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Revista Brasileira de Educação do Campo
Brazilian Journal of Rural Education
ARTIGO/ARTICLE/ARTÍCULO
DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e14836
O espaço da escola do campo ribeirinha na cidade de
Belém do Pará: direções das pesquisas acadêmicas em
educação
Jefferson Luis da Silva Cardoso1, Rosângela Araújo Darwich2
1 Universidade Federal Rural da Amazônia UFRA. Rodovia PA-451, Km-03, Bairro Açaizal. Tomé-Açu PA. Brasil.
2Universidade da Amazônia UNAMA.
Autor para correspondência/Author for correspondence: jefferson.cardoso@ufra.edu.br
RESUMO. O estudo aborda o espaço comunicante da educação
ribeirinha situada nas ilhas que compõe os limites geográficos
da cidade de Belém no Pará. O objetivo é analisar na produção
acadêmica dos programas de pós-graduação em educação de
duas instituições de ensino superior pública, o espaço
comunicante das escolas do campo ribeirinhas das ilhas de
Belém do Pará e sua contribuição à formação de professores. A
metodologia parte da abordagem qualitativa, da pesquisa
bibliográfica e descritiva na seleção do “espaço” como categoria
de estudo. A análise final é baseada na triangulação de métodos.
Como resultados apontam-se: o lugar da escola ribeirinha é
formador e difusor de culturas; o espaço das relações escolares
emana das comunidades; relações entre professores alunos e
comunidade evidenciam crenças, saberes e diversidades; a
formação permanente dos professores atrelada à vivência local;
necessidade de políticas públicas que resguardem o direito à
escola no espaço do campo; e, o espaço ribeirinho é visto como
ambiente de luta por educação pública no Brasil. Na conclusão é
oportuno afirmar que o espaço comunicante da escola ribeirinha
na Amazônia paraense carece de políticas públicas que
resguardem o direito das populações do campo de viver,
desenvolver e estudar no local em que habitam.
Palavras-chave: escola do campo ribeirinha, amazônia
paraense, formação de professores, espaço comunicante, lugar.
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The ribeirinha school countryside space in the city of
Belém in Pará: directions of academic research in
education
ABSTRACT. The study addresses the communicating space of
riverside education located on the islands that make up the
geographic limits of the city of Belém in Pará. The general
objective is to analyze in the academic production of the
postgraduate programs in education of two public higher
education institutions, the communicating space of the riverside
rural schools of the islands of Belém and their contribution to
the training of teachers. The methodology starts from the
qualitative approach, uses bibliographic and descriptive research
in the selection of “space” as a study category. The final
analysis is based on the triangulation of methods. As results, it is
pointed out: the place of the riverside school is a trainer and
diffuser of cultures; the space of school relations emanates from
the communities; relationships between teachers, students and
the community evidence beliefs, knowledge and diversities;
permanent training of teachers linked to local experience; there
is a need for public policies that protect the right to school in the
countryside; and, the riverside space is seen as an environment
of struggle for public education in Brazil. In conclusion, it is
opportune to state that the communicating space of the riverside
school in the Pará Amazon lacks public policies that protect the
right of rural populations to live, develop and study in the place
where they live.
Keywords: campo ribeirinha school, pará amazon, teacher
training, communicating space, place.
