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Bom, o professor de história e geografia, nessa realidade, ele tem uma função extremamente
relevante porque esses povos ribeirinhos eles têm uma característica, eu não posso falar de
todas as comunidades, mas da comunidade na qual estamos trabalhando eles têm uma
característica muito forte que é não conhecerem muito de sua identidade. Então isso é muito
complicado porque ao não conhecerem a sua origem, a sua verdadeira identidade também
como povo, porque eles podem não ter tanta consciência do que são, de onde vieram e etc e
isso os faz muitas vezes se sentir menores, se sentir com uma autoestima bastante abalada
(Ana, 2020).
Levantou-se a real necessidade de um ensino prático, contextualizado e aplicado aos
saberes ribeirinhos e entendeu-se que o ensino tradicional, visto nesse trabalho como o ensino
formal escolar, não é bem-sucedido nesses ambientes.
Baptista (2010) afirma ser lamentável como as escolas ainda aplicam o formato
tradicional e insistem na transmissão de conhecimento científico como único e universal. As
entrevistadas trouxeram esse assunto nas respostas e um exemplo é o relato da professora Sara
(2020) ao dizer: “não trabalha a história e geografia de um modo tradicional, a gente
trabalha bem no contexto deles sobre com relação à natureza e tudo aquilo que eles
conhecem.” As escolas ribeirinhas são exemplos dessa fuga do capitalismo e esse formato
carrega consigo características que dificilmente notamos em meios urbanos. Uma dessas é a
dificuldade com a noção temporal, habilidade importante para ensino de História, mas
também de outras disciplinas como notado pelas professoras.
A diferença foi bem grande na questão do tempo porque eles não possuem o tempo que a
gente conhece, que é o tempo relacionado ao relógio que pra cada período do dia a gente tem
um horário determinado pra cada ação, eles têm um tempo diferente que se chama o tempo
kairós que é aquele tempo que eles se guiam pelo sol. Eu encontrei essa diferença (Lia,
2020).
Essas crianças não tinham noção temporal, os meus alunos não conseguiam diferenciar o
‘ontem’ do ‘amanhã’ e com isso ficava muito difícil eles olharem pra uma palavra e juntarem
uma letra depois da outra porque eles não sabem o que é ‘antes’ e o que é ‘depois’, então
como que vai juntar as letras pra formar uma palavra? (Rebeca,2020).
A noção lógica de tempo deles é muito diferente da nossa e isso começa por coisas básicas,
por exemplo: a gente tá muito acostumado a lidar com o tempo de relógio né, então pra gente
tudo é relógio, você sempre vai se basear por isso. Eles não. Eles vão se basear ali olhando o
céu, o escuro, então se você perguntar tipo “Ah, que horas que você toma banho?”, às vezes
eles até vão falar uma hora, mas assim, é da cabeça deles porque eles não sabem na verdade
a hora que é, eles nem costumam ter relógio. Então assim “Ah, tava escuro ainda quando fui
tomar banho”, sabe? Ou então tipo “Ah, quando a canoa passa?”, “Ah, é um tempo depois
que o sol nasceu.” (Ester, 2020).
Nessas falas simples das entrevistadas notamos como a realidade é diferente em
comparação aos centros urbanos baseado em relógio, regras e cronologias, todavia, como
estudar História se os alunos não diferem o conhecimento de ‘antes’ e ‘depois’? A professora