RBEC
Tocantinópolis/Brasil
v. 8
e14489
10.20873/uft.rbec.e14489
2023
1
Este conteúdo utiliza a Licença Creative Commons Attribution 4.0 International License
Open Access. This content is licensed under a Creative Commons attribution-type BY
Revista Brasileira de Educação do Campo
Brazilian Journal of Rural Education
ARTIGO/ARTICLE/ARTÍCULO
DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e14489
Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência
em uma escola do campo em tempos de pandemia
Lia Heberlê de Almeida1, Elenize Rangel Nicoletti2, José Vicente Lima Robaína3,
1, 3 Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS. Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências. Rua
Ramiro Barcelos, n. 2600, bairro Floresta. Porto Alegre, Brasil. 2 Universidade Federal do Pampa - UNIPAMPA.
Autor para correspondência/Author for correspondence: lia_ha@hotmail.com
RESUMO. O presente estudo analisou a implementação de um
conjunto de atividades na Educação Infantil, baseadas na metodologia
das Ilhas de Racionalidade (Fourez, 1997). A pesquisa, de caráter
qualitativo, realizou-se de forma remota em duas turmas de Pré-Escola
em uma escola do campo no município de São Gabriel/RS, durante o
ano de 2020. Foram utilizadas diferentes estratégias metodológicas,
tais como: desenhos, observação do entorno de suas casas, da
paisagem local, entrevistas com familiares, escuta de rádio, elaboração
de poemas e produção de maquetes. Os dados são apresentados
segundo três categorias: i) Reflexões acerca do trabalho remoto na
Escola do Campo; ii) A metodologia IIR na Educação Infantil e iii)
Alfabetização Científica na Pré-escola. O trabalho remoto trouxe
alguns desafios, em especial na Educação Infantil, considerando a
necessidade de interação entre os sujeitos e mediação do professor.
Verificou-se que a aprendizagem ocorreu em outros espaços e tempos,
principalmente na interação com os familiares e na observação dos
ambientes sociais e naturais do seu entorno, sendo importantes para a
construção da identidade do sujeito do campo e a valorização das
culturas e dos saberes locais. A utilização da metodologia das IIR
desde a Educação Infantil vai ao encontro dos Campos de Experiência
sinalizados pela Base Nacional Comum Curricular (Brasil, 2017).
Conclui-se que algumas habilidades relacionadas à Alfabetização
Científica, como a autonomia, o domínio e a comunicação, podem ser
alcançadas com o desenvolvimento de uma IIR na Pré-escola, mesmo
que de forma remota.
Palavras-chave: pré-escola, projeto interdisciplinar, ensino remoto.
Almeida, L. H., Nicoletti, E. R., & Robaína, J. V. L. (2023). Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma escola do campo em tempos de
pandemia...
RBEC
Tocantinópolis/Brasil
v. 8
e14489
10.20873/uft.rbec.e14489
2023
2
Scientific Literacy in Child Education: experience in a
countryside school in pandemic times
ABSTRACT. The present study analyzed the implementation of a set
of activities in Early Childhood Education, based on the methodology
of the Islands of Rationality (Fourez, 1997). The qualitative research
was carried out remotely in two Pre-School classes in a rural school in
the city of o Gabriel/RS, during the year 2020. Different
methodological strategies were used, such as: drawings, observation
of the surroundings of their homes, the local landscape, interviews
with family members, listening to the radio, writing poems and
producing models. Data are presented according to three categories: i)
Reflections on remote work at Escola do Campo; ii) The IIR
methodology in Early Childhood Education and iii) Scientific Literacy
in Preschool. Remote work brought some challenges, especially in
Early Childhood Education, considering the need for interaction
between subjects and teacher mediation. It was found that learning
took place in other spaces and times, mainly in the interaction with
family members and in the observation of the social and natural
environments of their surroundings, being important for the
construction of the identity of the subject of the countryside and the
appreciation of cultures and knowledge. locations. The use of the IIR
methodology since Early Childhood Education is in line with the
Experience Fields signaled by the National Curricular Common Base
(Brasil, 2017). It is concluded that some skills related to Scientific
Literacy, such as autonomy, mastery and communication, can be
achieved with the development of an IIR in Preschool, even if
remotely.
Keywords: preschool, interdisciplinary project, remote learning.
Almeida, L. H., Nicoletti, E. R., & Robaína, J. V. L. (2023). Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma escola do campo em tempos de
pandemia...
RBEC
Tocantinópolis/Brasil
v. 8
e14489
10.20873/uft.rbec.e14489
2023
3
Alfabetización Científica en Educación Infantil:
experiencia en una escuela rural en tiempos de pandemia
RESUMEN. El presente estudio analizó la implementación de un
conjunto de actividades en Educación Infantil, a partir de la
metodología de las Islas de la Racionalidad (Fourez, 1997). La
investigación cualitativa se realizó de forma remota en dos clases de
preescolar en una escuela rural en la ciudad de São Gabriel/RS,
durante el año 2020. Se utilizaron diferentes estrategias
metodológicas, tales como: dibujos, observación de los alrededores de
sus casas, el paisaje local, entrevistas con familiares, escuchar la radio,
escribir poemas y producir maquetas. Los datos se presentan según
tres categorías: i) Reflexiones sobre el trabajo a distancia en la Escola
do Campo; ii) La metodología IIR en Educación Infantil y iii)
Alfabetización Científica en Preescolar. El trabajo a distancia trajo
algunos desafíos, especialmente en Educación Infantil, considerando
la necesidad de interacción entre sujetos y mediación docente. Se
encontró que el aprendizaje se dio en otros espacios y tiempos,
principalmente en la interacción con los miembros de la familia y en
la observación de los ambientes sociales y naturales de su entorno,
siendo importante para la construcción de la identidad del sujeto del
campo y la apreciación de las culturas y los conocimientos. El uso de
la metodología IIR desde la Educación Infantil está en línea con los
Campos de Experiencia señalados por la Base Común Curricular
Nacional (Brasil, 2017). Se concluye que algunas habilidades
relacionadas con la Alfabetización Científica, como la autonomía, el
dominio y la comunicación, se pueden lograr con el desarrollo de un
IIR en Preescolar, aunque sea a distancia.
Palabras clave: preescolar, proyecto interdisciplinario, enseñanza a
distancia.
Almeida, L. H., Nicoletti, E. R., & Robaína, J. V. L. (2023). Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma escola do campo em tempos de
pandemia...
RBEC
Tocantinópolis/Brasil
v. 8
e14489
10.20873/uft.rbec.e14489
2023
4
Introdução
Na Educação Infantil, a aprendizagem deve ser pautada em processos de enculturação e
emancipação dos sujeitos, construindo redes de apoio com os parceiros da escola e com os
integrantes da comunidade local. Dessa forma, é preciso investir em metodologias que
estimulem a autonomia e o protagonismo das crianças, e que promovam essa aproximação com
a comunidade escolar. As metodologias que articulam atos de brincar e socializar em situações
lúdicas, prazerosas, que envolvam brinquedos e brincadeiras são as mais adequadas para o
público infantil.
Entre diversas possibilidades metodológicas existentes para a sala de aula, este estudo
reflete sobre os limites e possibilidades do uso da metodologia das Ilhas Interdisciplinares de
Racionalidade (IIR) para o desenvolvimento de práticas na Educação Infantil que promovam a
Alfabetização Científica desde cedo. O estudo de caso aqui apresentado, investigou a
implementação de uma IIR ocorrida de forma totalmente remota em uma Escola do Campo no
interior do Rio Grande do Sul (RS). A pesquisa ocorreu em contexto pandêmico, no qual as
escolas adaptaram suas práticas pedagógicas, buscando diferentes meios de contatar seus
alunos e socializar os conhecimentos.
Neste cenário, investiu-se em atividades nas quais as crianças conseguissem realizar com
autonomia, sem necessitar da orientação constante de um adulto por períodos longos. Durante a
realização dos planejamentos para a Educação Infantil, foi ponderada a rotina das famílias das
crianças, especialmente a dos pais trabalhadores e que tinham dois ou três filhos em idade
escolar para atender. Ainda, foram avaliados os impactos da não manutenção do vínculo
escolar, caso as atividades não fossem enviadas.
