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1
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Revista Brasileira de Educação do Campo
Brazilian Journal of Rural Education
ARTIGO/ARTICLE/ARTÍCULO
DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e14765
Povos Campesinos: caminhos para a democratização de
acesso à educação
Raphaella Ferreira de Moura Negromonte1, Maria de Fátima Gomes da Silva2
1, 2 Universidade de Pernambuco - UPE. Faculdade de Ciências da Administração de Pernambuco/Mestrado em Gestão do
Desenvolvimento Local Sustentável. Avenida Sport Clube do Recife, 252. Recife- PE.
Autor para correspondência/Author for correspondence: raphaella.negromonte@upe.br
RESUMO. Este estudo tem como objetivo mapear a produção
acadêmica no Brasil sobre os caminhos utilizados para a
democratização do acesso dos povos campesinos à educação,
presentes na literatura constante nas bases científicas,
considerando o marco teórico no período de 2017 a 2022. Para
tanto, utilizou-se a revisão sistemática da literatura, cuja
tipologia foi a meta-análise qualitativa, utilizando-se de
descritores embasados no acesso de povos campesinos à
educação no campo. Realizou-se a pesquisa e os levantamentos
das produções científicas, que possuíam relação com a
investigação, em seguida, leitura dos títulos, das palavras-chave
e dos resumos para, posteriormente, proceder com um estudo
exploratório do arcabouço teórico. A pesquisa evidenciou que a
educação do campo ainda é uma pauta a ser ampliada as
discussões, assim como que a Pedagogia da Alternância tem
sido apontada como um dos caminhos norteadores para a
democratização dos povos campesinos à educação do campo.
Além disso, percebeu-se que os estudos demonstram a
importância de os espaços educativos não se limitarem à sala de
aula e que as concepções pedagógicas devem estar atreladas à
inserção da realidade dos povos do campo como parte das
discussões dos conteúdos vivenciados em sala de aula.
Palavras-chave: educação do campo, povos campesinos,
democratização do acesso e saberes dos povos campesinos.
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Peasant Peoples: Pathways to Democratizing Access to
Education
ABSTRACT. This study aims to map the academic production
in Brazil on the paths used for the democratization of the access
of peasant peoples to education, present in the literature
contained in scientific databases, considering the theoretical
framework in the period 2017 to 2022. To do so, a systematic
literature review was used, whose typology was the qualitative
meta-analysis, using descriptors based on the access of peasant
peoples to education in the countryside. The search and survey
of scientific productions related to the investigation was carried
out, followed by the reading of titles, keywords, and abstracts, to
proceed later with the exploratory study of the theoretical
framework. The research evidenced that rural education is still
an issue to be furthered in the discussions, as well as that the
alternating cycle pedagogy has been pointed out as one of the
guiding paths for the democratization of rural peoples to rural
education. Moreover, it was noticed that the studies demonstrate
the importance of the educational spaces not being limited to the
classroom and that the pedagogical conceptions should be linked
to the insertion of the reality of the rural people as part of the
discussions of the contents experienced in the classroom.
Keywords: rural education, peasant peoples, democratization of
access to and knowledge of peasant peoples.
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Pueblos campesinos: vías para democratizar el acceso a la
educación
RESUMEN. Este estudio tiene como objetivo mapear la
producción académica en Brasil sobre los caminos utilizados
para la democratización del acceso de los pueblos campesinos a
la educación, presentes en la literatura contenida en las bases
científicas, considerando el marco teórico en el período de 2017
a 2022. Para ello, se utilizó la revisión sistemática de la
literatura, cuya tipología fue el meta-análisis cualitativo,
utilizando descriptores basados en el acceso de los pueblos
campesinos a la educación en el campo. Se realizó la
investigación y las encuestas de las producciones científicas, que
tenían relación con la investigación, después, la lectura de los
títulos, palabras clave y los resúmenes para, posteriormente,
proceder al estudio exploratorio del marco teórico. La
investigación evidenció que la educación rural sigue siendo un
tema a ampliar en las discusiones, así como que la pedagogía de
ciclo alternado ha sido señalada como uno de los caminos
orientadores para la democratización de los pueblos rurales a la
educación rural. Además, se observó que los estudios
demuestran la importancia de que los espacios educativos no se
limiten al aula y que las concepciones pedagógicas se vinculen a
la inserción de la realidad de los pueblos rurales como parte de
las discusiones de los contenidos vividos en el aula.
Palabras clave: educación de campo, pueblos campesinos,
democratización del acceso y conocimiento de los pueblos
campesinos.
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Introdução
O presente estudo realizou um mapeamento da produção acadêmica no Brasil sobre o
acesso de povos campesinos à educação. Assim, buscou-se levantar e analisar as discussões
teóricas e científicas que demonstrassem as condições de democratização ofertadas a esses
povos.
A proposição dessas discussões sobre a educação no campo advém da preocupação de
romper os paradigmas educacionais, ainda, pautados na dicotomia entre a colonialidade e a
modernidade, apontada por Farias e Faleiro (2020, p. 1) como um resquício presente, até os
dias atuais, haja vista que essas divergências foram constituídas “a partir da colonização da
América, e suas bases são intrínsecas ao urbanocentrismo, que se constrói sob a égide da
civilidade, pautado nas dicotomias entre o urbano-superior e o rural-inferior”.
