Revista Brasileira de Educação do Campo
Brazilian Journal of Rural Education
EDITORIAL
DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e13419
Tocantinópolis/Brasil
v. 6
e13419
10.20873/uft.rbec.e13419
2021
ISSN: 2525-4863
1
Este conteúdo utiliza a Licença Creative Commons Attribution 4.0 International License
Open Access. This content is licensed under a Creative Commons attribution-type BY
Resultados de pesquisas sobre os (as) Egressos (as) das
Licenciaturas em Educação do Campo no Brasil
Mônica Castagna Molina1
1 Universidade de Brasília - UnB. Programa de Pós-Graduação em Educação e Programa de Pós-Graduação em Meio
Ambiente e Desenvolvimento Rural. Campus UnB Planaltina. Área Universitária, 01, Vila Nossa Senhora de Fátima. Planaltina
- DF. Brasil.
Autor para correspondência/Author for correspondence: mcastagnamolina@gmail.com
Apresentamos aos leitores da RBEC o Dossiê Resultados de pesquisas sobre os (as)
Egressos (as) das Licenciaturas em Educação do Campo no Brasil, trazendo um precioso
panorama sobre parte dos resultados alcançados pelos processos de institucionalização dessa
política de formação docente.
Sua organização faz parte dos esforços de uma pesquisa em andamento, desenvolvida
com o apoio do CNPq, com o objetivo principal de analisar a práxis dos(as) egressos(as) das
Licenciaturas em Educação do Campo e suas contribuições na implementação de novas
lógicas de Organização Escolar e do Trabalho Pedagógico nas Escolas do Campo.
As Licenciaturas em Educação do Campo foram concebidas para garantir a formação
na educação superior de educadores (as) que atuam nas Escolas do Campo e da juventude
camponesa que nelas possa vir a atuar. Construída desde o início no âmbito da contra-
hegemonia, essa modalidade de formação é concebida com o protagonismo dos movimentos
sociais na definição dos conteúdos de seu projeto formativo e nas intencionalidades
pedagógicas e políticas, projetando um novo perfil de educadores (as).
Os cursos dos quais tratamos neste Dossiê têm como objeto a escola de Educação
Básica, com ênfase na construção da Organização Escolar e do Trabalho Pedagógico para os
anos finais do Ensino Fundamental e do Ensino Médio. A proposta formativa da Educação do
Campo tem profunda vinculação com o projeto histórico da classe trabalhadora e com o
intrínseco compromisso de contribuir na construção do projeto territorial camponês, no qual é
imprescindível a realização da Reforma Agrária Popular, condição estruturante da
desconcentração fundiária e base da edificação de outro projeto de nação.
Molina, M. C. (2021). Resultados de pesquisas sobre os (as) Egressos (as) das Licenciaturas em Educação do Campo no Brasil...
Tocantinópolis/Brasil
v. 6
e13419
10.20873/uft.rbec.e13419
2021
ISSN: 2525-4863
2
Partindo desses pressupostos e a eles articulados, o PPP das Licenciaturas em
Educação do Campo foi concebido considerando um perfil para a formação docente com a
articulação de três dimensões: docência por área de conhecimento, gestão de processos
educativos escolares e gestão de processos educativos comunitários. A proposta formativa do
curso é promover a integração desse perfil, buscando formar educadores camponeses capazes
de atuar nessas diferentes dimensões.
A articulação dessas três dimensões no perfil proposto para a formação dos licenciados
em Educação do Campo associa-se intrinsecamente ao papel das Escolas do Campo no atual
contexto da luta de classes da sociedade brasileira, que exige profundas transformações em
sua função social. A redefinição das funções sociais da escola é o ponto nevrálgico em torno
do qual se desenvolvem os pressupostos dessa formação. A essência de seu Projeto Político
Pedagógico está na ideia de promover processos formativos que levem os educadores a
disporem dos elementos necessários para a transformação da forma escolar atual (Molina,
2017).
O Projeto Político Pedagógico das Licenciaturas em Educação do Campo foi
concebido com elementos que possibilitassem a formação de um educador capaz não de
compreender, mas também de contribuir na organização de ações a partir das Escolas do
Campo, a fim de fazer parte da resistência aos imensos desafios enfrentados pelos sujeitos
camponeses nos últimos anos no combate à brutal desterritorialização provocada pela
intensificação do agro-hidromineral negócio.
Por isso, a concepção de transformação da forma escolar concebida no Projeto Político
Pedagógico da Licenciatura em Educação do Campo busca preparar um educador que seja
capaz de promover, em suas práticas pedagógicas, a constante articulação entre escola do
campo e as comunidades camponesas, entre escola e vida, ou seja, entre escola e trabalho,
entre estudo e produção material da vida (Freitas, 2010).
É imprescindível destacar que, do período inicial de elaboração do PPP das
licenciaturas e da primeira fase de sua implementação das experiências-piloto, em 2007, ao
Edital de 2012, início de sua grande expansão (Molina, 2015; Molina & Hage, 2019) até o
presente período em 2021, de desmonte da Educação Pública e de profundo ataque à
Educação Superior, a correlação de forças é muito mais desfavorável à classe trabalhadora
(Frigotto, 2020; Freitas, 2020), com os dados dos conflitos indicando um brutal aumento da
violência no campo, com acelerada ampliação de despejos em áreas ocupadas, assassinatos e
expulsão de comunidades indígenas e quilombolas. O recrudescimento da luta de classes na
Molina, M. C. (2021). Resultados de pesquisas sobre os (as) Egressos (as) das Licenciaturas em Educação do Campo no Brasil...
Tocantinópolis/Brasil
v. 6
e13419
10.20873/uft.rbec.e13419
2021
ISSN: 2525-4863
3
sociedade brasileira, e em especial, no campo, atinge profundamente todas as conquistas do
Movimento Nacional da Educação do Campo, e dentre elas, o próprio direito à educação do
campesinato, em todos os níveis.
A partir de tais desafios e compreendendo a importância dessa política de formação
docente, objetivando construir um quadro capaz de trazer elementos de sua execução em todo
o país, selecionamos artigos que expõem os resultados de pesquisas sobre os (as) licenciados
(as) de quinze universidades distribuídas nas cinco regiões brasileiras, cujas ofertas trazem as
áreas de habilitação do curso: Linguagens (Linguística, Literatura, Teatro, Artes Visuais e
Música); Ciências da Natureza e Matemática; Ciências Agrárias; Ciências Humanas e Sociais.