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El espaço da escola do campo ribeirinha en la ciudad de
Belém do Pará: rumbos de la investigación académica en
educación
RESUMEN. El estudio aborda el espacio comunicante de la
educación ribereña ubicado en las islas que componen los
límites geográficos de la ciudad de Belém en Pará. El objetivo
general es analizar en la producción académica de los programas
de posgrado en educación de dos instituciones de educación
superior públicas, el espacio comunicativo de las escuelas
rurales ribereñas de las islas de Belém y su aporte a la formación
de docentes. La metodología parte del enfoque cualitativo,
utiliza la investigación bibliográfica y descriptiva en la selección
del “espacio” como categoría de estudio. El análisis final se basa
en la triangulación de métodos. Como resultados se apunta: el
lugar de la escuela ribereña es formador y difusor de culturas; el
espacio de relaciones escolares emana de las comunidades; las
relaciones entre docentes, estudiantes y la comunidad
evidencian creencias, saberes y diversidades; formación
permanente de docentes vinculados a la experiencia local; se
necesitan políticas públicas que protejan el derecho a la escuela
en el campo; y, el espacio ribereño es visto como un ambiente
de lucha por la educación pública en Brasil. En conclusión, es
oportuno afirmar que el espacio comunicativo de la escuela
ribereña en la Amazonía paraense carece de políticas públicas
que protejan el derecho de las poblaciones rurales a vivir,
desarrollarse y estudiar en el lugar donde habitan.
Palabras clave: escola do campo ribeirinha, amazonia pará,
formación de profesores, espacio comunicante, lugar.
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Introdução
A educação institucionalizada na figura da escola, como indica as leis vigentes no
Brasil, evidenciam uma diversidade de vivências que demarcam os modos de vida e da
realidade local o lugar onde estão inseridas. Escolas urbanas, escolas rurais, escolas
comunitárias, escolas confessionais, escolas quilombolas, escolas indígenas, escolas de
assentamentos, escolas ribeirinhas e tantas outras, afirmam as oportunidades de
desenvolvimento educacional, de instrução e de formação de alunos e professores. O país,
tendo sua dimensão geográfica continental, revela, assim, cenários distintos dos modos de ser
e viver da população, sendo a educação uma de suas manifestações mais fortes e mais rica na
área social.
A Amazônia brasileira, por sua grandeza e diversidade, possui uma visibilidade
internacional, assim como sua espacialidade é coberta de sincretismo e múltiplas interações
entre, o homem com seus modos de desenvolvimento e produção, e a natureza com sua
riqueza autossustentável. E, nesse contexto, emergem a necessidade de comunicabilidade das
relações sociais aqui presentes, como o caso da escola do campo ribeirinha, o lugar em que
estão inseridas e o espaço que ocupam na sociedade brasileira, tornando-se objeto de pesquisa
do presente estudo (Callai, 2003; Carlos, 1996; Ferrara, 2007; Santos, 1996; Spósito, 2004).
É na produção do espaço social que as relações afetivas dos sujeitos dão materialidade
para o ambiente/lugar em que vivem, e que será resultado das experiências construídas ao
longo da vida. As comunidades ribeirinhas podem ser e são, facilmente, enquadradas nessa
reflexão, haja vista que os saberes e conhecimentos produzidos por elas são repassados de
geração para geração e permeiam todas as relações sociais ali presentes. A educação, como
fenômeno de evolução social, recebe as informações do espaço comunicante e expõe as
marcas culturais dos diversos povos que vivem das águas, florestas e matas da Amazônia
paraense, e exercem forte influência sobre o trabalho do professor nas escolas ribeirinhas
(Almeida, 2009; Arroyo, 1999; Costa, 2012; Gonçalves, 2012; Loureiro, 2001; Meireles
Filho, 2014; Pojo & Vilhena, 2016).
Assim, este estudo tem metodologia baseada na abordagem qualitativa, usa pesquisa
bibliográfica descritiva tendo o “lugar” como categoria de análise e faz reflexão final com
base na triangulação de métodos: leitura, confronto dos dados empíricos e as novas relações
com o fenômeno estudado. o objetivo geral é analisar na produção acadêmica dos
programas de pós-graduação em educação de duas instituições de ensino superior pública, o
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espaço comunicante das escolas do campo ribeirinhas das ilhas de Belém do Pará e sua
contribuição para de formação de professores. Ressalta-se que os programas foram escolhidos
por sua tradição e reconhecida contribuição na formação continuada de professores e, por
serem os programas que atuam na área da Educação em nível stricto sensu com Mestrado e
Doutorado, além de estarem presentes e ativos na Região Metropolitana de Belém que inclui
suas ilhas.