Nessa direção, encontram-se os povos marginalizados que possuem seus diferentes
modos de vida e diferenças culturais na contramão de um urbanocentrismo
i
. Por isso, tem-se
um processo de inferiorização e a manutenção de realidades de povos alheios ao processo de
desenvolvimento (Farias & Faleiro, 2020).
Esse desenvolvimento tem relação direta com as propostas educacionais que, por muitos
anos, foi razão de lutas sociais e sindicais. Oliveira e Fernandes (2018, p. 184) coadunam com
os apontamentos de Farias e Faleiro (2020), ao revelarem, em seus estudos, que, não obstante
a “sociedade brasileira tenha se desenvolvido fundamentalmente no e a partir do campo, a
constituição do processo educativo formal em nosso país negligenciou tanto os sujeitos do
campo, as sociabilidades do campo quanto o modo de vida campesino”.
Com isso, a busca pelo combate ao modelo hegemônico vem sendo pauta de lutas
existentes pelos movimentos sociais no campo na perspectiva de alcance dos seus respectivos
direitos, dentre eles, a educação. Autores como Alves et al. (2021, p. 3) asseguram que a
educação brasileira vem avançado no que concerne à educação do campo, pois, vem
fomentando o “desenvolvimento de novos paradigmas educacionais que nascem de outro
olhar sobre o campo”.
Um dos paradigmas que tem sido destacado pelos autores é a substituição do termo e da
reconfiguração do que o mesmo representa em torno de uma educação anteriormente
denominada de educação rural, cujo contraposto teórico-prático é denominado educação no
campo, que, conforme explicam Oliveira e Fernandes (2018, p. 184), recentemente foi
incluída no vocabulário da educação brasileira e na letra das leis relativas à educação nacional
embora a educação “no” campo seja tão antiga quanto a própria vida campestre nacional”.
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Os limites da substituição do termo não são estabelecidos pela troca de nome, mas pelo
que a mesma representa, de modo que essa proposta de modalidade educacional se
reconfigure permitindo que os povos do campo e suas realidades sejam incorporadas ao
contexto educacional.
Gomes, Araújo e Antunes (2019, p. 15) corroboram que essa mudança de nome
“significou a ruptura com uma visão calcada em uma assimetria social e educacional em
busca de construção de uma educação baseada na participação coletiva”, preocupando-se com
apropriação de indivíduos que, assim, são denominados por viverem de sua subsistência.
Os povos denominados do campo, que vivem de sua própria subsistência, se constituem
por: “agricultores familiares, extrativistas, pescadores artesanais, ribeirinhos, os assentados e
acampados da reforma agrária, os trabalhadores assalariados rurais, os quilombolas, os
caiçaras, os povos da floresta, os caboclos e outros que produzam materiais para sua
existência” (Decreto 7.352, 2010).
Nessa esteira, as realidades diferentes vivenciadas por esses povos se conectam tanto
por melhores condições de existência na sociedade, por direitos de acesso à educação e pela
resolução de aspectos conflitantes que impeçam o que os autores Vizolli, Aires e Barreto
(2018, p. 3) definem com uma sustentável relação entre “terra-homem-trabalho-educação,
cuja resolução está atrelada a uma educação específica a ser ofertada aos povos que vivem no
e do campo”.
Daí, decorre afirmar a relevância do presente estudo em como esse acesso à educação
tem sido proporcionado a esses povos do campo e quais os caminhos acadêmicos, científicos,
pedagógicos e metodológicos têm sido implementados na direção de um processo de
democratização de acesso aos povos campesinos à educação, por meio de um diálogo
epistemológico, oriundo das percepções das autoras do artigo sobre as produções acadêmicas
no Brasil.
Para isso, foi realizado um mapeamento da produção acadêmica no Brasil sobre o
referido acesso e como esses caminhos convergem e divergem na perspectiva da oferta de
uma educação, como um direito fundamental e includente a todos os povos. Assim, com a
pergunta de partida - quais caminhos têm sido utilizados para a democratização de acesso de
povos campesinos à educação? - constituiu-se a pesquisa. O objetivo geral foi mapear a
produção acadêmica no Brasil sobre os caminhos utilizados para a democratização do acesso
dos povos campesinos à educação.
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Metodologia
A construção dos pressupostos teóricos do presente artigo foi realizada a partir de um
mapeamento da produção acadêmica no Brasil, cujo marco temporal foi o período de 2017 a
2022.
Realizou-se uma revisão sistemática, que é definida por Galvão e Ricarte (2020, p. 58)
como “uma modalidade de pesquisa, que segue protocolos específicos e que busca entender e
dar alguma logicidade a um grande corpus documental, especialmente, verificando o que
funciona e o que não funciona num dado contexto.”
A presente revisão sistemática se propôs a estruturar um corpus documental, a partir de
recortes da literatura que contivessem discussões teóricas e empíricas acerca da educação no
campo e de suas respectivas propostas de democratização. Para isso, adotou-se uma pesquisa
com as seguintes palavras-chave: “Campesinos e educação”; “Povos campesinos e educação”;
“Interculturalidade e educação”; “Saberes dos povos campesinos” e “Povos do campo e
educação”.
No intuito de dar continuidade à revisão sistemática, buscou-se adotar as orientações de
Galvão e Ricarte (2020, p. 58), no que diz respeito ao foco necessário estabelecido pelos
autores ao se referir à “preocupação em estabelecer critérios que observem o caráter de
reprodutibilidade por outros pesquisadores”. Para isso, buscou-se apresentar explicitamente as
bases de dados bibliográficos que foram consultadas, as de busca empregadas em cada uma
delas, o processo de seleção dos artigos científicos, os critérios de inclusão e exclusão dos
mesmos e o processo de análise de cada um.
