a estarem vigilantes
quanto ao exercício da práxis, aos
elementos de crítica necessários à leitura
da realidade concreta em que está inserida
sua força de trabalho e o público de
crianças, jovens e adultos com os quais
estão a realizar processos educativos.
Do ponto de vista das contribuições
do estudo da arte, os egressos e egressas
que participaram dessa pesquisa afirmam
que a arte é:
Arte é o que dá graça e entusiasmo às
pessoas e ao mundo.
Arte nos um entendimento de
mundo mais amplo em meio de
comunicação entre as pessoas e os
povos, nos subsídio para
compreender melhor a vida e suas
emoções.
Para mim Arte é qualquer atividade
humana que está ligada com as
manifestações, por meios de uma
variedade de linguagem como
música, dança, teatro e desenho etc...
A arte ocupa vários espaços,
vinculada em vários sujeitos e nossa
representação.
É a arte de abunitar o fazer
pedagógico, possibilitando ludicidade
no processo de ensino aprendizagem.
São formas criativas de expressar, de
cada sujeito. Intercâmbio de prática e
teoria.
Arte é as diversas maneiras de
expressar o sentimento do artista
sendo ela pela música, dança,
literatura...
A arte é a forma do ser humano
expressar suas emoções.
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É toda forma de expressar
sentimentos seja ela na tela, no corpo,
no canto, no jeito de lidar com a luta
e com a vida.
As 10 afirmações destacadas, que
apontam a arte como atividade própria do
ser humano, criação, expressão de
sentimentos, apontam também para
relações que se estabelecem entre arte e
formas de viver e organizar a vida. Nesse
sentido, inferimos sobre a importância de
ressaltar a existência, a relevância, a
necessidade e a função social da arte nos
processos de formação de educadoras e
educadores do Campo, pois desse debate
se origina compreensões sedimentadas na
práxis educativa e criadora, tendo como
horizonte processos de formação crítica e
de perspectiva emancipadora.
Do latim ars, a arte é o “talento de
saber fazer” (Bogo, 2016) e se caracteriza
como atividade vinculada a habilidades
humanas, conforme Bogo afirma que “a
arte acompanha a produção da existência;
foi e é parte da cultura. Ajuda a compor a
consciência estética dos indivíduos e dos
grupos sociais” (Bogo, 2002, p. 136).
Durante a trajetória histórica
humana a arte vem exercendo papel
fundamental para construção do
conhecimento. Não por acaso, pois o
exercício do fazer criativo é inerente à
natureza humana, desde os tempos mais
remotos que se têm indícios e
conhecimento da produção artística da
humanidade, seja nas pinturas rupestres,
seja na construção de ferramentas, seja
nos utensílios domésticos, seja nas obras
de artes que compõem museus em todo
mundo e ainda também nos reisados,
congadas, cordéis e tantas manifestações
artísticas populares dentre os mais
diversos povos. Essa afirmação tem
amparo nos estudos de Araújo (2016),
quando diz que
Ao longo dos anos a arte assumiu
diferentes funções e se manifestou
por uma diversidade de linguagens
e procedimentos técnicos, devido
às transformações sociais,
políticas, tecnológicas e culturais
que ocorreram na sociedade. Cada
vez mais o homem sentiu
necessidade de dialogar com o
mundo à sua volta e de demonstrar
seus anseios, ideias, emoções e
conhecimentos (p. 148).
A arte é uma área do conhecimento
que dialoga com todas as outras áreas,
pois, em quase tudo, a arte está presente,
desde o desenho de uma cadeira até a sua
fabricação o que revela o caráter utilitário
da arte, passando pelas criações têxteis,
moda, design tecnológicos até as pinturas,
espetáculos de dança e teatro, música e
toda produção artística que circula pela
humanidade. Para termos conhecimento
dessa produção artística é necessário
educarmos o “olhar”, apreciar a arte
presente, para que seja possível
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compreender as intenções do/a artista e
produzir interpretações significativas da
obra (Araújo, 2016, p. 148). E para que o
olhar seja educado de maneira a
compreender as relações da arte com o
homem é fundamental o movimento de
arte e educação e/ou educação com arte e
ainda mais a educação pela arte.
A Educação do Campo e o Ensino
da Arte se aproximam conforme Barbosa
(2012, p. 06) defende “Se pretendermos
uma educação não apenas intelectual, mas
principalmente humanizadora, a
necessidade da arte é ainda mais crucial
para desenvolver a percepção e a
imaginação, para captar a realidade
circundante e desenvolver a capacidade
criadora necessária à modificação desta
realidade”.
Tanto a arte quanto a educação do
campo se preocupam com uma formação
que valorize o processo de emancipação
das pessoas, buscando abordar conteúdos,
por exemplo, que realmente contribuam
para o processo de ensino e aprendizagem
dos sujeitos envolvidos. Essa assertiva
articula-se com a compreensão de arte
presente nas 10 afirmativas citadas acima,
assim como justifica que a arte faça parte
do trabalho pedagógico de 70% das
egressas e egressos do curso.