O artigo, para melhor sistematização, foi organizado em quatro seções, a primeira
introdução , traz o tema, problema e objetivo da pesquisa. A segunda seção
desenvolvimento , remete a uma revisão de literatura sobre as categorias espaço e lugar,
além da metodologia usada para construção do estudo. Já a terceira seção resultados e
discussões evidencia os achados principais da pesquisa. Por fim, as considerações finais que
apontam os caminhos das pesquisas sobre o tema e os possíveis horizontes do assunto aqui
tratado.
Desenvolvimento
O espaço da Escola do Campo Ribeirinha: o lugar do saber às margens dos rios
O processo de desenvolvimento das sociedades é marcado pela intervenção do homem
sobre a natureza, na medida em que organiza e muda os espaços geográficos para sua
sobrevivência e manutenção. É nesse caminho que as relações homem-natura-sociedade que
as marcas sociais vão se forjando e consolidando, no movimento do tempo que marca o
passado, o presente e indicam possíveis cenários futuros. A realidade vivida na construção
social dos espaços, a partir disso, demarca e firma as identidades do lugar.
Nessa discussão é importante perceber que,
Um lugar não é apenas um quadro de vida, mas um espaço vivido, isto é, de experiência
sempre renovada, o que permite ao mesmo tempo, a reavaliação das heranças e a indagação
sobre o presente e o futuro. A existência naquele espaço exerce um papel revelador sobre o
mundo (Santos, 2000, p. 114).
Callai (2003) indica que a relação homem-lugar é permeada pela questão das
identidades locais, na medida em que é pelo reconhecimento do espaço habitado que os
sujeitos interagem no movimento de trabalhar, produzir e reproduzir sua existência. Sob essa
análise, a autora ainda afirma que “a identidade de um lugar permite que as pessoas tenham
uma identificação com o mesmo, mas acima de tudo é necessário que cada sujeito construa
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sua identidade singular.” (Callai, 2003, p. 12), e que contribua também, com as marcas
socioculturais daquele ambiente que vive em constante mutação.
Ferrara (2007) afirma que é possível compreender o papel dos espaços comunicantes na
sociedade atual, na medida em que a dinâmica cultural dos diferentes lugares, assume
potencial da espacialidade, visibilidade e comunicabilidade, que anunciam e dialogam para
produzir verdadeiros territórios comunicantes - impressões que marcam, demarcam e contam
a história do lugar instituídos pelos sujeitos viventes. As questões levantadas pela autora são
oportunas para análise da realidade vivencial em qualquer temporalidade, haja vista a
complexidade dos processos de produção e reprodução histórica do próprio espaço, assim
como as comunidades ribeirinhas que se fazem presente na região norte do Brasil.
Sobre a produção e reprodução histórica do espaço, Carlos (1996, p. 20) diz que
... significa pensar a história particular (de cada lugar), se desenvolvendo, ou melhor, se
realizando em função de uma cultura/tradição/língua/hábitos que lhe são próprios,
construídos ao longo da história e o que vem de fora, isto é, que se vai construindo e se
impondo como conseqüência do processo de constituição mundial.
No avançar das investigações sobre os diferentes espaços, lugares e paisagens, Callai
(2003) compreende que fazer a leitura da diversidade de cenários, como resultado dessas
interações, permitirá o reconhecimento do que, de fato, existe na realidade observada no
sentido de sua compreensão. Para Ferrara (2007), essa percepção da realidade vazão à
constituição dos territórios do espaço comunicante mencionado, àquele que é consequência
da evolução histórica e cultural das sociedades. Desse modo, é importante levar em conta que
“a vida em sociedade supõe uma multiplicidade de funções e quanto maior o número destas,
maior a diversidade de formas e de atores.” (Santos, 1996, p. 65) e que permite múltiplos
olhares.