Definida que as atividades seriam mantidas em formato remoto, buscam-se subsídios
para estruturar propostas que envolvessem os estudantes e pudessem ser orientadas mesmo que
à distância pela professora. Surge então, uma proposição da Secretaria Municipal de Educação
(SEME) do município de São Gabriel, RS para que toda a rede abordasse a temática
‘Moradias’. Em 2020, o município passou a compor a Associação Internacional de Cidades
Educadoras (AICE), tornando-se uma Cidade Educadora. A primeira ação do movimento foi o
projeto intitulado “São Gabriel minha cidade educadora”, com o objetivo de “desenvolver o
conceito de Cidade Educadora para a comunidade escolar das Escolas Municipais de São
Gabriel/RS” (São Gabriel, 2020). Entre as finalidades iniciais, tinha por objetivo aproximar o
olhar dos estudantes ao seu contexto local.
Almeida, L. H., Nicoletti, E. R., & Robaína, J. V. L. (2023). Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma escola do campo em tempos de
pandemia...
RBEC
Tocantinópolis/Brasil
v. 8
e14489
10.20873/uft.rbec.e14489
2023
ISSN: 2525-4863
5
A Escola do Campo analisada no presente trabalho cria, então, o subprojeto ‘Moradias do
Campo’ para valorizar e investigar o contexto local das crianças, analisando o entorno das
residências como potência para a formação cidadã, utilizando o conhecimento do lugar e de
seus hábitos familiares. A proposta desenvolvida em formato de projeto interdisciplinar, parte
da análise dos Campos de Experiência da Base Nacional Comum Curricular (BNCC),
estruturando-se em oito etapas que envolvem a participação de estudantes matriculados na Pré-
escola e seus familiares. Busca-se analisar de que modo um conjunto de atividades
desenvolvidas remotamente com uma turma da Educação Infantil pode contribuir para a
Alfabetização Científica dos participantes.
Ilhas Interdisciplinares de Racionalidade: uma possibilidade na Educação Infantil
As crianças em idade pré-escolar são naturalmente curiosas e observadoras, fazem suas
descobertas a partir de muitas perguntas aos adultos, formulam hipóteses sobre as situações
vivenciadas em seu contexto e os estímulos que lhes são oferecidos. Nestas relações, a partir
das interações sociais, culturais e ambientais constroem sua identidade.
Para atender as especificidades da Educação Infantil, é preciso pensar em uma prática
pedagógica que contemple o exercício da cidadania, sendo a criança entendida como sujeito
capaz de transformar a sua realidade.
Lorenzetti e Delizoicov (2001) defendem a importância do debate sobre o papel da
cidadania na formação das crianças. A contextualização é fator determinante para a construção
de significados por parte do aluno, para que possam construir seus conhecimentos, a partir de
um novo olhar sobre os elementos cotidianos, uma vez que a cientificidade está relacionada
com as necessidades humanas mais básicas como alimentação, saúde e habitação (Shen, 1975,
citado por Lorenzetti & Delizoicov, 2001).
A ênfase no trabalho com diferentes abordagens na Educação Infantil suscita “imprimir
intencionalidade educativa às práticas pedagógicas” (Brasil, 2017, p. 38). Metodologias
baseadas em projetos, entre elas as IIR, podem subsidiar essas práticas, com uma proposta de
trabalho na perspectiva da Alfabetização Científica (Fourez, 1997).
Essa metodologia visa o trabalho participativo em equipe e nas relações entre as
diferentes áreas do conhecimento, assim como a participação ativa dos estudantes, pois
valoriza seus saberes prévios, a investigação e a pesquisa sobre o objeto de estudo. A
construção de uma IIR tem por finalidade relacionar os saberes das áreas de conhecimento aos
Almeida, L. H., Nicoletti, E. R., & Robaína, J. V. L. (2023). Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma escola do campo em tempos de
pandemia...
RBEC
Tocantinópolis/Brasil
v. 8
e14489
10.20873/uft.rbec.e14489
2023
ISSN: 2525-4863
6
saberes do cotidiano, com o propósito de organizar uma teorização, isto é, proporcionar um
entendimento próprio sobre determinado assunto.
A proposta defendida por Fourez (2005) envolve conceitos de diferentes disciplinas, os
quais formam uma rede de saberes, que proporcionam a professores e alunos uma visão geral
do objeto de estudo em vários aspectos. Nehring et al. (2000, p. 95) explicam que “a definição
sobre o que será feito na atividade não é determinada pelas diversas disciplinas vinculadas ao
tema, mas pelo projeto, por sua finalidade e por seu contexto”. Embora estruturada em oito
etapas, o autor afirma que no decorrer do projeto não necessidade de se cumprir de forma
linear todas, pois “elas são flexíveis e abertas, em alguns casos podendo ser suprimidas e/ou
revisitadas, quantas vezes a equipe julgar necessário” (Nehring et al., 2000, p. 96).
Metodologia
Para fins de organização, a metodologia seapresentada em duas partes. A primeira
busca detalhar o formato da pesquisa quanto sua natureza e forma de análise dos dados. A
segunda apresenta o que foi desenvolvido com os alunos enfatizando como as atividades foram
estruturadas e detalhando quais materiais foram analisados.
Delineamento metodológico
A pesquisa configura-se como um Estudo de Caso, que segundo Gil (2002, p. 54) tem o
objetivo de “preservar o caráter unitário do objeto estudado; e descrever a situação do contexto
em que está sendo feita determinada investigação”. Para tanto, realizou-se uma pesquisa
qualitativa, utilizando as explicações de Pope e Mays (1995 citado por Neves, 1996) de que os
métodos qualitativos trazem como contribuição ao pesquisador uma mistura de procedimentos
de cunho racional e intuitivo capazes de contribuir para a melhor compreensão dos fenômenos.
A implementação do projeto ocorreu durante duas semanas entre os meses de julho e
agosto de 2020 em uma Escola do Campo, distante 76 km da área urbana do município de São
Gabriel, RS. As atividades ocorreram totalmente de forma remota devido a situação
emergencial da Pandemia de Covid-19. A pesquisadora é, também, professora regente das
turmas participantes da pesquisa.
Foram analisados materiais produzidos por 12 alunos matriculados na Educação Infantil,
sendo seis de Pré A (4 anos) e os outros seis de Pré B (5 anos). As produções analisadas foram:
atividades impressas; entrevistas registradas em vídeos e escritas; produção de desenhos;
Almeida, L. H., Nicoletti, E. R., & Robaína, J. V. L. (2023). Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma escola do campo em tempos de
pandemia...
RBEC
Tocantinópolis/Brasil
v. 8
e14489
10.20873/uft.rbec.e14489
2023
ISSN: 2525-4863
7
colagens; pinturas; construção de maquetes e elaboração de poemas. Para organizar e analisar
os dados da pesquisa, utilizou-se os princípios da análise de conteúdo (Bardin, 2004),
definindo as categorias de análise a posteriori.
Delineamento pedagógico
Para estruturar-se o projeto, buscam-se as normativas oficiais, encontrando-se respaldo
nos objetivos de aprendizagem e desenvolvimento trazidos pela BNCC (Brasil, 2017) para a
Educação Infantil. O quadro 1 sistematiza os Campos de Experiência previstos para a Pré-
escola (Crianças pequenas, 4 anos a 5 anos e 11 meses) no documento.
Quadro 1 Campos de Experiência da BNCC considerados ao estruturar o Projeto Moradias para a Educação
Infantil.
Compreender a
aprendizagem
Código
alfanumérico
Objetivo de aprendizagem e desenvolvimento
Crianças pequenas (4 anos a 5 anos e 11 meses)
O eu, o outro e o
nós
EI03EO03
Ampliar as relações interpessoais, desenvolvendo atitudes de
participação e cooperação.
EI03EO04
Comunicar suas ideias e sentimentos a pessoas e grupos diversos.
EI03EO06
Manifestar interesse e respeito por diferentes culturas e modos de vida.
Traços, sons,
cores e formas
EI03TS02
Expressar-se livremente por meio de desenho, pintura, colagem,
dobradura e escultura, criando produções bidimensionais e
tridimensionais.
Escuta, fala,
pensamento e
imaginação
EI03EF01
Expressar ideias, desejos e sentimentos sobre suas vivências, por meio
da linguagem oral e escrita (escrita espontânea), de fotos, desenhos e
outras formas de expressão.
EI03EF02
Inventar brincadeiras cantadas, poemas e canções, criando rimas,
aliterações e ritmos.