Estão presentes neste Dossiê pesquisas sobre egressos (as) das Licenciaturas em
Educação do Campo das seguintes universidades federais: Roraima; Pará - Campus Altamira;
Sul e Sudeste do Pará - Campus de Marabá; Tocantins - Campus de Arraias; Campina Grande
- Campus Sumé; Piauí (nos 4 campi que têm as licenciaturas); Bahia; Recôncavo Baiano -
Campus Feira de Santana; Brasília - Campus Planaltina; Goiás; Catalão; Minas Gerais; Santa
Catarina; Rio Grande do Sul - Campus Porto Alegre. uma pesquisa sobre licenciados (as)
de uma universidade estadual, a Universidade do Estado da Bahia - UNEB, Campus de
Itaberaba.
Essas pesquisas, resultantes de trabalhos de mestrado, de doutorado, de investigações
sobre egressos (as) financiadas pelo CNPq e ainda alguns estudos específicos produzidos para
serem submetidos a este Dossiê, revelam algo ao mesmo tempo imensamente animador e
inquietante. Históricos e significativos passos foram dados, porém ainda são grandes os
entraves a serem superados para a consolidação dessa política pública de formação docente.
As pesquisas selecionadas tratam de várias dimensões do Projeto Político Pedagógico
das licenciaturas, porém com ênfases diferentes, sendo todas igualmente importantes para a
compreensão de como ocorre a práxis dos (as) egressos (as) na materialização dos principais
elementos do PPP.
Desse modo, no corpo do Dossiê encontram-se pesquisas que trazem dados concretos
sobre a inserção de licenciados (as) dos cursos no trabalho docente, sendo desse grupo o
maior número de artigos selecionados que abordam categorias fundamentais à execução do
perfil formativo proposto. Entre tais categorias se sobressaem as seguintes: a percepção de
como se desencadeia ou não a transformação da forma escolar a partir da prática docente
desses sujeitos; em que medida eles têm sido capazes de incorporar o trabalho como princípio
educativo em suas práticas; como se tem desenvolvido ou não o trabalho interdisciplinar e em
Molina, M. C. (2021). Resultados de pesquisas sobre os (as) Egressos (as) das Licenciaturas em Educação do Campo no Brasil...
Tocantinópolis/Brasil
v. 6
e13419
10.20873/uft.rbec.e13419
2021
ISSN: 2525-4863
4
que medida ele tem avançado na organização pedagógica das Escolas do Campo a partir das
áreas do conhecimento; como aparece o trabalho coletivo nessas unidades escolares a partir da
ação de formados (as) nos cursos de Educação do Campo; qual o protagonismo que eles têm
conseguido garantir aos movimentos sociais e sindicais do campo; de que maneira aparece a
cultura como matriz formativa nas suas práticas pedagógicas; quais os tempos e espaços
educativos que egressos (as) têm dedicado à promoção da auto-organização dos (as)
estudantes.
Na sequência, encontramos outro conjunto de artigos que deram maior ênfase à
pesquisa sobre a colocação dos (as) licenciados (as) nas outras dimensões propostas pelo
perfil de formação docente das licenciaturas, abordando a sua inserção nos processos de
Gestão Educativa Escolar e Gestão Educativa Comunitária, com importante foco na relação
desses sujeitos com o desenvolvimento dos territórios camponeses nos quais essas formas de
gestão ocorrem.
Como parte desta apresentação, buscamos trazer ao leitor chaves de leitura de questões
centrais que consideramos abordadas pelos artigos, indicando instigantes temas para a
continuidade das pesquisas, bem como para a agenda de lutas políticas do Movimento
Nacional de Educação do Campo. Assim, importa destacar que os quinze trabalhos trazem aos
leitores resultados de pesquisas qualitativas que se valeram de um diversificado conjunto de
instrumentos para a geração dos dados ora expostos, entre os quais se sobressaem, além da
pesquisa documental, a majoritária presença de entrevistas semiestruturadas, grupos focais e
rodas de conversa. São estratégias que se revelam coerentes com os princípios que vêm sendo
construídos na Educação do Campo, tratando camponeses (as), nas pesquisas que se
desenvolvem sob sua égide, como sujeitos da produção do conhecimento e não como meros
objetos de pesquisa. Nessa direção, é rico sobrelevar o protagonismo que a voz dos (as)
próprios (as) egressos (as) tem nos trabalhos aqui trazidos.
Além disso, consideramos ser necessário salientar que várias pesquisas desenvolveram
amiúde o acompanhamento desses (as) docentes em sala de aula, observando por extensos
períodos não suas práticas educativas, mas também seus processos de organização;
planejamento e elaboração dos planos de ensino; estratégias de avaliação; relação com outros
educadores e direção, etc.
Pode-se afirmar que uma das maiores potencialidades que as pesquisas revelam é que,
de fato, as Licenciaturas em Educação do Campo têm sido capazes de dar efetivas
contribuições à inclusão de uma ampla diversidade de sujeitos camponeses na educação
Molina, M. C. (2021). Resultados de pesquisas sobre os (as) Egressos (as) das Licenciaturas em Educação do Campo no Brasil...
Tocantinópolis/Brasil
v. 6
e13419
10.20873/uft.rbec.e13419
2021
ISSN: 2525-4863
5
superior no Brasil. A respeito de quem são os sujeitos que se formam nesses cursos, os
resultados das pesquisas aqui reunidas ratificam uma de suas maiores contribuições: a
Educação do Campo é também das Águas, das Florestas, de ribeirinhos, de quilombolas, de
extrativistas, de pescadores (as), das comunidades dos fundos de pasto, de coletores (as) de
açaí, das quebradeiras de coco, dos povos do Cariri paraibano, de gerazeiros (as), de
cerratenses, dos povos dos pampas, bem como dos povos indígenas de diferentes etnias que
têm ingressado em algumas licenciaturas.
A maioria das pesquisas incluídas neste Dossiê traz avaliações positivas em relação à
qualidade da inserção de egressos (as) nas redes públicas de ensino quando se trata de analisar
a sua prática docente, porém identificam-se barreiras no que diz respeito à sua quantidade,
ponto que será abordado mais à frente.
Os estudos ora socializados que, através de diferentes instrumentos de pesquisa
analisaram a atuação de licenciados em sala de aula, indicam avanços consideráveis na
apropriação de princípios da Educação do Campo nesse trabalho docente: esses (as) docentes
têm-se desafiado a buscar formas de trazer a realidade de seus educandos para os planos de
ensino e têm desenvolvido metodologias participativas procurando envolver e ampliar o
protagonismo dos (as) educandos (as) e da própria comunidade, como mostram, por exemplo,
os trabalhos da UFMG, da UFCG, da UNEB, da UnB, além de outras instituições.