Na ideia de Callai (2003), cada lugar expressa ao seu tempo e modo, as características
que são inerentes àquele lugar e das interferências regionais, nacionais e internacionais que
eles assumem, no processo de evolução social. Spósito (2004, p. 115), sobre o estudo dos
espaços geográficos, aponta que “a casa, a rua, o ambiente de trabalho, os grupos de pessoas
circundantes e tudo aquilo que faz parte do cotidiano torna-se elemento referencial para
estudos dessa natureza” e que revelam as marcas individuais e afetivas das diversas
comunidades existentes no mundo.
A partir das breves reflexões sobre espaço e lugar, bem como sua contribuição na
compreensão da evolução histórica e cultural das sociedades, é oportuno discorrer sobre a
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posição que ocupa a escola do campo ribeirinha no cenário geográfico do estado do Pará e a
influência que exerce sobre o trabalho docente e a própria formação de professores a nível
local. Antes, vale a reflexão de Wagley (1957) sobre o termo “comunidade” que estão
presentes no território amazônico, ao afirmar que
Nas comunidades existem relações humanas de indivíduo para indivíduo, e nelas, todos os
dias, as pessoas estão sujeitas aos preceitos de sua cultura. É nas suas comunidades que os
habitantes de uma região ganham a vida, educam os filhos, levam uma vida familiar,
agrupam-se em associações, adoram seus deuses, têm suas superstições e seus tabus e são
movidos pelos valores e incentivos de suas determinadas culturas. Na comunidade, a
economia, a religião, a política e outros aspectos de uma cultura parecem interligados e
formam parte de um sistema geral de cultura, tal como o são na realidade (Wagley, 1957, p.
43-44).
Fica evidente nas andanças do autor pela Amazônia que a comunidade expressa as
marcas de um lugar, seja ela cultural, política, econômica, social e outras tantas que se são
entrelaçadas pela cotidianidade. Vale o destaque à transmissão dos saberes coletivos presentes
na comunidade e que estão presentes na expressão educam os filhos”, como fator de
perpetuação dos valores e costumes do lugar. Concordando com autores já mencionados neste
estudo, Chaves (2001, p. 78, grifo do autor) completa que “... a comunidade é composta por
um conjunto de relações/intercâmbios de produção e político-organizativa dos homens entre
si e com a natureza” questões determinantes para diferenciar as comunidades entre si.
A Amazônia brasileira é considerada, em termos de ocupação humana, como o
resultado do processo de colonização do país e que observa, entre os séculos XVII e XIX, o
surgimento das populações ribeirinhas, chamadas de cabloca em consequência dos
aldeamentos missionários e das vilas de colonos da região norte (Fernandes & Moser, 2021).
É necessário identificar o personagem ribeirinho da Amazônia Paraense. Entre as formas de
conceituação desses atores locais na literatura da área, concordamos com Gonçalves (2012, p.
154) ao indicar que:
O Caboclo ribeirinho é, sem dúvida, o mais característico personagem amazônico. Em suas
práticas estão presentes as culturas mais diversas que vêm dos mais diferentes povos
indígenas, do imigrante português, de imigrantes nordestinos e de populações negras.
Habitando as várzeas desenvolveu todo um saber na convivência com os rios e com a
floresta.
E que, a partir da visão dos atores que interagem com o ambiente em que vive, produz e
se desenvolve, é possível apontar que
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O termo ribeirinho, contudo, busca identificar um perfil sociocultural de grupos caboclos que
se estabeleceram às margens dos rios, num espaço dinâmico que articula as relações de
sociabilidade e culturais dentro das particularidades desse espaço, onde a marca dessa
configuração pode ser vista nos comportamentos, na maneira de viver, em sua alimentação,
nas crenças, em sua religiosidade etc., específicos daquele espaço (Rente Neto & Furtado,
2015, p. 160).