EI03EF04
Recontar histórias ouvidas e planejar coletivamente roteiros de vídeos e
de encenações, definindo os contextos, os personagens, a estrutura da
história.
EI03EF09
Levantar hipóteses em relação à linguagem escrita, realizando registros
de palavras e textos, por meio de escrita espontânea.
Espaços, tempos,
quantidades,
relações e
transformações
EI03ET01
Estabelecer relações de comparação entre objetos, observando suas
propriedades.
EI03ET02
Observar e descrever mudanças em diferentes materiais, resultantes de
ações sobre eles, em experimentos envolvendo fenômenos naturais e
artificiais.
EI03ET03
Identificar e selecionar fontes de informações, para responder a questões
sobre a natureza, seus fenômenos, sua conservação.
EI03ET04
Registrar observações, manipulações e medidas, usando múltiplas
linguagens (desenho, registro por números ou escrita espontânea), em
diferentes suportes.
EI03ET05
Classificar objetos e figuras de acordo com suas semelhanças e
diferenças.
Fonte: Adaptado de Brasil (2017).
O quadro 2 sintetiza a IIR implementada na Educação Infantil. Além das oito etapas
previstas pelo autor, tem-se a etapa de organização do trabalho docente (etapa zero).
Almeida, L. H., Nicoletti, E. R., & Robaína, J. V. L. (2023). Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma escola do campo em tempos de
pandemia...
RBEC
Tocantinópolis/Brasil
v. 8
e14489
10.20873/uft.rbec.e14489
2023
ISSN: 2525-4863
8
Quadro 2 Descrição das etapas do Projeto Moradias implementado em uma Escola de Campo de forma remota
na Educação Infantil (continua).
Etapas
Descrição
Objetivos para a pesquisa
ETAPA 0:
Organização da Ilha
Planejamento das ações do projeto de forma remota.
Envio dos seguintes materiais aos alunos:
- Cronograma;
- Material de instruções aos pais;
- Atividades para os estudantes.
Preparar e organizar o projeto
ETAPA 1: Clichê
Atividade de responder e desenhar à pergunta: “Quais
tipos de casa você conhece?”
Compreender os
conhecimentos prévios das
crianças.
ETAPA 2: Panorama
espontâneo
Escolha de um especialista podendo ser alguém da
comunidade, um avô, um tio, um vizinho, entre outros.
Logo após responda: “Quem escolheu? Por quê?”,
“Qual o grau de afinidade com esta pessoa?
Compreender os
conhecimentos prévios das
crianças.
ETAPA 3:
Consulta aos
especialistas
Programa de Rádio exibido no dia 31 de julho com o
especialista convidado, Prof. de Geografia e mediação
da professora regente das turmas (1° autora deste
trabalho). Logo após escutar o programa os alunos
registraram com desenhos no material enviado os tipos
de moradias que conheceram por meio do Programa de
rádio.
Aprofundar e socializar os
conhecimentos a respeito de
diferentes moradias
ETAPA 4: Indo a
campo
Entrevista com o especialista escolhido, utilizando o
questionário estruturado pela professora e com as
orientações para os registros das respostas (podendo ser
por meio de vídeo, áudio, ou com a ajuda de um
familiar de forma escrita).
Desenvolver uma
investigação. Levantar
hipóteses a partir do diálogo
com o especialista.
Compreender as mudanças na
natureza ao longo do tempo.
ETAPA 5: Abertura
de caixas pretas com
a ajuda de
especialistas
Com o auxílio dos pais, os alunos conversaram sobre as
diferentes “moradias dos animais”, maneira
representativa de proporcionar um olhar sobre o habitat
dos animais. E com materiais reutilizáveis, construíram
uma casinha de passarinhos. Responderam algumas
questões enviadas pela professora.
Compreender a
aprendizagem. Produzir um
material, utilizando de
autonomia.
ETAPA 6: Esquema
global
Por meio de atividades impressas (recorte, colagem e
pintura) os alunos conheceram os cômodos de uma
casa. A tarefa foi construir uma pequena maquete de
seu cômodo preferido em sua casa.
Compreender a aprendizagem
ETAPA 7: Abertura
de caixas pretas sem
a ajuda de
especialistas
Por meio de atividades impressas os alunos foram
instigados a observar as moradias, os seres vivos, as
plantações e vegetações próximas a sua residência.
Desenvolver uma
investigação
Fonte: elaboração própria (2022).
Quadro 2 Descrição das etapas do Projeto Moradias implementado em uma Escola de Campo de forma remota
na Educação Infantil (conclusão).
Etapas
Descrição
Objetivos para a pesquisa
ETAPA 8: Síntese da
IIR
Os alunos tiveram contato com a poesia “O melhor
lugar do mundo” de Noele Berger, após foram
desafiados junto com seus pais a compor um poema ou
versinho sobre Azevedo Sodré (local onde se localiza a
escola e a maior parte dos estudantes).
Compreender a aprendizagem
Fonte: elaboração própria (2022).
Durante o período da pandemia, as atividades pedagógicas eram elaboradas e
organizadas pela professora, e encaminhadas à equipe diretiva, que organizava e fazia a
Almeida, L. H., Nicoletti, E. R., & Robaína, J. V. L. (2023). Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma escola do campo em tempos de
pandemia...
RBEC
Tocantinópolis/Brasil
v. 8
e14489
10.20873/uft.rbec.e14489
2023
ISSN: 2525-4863
9
separação das atividades de acordo com as linhas de ônibus. Logo após, as atividades eram
enviadas por meio do transporte escolar, para serem levadas até as residências dos estudantes
quinzenalmente. A cada ida quinzenal na casa do aluno, ocorria a troca de materiais, ou seja, o
aluno entregava as atividades para correção e recebia novas atividades para serem realizadas.
No caso deste projeto, utilizou-se apenas uma quinzena.
Resultados e Discussões
Organizar um trabalho à distância para crianças pequenas em uma escola do campo foi
um desafio ao mesmo tempo que suscitou diversas reflexões. Desse modo, dos resultados
emergiram três categorias: i) Reflexões acerca do trabalho remoto na Escola do Campo; ii) A
metodologia IIR na Educação Infantil e iii) Alfabetização Científica na Pré-escola.
O trabalho remoto na Escola do Campo
A escrita deste texto ocorreu no início de 2021, em que a pandemia de COVID-19 durava
cerca de um ano. O distanciamento social proporcionou inúmeros sentimentos: alegrias,
aprendizados, superação, incertezas, angústias. Nesse emaranhado de sentimentos, foi retirado
o lugar de ser e fazer a docência: o chão da escola. A cada dia aumentava o desejo de criar
caminhos para mostrar-se presente, para expressar e reafirmar que os professores estavam
presentes na busca de acolher o outro.
Pensando na realidade da Educação Infantil em escolas do campo, foi necessário
considerar as dificuldades de acesso contínuo à internet. Dos seis alunos da Pré-escola (Pré A),
um possuía acesso à internet todos os dias (por possuir internet via rádio e residir próximo a
torre de sinal); um possuía internet via satélite, e os demais apenas internet via celular pré-pago
dos pais ou responsáveis. Estes, ressalta-se que geralmente ficavam sem acesso à internet, seja
por falta de créditos, seja por falta de sinal em suas residências no interior. Entre os seis alunos
da Pré-escola (Pré B), dois possuíam internet via rádio e os demais apenas com acesso via
plano pré-pago.
Vale destacar que dois alunos possuíam mais irmãos e apenas um aparelho celular em
casa, sem acesso à internet, com sinal apenas para ligações telefônicas. Um deles, quando
contatado, geralmente o pai que atendia durante seu trabalho na lavoura. Era então deixado
recado para o aluno, pedindo que retornasse a ligação se possível, ou retornava-se a ligação à
noite, pois era o horário que o pai da criança estava em casa. Ainda assim, foi criado um grupo
Almeida, L. H., Nicoletti, E. R., & Robaína, J. V. L. (2023). Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma escola do campo em tempos de
pandemia...
RBEC
Tocantinópolis/Brasil
v. 8
e14489
10.20873/uft.rbec.e14489
2023
ISSN: 2525-4863
10
no WhatsApp para comunicação e envio de recados gerais, fotos e vídeos. A maioria dos pais
relataram que apenas conseguiam ver as mensagens quando vinham até a cidade.