O artigo produzido a partir da tese de doutorado realizada na USP, que analisou a
práxis de egressas da UFMG tendo como foco um dos objetivos centrais do projeto formativo
construído pelas Licenciaturas em Educação do Campo, conclui que os
... resultados revelam movimentos significativos de mudanças na forma escolar,
desencadeados pelas egressas e pelas escolas em que atuam. As escolas
desenvolvem projetos que permitem inserir o educando em seu meio, com vistas a
criticá-lo, compreender as relações sociais, culturais e de trabalho e, assim, mirar em
uma educação omnilateral.
Os artigos que pesquisaram as práticas docentes de licenciadas de Altamira e Marabá
encontraram nessas práticas importantes pontos de resistência e transgressão à gica
hegemônica das escolas, com as docentes pesquisadas buscando desenvolver ações
efetivamente transformadoras, indicando que sim um relevante processo de mudança em
andamento. Elas desenvolvem ações formativas mais participativas e dialógicas que buscam
produzir concretos diálogos com as condições de vida das crianças e da juventude camponesa
que estão a educar.
Molina, M. C. (2021). Resultados de pesquisas sobre os (as) Egressos (as) das Licenciaturas em Educação do Campo no Brasil...
Tocantinópolis/Brasil
v. 6
e13419
10.20873/uft.rbec.e13419
2021
ISSN: 2525-4863
6
Todavia, é preciso acrescentar que essas mesmas pesquisas ressaltam que seria
ingenuidade imaginar que os limites estruturais impostos pelo próprio sistema público não
dariam fortes contornos a tais mudanças, lembrando que “o modo rígido com que a educação
como um todo se organiza continua enquadrando/limitando as iniciativas” (UNIFESSPA).
Dito de outro modo, como expressa a investigação sobre as egressas da UFPA, Campus de
Altamira,
Seria inocência a compreensão de que as professoras formadas pelo viés ideológico
da Educação do Campo, uma vez lançadas em campo de atuação docente (dentre
muitos lugares, a sala de aula), não deveriam se utilizar mais de táticas e somente de
estratégias autônomas, como se, das agentes, pudessem surgir uma prática que não
levasse em conta as condições materiais em que elas se situam.
Afirmamos que sim, as condições materiais onde se inserem esses (as) educadores (as)
recém-formados (as) impõem graves limites, fazendo com que, além de todos os desafios que
o local por si oferece, enfrentem outros ainda maiores, propostos pelos paradigmas da
Educação do Campo e da Escola do Campo que almejam construir.
Ainda em relação à inserção de egressos (as) nas Escolas do Campo, observa-se outra
recorrência: eles (as) vêm atuando não nos anos finais do Ensino Fundamental e do Ensino
Médio, função para a qual o curso os (as) prepara. Nas várias regiões pesquisadas, tem-se a
presença de licenciados (as) trabalhando na docência da Educação Infantil e dos Anos
Iniciais. Vários artigos relatam a sua atuação nas turmas de EJA, como observado nas
pesquisas da UFCG e da UNEB. O texto desta segunda IES ressalta: “Chama-nos a atenção
que esta atuação está se dando com pessoas oriundas de comunidades camponesas, com
pessoas que foram excluídas do tempo regular de sua escolarização, por exemplo, a
modalidade EJA”.
É interessante distinguir que, em outra dimensão avaliativa de enorme importância,
que é a autoavaliação desses (as) licenciados (as) sobre seu trabalho como docentes nas
Escolas do Campo, foram encontrados resultados significativos condizentes com os principais
elementos propostos pelo PPP do curso, como destacado na pesquisa da UFCG. Ao serem
instigados a examinar seu próprio trabalho docente, os egressos avaliam que estão
conseguindo realizar mudanças nas escolas e responderam positivamente à questão da
interdisciplinaridade, um princípio adotado pela formação por área de conhecimento”,
trazendo como grande destaque a incorporação e a promoção do trabalho coletivo em suas
práticas pedagógicas.
Molina, M. C. (2021). Resultados de pesquisas sobre os (as) Egressos (as) das Licenciaturas em Educação do Campo no Brasil...
Tocantinópolis/Brasil
v. 6
e13419
10.20873/uft.rbec.e13419
2021
ISSN: 2525-4863
7
A referência à capacidade dos (as) próprios (as) e egressos (as) de promoverem ações
interdisciplinares (Frigotto, 2008) é um achado altamente positivo, pois diz respeito a uma das
maiores intencionalidades do próprio curso, que busca ofertar a formação por área de
conhecimento. Essa estratégia formativa foi concebida para oferecer subsídios aos (às) futuros
(as) docentes do campo para que promovam práticas pedagógicas que contribuam com a
superação da fragmentação do conhecimento, que conduzam seus (suas) educandos (as) a uma
leitura mais completa da realidade, enxergando nela os conhecimentos científicos que lhes
podem ser úteis para um entendimento mais abrangente de seu contexto e das ações
necessárias à sua transformação.
Nessa direção, é muito animadora a autoavaliação dos (as) licenciados (as) da UFCG
quanto à própria capacidade de internalizarem a interdisciplinaridade em sua ação
pedagógica, como também são excelentes as falas trazidas pelos (as) docentes de Educação do
Campo formados (as) pela UFRGS, que expõem a significância dessa estratégia formativa por
áreas de conhecimento, apesar de todas as dificuldades e superações que simultaneamente
impõem aos (às) docentes formadores (as). Vejamos extratos das falas de um licenciado e
uma licenciada da UFGRS, que demonstram a potencialidade da formação por área e o papel
das Ciências da Natureza, explicitando o quanto avançaram na compreensão da
intencionalidade do curso em promovê-la. Esclarecemos que o pesquisador identificou o
entrevistado e a entrevistada com nomes de pássaros de sua região, para terem suas
identidades preservadas.
Por exemplo: nós fizemos queijo na aula... Então, todas aquelas relações que m a
partir dali, tanto nos processos de como aquele leite vai virar queijo quanto nos
processos de quem é que produz queijo aqui na minha comunidade? Como é que ele
vende? Fazer todas essas relações, mostrar pras crianças desde a produção, o
transporte, a reação química e física que acontece ali; a matemática: o quanto que
aquele produtor precisa produzir para realmente ser rentável, ou não é rentável, as
dificuldades. O que é aquele alimento? (João-de-Barro).