Nesta análise, a educação como manifestação social e sendo direito de todos os
cidadãos, assegurada no Brasil pela Constituição Federal de 1988, está inserida nas
comunidades ribeirinhas por meio da escola institucionalizada que recebe crianças e
adolescentes para participar de um processo educativo que, assim como os rios que se
entrelaçam com a floresta e as matas, é rica pela diversidade de saberes e conhecimentos que
tornam a relação escola-professor-aluno uma tríade espetacular para o desenvolvimento das
populações que vivem e se desenvolvem as margens dos grandes rios da Amazônia, inclusive
na cidade de Belém do Pará.
São crianças e adolescentes que participam ativamente dos modos produtivos de suas
comunidades, aprendem no dia a dia as habilidades necessárias para perpetuação de seus
costumes e crenças, tendo como primeiros educadores seus pais e avós (Almeida, 2009). Não
obstante, nas observações de Loureiro (2001) ao tempo que é preciso atender as demandas do
mundo ribeirinho, é oportuna a contribuição da cultura urbana a partir dos conhecimentos
trazidos para sala de aula pelos professores efetivamente formados nos grandes centros
urbanos. É nessa simbiose diária, entre os saberes científicos levados pelos docentes e os
saberes culturais perpetuados nas comunidades ribeirinhas, que o lugar da escola merece
destaque, que instaura um movimento de apropriação das crenças e valores locais para
indicar “novos” horizontes para formação de professores a nível local.
Assim, o município de Belém do Pará é composto por uma coletânea de 43 ilhas
(Meireles Filho, 2014), das quais, segundo os estudos de Pojo e Vilhena (2012, p. 3) “a oferta
educacional pela Secretaria Municipal de Belém está em oito (08) ilhas que estão sob a égide
das águas e dos modos culturais ribeirinho, abrangendo 14 Unidades Pedagógicas anexos de
escolas-sede” e que necessitam de profissionais da educação habilitados e capacitados para
atuar no cotidiano da educação do campo e ribeirinha.
Em estudo realizado por Cardoso e Marinho (2020) sobre as escolas ribeirinhas e a
formação de professores para atender à necessidade local, foi possível perceber que apesar das
grandes divergências observadas na formação de professores em cenário nacional, que está de
acordo com a LDB nº 9.394/1996 (nível superior), tendo sua práxis pedagógica voltada para a
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realidade das ilhas no sentido de valorizar as experiências e saberes resguardados. Contudo,
necessidade latente de fortalecimento das políticas públicas para Educação do Campo a
nível nacional. Os autores ainda destacam que “... a SEMEC Belém ainda consegue ofertar
o direito adquirido pelos sujeitos do campo à educação pública e assim, manter e fortalecer a
educação ribeirinha das ilhas da cidade” (Cardoso & Marinho, 2020, p. 135).
Essa educação exerce no território amazônico forte influência, haja vista valorizar de
forma marcante a constituição de novos conhecimentos, valores, saberes e práticas educativas,
que somados aos saberes científicos do professor, convergem para novos horizontes de
conhecimento sociopolítico e cultural, formadores do lugar em que vivemos. Para tanto,
“reconhecer que os processos educativos, ou melhor, que a educação básica tem que prestar
especial atenção às matrizes culturais do homem, da mulher, do povo do campo” (Arroyo &
Fernandes, 1999, p. 22), em virtude da expressão que esse espaço comunicante o campo
possui, sem deixar de lado a construção de conhecimentos científicos e os ensinamentos da
educação básica institucionalizada à que todos têm direito no Estado democrático brasileiro.
Espacialidades metodológicas
O estudo em questão segue a abordagem qualitativa na medida em que leva em
consideração as impressões pessoais, relações e experiências sociais que permitem reconhecer
as peculiaridades dos fenômenos estudados e assim, permite novas interpretações acerca das
influências subjetivas dos sujeitos sobre objetos de análise social (Minayo, 2006). Não
obstante, recorre-se à pesquisa descritiva como forma de descrever melhor as características,
atitudes e crenças (Gil, 2017) existentes na educação do campo ribeirinha.