Ora, se a arte é “toda forma de
expressar sentimentos, seja ela na tela, no
corpo, no canto, no jeito de lidar com a
luta e com a vida”, essa compreensão por
si reafirma que a arte não poderá estar
ausente de processos educativos; arte é
presença indispensável aos processos de
formação humana; é constante e inerente
aos processos de educação humanização
das pessoas. Ou seja, na medida em que a
arte é entendida como formas de
expressar sentimentos, se torna peculiar à
educação, aos processos educativos e ao
trabalho pedagógico. Conforme nos
referimos anteriormente “a arte é a
atividade humana que consiste em um
homem comunicar conscientemente a
outros” (Tolstoi, 2002, p. 15).
Se por um lado a arte expressa
humanização, criação e sentimentos, por
outro, o Projeto de Educação do Campo
protagonizado pelos movimentos sociais
populares do campo dá lugar à mística
como atividade criadora, política e
revolucionária. De acordo com a
discussão anunciada anteriormente, a
mística “...tem o papel de nos animar, de
nos revigorar para novas e maiores lutas.
De nos unir e fortalecer. Tem o papel de
nos dar consistência ideológica em nosso
trabalho do dia-a-dia...” (Bogo, Boff &
Pelloso, 1998, p. 05). E por isso esteve
intencionalmente presente durante todo o
percurso de formação das egressas (os) do
curso.
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Não sem razão, a mística é
atividade que está presente no trabalho
pedagógico. As respostas apresentadas no
questionário sobre a compreensão de
mística indicam que a arte se corporifica
como mística, nos processos educativos
que as egressas (os) realizam. Ao
indagarmos sobre o que é mística, 08 das
respostas apontam para uma relação
intrínseca com a arte. Ademais, 47,1%
das egressas e egressos (08 pessoas) se
utilizam da mística como atividade
regular no seu trabalho pedagógico.
Vejamos as respostas a seguir:
Mística está no que apenas é possível
sentir sem necessidade de
explicação. Expressar a arte em
movimento.
vivencia como o resgate de uma
originária entre o fundamento da
realidade de aquilo que pode ser
retratado de diversas formas
Aquilo que nos encoraja, que nos
estimula, que nos toca.
É uma postura de acolhimento e
submersão no mistério interior que
nos habita e habita o cosmo...
É a maneira de manifestar de povo,
de grupo, levando em conta, os
aspectos culturais, sociais, religiosos,
temáticos, etc. Na minha visão, é
uma linguagem artística.
Mística é um dos melhores métodos
de transmitir ideias, transmitir
emoção, demonstrar talentos. Mística
é, se emocionar e transmitir emoção.
É uma forma de meditar a vida
Expressão de linguagens
Mística é ímpar, inexplicável tanto
para quem faz quanto pra quem
assisti, a gente se envolve naquele
momento em que ela acontece, uma
energia surreal nos emocionamos,
refletimos... Assim então a mística
acontece e nos embreaga daquelas
sensações que só a mística permite
acontecer.
Mística pra mim é o badalar da alma.
Um tipo de manifestação cultural das
comunidades ou assentamentos
vinculadas com algum movimento
social
A mística é a representação de
mistério, das lutas sociais através das
mesmas os sujeitos sociais mostra as
suas lutas e conquistas alcançada no
decorrer do processo de
acampamento e assentamento
Uma tradição que se comunica, que
com o uso da mística conseguimos
responder as questões que nos
interessam.
Arte
São ações comunicativas, uma leitura
da luta diária do povo.
É a essência desse movimento, é o
que me possibilita acordar todos os
dias com a esperança de dias
melhores.
Estas respostas evidenciam ainda
que a stica tem raízes militantes, pois
“Militantes: mulheres e homens em cada
ação fazem-se a si próprios e a
organização. Tem ela o jeito de seus
passos, o carinho de seus gestos e a
acolhida de seus braços” (Bogo, 2004).
Vale ressaltar que além do elo entre
mística e militância e do caráter político-
revolucionário da mística, ela é, como
totalidade, atividade formadora atua
como movimento dialético de
contribuições formativas tanto para quem
planeja e realiza a mística, como para
quem participa na plateia, assistindo,
interagindo com a simbologia das
linguagens que são mobilizadas para
Ferreira, M. J. L., Silva, L. B., & Freitas, G. M. C. (2021). Licenciatura em Educação do Campo da Universidade do Estado da Bahia (UNEB): arte e
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aquele momento formativo. As (os)
egressas (os) do curso aprenderam a lição
e evidenciam em suas afirmações a
mística como expressão concreta,
incisiva, objetiva, mas plena de beleza,
valores, crítica, estética, esperança.