Adotou-se, com isso, a meta-análise qualitativa dos referidos autores, pois buscou-se
“sintetizar estudos qualitativos sobre um tópico a fim de localizar temas, conceitos ou teorias-
chave que forneçam novas ou mais poderosas explicações para o fenômeno sob análise”,
nesse caso, caminhos democráticos de acesso aos povos do campo.
Diante do exposto, após levantamento dos materiais bibliográficos encontrados, a
pesquisa demonstrou que as discussões teóricas sobre as realidades dos povos do campo ainda
se apresentaram de forma incipiente.
A seguir, são dispostos os critérios de inclusão e de exclusão utilizados para a pesquisa,
conforme constam, no Quadro 1:
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Quadro 1 Critérios de Inclusão e Exclusão.
Critérios de Inclusão
Critérios de Exclusão
Artigos em Língua Portuguesa, no período de 2017 a
2022, que abordem questões de povos do campo e a
educação.
Artigos em língua estrangeira publicados no período
de 2017 a 2022, que não abordem questões de povos
do campo e a educação.
Artigos que, no título, entre as palavras-chaves ou no
resumo apresentavam os descritores: “Campesinos e
educação”; “Povos campesinos e educação”;
“Interculturalidade e educação”; “Saberes dos povos
campesinos” e “Povos do campo e educação”.
Artigos que no título, entre as palavras-chaves ou no
resumo não apresentavam os descritores: “Campesinos
e educação”; “Povos campesinos e educação”;
“Interculturalidade e educação”; “Saberes dos povos
campesinos” e “Povos do campo e educação”.
Artigos que no resumo demonstrassem questões
sobre a educação e o acesso à educação pelos povos
do campo
Artigos que no resumo não sinalizassem a abordagem
de questões sobre a educação e o acesso pelos povos
do campo
Seleção da criterização “revisão por pares” na
plataforma estudada do item revisão por pares
Aqueles que não compõem a seleção da criterização
“revisão por pares” na plataforma estudada do item
revisão por pares
Fonte: Negromonte e Silva (2022).
Após as etapas metodológicas cumpridas, procedeu-se a uma análise e discussão dos
resultados.
Resultados e Discussão
Na presente seção, foram expostos o mapeamento da produção acadêmica acerca dos
povos campesinos e da educação, assim como caminhos propostos para democratizar o acesso
à educação por esses povos.
Mapeamento da produção acadêmica no Brasil sobre o acesso de povos campesinos à
educação
A produção acadêmica no Brasil sobre o acesso de povos campesinos se demonstrou
passível de ampliação de novas pesquisas acadêmicas, haja vista que as peculiaridades dos
povos campesinos são diversas, complexas e têm sido pouco exploradas nos estudos
científicos.
É importante destacar que tal como aconteceu com os autores Amaral e Mateus (2020),
que realizaram uma recente revisão sistemática de literatura sobre as concepções de Educação
do Campo, com um percentual de 76% dos artigos achados foram oriundos da Revista
Brasileira de Educação do Campo, o presente trabalho também teve uma predominância de 9
artigos oriundos daquela Revista (Amaral & Mateus, 2020, p. 11).
Foram encontrados também artigos nos periódicos Educação em Revista EDUR (1),
Educação e Pesquisa (1) e Revista Interdisciplinar em Cultura e Sociedade (RICS) (1), sendo
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a Revista Brasileira de Educação do Campo aquela que se constitui como uma importante
referência no país em se tratando de publicações de estudos sobre a Educação do Campo”
(Amaral & Mateus, 2020, p. 11), razão pela qual, também, buscou-se submeter este trabalho.
Dos achados da pesquisa, obteve-se como aporte teórico 6 dissertações, 6 teses e 15
artigos científicos, os quais demonstraram relação com o presente estudo. As bases científicas
de dados, que compuseram a pesquisa, foram a Scielo, Capes Periódicos (revisado por pares),
Capes (plataforma sucupira) e BDTD (biblioteca digital brasileira de teses e dissertações) e
Google Scholar.
Após a leitura exploratória dos resumos da pesquisa, foram descartados 7 arquivos,
entre dissertações e teses, e mantidos todos os artigos científicos encontrados.
No Quadro 2, verifica-se o detalhamento desse levantamento no que se refere aos
artigos:
Quadro 2 Mapeamento da produção acadêmica no Brasil Artigos.