Antes de pensar na parte pedagógica, precisou-se conceber as crianças na sua totalidade,
considerando o contexto local e suas relações, com as questões éticas, de gênero, religiosas,
culturais, de raça e etnia e suas respectivas relações econômicas e sociais. A escuta das
crianças e suas famílias foi a primeira estratégia. Foi necessário reinventar as práticas
alinhando as possibilidades do momento, as concepções e marcos legais vigentes, as
necessidades das crianças e de suas famílias, além das possibilidades tecnológicas.
Buscou-se a equidade do processo educativo e a universalização do acesso por meio do
envio de atividades impressas e o cronograma com orientações para realização, bem como
ligações e mensagens para complementar as informações enviadas. Desse modo, foram
enviadas atividades pedagógicas não presenciais impressas por meio do transporte escolar,
chegando quinzenalmente na residência dos alunos. Nesse momento, os alunos também
enviavam as atividades anteriores para correção do professor, atendendo assim também as
proposições da mantenedora municipal.
Durante a pandemia observou-se que o meio virtual adentrou as casas das famílias com
crianças em idade escolar. Desse modo, optou-se por não abrir mão de alguns princípios, como
a escolha das mídias a serem utilizadas. O currículo sinaliza que as crianças não devem fazer
uso de telas, principalmente até os 2 anos de idade (OMS, 2019). Depois disso, recomenda-se
poucas horas de contato com as telas, o que exige cautela ao orientar o uso excessivo em
tarefas escolares. Pautadas nestas perspectivas, justifica-se a não utilização das mídias,
privilegiando o “cuidar” e o “educar” previstos na BNCC. O cuidar no sentido de zelar pela
saúde das crianças e o educar no sentido de educar para as diferenças sociais e desigualdades,
privilegiando uma proposta que chegasse a todos os alunos, na qual todos pudessem participar
e receber as atividades.
Ressalta-se que algumas etapas receberam retorno de todas as crianças, entretanto
algumas atividades vieram em branco. A professora Rute Neves, em entrevista para a revista
Nova Escola sobre as escolas rurais em quarentena, afirma: “Muitos pais não têm o Ensino
Médio completo, então fica difícil conseguirem ajudar os filhos. Por isso, passei a deixar mais
detalhado o enunciado das atividades, por exemplo” (Bimbati, 2020). Esse relato se assemelha
à realidade das famílias das turmas desta pesquisa, uma vez que culturalmente os povos do
campo iniciam o trabalho na roça muito cedo, sendo este mais valorizado do que a educação.
Almeida, L. H., Nicoletti, E. R., & Robaína, J. V. L. (2023). Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma escola do campo em tempos de
pandemia...
RBEC
Tocantinópolis/Brasil
v. 8
e14489
10.20873/uft.rbec.e14489
2023
ISSN: 2525-4863
11
A ideia de educar as crianças por meio de atividades pedagógicas não presenciais é
desafiadora, pois a Educação infantil se constitui nos espaços coletivos. A pandemia exigiu a
reinvenção das práticas pedagógicas a partir de um contexto com pouco acesso à internet, com
utilização de mídia de rádio e como fonte principal de comunicação as atividades
acompanhadas de instruções e cronogramas.
Entretanto, buscou-se construir um processo de experiências neste contexto diferenciado,
considerando a importância e a responsabilidade da educação, especialmente para essas
crianças filhos e filhas de trabalhadores/as, agricultores/as familiares, assalariados/as rurais,
sem-terras, dentre outros que, a partir de seus saberes e práticas vivenciadas e compartilhadas,
constroem identidades próprias e coletivas. Assim, infância, família e escola podem ser
consideradas construtos sociais deste tempo histórico.
A IIR sobre a temática moradias na Educação Infantil
Nos retornos da primeira semana de envio das atividades, as mães relataram que as
crianças ficaram felizes em receber as atividades, sendo que algumas estavam fazendo um
número maior do que as sugestões enviadas. As famílias das turmas analisadas, em sua
maioria, são compostas de duas a três crianças no grupo familiar em idade escolar. Como
algumas recebiam as atividades no ensino fundamental, as crianças da educação infantil
também esperavam receber atividades.
Inicialmente, as crianças foram desafiadas a ilustrarem os tipos de casas que conheciam.
Essa atividade foi planejada para envolver quatro Campos de Experiência e explorar objetivos
de aprendizagem e desenvolvimento. Desse modo, esperava-se que eles pudessem: “comunicar
as suas ideias” (EI03EO04); expressar-se livremente por meio de desenho, pintura, colagem”
(EI03TS02); “levantar hipóteses em relação à linguagem escrita” (EI03EF09); e “classificar
objetos e figuras de acordo com suas semelhanças e diferenças” (EI03ET05), (Brasil, 2017).
Na etapa denominada Clichê, as crianças ilustraram os tipos de casas que elas conheciam
por meio de desenhos que representaram casas [objetivos BNCC - EI03ET04; EI03ET01
(Brasil, 2017)]: (1) “de madeira e de cimento”; (3) “tijolo e madeira”; “tábua e de tijolo”; (1)
“casa, cabana, prédio e apartamento”. Três alunos enviaram áudio: “tábua e tijolo”; “casa e
barraca”; “eu conheço essa casa”. Em todas as atividades, constavam orientações aos pais ou
responsáveis, sendo que era solicitado a transcrição pelos pais das respostas, utilizando
Almeida, L. H., Nicoletti, E. R., & Robaína, J. V. L. (2023). Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma escola do campo em tempos de
pandemia...
RBEC
Tocantinópolis/Brasil
v. 8
e14489
10.20873/uft.rbec.e14489
2023
ISSN: 2525-4863
12
exatamente as palavras da criança, havendo um espaço para registro dos pais e desenho das
crianças.
A etapa 2 foi o momento das crianças escolherem os especialistas. A atividade foi
pensada para que eles tivessem oportunidade de obter informações sobre as moradias por meio
de diferentes fontes [objetivo BNCC - EI03ET03 (Brasil 2017)]. Entre as escolhas aparecem:
papai (1), vovó (5) e vô (1).
A etapa 3 foi pensada fazendo utilização do Programa de Rádio com o especialista
convidado, sendo um professor da área da Geografia para aprofundar informações sobre a
temática em estudo. Logo após escutar o programa, os alunos registraram as informações por
meio de desenhos. Do total de 12, apenas três alunos não responderam e informaram que não
possuíam rádio.
A etapa 4 foi planejada para proporcionar uma investigação, onde o aluno deveria
selecionar um especialista (definido na etapa 2) e que, a partir do diálogo, pudesse levantar
hipóteses. Foi um momento em que tiveram contato com diferentes culturas e modos de vida
de seus antepassados [objetivo BNCC - EI03EO06 (Brasil, 2017)].
Durante as entrevistas, os alunos ou seus pais ou responsáveis, podiam gravar áudios ou
vídeos. Ainda, poderiam transcrever no material impresso enviado. Nessa etapa, três alunos
enviaram vídeos, dois enviaram áudios e para os outros três as entrevistas foram transcritas na
atividade impressa. O Quadro 3 apresenta as perguntas das entrevistas encaminhadas pela
professora antecipadamente e as respostas dos especialistas selecionados.
Quadro 3 Questionário de entrevista com os especialistas (continua).
Perguntas da
entrevista
Respostas dos especialistas escolhidos pelos alunos
Que tipos de
casa que você
conhece?
“A vó conhece casa de tábua, de material, a vó conheceu, viu e morou em casa de torrão, e já
vi casa de pau a pique também. A casa de torrão é feita de laje de torrão, e a de pau a pique
faz a armação da casa, e faz as paredes uns quadrados de bambu, amarrada todas as pontas
dela, e depois cobre toda a parede com barro, sova bem o barro, e gruda, bate com força na
parede, ele fica colado ali, fica um de um lado e o outro do outro, quando um solta uma laje
de barro, o outro solta também, e ai ela fica colada, é uma casa muito boa para o inverno bem
quentinha, e fresquinha no verão, tem umas que são tapada de zinco, de telha, e outras de
capim santa fé, que pouco existe hoje” (Especialista 1)
“Eu conheço casa de tijolo, casa de tábua, conheço vários tipos de casa” (Especialista 2)
“Conheço casa de material, de madeira, e já vi casa de barro também” (Especialista 3)
“Eu conheço a casa de parede de barro, e a cobertura de capim, e o piso é de chão batido. E a
casa que eu moro aqui, é a minha casa, muito antiga tem mais de 200 anos, é a casa do avô do
meu esposo, e ela é parede de barro com pedra, e a parede tem 40 cm de largura, e a cobertura
é de capim” (Especialista 4)
“De tijolo e de madeira” (Especialista 5, 6, 7 e 8)
E a casinha dos
animais, quais
você conhece?