Hoje eu vejo que [a interdisciplinaridade] é bem mais... não precisa chamar o
professor de outra disciplina para acontecer, tu pode trabalhar isso com outros
espaços no entorno da Comunidade, como por exemplo, nos meus estágios, eu
trabalhei com o pessoal do posto de saúde, isso era uma atividade que envolve a
outras disciplinas. Trabalhei com o pessoal da colônia dos pescadores, na aldeia
indígena, trabalhei com as lideranças que envolvem questões de cura que é a Pajé,
então eu consegui ver que não é tu convidar um colega para trabalhar e fazer um
projeto, é muito além (Caturrita).
Embora as pesquisas indiquem que efetivamente um relevante processo de
mudança em andamento, existe ainda um largo conjunto de questões a ser superado para
mudanças mais permanentes e duradouras serem instauradas no que diz respeito à inserção
Molina, M. C. (2021). Resultados de pesquisas sobre os (as) Egressos (as) das Licenciaturas em Educação do Campo no Brasil...
Tocantinópolis/Brasil
v. 6
e13419
10.20873/uft.rbec.e13419
2021
ISSN: 2525-4863
8
dos egressos das Licenciaturas em Educação do Campo nas escolas, sobretudo em se tratando
do quantitativo dessa inserção, conforme exposto anteriormente. Sem dúvida, esse é um
ponto nevrálgico a ser superado com muita luta e organização política coletiva.
Entre os principais pontos comuns que se pode ressaltar das investigações sobre
docentes formados (as) pelas Licenciaturas em Educação do Campo, estão as grandes
dificuldades enfrentadas por eles (as) para sua incorporação definitiva às redes públicas de
ensino, questão abordada em quase todos os artigos e trazida ainda com maior ênfase nas
pesquisas da UFSC, da UFRB, da UFCG, da UFT e de algumas outras. Fatores de diferentes
ordens integram o leque de tais dificuldades.
fatores estruturais, como a própria ausência do Estado na garantia do direito à
educação dos sujeitos camponeses, o que resulta na mínima oferta de Escolas do Campo para
a sua colocação, com o agravante de que, com a pouca oferta de unidades escolares no campo,
as oportunidades não são para concursos permanentes, uma vez que ainda não um sistema
público de educação consolidado no campo, sendo a maior parte para vagas temporárias.
Soma-se a isso o gravíssimo processo de fechamento de Escolas do Campo, cuja
intensificação tem-se dado de forma avassaladora na última década, fenômeno recorrente em
todo o território nacional.
Existem fatores de ordem política, como a recusa da aceitação dos diplomas de
formados (as) nessas Licenciaturas em função da habilitação por área do conhecimento. De
acordo com o texto da UFRR, para a “maioria dos entrevistados a falta de reconhecimento do
curso pelas entidades governamentais compromete as vagas em seletivas e concursos
públicos”. Sem dúvida, esse tem sido um dos grandes limites encontrados por egressos (as):
as redes públicas ainda mantêm estratégias de seleção nos seus concursos majoritariamente
disciplinares, havendo inúmeros casos de licenciados (as) que, embora consigam aprovação
nos concursos, não conseguem tomar posse por causa da recusa de seus diplomas pelas
Secretarias de Educação que os realizam.
Diferentes artigos relatam as lutas jurídicas e políticas travadas por egressos (as), na
maior parte das vezes com grande apoio dos cursos onde se formaram, para conseguirem
reverter mais esse profundo sinal de discriminação e preconceito em relação ao campo.
Recusam docentes legitimamente formados (as) com o suporte de uma política pública
oficialmente instituída, regulamentada e com marcos legais consolidados.
Entre os artigos que tratam dessa problemática, está o belo texto produzido pelos
próprios (as) egressos (as) da UFRB, que se propuseram a escrever para este Dossiê
Molina, M. C. (2021). Resultados de pesquisas sobre os (as) Egressos (as) das Licenciaturas em Educação do Campo no Brasil...
Tocantinópolis/Brasil
v. 6
e13419
10.20873/uft.rbec.e13419
2021
ISSN: 2525-4863
9
abordando, entre ouros relevantes pontos, as superações que têm enfrentado para a sua
inserção nas redes. Em seu artigo, apontam com clareza e coerência que um dos caminhos
para a superação desse entrave passa por um dos princípios basilares da formação das
Licenciaturas em Educação do Campo: o processo de consolidação da auto-organização dos
sujeitos do campo, a fim de darem sequência às lutas propostas pelo Movimento Nacional de
Educação do Campo. Também nessa direção, pontuando a urgente necessidade da auto-
organização dos (as) estudantes e dos (as) profissionais formados (as) por essas licenciaturas
para enfrentarem essa contradição, o artigo da UFSC afirma que, no âmbito do
aprofundamento das discussões sobre a titulação e a inserção no trabalho docente,
pontuamos a relevância da organização coletiva dos (as) egressos (as) por meio dos
movimentos de luta da Educação do Campo, elementos necessários para o horizonte de
atuação para a transformação das escolas”.
Apesar desse crucial desafio ainda a ser superado, consideramos importantíssimo
evidenciar que as pesquisas sobre os (as) egressos (as) não focaram somente na análise de sua
inserção nos espaços escolares no âmbito da docência, mas, coerentes com o próprio perfil
formativo proposto pelo curso, as análises em tela geraram e trouxeram ampla e diversificada
gama de informações sobre como vem ocorrendo o seu ingresso em outros espaços
profissionais nos respectivos territórios rurais de origem.
As pesquisas aqui analisadas desvelam contribuição nuclear das Licenciaturas em
Educação do Campo à construção do projeto territorial camponês: a garantia da chegada da
preciosa diversidade de sujeitos camponeses a essas licenciaturas tem como corolário o
reconhecimento da diversidade territorial de onde advêm, das diferentes formas de produção
material da vida e das lutas que esses sujeitos coletivos protagonizam em cada um desses
territórios, ampliando significativamente a produção do conhecimento a partir do
protagonismo desses (as) estudantes e licenciados (as). Essas lutas são trazidas à
Universidade, e a Universidade também chega até elas, movida pela própria dinâmica
decorrente da Alternância entre Tempo Comunidade e Tempo Universidade. Nesse âmbito, as
pesquisas sobre os (as) egressos (as) confirmam um dos grandes acertos dessas licenciaturas
propostos por seu projeto político pedagógico: considerar indissociáveis as questões entre
Terra-Luta-Trabalho-Educação-Território-Cultura-Identidade.