TÍTULO
BASE DE DADOS
ANO
1
Educação dos povos do campo no Brasil:
colonialidade/modernidade e urbanocentrismo
Scielo
2020
2
A teia dos povos e a universidade: agroecologia, saberes
tradicionais insurgentes e descolonização epistêmica
Scielo
2022
3
Interculturalidade na formação de professores do campo: análise
de uma experiência
Capes periódicos
(revisado por pares)
2017
4
Ecologia de saberes na educação do campo como
alternativa epistemológica e societal: experiência do siecs
Capes periódicos
(revisado por pares)
2018
5
O campo e a educação: caminhos e descaminhos das políticas
educacionais brasileiras
Capes periódicos
(revisado por pares)
2018
6
Licenciatura em educação do campo: contribuições à formação
de monitores de escolas família agrícola
Capes periódicos
(revisado por pares)
2018
7
Legislação sobre posse de terras e educação do campo no Brasil
Capes periódicos
(revisado por pares)
2019
8
Licenciatura em educação do campo: contribuições à formação
de monitores de escolas família agrícola
Capes periódicos
(revisado por pares)
2018
9
A Pedagogia da Alterncia presente nos projetos político-
pedagógicos das escolas famílias agcolas do Tocantins
Scielo
2018
10
Educação popular e educação do/no campo: perspectivas
para uma educação inclusiva a escola família agrícola
em Sidrolândia - MS
Capes periódicos
(revisado por pares)
2017
11
O movimento dos pequenos agricultores na interface
entre agricultura familiar e educação do campo
Capes periódicos
(revisado por pares)
2017
12
Educação do campo, ensino médio e juventude
camponesa: conceitos em construção
Capes periódicos
(revisado por pares)
2018
13
Que educação para os povos do campo no sudeste de Goiás?
Google Scholar
2021
14
Os (des)caminhos da Educação do Campo em Campos dos
Goytacazes: uma análise das políticas públicas educacionais
Google Scholar
2022
15
Concepções de Educação do Campo: uma revisão sistemática de
literatura
Google Scholar
2022
Fonte: Negromonte e Silva (2022).
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Um dos aspectos convergentes identificados nos artigos foi que esses defendiam uma
necessária adaptação das atividades voltadas ao ensino e aprendizagem à realidade vivenciada
pelos povos do campo, de modo que o respeito à cultura e à diversidade étnica fosse
considerada na tomada de decisões administrativas, na construção de propostas pedagógicas e
na preocupação de inclusão e busca por um coletivo que se preocupa com as singularidades.
Outrossim, destaca-se que o arcabouço teórico mapeado trouxe uma percepção
compartilhada de não ter como implementar ações voltadas aos povos do campo sem que a
escola dialogue com os mesmos ou esteja presente, vivenciando aquela realidade, para adaptá-
la ao processo educativo.
Os autores também coadunam com uma preocupação de garantia da educação como um
direito fundamental e precípuo para que os povos do campo alcancem seus demais direitos;
por isso, ressaltam que a necessidade de estabelecer melhorias no acesso à educação, por parte
desses povos, deve ser um compromisso de todos, governantes, sociedade civil, empresas e,
especialmente, da própria escola.
A seguir, no Quadro 3, verifica-se o detalhamento desse levantamento no que se refere
às teses e dissertações:
Quadro 3 Mapeamento da produção acadêmica no Brasil Artigos e Teses.
TÍTULO
BASE DE DADOS
ANO
13
Os saberes campesinos nas práticas docentes
em escolas do campo no município de riacho
das Almas-PE: um olhar através dos
paradigmas da educação do campo
Capes (plataforma
sucupira)
2020
14
Egressas do curso de licenciatura em educação
do campo da UFMG: olhares para escolas no
contexto campesino em Francisco SÁ/MG
Capes (plataforma
sucupira)
2020
15
O ensino de geografia, a educação do/no campo
e o território: uma proposta de sequência
didática investigativa para a escola Família
Agrícola de Veredinha - MG
Capes (plataforma
sucupira)
2019
16
Mapeando a educação do campo em minas
gerais: um estudo sobre egressos da licenciatura
em educação do campo da UFMG (2005-2011)
do Vale do Jequitinhonha
Capes (plataforma
sucupira)
2019
17
Por dentro de uma escola pública campesina em
tempos de resistência: o caso da escola do Xuri.
BDTD (biblioteca digital
brasileira de teses e
dissertações)
2019
18
Crença, motivação e autonomia em relatos de
experiência docente no ensino de inglês para
alunos campesinos da EJA
B (biblioteca digital
brasileira de teses e
dissertações)
2020
19
Livros didáticos do PNLD campo e
epistemologias campesinas
BDTD (biblioteca digital
brasileira de teses e
dissertações)
2019
20
Por uma educação do campo popular: uma
BDTD (biblioteca digital
2018
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10
TÍTULO
BASE DE DADOS
ANO
análise a partir do curso de licenciatura
interdisciplinar em educação do campo da
UFERSA
brasileira de teses e
dissertações)
21
Concepções e práticas da educação do campo:
um estudo com professores em formação
BDTD (biblioteca digital
brasileira de teses e
dissertações)
2017
22
Institucionalização da licenciatura em educação
do campo na UNIFESSPA: avanços e
contradições
BDTD (biblioteca digital
brasileira de teses e
dissertações)
2020
23
A licenciatura em educação do campo no
estado de Roraima : contribuições para a escola
do campo
BDTD (biblioteca digital
brasileira de teses e
dissertações)
2018
24
A alfabetização é nossa! contribuições da
educação dialógica à alfabetização e ao
letramento do campo: um estudo bibliográfico
BDTD (biblioteca digital
brasileira de teses e
dissertações)
2021
Fonte: Negromonte e Silva (2022).
As dissertações compostas no item 14 e 16 foram excluídas, dada à sua relação
direcionada para os egressos e, após a leitura mais aguçada, percebeu-se que possuía um
direcionamento maior ao povo campesino egresso. Quanto às dissertações 18, 20, 21, 22 e 23,
as mesmas não foram utilizadas, tendo em vista que o aprofundamento do estudo e de suas
temáticas divergiam do foco principal da presente pesquisa.