“As únicas casinhas que eu conheço, a casinha do coelho que é um buraco no chão, e a do
João Barreiro que ele faz na árvore, que ele constrói de barro e faz com o biquinho dele
mesmo” (Especialista 1)
Almeida, L. H., Nicoletti, E. R., & Robaína, J. V. L. (2023). Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma escola do campo em tempos de
pandemia...
RBEC
Tocantinópolis/Brasil
v. 8
e14489
10.20873/uft.rbec.e14489
2023
ISSN: 2525-4863
13
Conheço, conheço casinha de cachorro, casinha de passarinho e casinha de João de barro”
(Especialista 2)
“Porongo, papelão e cachorro” (Especialista 3)
“Eu conheço a casinha que nós temos aqui, que é do nosso cachorro, do porco e das galinhas,
que é o galinheiro e do gatinho, casinha do gatinho também” (Especialista 4)
“Casinha de João de Barro, e casinha de cachorro” (Especialista 5)
“Não respondeu” (Especialista 6)
“Madeira” (Especialista 7)
“Pássaro e cachorro” (Especialista 8)
Aqui onde é sua
casa, a vida
mudou muito
durante o
decorrer dos
anos? O que
você percebeu
que mudou?
“Pouca coisa, mas teve umas mudanças, no sítio mesmo aqui, que teve umas reforminhas,
simples, mas teve, e mais foi a mudança de plantar árvore frutífera, sombras que nasceram da
natureza” (Especialista 1)
“Ah mudou bastante, a forma como o pessoal construía as casas, antigamente existia muitas
casas antigas, hoje o pessoal modificou na construção de casas, mudou bastante. (Especialista
2)
“Mudou bastante coisa” (Especialista 3)
“Sim, mudou na minha casa, porque a minha casa era de capim, ai nós troquemos, coloquemo
brasilite, e reformemo toda ela, então mudou a nossa casa” (Especialista 4)
“Sim, bastante temos telefone, internet, luz, Br e carros” (Especialista 5)
“Não respondeu” (Especialista 6)
“As pessoas estão indo embora para a cidade e abandonando a campanha” (Especialista 7)
“Não respondeu” (Especialista 8)
Fonte: elaboração própria (2022).
Quadro 3 Questionário de entrevista com os especialistas (conclusão).
Perguntas da
entrevista
Respostas dos especialistas escolhidos pelos alunos
Como era
antes?
“Antes era mais difícil porque não tinha luz, agora tem. E antes a gente tinha ônibus mais
perto de casa e agora a gente só tem lá na faixa, no mais continua normal” (Especialista 1)
“Antes as casas eram construídas de barro, de pau a pique, como se chamada com cobertura
de capim, também o pessoal produzia seus próprios tijolos no campo, muitas vezes, e assim
por diante, foi mudando muito, casa de telha, quase não se vê mais, se vê mais casa de
brasilite e zinco, enfim mudou bastante hoje” (Especialista 2)
“Antes tinha mais casa de madeira, depois foi surgindo mais casa de material” (Especialista 3)
“Respondeu na pergunta anterior” (Especialista 4)
“Tinha estação férrea e água de cacimba” (Especialista 5)
“Não respondeu” (Especialista 6 e 8)
“O povo era mais unido” (Especialista 7)
Quantos
animais tinha
aqui? Algum
animal não
mora mais
aqui?
“Algum animal não mora mais aqui? Olha de ir embora mesmo, acho que nenhum, porque os
que tem no campo aqui, eles saem uns mais volta outros, e continua. Só os gatinhos que as
vezes eles saem, dá uma passeada e as vezes acabam não voltando, e tem os outros que vocês
levaram para a casa de vocês e ai eles não voltam mais, tá morando com vocês” (Especialista
1)
“É tinha bastante animal aqui, como hoje a gente cultiva só a citricultura, não se trabalha mais
com animal, hoje pode se dizer que o gado não convive mais aqui, mas ainda tem passarinho,
tem gato, cachorro e também tem animais silvestres que a gente vê quase todos os dias, como
o sorro, tatu, a gente vê muitos animais ainda. Mas o que não convive com nós hoje é os
bovinos como o gado” (Especialista 2)
“Tem, mas maioria já foram embora ou já morreram” (Especialista 3)
“Olha aqui nós temos alguns, mas muitos já morreram, não existem mais” (Especialista 4)
“Tinham 7 e mora 1” (Especialista 5)
“Não respondeu” (Especialista 6 e 8)
“20 vacas e 4 cachorros” (Especialista 7)
Como chega a
água na sua
casa?
“A água na campanha assim, no interior, geralmente é de cacimba, aqui é poço, a gente
puxava com uma corda com uma rondana, e era assim. Ai depois que veio a luz, ai ficou mais
fácil porque ai foi feito encanamento, e depois a caixa de água, ai agora a gente tem a água na
Almeida, L. H., Nicoletti, E. R., & Robaína, J. V. L. (2023). Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma escola do campo em tempos de
pandemia...
RBEC
Tocantinópolis/Brasil
v. 8
e14489
10.20873/uft.rbec.e14489
2023
ISSN: 2525-4863
14
torneira dentro de casa” (Especialista 1)
“A água aqui hoje ela chega por meio de poço artesiano, onde é feita a perfuração do solo, e
onde se extrai a água para o nosso consumo, ela não passa por tratamento nenhum, apenas
direto da caixa de água, e da caixa de água para a torneira onde a gente bebe” (Especialista 2)
“De cano e manga” (Especialista 3)
“Aqui chega a água puxada com a bomba lá da cacimba” (Especialista 4)
“Poço artesiano” (Especialista 5, 6 e 7)
“Cano” (Especialista 8)
Fonte: elaboração própria (2022).
Percebe-se que no contexto das residências, citou-se a casa de madeira pela maioria dos
especialistas e que pode ser associado pela disponibilidade desse material no interior, fácil e de
baixo custo. A curiosidade maior foi a menção da casa de barro, também conhecida como casa
de torrão, onde o Especialista 1 descreve, inclusive, todo o processo de elaboração e ainda
menciona “é uma casa muito boa para o inverno bem quentinha, e fresquinha no verão”,
ampliando nosso conhecimento sobre essa cultural local.
Em relação às residências dos animais, a citação predominante foi casa do cachorro e do
gato. Mas os especialistas mencionaram outros animais, comuns ao contexto do interior, mas
distante das comunidades urbanas, como coelho, pássaro (em particular do João de Barro),
porco e galinha. Quando questionados sobre as mudanças ocorridas, apesar das transformações
no interior ocorrerem de forma mais lenta, os especialistas destacaram que muitas
características mudaram no interior nos últimos anos e citaram: mudanças na agricultura;
mudanças nas formas de construção das casas; presença de telefone, internet, luz, rodovia e
carros. Outro ponto que chama atenção, talvez considerado um dos maiores desafios, é a
migração das pessoas do campo para a cidade.
Os especialistas destacaram situações do passado, como a não existência de energia
elétrica; os materiais utilizados na construção das casas; os ônibus que passavam mais perto
das casas; a existência de trens de passageiros e de mais união entre os vizinhos. Também
foram mencionadas situações relacionadas a alteração da quantidade de animais,
principalmente a produção de gado que foi substituído pelas lavouras.
Na última questão da entrevista, sobre como a água chega até a sua casa, mencionaram a
existência de cacimba ou poço artesiano; e bombas para retirada da água. Ainda, citaram a
presença objetos utilizados nas instalações hidráulicas atuais das residências, tais como cano,
manga, caixa d’água e torneira, apresentando uma visão simplista de como a água chega até
suas residências.
Embora falas importantes tenham sido extraídas das entrevistas, esta etapa da IIR
apresentou um maior grau de dificuldade, considerando que os alunos não eram alfabetizados.
Almeida, L. H., Nicoletti, E. R., & Robaína, J. V. L. (2023). Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma escola do campo em tempos de
pandemia...