Os (as) licenciados (as), outrora estudantes das Licenciaturas em Educação do Campo,
trouxeram consigo vasta bagagem cultural associada às diferentes tradições que esses
coletivos foram construindo e vivenciando nos processos de resistência em suas terras e
Molina, M. C. (2021). Resultados de pesquisas sobre os (as) Egressos (as) das Licenciaturas em Educação do Campo no Brasil...
Tocantinópolis/Brasil
v. 6
e13419
10.20873/uft.rbec.e13419
2021
ISSN: 2525-4863
10
territórios, tradições que dialogaram com os conhecimentos acadêmicos. As pesquisas
demonstraram que o resultado do diálogo entre esses diferentes saberes foi ainda mais
valorizado e ressignificado após tais processos, sendo trazido com força em suas práticas de
inserção socioprofissional atual.
licenciados (as) inserindo-se profissionalmente em diferentes espaços de gestão
educativa, não escolares, onde têm feito uma enorme diferença, garantindo, de fato, uma
gestão democrática participativa, como mostra o artigo da UnB, mas também em atividades
de gestão educativa comunitária, como em associações e cooperativas, em sindicatos (de
trabalhadores rurais e de professores), etc.
Como afirma o texto da UFGRS, egressas e egressos entrevistados, após o curso,
ressignificaram suas formas de ler e intervir em seus territórios”, o que é também expresso no
texto da UFPA, ao analisar a sua prática: “um senso de auto-responsabilização é acionado
quando se reportam ao seu papel na condução e continuidade das lutas pelo que julgam
'desenvolvimento' de sua localidade, de sua comunidade. A aplicação do conhecimento formal
direcionado à ação coletiva seria o dispositivo de atualização dos laços" com seus respectivos
territórios.
Desse modo, são positivos e reveladores os achados das pesquisas sobre a atuação de
egressos (as) no território do Cariri paraibano, no Vale do Jequitinhonha, bem como na região
do Xingu e Transamazônica, entre outros. Nos territórios analisados em que um número
maior de licenciados (as) em Educação do Campo e uma recorrência de sujeitos formados
atuando em várias frentes, vão-se constituindo importantes redes de luta e resistência,
produzindo sinergias para o enfrentamento coletivo das grandes barreiras a serem derrubadas
para continuarem a garantir a sua reprodução material no campo, nas florestas e nas águas.
Como bem pontua a pesquisa sobre a atuação dos egressos na Transamazônica, as
Licenciaturas em Educação do Campo têm contribuído para "a emergência de mediadores,
alguns advindos da posição de lideranças locais, outros assumindo esse lugar de intermediar
demandas, recursos, etc.; em ambos os casos, é possível que estejam construindo instâncias
locais de poder, criando espaços de inclusão política”. Esses espaços têm sido construídos
através de um perceptível e significativo aumento de seu protagonismo em diferentes âmbitos
de atuação. A esse respeito, o trabalho sobre os licenciados (as) da UFMG que atuam no Vale
do Jequitinhonha revela:
Como resultado da pesquisa, constatou-se diversidade de cargos, práticas e
instituições ocupadas pelos egressos, o que subsidiou a criação de um mapa
indicando e qualificando a espacialização e territorialização da luta pela terra a partir
da atuação socioprofissional dos egressos em Minas Gerais.
Molina, M. C. (2021). Resultados de pesquisas sobre os (as) Egressos (as) das Licenciaturas em Educação do Campo no Brasil...
Tocantinópolis/Brasil
v. 6
e13419
10.20873/uft.rbec.e13419
2021
ISSN: 2525-4863
11
grande ênfase dos textos na centralidade da vinculação dos processos de formação
desenvolvidos nas Licenciaturas em Educação do Campo com o trabalho e atuação desses (as)
profissionais em seus territórios. Convém destacar que uma significativa colocação
socioprofissional deles (as) em quase todos os cursos pesquisados, com exceção de duas
situações de maior gravidade, onde porcentagens muito baixas de formados (as),
consequentemente, de seu ingresso nas redes públicas e nos demais tipos de trabalhos
educacionais. Porém, mesmo em tais casos de menor ingresso profissional nas redes, “os
egressos revelam que o curso proporcionou contribuições importantes à formação pessoal,
uma vez que muitos hoje têm outra visão da Educação do Campo”, tal qual afirma o texto da
UFT.
Ainda nesse caminho, mesmo expondo os diversificados problemas a serem encarados
para a integração profissional desses (as) licenciados (as) nas escolas, os textos da UFG e da
UFCAT afirmam que um consenso de que a formação em ambas as universidades foi
capaz de promover uma formação pautada na conscientização do papel destes alunos em suas
comunidades, sendo agentes de mudança” com importante atuação nelas.
A inserção comunitária constatada em quase todos os trabalhos merece ser salientada,
pois, segundo afirmamos anteriormente, integra o perfil projetado para os (as) licenciados
(as) do curso no que diz respeito à ênfase dada no PPP à habilitação para a Gestão de
Processos Educativos Comunitários, que significa, conforme a matriz original das LEdoCs, a
"preparação específica para o trabalho pedagógico com as famílias e/ou grupos sociais de
origem dos estudantes, para liderança de equipes para a implementação de projetos de
desenvolvimento comunitário sustentável” (Caldart, 2011, p. 99).
Portanto, é relevante o fato de as pesquisas sobre os (as) egressos (as) apontarem seu
significativo envolvimento na vida comunitária e, conforme descrito nas pesquisas, tal
integração tem-se dado numa perspectiva transformadora, buscando exercer seu protagonismo
no contexto de lutas e posicionamentos políticos críticos que atuam no sentido de lutar pelo
fortalecimento da identidade camponesa e da elevação dos níveis de consciência em relação à
própria realidade. Nesse caminho, é exemplar o fragmento do artigo da UFRGS trazendo
várias falas dos sujeitos entrevistados (as) sobre a importância da formação recebida no curso,
concluindo que, a partir dos dados da pesquisa feita com esses sujeitos,
... podemos compreender o quanto o ingresso na LEDOC muda a perspectiva de
futuro não do estudante que acessa a Universidade, mas de toda a comunidade
onde este está inserido: 'A minha relação profissional com o campo aconteceu
Molina, M. C. (2021). Resultados de pesquisas sobre os (as) Egressos (as) das Licenciaturas em Educação do Campo no Brasil...