Observou-se que as dissertações estavam alinhadas com as diretrizes da proposição de
uma educação do campo que reconheça as diferenças do modo de vida do campo, dos saberes,
das experiências, da cultura e das potencialidades que melhor devem ser aproveitadas dos
povos campesinos e da região em que eles estão inseridos, devendo os processos didáticos-
pedagógicos serem alterados para a promoção da cidadania, da igualdade e do
desenvolvimento para todos.
Caminhos para a democratização de acesso de povos campesinos à educação: o diálogo
com as produções acadêmicas no Brasil.
Após a revisão sistemática realizada, a presente seção foi estruturada com os principais
caminhos apontados pelos autores das produções acadêmicas no Brasil que estivessem
alinhadas com uma democratização de acesso à educação pelos povos do campo.
Em seu estudo sobre a Pedagogia utilizada e a observância dos Projetos Políticos
Pedagógicos em escolas agrícolas, no Tocantins, Vizolli, Aires e Barreto (2018, p. 3)
apresentam que uma proposta adequada de democratização do acesso dos povos campesinos é
implementar uma transformação na escola que esteja alinhada com a construção de princípios
pedagógicos que correspondam à instituição de uma Pedagogia da Alternância, cuja definição
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propõe que o processo educativo aconteça em tempos/espaços alternados (escola-
comunidade), com instrumentos didático-pedagógicos elaborados a partir da realidade da
escola e de seus estudantes”.
Essa pedagogia se apresenta como uma alternativa à inclusão dos povos do campo, pois
promove uma educação específica direcionada às realidades dos diferentes sujeitos, tal como
os do campo, que se trata de uma “proposta educacional que contempla, respeita e valoriza
os saberes presentes em contextos socioculturais, considerando a escola, a família e a
comunidade como espaços de produção, organização, articulação e difusão de
conhecimentos” (Vizolli, Aires & Barreto, 2018, p. 3).
Com isso, a percepção desses autores coaduna com uma necessidade de esses caminhos
pedagógicos associarem a valorização das experiências do estudante e do contexto em que ele
está inserido, permitindo um maior envolvimento por parte dele, à proporção que o mesmo
identifica o compromisso da Instituição e dos seus respectivos responsáveis com suas
diferenças socioculturais.
Alves et al. (2021) também defendem a Pedagogia da Alternância no processo de
ensino-aprendizagem para um melhor acesso pelos povos do campo, pois “ocorre em espaços
e territórios diferenciados e alternados. Os autores (2021, p.19) elencam que, em seus
achados, são percebidas que essas medidas têm sido efetivas no âmbito da Escola de Família
Agrícola de Orizona - EFAORI, pois, diante da realidade dos jovens que cursam Ensino
Médio e ensino técnico concomitamente, a alternância tem sido favorável à aprendizagem,
uma vez que esses “permanecem um período na escola, em regime de internato, e, por igual
período, permanecem na propriedade, com suas famílias, aplicando os conhecimentos
apreendidos na escola”.
Essa Pedagogia da Alternância também foi apontada por Silva Filho (2018), em sua
dissertação, como uma alternativa ao estímulo ao diálogo e à autonomia.
Por isso, essa relação de uma oferta de ensino que proporcione a aplicação dos
conhecimentos e reúna as possibilidades de os saberes serem praticados a partir da vida
pessoal e profissional desses povos facilita para que haja um retorno dos saberes para as
comunidades em que esses estiverem inseridos.
Assim, a promoção de espaços que ofertem uma educação do campo qualificadamente
ressignifica a realidade posta e se compromete com a eliminação da “dicotomia campo e
cidade, entendendo que se faz necessário superar a gica do capital que coisifica os sujeitos
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e, nesse sentido, engajar-se com a luta maior que coloca os sujeitos na centralidade do debate
(Gonçalves, 2018, p. 624).
No caso dos povos do campo, acentua-se a necessidade de que esses saberes
ultrapassem os limites da sala de aula, pois eles reconhecem na educação uma oportunidade
de acesso aos seus demais direitos e de suas respectivas famílias, na perspectiva de uma
sobrevivência com dignidade e o direito à sua permanência no campo como meio de
subsistência.
Nessa esteira, a busca por uma educação que contemple os povos do campo é essencial
a ser conduzida pelas Instituições de Ensino, de modo a contribuir com o desenvolvimento
das realidades que os circundam, proporcionando aos povos campesinos reescreverem suas
histórias de exclusão. Assim, o caminho de democratização proposto por Alves et al. (2021,
p. 4) é que se construa uma proposta para “repensar a educação a ser ofertada para os povos
do campo, mas, agora, com os povos do campo”.
Essa proposta encontra basilares nos estudos de Lima (2021), em decorrência de a
autora defender que as transformações necessárias para uma educação da contemporaneidade
de modo que a construção de um conhecimento seja acessível aos diferentes indivíduos e às
diferentes realidades.
Para a autora Lima (2021, p. 1621-1622), a educação da contemporaneidade “deve
romper o paradigma de uma lógica academicista excludente”, de modo que haja uma proposta
de ensino pautada na construção de um conhecimento dinâmico e com “multifacetas de tal
forma que a família, os educadores, o estudante e meio social sejam coparticipes, em um
processo mediado pela valorização e pelo respeito às diferenças socioculturais inerentes às
populações do campo”.