RBEC
Tocantinópolis/Brasil
v. 8
e14489
10.20873/uft.rbec.e14489
2023
ISSN: 2525-4863
15
Assim, demandaram mais ajuda dos pais para fazer a leitura das perguntas (para que eles
fizessem aos especialistas) e para transcrevê-las no papel. Ainda, aqueles que optavam por
registrar as entrevistas em áudio ou vídeo, precisavam dos pais para a filmagem ou envio de
áudio para a professora.
Sasseron e Carvalho (2008, p. 138) reiteram que “o ensino de ciências deve ocorrer por
meio de atividades abertas e investigativas nas quais os alunos desempenham o papel de
pesquisadores”. Nessa etapa, porém, não pode-se identificar o nível de envolvimento dos
estudantes nem propor maiores discussões entre eles. Na Educação Infantil, as rodas de
conversa são uma oportunidade de os estudantes construírem relações entre os conhecimentos
das ciências, as tecnologias associadas a esses saberes e as consequências para a sociedade e
meio ambiente. O professor é fundamental nessa mediação, no uso da linguagem apropriada,
na identificação dos elementos levantados pela criança. Por isso, ressalta-se o papel
imprescindível do professor na mediação das aprendizagens, em especial na Educação Infantil.
A etapa 5 buscou promover o diálogo entre os pais e a criança sobre as diferentes
moradias dos animais, e com materiais recicláveis construir uma casinha para passarinhos. Ao
planejar essa etapa, pensou-se em explorar os objetivos de aprendizagem (Brasil, 2017):
“Ampliar as relações interpessoais, desenvolvendo atitudes de participação e cooperação”
(EI03EO03), e expressar-se livremente por meio de desenho, pintura, colagem, dobradura e
escultura, criando produções bidimensionais e tridimensionais (EI03TS02). Esse caso
fortaleceu as relações entre os familiares que passaram a participar mais ativamente das
atividades escolares. Recebemos retorno de todas as crianças, que utilizaram como materiais
caixas de leite e garrafas pet. Algumas enviaram áudio relatando como havia sido a construção;
ainda, os pais de outras registraram na tarefa impressa o local de escolha para colocar a casinha
depois de pronta.
Nessa mesma perspectiva, as atividades impressas da etapa 6 permitiram aos alunos
observarem mais atentamente os cômodos da casa e identificarem os objetos de cada um deles.
Logo, usando de sua autonomia elaboraram uma maquete de seu cômodo preferido,
expressando suas vivências [objetivo BNCC - EI03EF01 (Brasil, 2017)].
Apesar de simples para um adulto, construir uma casinha de passarinho e uma maquete,
para crianças de 4 a 5 anos, exige esforços complexos. A partir do retorno de 100% das
atividades nas etapas 5 e 6, infere-se que, além dos objetivos de aprendizagem, proporcionou-
se um momento de confraternização familiar, onde pais e filhos sentaram juntos para fazer a
Almeida, L. H., Nicoletti, E. R., & Robaína, J. V. L. (2023). Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma escola do campo em tempos de
pandemia...
RBEC
Tocantinópolis/Brasil
v. 8
e14489
10.20873/uft.rbec.e14489
2023
ISSN: 2525-4863
16
tarefa escolar, de forma lúdica. A escola é complementar à vida familiar, algo muito positivo
em meio a tantos desafios (Brasil, 2017). Segundo uma reportagem da revista Nova Escola
(Bernardo, 2020):
... apesar dos pesares, a relação entre família e escola melhorou durante a pandemia. Ficou
mais próxima, intensa, colaborativa. “A família se obrigou a participar mais da vida escolar de
seus filhos. Isso, para a formação da criança, é excelente”, afirma a professora de Lucas do
Rio Verde (MT). ‘Antes do confinamento, muitas famílias nem ligavam. Hoje, elas se
interessam mais, correm atrás’.
É possível que a diferença na porcentagem apontada pela matéria em relação com as
atividades (etapas 5 e 6) retrate as diferenças entre escolas urbanas e escolas do campo, onde as
comunidades rurais ainda têm a escola como uma referência e que a participação sempre foi
algo comum identificado na sua cultura. Essa aproximação se torna relevante no
relacionamento família e escola e na participação dos alunos e o acompanhamento da sua
aprendizagem.
Na etapa 7, os alunos foram provocados a olhar com atenção para o entorno de sua casa,
observando seres vivos, plantas e vegetações. Buscou-se relacionar os objetivos de
aprendizagem (Brasil, 2017): “observar e descrever mudanças ... envolvendo fenômenos
naturais” (EI03ET02), “registrar observações, ... usando múltiplas linguagens (desenho,
registro por números ou escrita espontânea)”, explorando o campo de experiência “Espaços,
tempos, quantidades, relações e transformações”. Esse campo tem uma relação intrínseca com
o diálogo do lugar e do cotidiano, sendo uma vertente forte na temática escolhida, incitando os
alunos a refletir sobre o meio que estão inseridos. Relacionar as atividades ao contexto do
estudante torna-se um agente facilitador no processo de aprendizagem, estimulando-os a
refletir sobre o seu meio.
Na etapa 8, destinada a síntese da IIR, os alunos com seus responsáveis foram desafiados
a compor um poema sobre Azevedo Sodré (local onde se localiza a escola e a maior parte dos
estudantes). A atividade está de acordo com a habilidade ‘EI03EF02’ (Brasil, 2017) que busca
estimular a criação de rimas pelos estudantes da Educação Infantil.
Quadro 4 Poema produzido pelos alunos e pais da Educação Infantil do Campo, como produto de uma IIR sobre
as moradias.
Eu nasci lá na cidade...
Me criei aqui neste chão
Aonde quer que vá...
Levo Azevedo Sodré no coração.
No Azevedo Sodré tem boa
vizinhança
Tem adultos e idosos
E tem também jovens e crianças
Tem lavouras e gados
Sodré é meu chão.
Sodré do meu coração.
Sodré é meu rincão,
Onde eu vivo de paixão!
Almeida, L. H., Nicoletti, E. R., & Robaína, J. V. L. (2023). Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma escola do campo em tempos de
pandemia...
RBEC
Tocantinópolis/Brasil
v. 8
e14489
10.20873/uft.rbec.e14489
2023
ISSN: 2525-4863
17
Lugar de muita esperança.
Fonte: dados da pesquisa (2020).
Os poemas foram curtos, com no máximo cinco ou seis estrofes (Quadro 4). Foi
perceptível a ausência de argumentação, e os textos se limitaram a frases de construção muito
simples. Apenas três famílias enviaram essa atividade, possivelmente pela ausência do hábito
da leitura, o que talvez tenha sido uma dificuldade para a elaboração do poema. Ressalta-se que
a atividade favoreceu o protagonismo dos estudantes e suas famílias, utilizando sua
criatividade, um fator marcante nesta tarefa.
O trabalho com a temática das Moradias na Educação infantil, a partir da metodologia
das IIR, permite explorar a diversidade encontrada no ambiente interno e no entorno de uma
moradia. Partindo de uma perspectiva interdisciplinar, o interno pode ser analisado no contexto
visual e relacional dos cômodos, móveis e objetos, da organização, dimensões e cores. No
externo, parte da estrutura da casa, da disposição das coisas no terreno, bem como sua relação
com a rua/estrada, bairro/localidade e cidade/campo. Assim como os tipos de residências
existentes tanto na sua localidade como pelo mundo.
Boff (2000a, 2000b, 2000c), Morin (2002, 2003) e Morin, Ciurana e Motta (2003)
refletem a relação dos seres humanos para consigo e seu entorno, mostrando como o ser
humano vem desprezando a Terra e seus recursos naturais, que resulta na degradação e ameaça
ao planeta. O estudo do entorno sugere uma educação para a conscientização do “Aprender a
Cuidar” e o fortalecimento do sentimento de pertencimento.
Este contexto poderá ser um caminho para potencializar o relacionamento com o entorno,
a contemplação e a preservação da natureza, suscitando um universo de significados,
motivações, aspirações, valores e atitudes para a construção de um espaço mais profundo de
relações. Assim como Louv (2016, p. 89) reitera que “qualquer espaço natural contém uma
reserva infinita de informações, portanto, um potencial para inesgotáveis descobertas novas”.