Tocantinópolis/Brasil
v. 6
e13419
10.20873/uft.rbec.e13419
2021
ISSN: 2525-4863
12
quando eu ingressei no vestibular de Educação do Campo, que eu não sabia que era
possível trabalhar o que eu aprendi com meu avô, com meu pai, com a minha mãe,
que podia abordar esses temas e conversar sobre, dentro de uma universidade'
(Caturrita). Este reconhecimento dos saberes próprios do território como algo
importante e necessário à formação acadêmica é algo que vem sendo destacado
pelas pesquisas como fundamental ao diálogo entre conhecimentos tradicionais e
científicos.
A isso soma-se um fator bastante relevante encontrado em vários textos, que diz
respeito à ampliação dos espaços da juventude camponesa formada em Educação do Campo.
São significativas as reflexões trazidas em diversos artigos deste Dossiê sobre o fato de os
cursos estarem se constituindo em expressivo caminho para a juventude camponesa, o que
tem contribuído para o processo de territorialização e espacialização da Educação do Campo
em alguns territórios.
Nesse sentido, distingue-se a pesquisa sobre os (as) egressos (as) do Vale do
Jequitinhonha, que constrói um mapa esclarecedor indicando a temporalidade e quantidade de
docentes oriundos (as) da licenciatura no respectivo território, que tem 38% de sua população
na área rural, de um total de 698.413 pessoas, o que tem grande relevância de estudo para a
Educação do Campo, não somente pelo peso e importância no estado de Minas Gerais. De
acordo com o referido trabalho, a LECampo (sigla usada pela UFMG para o curso) formou
144 docentes em Educação do Campo de 2005 a 2011, dos quais 26 são originários do Vale
do Jequitinhonha.
Como constata a pesquisa citada,
É possível perceber a concentração de diferentes sujeitos de um mesmo município
no LECampo UFMG. Ao longo dos anos, o curso significou um caminho possível
para a juventude do campo. Tomemos como exemplo o município de Jordânia, que
tem egressos das turmas de 2005, 2008, 2010 e 2011, observando-se algo parecido
também com Almenara, Itaobim e Turmalina.
O fato de a Licenciatura em Educação do Campo representar um possível caminho
para a juventude é um imenso potencial a ser explorado pelo Movimento Nacional de
Educação do Campo, visto que pode e deve integrar as lutas contra o fechamento das escolas
e pela abertura de centenas de outras, no sentido de buscarmos a promoção de um efetivo
desenvolvimento da produção agroecológica e da soberania alimentar através da realização da
Reforma Agrária Popular. Trata-se de uma luta que é um caminho para reverter um histórico
processo de fechamento de portas no meio rural para a juventude camponesa, em função da
absurda concentração fundiária e constante violência e expulsão de suas famílias do campo.
Molina, M. C. (2021). Resultados de pesquisas sobre os (as) Egressos (as) das Licenciaturas em Educação do Campo no Brasil...
Tocantinópolis/Brasil
v. 6
e13419
10.20873/uft.rbec.e13419
2021
ISSN: 2525-4863
13
Das investigações trazidas a este Dossiê, ressalta-se ainda outra marca de grande
diferencial do Projeto Político Pedagógico dessa modalidade de licenciatura: os cursos vêm
materializando uma determinada concepção de formação docente na qual a pesquisa tem
papel preponderante, buscando-se, através dela, dotar os educadores de autonomia intelectual,
propiciando sua formação como sujeitos de práxis.
Um dado excepcionalmente positivo da importância da pesquisa na matriz formativa
das Licenciaturas em Educação do Campo diz respeito ao valor dado à produção do
conhecimento nos cursos a partir do protagonismo dos (as) próprios (as) estudantes dessas
graduações, agora pesquisados como ex-alunos (as). outra recorrência positiva nos
trabalhos em relação às informações geradas sobre o número de egressos (as) que seguem
estudando em diversos tipos de formação continuada. Dessa forma, são exemplares os dados
encontrados no artigo que analisou simultaneamente as quatro licenciaturas da UFPI. O artigo
relata o efetivo ingresso de seus licenciados em Programas de Pós-Graduação em diferentes
áreas de conhecimento da própria UFPI, como também em IESs de outras unidades
federativas, como UnB, UFPB e UECE.
Entre as muitas superações a construirmos, destacamos uma que nos parece
significativa e que emerge em diferentes artigos, mas é tratada com ênfase maior na pesquisa
sobre os (as) docentes formados (as) na UFBA. Esse ponto está relacionado com o enorme
desafio que temos para seguir consolidando o Projeto Político Pedagógico dos cursos, que diz
respeito à própria formação dos formadores (as) das universidades públicas que neles atuam.
É imprescindível avançarmos na formação política desses (as) formadores (as), visto que isso
tem-se revelado um grande entrave à materialização do PPP do curso (Molina & Martins,
2019). Nesta direção, grande ênfase exposta nos dados analisados na pesquisa da UFBA,
que nos indaga: “É possível formar indivíduos para se tornarem sujeitos das lutas de classes
dentro de concepções que sequer aceitam a existência da luta de classes?”.
Ao grande desafio de seguirmos com a formação de nossos (as) formadores (as) nas
Licenciaturas em Educação do Campo, soma-se a urgente necessidade de que construamos
juntos fortes barreiras de resistência aos imensos ataques das forças privatistas e neoliberais
que têm avançado rapidamente sobre a educação pública, buscando tirar os fundos públicos
que a sustentam para minimizar os prejuízos que enfrentam decorrentes da crise estrutural do
capital.
Desse modo, uma crescente tensão para retirar a educação do âmbito dos deveres
do Estado e colocá-la na esfera do mercado. Décadas de luta da classe trabalhadora pelo
Molina, M. C. (2021). Resultados de pesquisas sobre os (as) Egressos (as) das Licenciaturas em Educação do Campo no Brasil...
Tocantinópolis/Brasil
v. 6
e13419
10.20873/uft.rbec.e13419
2021
ISSN: 2525-4863
14
direito à educação veem-se seriamente ameaçadas pelos interesses empresariais (Freitas,
2020) que atuam com força nas ações políticas, buscando reconfigurar o papel do Estado,
diminuindo seu escopo de atuação e ampliando a abrangência do mercado.
Conforme destaca Freitas (2021), essa não é uma tendência nova, está em curso
algum tempo, mas os experimentos feitos durante a pandemia na área educacional, com o
ensino remoto e a forte tendência de sua continuidade e ampliação no período pós-pandemia,
tornam ainda mais graves os cenários para a classe trabalhadora. Exigem dela uma ampliada
capacidade de ação e articulação para enfrentar as lutas que estão no horizonte bastante
sombrio no que diz respeito ao direito à educação.