Essas multifacetas contemplam as peculiaridades das populações, inclusive, as do
campo, de tal forma, que as diferenças socioculturais não sejam respeitadas e inseridas no
contexto prático-teórico, mas, também, que a coparticipação deles no processo de ensino e
aprendizagem venha a ser oportunizada para fortalecer, ainda mais, o enriquecimento dos
saberes discutidos em sala de aula.
Alves et al. (2021, p. 20) também defendem que, ao relacionar a educação do campo às
vivências dos povos que dela dependem, transforma-se em um importante “mecanismo de
fortalecimento na luta pela terra, tanto para o acesso, quanto para permanência nela, por isso,
precisa-se valorizar os saberes e fazeres do campo”.
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Essa interação entre o estudante como participante do processo de ensino-aprendizagem
se remete à proposta de uma educação libertadora e inclusiva, defendida por Paulo Freire, ao
mencionar que quanto mais se problematizam os educandos, como seres no mundo e com o
mundo, tanto mais se sentirão desafiados. Tão mais desafiados, quanto mais obrigados a
responder ao desafio” (Freire, 2010, p. 80).
Com isso, a problematização traz à tona a responsabilidade do educando ser parte das
discussões postas em sala de aula. Autores como Alves et al. (2021, p.3) revelam que a
educação brasileira vem avançado no que concerne à educação do campo, que, a partir de
lutas de movimentos sociais do campo na luta pelos seus direitos, tal qual a educação, tem-se
ampliado o “desenvolvimento de novos paradigmas educacionais que nascem de outro olhar
sobre o campo”, e traz à educação o grande desafio de entender as diferenças sociais, culturais
e políticas que devem ser abarcadas em um ensino inclusivo e transformador.
Nesse discurso supracitado por Alves et al. (2021), percebe-se a busca por caminhos
que permitam o acesso educacional, mas que os valores culturais sejam prevalecidos e
respeitados. Diante disso, para se repensar a educação para os povos do campo, iniciativas
locais devem ser construídas com a participação desses povos.
Adicionalmente, autores como Santos e Richard (2017, p. 101-102) trazem como
alternativa que tais iniciativas sejam norteadas por uma política nacional de educação do
campo, a partir do diálogo com as diversas esferas da gestão do Estado, com os movimentos e
organizações sociais do campo brasileiro”.
Percebe-se que para os autores supracitados, a culminância de um acesso à educação por
parte dos povos campesinos está diretamente vinculada à capacidade de articular ações locais
com diretrizes nacionais que dialoguem na busca de uma inclusão social, da promoção da
cidadania e da valorização da diversidade étnica e cultural desses povos.
Estratégias educacionais sobre esse cuidado com a diversidade étnica e cultural também
foram discutidas por Marques (2017, p. 467), ao mencionarem que a participação ativa de
grupos populares na elaboração e seleção dos conteúdos escolares e estratégias educativas”
devem ser adotadas na perspectiva de ter uma representatividade com essa visão para
proporcionar um processo educativo que envolva diferentes realidades.
Para isso, o autor sugere que os órgãos gestores, quando possíveis, sejam compostos
por representantes de movimentos sociais, egressos, discentes e docentes que possuam
envolvimento com a Educação do Campo (Marques, 2017, p. 467).
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Assim, a articulação da gestão educacional com propostas que estejam alinhadas com os
sujeitos que dela fazem parte favorece o surgimento de sentimentos de pertencimento e
corresponsabilidade por parte dos envolvidos, pois se percebe que a efetividade de ações
voltadas ao campo é inerente à participação com opiniões, observância e escutas desses povos
conjuntamente.
Essa proposta de maior articulação com os povos campesinos foi estudada por Pimentel
e Menezes (2022, p. 1), a partir das relações entre a Universidade Federal do Sul da Bahia e a
Teia dos povos, “movimento que articula comunidades tradicionais e movimentos sociais do
campo e da cidade, que se propõe ao encontro de saberes tradicionais aos conhecimentos
acadêmicos como uma referência pedagógica de uma educação descolonizadora”. Uma das
ações percebidas foi que, a Teia lançou no portal de vídeos Youtube o canal Diálogo com os
Povos e passou a produzir programas ao vivo (as chamadas lives) com alguns dos principais
mestres dos saberes tradicionais e populares que se conectaram à aliança nos últimos anos”,
conforme afirmam Pimentel e Menezes (2022, p. 14).
Essas articulações, tal como as promovidas pelos povos da Teia, o relevantes para
eliminar as barreiras de acesso de grupos excluídos socialmente e proporcionar a educação
como um direito dentro dessa gica de diversidade e da ampliação da aproximação entre a
sociedade e a Universidade.
Nessa direção, Marques (2017, p. 467) complementa que as Instituições devem prezar
pelo fomento ao direito à igualdade, por isso, reconhece que um pilar do princípio da
igualdade de oportunidades é a participação frequente de representantes de movimentos
sociais do campo em palestras, conferências e encontros promovidos na proposta de relação
comunidade-escola.
Concorda-se com o autor, ao demonstrar que o envolvimento dos povos do campo na
construção de propostas pedagógicas e educativas cotidianamente aproxima a disseminação
de saberes orientados pelas experiências vivenciadas pelos povos do campo, permitindo
maiores condições de contemplar suas reais necessidades nas políticas implementadas.