Indícios de Alfabetização Científica nas atividades da IIR
A Alfabetização Científica (AC) acontece em espaços formais e não formais de ensino,
sendo um processo contínuo e permanente (Marques & Marandino, 2018). As autoras
supracitadas afirmam que é possível que o indivíduo relacione-se com a AC antes mesmo de
ter frequentado a escola, defendendo que quanto mais cedo esse contato, e o quanto antes essa
Almeida, L. H., Nicoletti, E. R., & Robaína, J. V. L. (2023). Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma escola do campo em tempos de
pandemia...
RBEC
Tocantinópolis/Brasil
v. 8
e14489
10.20873/uft.rbec.e14489
2023
ISSN: 2525-4863
18
relação ocorrer, “mais significativo e rico será o conhecimento científico desse indivíduo”.
Entretanto, as discussões acerca da AC na Educação Infantil ainda são poucas e recentes.
O desenvolvimento de uma IIR busca promover a AC nos sujeitos. Bettanin e Alves
Filho (2003) propõem uma ficha de observação para analisar se os atributos relacionados a AC
foram alcançados durante o desenvolvimento da IIR. De modo geral, as habilidades sugeridas
para análise de cada um dos atributos são: em relação a autonomia: buscar informações a
respeito da situação; ter ideias próprias, não se deixar influenciar pelos outros; ter criatividade;
tomar decisões com segurança frente às situações Em relação ao domínio do assunto: saber
fazer; conhecer sobre o assunto; domínio e responsabilidade frente a situação problema;
relacionar os conhecimentos científicos com a situação problema. E em relação a
comunicação: saber expressar suas opiniões; saber dialogar na equipe e com os especialistas;
elaborar modelos teóricos; ter boas argumentações nas colocações.
Os autores salientam que dificilmente a autonomia, o domínio do conteúdo e a
comunicação andam separados (Bettanin & Alves Filho, 2003). Ressalta-se que, na maioria das
vezes, nas quais o aluno demonstra entendimento sobre determinado assunto ele precisa
expressar-se e, portanto, utilizar alguma forma de comunicação. O quadro 5 apresenta os
materiais analisados e quais atributos foram alcançados em cada uma das etapas da IIR.
Quadro 5 Atributos relacionados à AC encontrados nas atividades com estudantes da Educação Infantil.
Material analisado
Autonomia
Domínio
Comunicação
1 - Desenhos
X
2 - Ficha com a escolha do especialista
X
3 - Desenho a partir das escutas no programa de
rádio
X
X
4 - Ficha preenchida pelos entrevistados
X
5 - Casinha de passarinho criada de modo livre
X
6- Maquete do cômodo preferido da casa
X
X
7 - Folha registrando as observações individuais do
entorno da escola
X
X
8 Poema sobre a localidade da escola
X
X
X
Fonte: elaboração própria (2022).
Devido a extensão do trabalho, optou-se por descrever as atividades relacionadas às
produções de desenhos dos estudantes (etapas 1 e 3).
Almeida, L. H., Nicoletti, E. R., & Robaína, J. V. L. (2023). Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma escola do campo em tempos de
pandemia...
RBEC
Tocantinópolis/Brasil
v. 8
e14489
10.20873/uft.rbec.e14489
2023
ISSN: 2525-4863
19
As crianças envolveram-se com as atividades e buscaram ilustrar os tipos de casas de
acordo com suas vivências (Figuras 1 e 2). Assim foi possível identificar seus conhecimentos
prévios a respeito do tema, onde a criança especifica a casa, a cabana e o prédio, ilustrando as
diferenças entre estas moradias.
Figura 1 e 2 Registros dos escolares obtidos durante a etapa 1 da IIR Moradias das crianças na etapa 1.
Fonte: dados da pesquisa (2020).
Destaca-se que os alunos estavam atentos ao Programa de Rádio
i
e fizeram associações,
de acordo com a escuta dos detalhes das moradias, relacionando com suas experiências e
conhecimentos prévios. A capacidade de abstração fica evidente na Figura 4, na qual é
ilustrada a iglu (casa de gelo que protege do frio). Na Figura 3, infere-se que a casa do centro
do desenho seja uma casa de madeira, pelo traçado vertical.
Figuras 3 e 4 Respostas das crianças na etapa 3.
Fonte: dados da pesquisa (2020).
Neste sentido, aproximar a prática pedagógica da pré-escola, com os pressupostos da AC,
pressupõe a discussão de problemas e situações do cotidiano vivenciados na comunidade
escolar, como por exemplo: a valorização da biodiversidade por meio do cuidado com o
Almeida, L. H., Nicoletti, E. R., & Robaína, J. V. L. (2023). Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma escola do campo em tempos de
pandemia...
RBEC
Tocantinópolis/Brasil
v. 8
e14489
10.20873/uft.rbec.e14489
2023
ISSN: 2525-4863
20
entorno, a preservação das florestas, dos habitats dos animais presentes nelas e dos recursos
naturais.
Refere-se às experiências que promovam a construção de conhecimentos sobre o destino
correto do lixo que é produzido, da reciclagem, da diminuição do consumo, da reutilização de
materiais, necessidade de uma alimentação equilibrada e a possibilidade de produzir alimentos
sem agrotóxicos em hortas caseira, assim como economizar água e energia. Na prática
apresentada neste trabalho a AC foi abordada por meio da exploração do entorno da residência
do estudante, buscando a valorização e o cuidado com a biodiversidade. As perspectivas da AC
são diversificadas, a exploração do ambiente natural envolve e mobiliza as crianças em sua
curiosidade para desvelar o mundo.
Os aportes teóricos sobre AC e a metodologia das IIR contribuem para a construção de
práticas pedagógicas para a Pré-escola, pois auxiliam na construção de uma leitura crítica em
relação à realidade do entorno em que vivem e por meio dessas interações e experimentações
ampliam a compreensão do mundo em uma perspectiva interdisciplinar.
Considerações finais
A Educação Infantil, diferente das demais etapas e modalidades de ensino, abrange
concepções importantes e indissociáveis, que são: cuidar, brincar e o educar. Essas ações, no
contexto pedagógico, promovem o desenvolvimento da integralidade do sujeito criança, que
também envolve as questões da formação cidadã, tornando-se algo inerente à educação infantil.
Portanto, torna-se necessário pensar a criança como sujeito que deve ser ouvido, ser
considerado socialmente competente, que consegue criar e recriar, ressignifica os seus
conhecimentos, enxerga o mundo com seus próprios olhos, cria suas próprias culturas. O
ambiente da educação infantil deve amparar as crianças em todos os seus direitos, inclusive o
de aprendizagem.
Muitas questões tomaram conta do cotidiano docente: como garantir que essas rotinas
sejam permeadas de interações e brincadeiras? Como garantir as intencionalidades pedagógicas
nas atividades planejadas? O que significa atender as crianças do campo respeitando seus
espaços, tempos, saberes, organização da vida social? Que propostas pedagógicas poderão
acolher as infâncias do campo? As perguntas não poderão ser respondidas em uma perspectiva
de “manuais” ou “receitas”, mas por meio de interação reflexiva do professor com essas
crianças, na compreensão docente do cenário individual e coletivo de inserção desses
Almeida, L. H., Nicoletti, E. R., & Robaína, J. V. L. (2023). Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma escola do campo em tempos de
pandemia...
RBEC
Tocantinópolis/Brasil
v. 8
e14489
10.20873/uft.rbec.e14489
2023
ISSN: 2525-4863
21
estudantes. No entanto, um ponto base é reconhecer a educação como direito, de acesso e
permanência, garantindo os princípios dos direitos fundamentais, acolhendo as diferenças e
especificidades e, ao mesmo tempo, construindo processos de superação das desigualdades.
As práticas pedagógicas analisadas evidenciaram as fragilidades da educação em tempos
de pandemia. Devido à suspensão das aulas presenciais, foi necessário adotar atividades
pedagógicas não presenciais, o que provocou dificuldades na mediação do professor no
desenvolvimento do processo de ensino e de aprendizagem. Entretanto, as atividades propostas
oportunizaram outros espaços e tempos de aprendizagem, principalmente na interação com os
familiares e na observação dos ambientes sociais e naturais do seu entorno, sendo importantes
para a construção da identidade do sujeito do campo e a valorização das culturas e dos saberes
locais.
Pela distância entre a sede urbana e a escola, as interações não ocorreram no ambiente
escolar, devido ao distanciamento social, mas no contexto social da criança, com adultos,
familiares, vizinhos, amigos, pois é nelas que o conhecimento se constitui.