Precisamos ainda estar atentos aos enormes desafios que enfrentaremos no retorno das
Licenciaturas em Educação do Campo no período pós-pandemia, promovendo estudos e ações
coletivas que nos permitam agir sobre as contradições de tal período, engendrando as
estratégias mais adequadas para sua superação, objetivando minimizar os incontáveis
prejuízos que as desigualdades socioeconômicas e estruturais do campo impuseram aos
camponeses durante a mais grave crise sanitária enfrentada neste país.
Mesmo com resultados expressivos, o Projeto Político Pedagógico das licenciaturas
enfrenta atualmente ameaças de diferentes ordens, sendo uma das maiores a mudança nos
marcos legais da política de formação docente no país. Embora excepcionalmente promissor,
todo esse processo está ameaçado pelo acelerado avanço das forças privatistas contra a
educação pública, em razão do desmonte da educação superior e de sua transformação em
educação à distância, além das rápidas mudanças nos marcos legais da formação docente,
como a abrupta revogação da Resolução CNE/CP 2/2015 e sua substituição pela Resolução
CNE\CP 2/2019, trazendo um imenso retrocesso às políticas de formação docente (Bazzo
& Schaibe, 2019; Silva et al., 2020). Outra grave ameaça à consolidação dos princípios que
podem materializar a Escola do Campo, para qual construção vem sendo formados os
ledoquianos, parte da Matriz Nacional Comum de Competências do Diretor Escolar, que
precisamos também enfrentar, pois representa um profundo ataque à concepção da gestão
democrática.
Se os desafios são grandes, maior ainda é nossa força coletiva com o precioso
patrimônio político pedagógico construído pela Educação do Campo nesses últimos 22 anos.
Como nos lembra a canção de Milton Nascimento: “Se muito vale o feito, mais vale o que
será ...”. Temos uma imensa força e potencialidade, e vamos seguir lutando juntos, resistindo
e construindo um país livre, soberano e justo. Nele a Educação do Campo e a formação dos
Molina, M. C. (2021). Resultados de pesquisas sobre os (as) Egressos (as) das Licenciaturas em Educação do Campo no Brasil...
Tocantinópolis/Brasil
v. 6
e13419
10.20873/uft.rbec.e13419
2021
ISSN: 2525-4863
15
educadores e educadoras do campo têm tarefas imprescindíveis a cumprir, transformando as
Escolas do Campo em sementeiras de mudanças, ajudando a avançar na construção do projeto
territorial camponês com justiça social, agroecologia e soberania alimentar. Avancemos, pois,
em direção ao futuro que já estamos a construir.
Por fim, queremos expressar nossos sinceros agradecimentos aos pesquisadores e
pesquisadoras que se m desafiado a registrar esta história tão significativa à luta da classe
trabalhadora e que oferecem, com a apresentação dos resultados de suas pesquisas para este
Dossiê, importante contribuição não à produção do conhecimento cientifico no âmbito da
política educacional, mas também à memória e história de nossas lutas e conquistas.
Agradecemos à Equipe da Revista Brasileira de Educação do Campo, especialmente ao Editor
Gustavo Cunha de Araújo, por sua enorme atenção e disponibilidade em todas as diversas
etapas de organização deste trabalho.
Excelente leitura a todos!
Referências
Aires, H. Q. P., & Bezerra Neto, L. (2021). Perspectivas dos egressos do Curso de
Licenciatura em Educação do Campo, Campus Arraias/Tocantins. Rev. Bras. Educ. Camp., 6,
e12819. http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e12819.
Ângelo, A. A., & Kruppa, S. M. P. (2021). Egressas da Licenciatura em Educação do Campo:
caminhos na mudança da forma escolar. Rev. Bras. Educ. Camp., 6, e12756.
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e12756.
Anjos, H. P., & Cordeiro, D. R. (2021). Professoras de Educação do Campo e resistência: as
brechas no habitus docente. Rev. Bras. Educ. Camp., 6, e12921.
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e12921.
Bazzo, V., & Scheibe, L. (2019). De volta para o futuro... retrocessos na atual política de
formação docente. Retratos da Escola, 13(27), 669-684.
https://doi.org/10.22420/rde.v13i27.1038.
Caldart, R. S. (2011). Licenciatura em Educação do Campo e projeto formativo: qual o lugar
da docência por área? In Molina, M. C., & Sá, L. M. (Orgs.). Licenciaturas em Educação do
Campo: registros e reflexões a partir das experiências-piloto (pp. 99-122). Belo Horizonte:
Autêntica. Recuperado de http://flacso.redelivre.org.br/files/2013/02/1033.pdf.
Carmo, N. C. C., & Martins, M. F. A. (2021). Mapeando a Educação do Campo em Minas
Gerais: quem são e onde estão os egressos do LeCampo UFMG naturais do Vale do
Jequitinhonha. Rev. Bras. Educ. Camp., 6, e12931.
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e12931.
Molina, M. C. (2021). Resultados de pesquisas sobre os (as) Egressos (as) das Licenciaturas em Educação do Campo no Brasil...
Tocantinópolis/Brasil
v. 6
e13419
10.20873/uft.rbec.e13419
2021
ISSN: 2525-4863
16
Dalmolin, A. M. T., Hoffmann, M. B., & Schirmer, S. B. (2021). O voo dos pássaros egressos
da Licenciatura em Educação do Campo da UFRGS: desafios e possibilidades na formação de
professores de Ciências da Natureza. Rev. Bras. Educ. Camp., 6, e13322.
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e13322.
Ferreira, M. J. L., Silva, L. B., & Freitas, G. M. C. (2021). Licenciatura em Educação do
Campo da Universidade do Estado da Bahia (UNEB): arte e reflexões sobre o trabalho
pedagógico de egressos (as). Rev. Bras. Educ. Camp., 6, e12970.
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e12970.
Freitas, L. C. (2010). A Escola Única do Trabalho: explorando os caminhos de sua
construção. In Caldart, R. S. (Org.). Caminhos para a transformação da escola: reflexões
desde práticas da Licenciatura em Educação do Campo (Vol. 1) (pp. 155-175). São Paulo:
Expressão Popular.
Freitas, L. C. (2020). Prefácio. In Uchoa, A. M. C., Lima, A. M., & Sena, I. P. F. S. (Orgs.).