Considerações conclusivas
Ao longo do texto objetivamos,
sobretudo, discutir concepções e
princípios da formação de Educadoras/es,
no curso de Licenciatura em Educação do
Campo, do DEDC XIII, da UNEB, bem
como as contribuições da arte nesse
processo formativo. A pesquisa
evidenciou um intenso processo de
formação docente que toma como
pressuposto os fundamentos teórico-
metodológicos da arte. Dessa perspectiva
formativa os componentes curriculares do
curso realizaram atividades
interrelacionando conteúdos e atividades
pedagógicas, principalmente, o
componente Seminário Articulador de
Tempo Universidade e Tempo
comunidade, que ocorre em todos os
semestres letivos do curso. Então, além da
arte se apresentar como estratégia
metodológica na matriz curricular, ela
assumiu também a centralidades e práxis
nos processos formativos.
Arte e trabalho pedagógico na
educação básica, e em outros espaços
educativos onde os participantes da
pesquisa atuam, devem se apoiar um no
outro para que a arte tenha lugar efetivo,
constante, continuado e cumpra com a
intencionalidade formativa para a leitura
crítica da realidade e realização de
processos educativos de perspectiva
emancipadora. Sob a gica das relações
que se estabeleceram durante o curso de
Licenciatura em Educação do Campo e a
forma como a arte assume lugar de
destaque no trabalho pedagógico, ela tem
se caracterizado como alternativa teórico-
metodológica para a formação de
educadoras (es) do campo e para o
trabalho pedagógico na escola e no
exercício docente.
Os estudos no campo da Educação
do Campo e da Arte são reveladores de
debates, visto que ainda é muito recente o
estudo com essas duas áreas do
conhecimento. Assim, vale a ressalva de
que este artigo revelou um campo muito
rico para esse debate, pois as práticas
artísticas são fundamentais nos espaços
escolares e não escolares e tem muito a
contribuir na prática docente desses
egressos.
É salutar continuar debatendo a
temática a fim de que cada vez mais
escolas possam colocar a arte como
centralidade em sua prática,
principalmente as escolas do campo.
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Ter um curso de Licenciatura em
Educação do Campo com habilitação em
Códigos e Linguagens potencializa a luta
por formação de professores que abordem
as questões relacionadas à formação
humana em todas as áreas, inclusive na
área de artes, que durante muito tempo foi
vista como conhecimento para a
burguesia e não para a classe
trabalhadora. Quando a universidade
assume esse compromisso, junto aos
movimentos sociais, e oferta um curso
com essas características, rompe com o
modelo de exclusão que ainda prevalece
em nosso país.
A arte foi e é libertadora, promoveu
e promove pensamentos ilimitados, capaz
de empoderar e incentivar a romper com
os medos, com a opressão, dando força
pra continuar. Sendo assim, reiteramos
um entendimento que aponta a arte como
meio de comunicação e, “portanto,
também de progresso isto é, da
caminhada da humanidade rumo à
perfeição” (Tolstoi, 2002, p. 207).
Talvez ainda não tenhamos chegado
à perfeição (não chegamos!), mas temos
certeza de que já começamos a caminhada
rumo à consolidação da Arte no contexto
da Educação do Campo como área do
conhecimento da maior importância para
o processo de emancipação de todos os
campesinos.
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Informações do Artigo / Article Information
Recebido em : 30/08/2021
Aprovado em: 12/10/2021
Publicado em: 13/11/2021
Received on August 30th, 2021
Accepted on October 12th, 2021
Published on November, 13th, 2021
Contribuições no Artigo: As autoras foram as
responsáveis por todas as etapas e resultados da
pesquisa, a saber: elaboração, análise e interpretação dos
dados; escrita e revisão do conteúdo do manuscrito
e; aprovação da versão final publicada.
Author Contributions: The author were responsible for
the designing, delineating, analyzing and interpreting the
data, production of the manuscript, critical revision of the
content and approval of the final version published.
Conflitos de Interesse: As autoras declararam não haver
nenhum conflito de interesse referente a este artigo.
Conflict of Interest: None reported.
Avaliação do artigo
Artigo avaliado por pares.
Article Peer Review
Double review.
Agência de Fomento
Não tem.
Funding
No funding.
Como citar este artigo / How to cite this article
APA
Ferreira, M. J. L., Silva, L. B., & Freitas, G. M. C. (2021).
Licenciatura em Educação do Campo da Universidade do
Estado da Bahia (UNEB): arte e reflexões sobre o trabalho
pedagógico de egressos(as). Rev. Bras. Educ. Camp., 6,
e12970. http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e12970
ABNT
FERREIRA, M. J. L.; SILVA, L. B.; FREITAS, G. M. C.
Licenciatura em Educação do Campo da Universidade do
Estado da Bahia (UNEB): arte e reflexões sobre o trabalho
pedagógico de egressos(as). Rev. Bras. Educ. Camp.,
Tocantinópolis, v. 6, e12970, 2021.
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e12970