Não podemos afirmar que este tempo de pandemia foi subutilizado ou que necessita ser
recuperado. Pelo contrário, serve de aprendizagem coletiva, para ser olhado, refletido,
analisado, apropriado, que proporcionou situações de desacomodação e de descobertas.
Precisamos refletir o contexto em que estamos inseridos e consolidar aprendizagens dessas
experiências, para que não haja um retorno mecanizado das rotinas, dos horários e dos
problemas anteriores. Precisamos trabalhar em uma outra construção, na somatória de
experiências vividas antes, durante e após a pandemia, construindo uma escola que pensa o
coletivo da comunidade escolar.
Referências
Brasil. (2017). Base nacional comum curricular: educação é a base. Recuperado de:
http://www.observatoriodoensinomedio.ufpr.br/wpcontent/uploads/2017/04/BNCC-
Documento-Final.pdf
Bernardo, A. (2020, 08 de julho). Da pandemia nasce uma nova relação entre escola e família.
[Site Nova Escola]. Recuperado de: https://novaescola.org.br/conteudo/19474/da-pandemia-
nasce-uma-nova-relacao-entre-escola-e-familia?gclid=Cj0KCQjwl7qSBhD-
ARIsACvV1X0t8gP1tORruLZXE2hZp0ViGugfsFv8AQPgaYpu8n7xQiEkefW9aI4aAr2EEA
Lw_wcB
Almeida, L. H., Nicoletti, E. R., & Robaína, J. V. L. (2023). Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma escola do campo em tempos de
pandemia...
RBEC
Tocantinópolis/Brasil
v. 8
e14489
10.20873/uft.rbec.e14489
2023
ISSN: 2525-4863
22
Bettanin, E., & Alves Filho, J. P. (2003). Alfabetização científica e técnica: um instrumento
para observação dos seus atributos. In Anais do IV Encontro Nacional de Pesquisa em
Educação em Ciências. Bauru, SP.
Bimbati, A. P. (2020, 01 de julho). Escolas rurais em quarentena: internet via rádio, acesso
limitado aos materiais impressos e evasão escolar. [Site Nova Escola]. Recuperado de:
https://novaescola.org.br/conteudo/19440/escolas-rurais-em-quarentena-internet-via-radio-
acesso-limitado-aos-materiais-impressos-e-evasao-
escolar#:~:text=Os%20desafios%20e%20esfor%C3%A7os%20docentes,os%20materiais%20i
mpressos%20na%20escola
Boff, L. (2000a). Ética da vida. Brasília: Letraviva.
Boff, L. (2000b). Ethos Mundial: um consenso mínimo entre os humanos. Brasília: Letraviva.
Boff, L. (2000c). A voz do arco-íris. Brasília: Letraviva.
Fourez, G. (1997). Qu'entendre par "ilot de rationalite"? Et par "îlot interdisciplinaire de
rationalité"? Aster, 25, 217-225. Recuperado de: http://ife.ens-lyon.fr/publications/edition-
electronique/aster/RA025-10.pdf
Fourez, G. (2005). Alfabetización científica y tecnológica: acerca de las finalidades de la
enseñanza de las ciencias. Buenos Aires: Ediciones Colihue.
Gil, A. C. (2002). Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Atlas.
Lorenzetti, L., & Delizoicov, D. (2001). Alfabetização científica no contexto das séries iniciais.
Ensaio Pesquisa em Educação em Ciências, 3(1), 37-50. http://dx.doi.org/10.1590/1983-
21172001030104
Louv, R. (2016). A última criança da natureza: resgatando nossas crianças do transtorno do
déficit de natureza. São Paulo: Aquariana.
Marques, A. C. T. L., & Marandino, M. (2018). Alfabetização científica, criança e espaços de
educação não formal: diálogos possíveis. Educação e Pesquisa, 44.
http://dx.doi.org/10.1590/s1678-4634201712170831
Morin, E., & Kern, A. B. (2002). Terra-Pátria. Porto Alegre: Sulina.
Morin, E. (2003). Ciência com consciência. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.
Morin, E., Ciurana, E-R., & Motta, R. D. (2003). Educar na era planetária: o pensamento
complexo como método de aprendizagem pelo erro e incerteza humana. São Paulo: Cortez;
Brasília: UNESCO.
Nehring, C. M., Silva, C. C., Trindade, J. A. de O., Pietrocola, M., Leite, R. C. M., & Pinheiro,
T. de F. (2000). As ilhas de racionalidade e o saber significativo: o ensino de ciências através
Almeida, L. H., Nicoletti, E. R., & Robaína, J. V. L. (2023). Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma escola do campo em tempos de
pandemia...
RBEC
Tocantinópolis/Brasil
v. 8
e14489
10.20873/uft.rbec.e14489
2023
ISSN: 2525-4863
23
de projetos. Revista ENSAIO Pesquisa em Educação em Ciências, 2(1), 88-105.
http://dx.doi.org/10.1590/1983-21172000020107
Neves, J. L. (1996). Pesquisa qualitativa características, usos e possibilidades. Caderno de
Pesquisas em Administração, 1(3), 1-5. Recuperado de:
https://www.hugoribeiro.com.br/biblioteca-digital/NEVES-Pesquisa_Qualitativa.pdf
Organização Mundial de Saúde. (2019). Orientações sobre a atividade física, comportamento
sedentário e sono para crianças menores de 5 anos. Organização Mundial de Saúde
Parecer CNE/CEB nº 20/2009, de 11 de novembro de 2009 (2009, 11 de novembro). Revisão
das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Recuperado de:
http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/pceb020_09.pdf
Parecer CNE/CP nº 5/2020, de 28 de abril de 2020 (2020, 28 de abril). Reorganização do
Calendário Escolar e da possibilidade de cômputo de atividades não presenciais para fins de
cumprimento da carga horária mínima anual, em razão da Pandemia da COVID-19.
Recuperado de:
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=14511-
pcp005-20&category_slud=marco-2020-pdf&Itemid=30192
São Gabriel. (2020). Projeto minha Cidade Educadora. Secretaria Municipal de Educação de
São Gabriel. São Gabriel, 2020.
Sasseron, L. H., & Carvalho, A. M. P. de. (2008). Almejando a alfabetização científica no
ensino fundamental: a proposição e a procura de indicadores do processo. Investigações em
Ensino de Ciências, 13(3), 333352.
i
O Programa de rádio faz parte do Projeto Rádio Educação, proposto pela Secretaria Municipal de Educação de
São Gabriel (RS), importante estratégia neste tempo de pandemia, que foi divulgada pelo Jornal Diário de Santa
Maria. Disponível em: https://cutt.ly/HzFdi2X.
Informações do Artigo / Article Information
Recebido em: 31/05/2022
Aprovado em: 15/02/2023
Publicado em: 13/05/2023
Received on May 31th, 2022
Accepted on February 15th, 2023
Published on May, 13th, 2023
Contribuições no Artigo: Os(as) autores(as) foram os(as) responsáveis por todas as etapas e resultados da pesquisa, a
saber: elaboração, análise e interpretação dos dados; escrita e revisão do conteúdo do manuscrito e; aprovação da versão
final publicada.
Author Contributions: The author were responsible for the designing, delineating, analyzing and interpreting the data,
production of the manuscript, critical revision of the content and approval of the final version published.
Almeida, L. H., Nicoletti, E. R., & Robaína, J. V. L. (2023). Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma escola do campo em tempos de
pandemia...
RBEC
Tocantinópolis/Brasil
v. 8
e14489
10.20873/uft.rbec.e14489
2023
ISSN: 2525-4863
24
Conflitos de Interesse: Os(as) autores(as) declararam não haver nenhum conflito de interesse referente a este artigo.
Conflict of Interest: None reported.
Avaliação do artigo
Artigo avaliado por pares.
Article Peer Review
Double review.
Agência de Fomento
Não tem.
Funding
No funding.
Como citar este artigo / How to cite this article
APA
Almeida, L. H., Nicoletti, E. R., & Robaína, J. V. L. (2023). Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma
escola do campo em tempos de pandemia. Rev. Bras. Educ. Camp., 8, e14489. http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e14489
ABNT
ALMEIDA, L. H.; NICOLETTI, E. R.; ROBAÍNA, J. V. L. Alfabetização Científica na Educação Infantil: experiência em uma
escola do campo em tempos de pandemia. Rev. Bras. Educ. Camp., Tocantinópolis, v. 8, e14489, 2023.
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e14489