Reformas educacionais: avanço ou precarização da educação pública? (Diálogos críticos,
Vol. 2) (pp. 9-10). Recuperado de https://3c290742-53df-4d6f-b12f-
6b135a606bc7.filesusr.com/ugd/48d206_b5a8740a4b0a4ae0a58087199eefbc6a.pdf.
Frigotto, G. (2008). A interdisciplinaridade como necessidade e como problema nas ciências
sociais. Ideação - Rev. Unioeste, 10(1), 41-62. Recuperado de https://e-
revista.unioeste.br/index.php/ideacao/article/view/4143/3188.
Frigotto, G. (2020). A educação e o avanço da nova (ou extrema?) direita no Brasil
[Entrevista cedida a J. F. Hermida e J. Lira]. Roteiro, 45. Recuperado de
https://portalperiodicos.unoesc.edu.br/roteiro/article/view/23215/14306.
Gonçalves, M. C., Medeiros, L. B., & Dias, E. F. S. (2021). Cursos de Licenciatura em
Educação do Campo no Piauí e a utopia que ajuda a caminhar. Rev. Bras. Educ. Camp., 6,
e12974. http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e12974.
Janata, N. E., Corrêa, A. J., & Stefanes, K. T. (2021). Desafios da inserção dos egressos e
egressas da Licenciatura em Educação do Campo no trabalho docente. Rev. Bras. Educ.
Camp., 6, e12969. http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e12969.
Meneses, A. S., & Gomes, R. A. (2021). Deslocamentos sociais provocados pelo ensino
superior: as ações e percepções de mediadores formados no curso Educação do Campo da
Transamazônica e Xingu. Rev. Bras. Educ. Camp., 6, e12939.
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e12939.
Molina, M. C. (2015). Expansão das Licenciaturas em Educação do Campo: desafios e
potencialidades. Educar em Revista, 55, 145-166. Recuperado de
https://www.scielo.br/j/er/a/qQMpZkcTFxbFDk59QJKpWmG/?format=pdf&lang=pt.
Molina, M. C. (2019). Contribuições das Licenciaturas em Educação do Campo para as
políticas de formação de educadores. Educação & Sociedade, 38(140), 587-609. Recuperado
de https://www.scielo.br/j/es/a/57t84SXdXkYfrCqhP6ZPNfh/?format=pdf&lang=pt.
Molina, M. C. (2021). Resultados de pesquisas sobre os (as) Egressos (as) das Licenciaturas em Educação do Campo no Brasil...
Tocantinópolis/Brasil
v. 6
e13419
10.20873/uft.rbec.e13419
2021
ISSN: 2525-4863
17
Molina, M. C., & Hage, S. (2019). Licenciaturas em Educação no Campo: resultados da
pesquisa sobre os riscos e potencialidades de sua expansão (2013-2017). Florianópolis:
LANTEC /CED/UFSC.
Molina, M. C., & Martins, M. F. (2019). Formação de Formadores: reflexões sobre as
experiências das Licenciaturas em Educação do Campo no Brasil. 1ª. Edição. Belo
Horizonte: Autêntica Editora. (Coleção Caminhos da Educação do Campo, v.9).
Molina, M. C., Pereira, M. F. R., & Brito, M. M. B. (2021). A práxis de egressos (os) da
LEdoC UnB na gestão das escolas do campo: caminhos para resistência à Matriz Nacional
Comum de Competências do Diretor Escolar. Rev. Bras. Educ. Camp., 6, e12965.
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e12965.
Paula, H. V. C., & Castro, A. G. (2021). A Licenciatura em Educação do Campo no estado de
Goiás: olhares dos egressos sobre os múltiplos aprendizados na formação do educador do
campo na UFG e UFCat. Rev. Bras. Educ. Camp., 6, e9057.
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e12971.
Santos, J. B. (2021). A questão agrária na prática pedagógica dos/as professores/as
egressos/as da LEC/UFBA: o desafio de efetivar o projeto de escolarização da classe
trabalhadora. Rev. Bras. Educ. Camp., 6, e12940. http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e12940.
Sarmento, C. S., & Lopes, S. L. (2021). O processo formativo: história, memória e trajetória
de egressos/as do curso de Licenciatura em Educação do Campo da Universidade Federal de
Roraima (LEDUCARR/UFRR). Rev. Bras. Educ. Camp., 6, e13004.
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e13004.
Silva, H. S. A., Anjos, M. P., Molina, M. C., & Haje, S. A. M. (2020). Formação de
professores do campo frente às “novas/velhas” políticas implementadas no Brasil: r-existência
em debate. Dossiê: “Consequências do bolsonarismo sobre os direitos humanos, a educação
superior e a produção científica no Brasil”. Revista Eletrônica de Educação, 14, 1-22,
e4562146. Recuperado de
http://www.reveduc.ufscar.br/index.php/reveduc/article/view/4562/1067.
Silva, M. S., & Alves, M. S. (2021). A contribuição da Licenciatura em Educação do Campo
UFCG para a formação docente e a prática pedagógica das escolas no Cariri paraibano:
concepção dos egressos. Rev. Bras. Educ. Camp., 6, e12973.
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e12973.
Sousa, B. S., Augusto, S. O., Barbosa, J. S., Souza, E. N., & Santos, F. M. (2021). A
organicidade dos egressos (as) da Licenciatura em Educação do Campo: uma construção em
percurso. Rev. Bras. Educ. Camp., 6, e12966.
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e12966.
Informação do Editorial / Editorial Information
Recebido em: 05/11/2021
Aprovado em: 10/11/2021
Publicado em: 13/11/2021
Molina, M. C. (2021). Resultados de pesquisas sobre os (as) Egressos (as) das Licenciaturas em Educação do Campo no Brasil...
Tocantinópolis/Brasil
v. 6
e13419
10.20873/uft.rbec.e13419
2021
ISSN: 2525-4863
18
Received on November 05th, 2021
Accepted on November 10th, 2021
Published on November, 13th, 2021
Conflitos de Interesses: A autora declarou não existir conflitos de interesses a respeito deste Editorial.
Conflict of Interest: None reported.
Como citar este Editorial / How to cite this Editorial
APA
Molina, M. C. (2021). Molina, M. C. (2021). Resultados de pesquisas sobre os (as) Egressos (as) das Licenciaturas em
Educação do Campo no Brasil. Rev. Bras. Educ. Camp., 6, e13419. http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e13419
ABNT
MOLINA, M C. Resultados de pesquisas sobre os (as) Egressos (as) das Licenciaturas em Educação do Campo no Brasil. Rev.
Bras. Educ. Camp., Tocantinópolis, v. 6, e13419, 2021. http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e13419