Gomes, Araújo e Antunes (2019, p. 18) também compartilham dessa construção de
saberes permeada por uma lógica em que os “discursos produzidos para as questões
educacionais campesinas apresentem diversidade, construindo interpretações para tais, de
acordo com concepções de campo e de educação do campo”. Nessa perspectiva, os docentes
devem desenvolver conteúdos e práticas pedagógicas que dialoguem com essa pluralidade e
realidade social diversificada.
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Para isso, os autores Assunção e Bernardelli (2017, p. 316) orientam sobre uma
estratégia de implementação de medidas de parcerias e de aproximação entre comunidade do
campo, docentes e escola:
A escola articula-se com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - EMBRAPA, a
Agência de Desenvolvimento Agrário e Extensão Rural - AGRAER, o Movimento Sem Terra
- MST, a Federação dos Trabalhadores em Agricultura - FETAGRI e a Central Única dos
Trabalhadores - CUT e estabelece parcerias com os sitiantes da região, que oportunizam aos
alunos receberem aulas práticas dos técnicos agrícolas, de piqueteamento, agroindústria de
polpa e frutas, desenvolvimento de hortas, adubos orgânicos, irrigação, viveiros de mudas do
cerrado, entre outros. Para o ano de 2017 estão estabelecendo parceria com a Universidade
Federal da Grande Dourados UFGD, para que possam contribuir com a formação de seu
quadro de professores, em termos dos conhecimentos técnicos e pesquisa.
Com isso, é perceptível que atrelar os elementos de sala aula às vivências locais, assim
como, retroalimentar o ensino, a partir dessas diferentes vivências, por meio do protagonismo
dos professores e estudantes, evidencia-se um compromisso institucional com a
democratização do acesso aos povos do campo e uma preocupação em inseri-los nas
discussões acadêmicas.
Silva e Silva (2018) defendem que o curso e as práticas pedagógicas a ele atreladas
devem contemplar os princípios da educação do campo, tanto pela dimensão de apropriação
dos saberes didático-pedagógicos, quanto pelo estímulo à realização de práticas pedagógicas
interdisciplinares”
Essas práticas pedagógicas interdisciplinares, mencionadas por Silva e Silva (2018)
revelam a necessidade de o processo de ensino e aprendizagem não ser estatístico nem alheio
às características de outras disciplinas que, quando integradas, podem enriquecer a formação
do indivíduo e a sua capacidade de trazer à vida social os conceitos acadêmicos.
Em complemento, Gonçalves (2018, p. 264) evidencia que mais que propostas
pedagógicas, necessita-se que a educação do campo possua infraestrutura adequada, pois, para
o autor, essas questões de acesso à escola não podem prescindir da melhoria da infraestrutura
das escolas, das estradas, de saneamento básico, de transporte de qualidade, de acesso à água,
energia elétrica, à internet e a tantos outros insumos e processos. (Gonçalves, 2018, p. 624).
Isso decorre da necessidade de ofertar condições para todos os envolvidos no processo
educativo, de modo que com a qualidade na infraestrutura se possam ter ambientes propícios
a uma aprendizagem atrativa e de boa qualidade por parte daqueles que possuem suas
respectivas dificuldades de subsistência, como é o caso, dos povos do campo.
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O estudo de Gonçalves (2018) traz os efeitos causados com a realização de um
Seminário Interterritorial de Educação do Campo no Semiárido (SIECS), sediado no IFBA de
Juazeiro-Bahia, com tema Terra, Trabalho e Educação, cuja proposta de desenvolvimento é
atrelada a “uma perspectiva pluralista de pensar engajadamente o conhecimento sobre
Educação do Campo, com a contribuição de um coletivo plural e portador de saberes
diversos: Academia, Movimentos Sociais do Campo, Movimento Estudantil e Artistas”.
Eventos como esse, que propõe o estreitamento entre os diversos povos, movimentos,
academia e movimentos culturais, são de grande valia para o fortalecimento das causas dos
povos do campo, haja vista que podem materializar demandas represadas e dar visibilidade às
realidades vivenciadas por esses povos. No caso desse evento, pôde-se contar com uma carta
Política, construída para ser entregue a diferentes atores sociais.
Assunção e Bernardelli (2017, p. 316) asseguram que para que o currículo abarque as
realidades e dimensões, que estão além da sala de aula, esse deve ser organizado de forma
dinâmica e integral, havendo interdisciplinaridade dos componentes curriculares do eixo
comum em conjunto com as aulas técnicas: agricultura, zootecnia e práticas agrícolas”. Trata-
se assim de uma possibilidade de trazer à luz dos conhecimentos científicos e direcionados
por uma adequada condução do docente a uma educação, ainda mais, popular e que beneficie
aqueles que se encontram em vulnerabilidade social, cultural e econômica.
Sousa e Machado (2018, p. 590), em seu estudo sobre como promover uma proposta
educativa com a juventude camponesa revelam um olhar diferenciado sobre a forma de se
estimular e estruturar a produção de conhecimentos por parte dos povos campesinos. Para
eles, é preciso atentar que o movimento de produção de conhecimentos dos sujeitos do
campo, não pode se limitar aos livros didáticos”. Concorda-se com Sousa e Machado (2018),
ao evidenciarem que não existem fórmulas prontas, mas que essas devem ser além dos livros
didáticos, mas dinâmica e viva, abarcando os diferentes contextos vivenciados por esses
povos.
Docentes que participaram desse estudo asseguram que a educação ofertada é pautada
em propostas que envolvam conteúdos práticos e que possam ser atrelados à natureza e à
vida: O trabalho é dentro da realidade, mas, com a preocupação de mostrar também algumas
coisas lá de fora, alguns materiais que são utilizados, a gente aproveita mais a realidade de
vida deles. A natureza em si é o nosso próprio laboratório (Sousa & Machado, 2018, p. 590).
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Esses autores também complementam a fundamental atuação do docente em atrelar os
saberes discutidos em sala de aula com a vida do estudante, de modo que o aprendizado seja
estimulado a ser praticado no cotidiano dele.
Em sua dissertação, a autora Santos (2020, p. 83) trouxe uma proposta de uma
“Sequência Didática Investigativa (SEI). O SEI buscou criar estratégias educacionais para
discutir sobre o território, “haja visto a importância histórica desta categoria geográfica para
os agricultores que lutam por uma Educação do/no Campo, também por terra, pelo direito de
continuarem a serem agricultores e de compartilharem seus modos e saberes de produção e
reprodução da vida”. Com isso, percebe-se que Santos (2020) visou trabalhar a questão
geográfica do território, tratando-se a monocultura do eucalipto como uma forma de discutir
sobre os conteúdos teóricos sobre a geografia, atrelando-se às peculiaridades da região.
Na dissertação de Oliveira (2020, p.121), é perceptível uma preocupação com os
saberes que devem ser aplicados à estruturação de caminhos de uma educação acessível aos
povos. A autora evidencia “que devem compor as práticas da escola do campo, de modo que
sejam englobados saberes da terra, saberes socioculturais e saberes da organização social.
Esses saberes perpassam pela história, o modo de vida, a forma de organização dos
povos e a sua atuação prática na terra, além dos seus respectivos valores culturais. Em
conformidade com o autor Cunha (2019, p. 165), é preciso dar voz aos povos campesinos para
que eles possam demonstrar suas potencialidades, pois “os intelectuais orgânicos, artistas-
devotos da terra, têm suas ações invisibilizadas e, muitas vezes, desconsideradas a partir da
falácia de que são saberes do senso comum e, portanto, sem relevância epistemológica”.
Concorda-se com Cunha (2019) no seu discurso, pois se acredita que a relevância
epistemológica é observada a partir da capacidade de atrelar essas vivências práticas aos
conteúdos vistos em sala de aula. Mais que isso, Silva Filho (2018, p. 172) observa nos seus
achados que, para os povos campesinos, “é de grande relevância haver outros espaços de
relação de poder que estejam mais equânimes e os educandos possam se expressar mais
livremente.
Esses novos espaços relevados por Silva Filho (2018) demonstram um interesse desses
povos em aproximar a aula da sua realidade, vivenciando situações o mais prático possível e
que ultrapassem os muros da escola.
Assim, verifica-se que experiências que agreguem valor aos povos campesinos
dependem do respeito às suas singularidades e ao seu contexto cultural, às formas de
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aprendizagem e aos mecanismos de envolvimento utilizados que possam facilitar a construção
de saberes por parte deles e esse conhecimento seja aplicado em sua realidade.
Considerações finais
Percebe-se que os povos do campo reconhecem o direito de acesso à educação como
uma oportunidade de fortalecer as lutas sociais vivenciadas por eles, sendo o acesso a esse
direito um encadeamento de demais direitos.
Para isso, os autores que foram elencados no aporte teórico demonstraram uma
preocupação em estabelecer estratégias e mecanismos de alcance desses povos,
desenvolvendo atividades fora da sala de aula, estimulando a prática com a vivência no
campo, considerando as discussões e questões culturais que envolvam e fortaleçam esses
povos.
Verificou-se que um dos caminhos pedagógicos mais citados foi a Pedagogia da
Alternância que é a subdivisão entre a prática acadêmica e a atuação no campo como
mecanismo de colocar em prática a aprendizagem. Para isso, as escolas precisarão aderir e
reconhecer nessa pedagogia uma relevante forma de acesso dos povos campesinos.
Pode-se visualizar que ainda uma reduzida quantidade de pesquisas científicas com
vistas a discutir as especificidades desses povos, por isso, é preciso fomentar a ampliação
dessas discussões como uma forma também de dar visibilidade às dificuldades desses povos
para acesso à educação.
Por fim, identificou-se que as questões culturais e do cotidiano dos povos campesinos
devem ser considerados na construção de conhecimento para que a aprendizagem seja mais
significativa e efetiva.
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Urbanocentrismo também está intrínseco à construção da colonialidade/modernidade, tendo em vista que o ideal
moderno e civilizatório para se constituir o homem moderno, estavam vinculados com os modos de vida
(cultura, comportamentos) e produção (capitalista-industrial) urbanos (Farias & Faleiro, 2020, p. 5).
Informações do Artigo / Article Information
Recebido em: 25/08/2022
Aprovado em: 21/04/2023
Publicado em: 19/07/2023
Received on Agust 25th, 2022
Accepted on April 21th, 2023
Published on July, 19th, 2023
Negromonte, R. F. M., & Silva, M. F. G. (2023). Povos Campesinos: caminhos para a democratização de acesso à educação...
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Negromonte, R. F. M., & Silva, M. F. G. (2023). Povos Campesinos: caminhos para a democratização de acesso à educação.
Rev. Bras. Educ. Camp., 8, e14765. http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.exxxxxx
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