Para melhor compreensão sobre o estudo do espaço da educação ribeirinha foi realizada
pesquisa bibliográfica no sentido de levantar publicações científicas, obras e outras pesquisas
já realizadas para analisar o que já foi produzido sobre o assunto em análise (Severino, 2013).
É possível nessa busca captar as diferentes perspectivas com que foi tratado o assunto no
sentido de avançar em outras questões relevantes para compreensão total dos fenômenos
sociais na área da educação.
No percurso metodológico, foi preciso caminhar pela pesquisa sobre o espaço
geográfico para reconhecer o lugar das relações sociais da escola ribeirinha, até porque,
... significa pensar a história particular (de cada lugar), se desenvolvendo, ou melhor, se
realizando em função de uma cultura/tradição/língua/hábitos que lhe são próprios,
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construídos ao longo da história e o que vem de fora, isto é, que se vai construindo e se
impondo como conseqüência do processo de constituição mundial (Carlos, 1996, p. 20).
Nesse caminho, Ferrara (2007) contribui com seus estudos sobre a construção do
“espaço comunicante” que são separados nas seguintes categorias: espacialidade,
comunicabilidade e visibilidade, que permitem o ver além das dimensões físicas do espaço
como construção cognitiva sendo percebidos pelas dimensões material e sensível.
Para a análise foi escolhida a concepção interpretativa ou triangulação de métodos,
que esta é a
combinação e cruzamento de múltiplos pontos de vista” e que visa a compreensão do
“contexto, da história, das relações, das representações ... visão de vários informantes e o
emprego de uma variedade de técnicas de coleta de dados que acompanha o trabalho de
investigação (Minayo, 2005, p. 28-29).
Assim, no sentido de perceber melhor as indicações da realidade vivida e parte do
seguinte desenho esquemático:
Figura 1 - Triangulação de Métodos.
Fonte: elaborado pelos autores, 2022.
Discussão dos Resultados
A Escola do Campo Ribeirinha na produção acadêmica da UFPA e da UEPA: reflexões
sobre espaço comunicante do trabalho docente na Amazônia Paraense
Para compreender melhor os caminhos trilhados pelos pesquisadores no território do
Estado do Pará, foi realizado um levantamento nos Programas de Pós-graduação em
Educação das duas Universidades de referência na cidade de Belém do Pará. Assim, foi
analisada a produção da Universidade do Estado do Pará (UEPA)e da Universidade Federal
do Pará (UFPA). A primeira, formou quatorze turmas em nível de mestrado e possui uma
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turma em curso de doutorado; a segunda, possui o mestrado com dezesseis turmas
formadas e doutorado com dez turmas já formadas.
Como estratégia de investigação, optou-se por levantar as dissertações da UEPA que
o doutorado é recente, e as teses da UFPA pelo doutorado consolidado, de forma que se
consiga um mapa da contribuição das duas instituições. Assim, após a seleção das categorias
de análise, foi pesquisado junto às produções científicas dos programas, as duas categorias-
chave: educação do campo e educação ribeirinha. Desse modo, foram encontradas 08 (oito)
dissertações na UEPA e 12 (doze) teses na UFPA, o que perfaz um total de 20 (vinte)
produções vistoriadas. Após a leitura do resumo, do objetivo e das palavras-chave, foram
escolhidas 10 (dez) produções, que tiveram maior aderência às categorias analisadas neste
estudo, como mostra o quadro a seguir.
Quadro 1 Sistematização das produções locais, em nível de mestrado e doutorado.
IES
AUTOR/ANO
TÍTULO
PALAVRAS-CHAVE
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO
PARÁ
G. C.
Cavalcante
(2011)
Fronteiras entre Campo e Cidade: Saberes e
práticas educativas no cotidiano de uma escola
nucleada em Rio Maria/PA.
Educação na Amazônia.
Saberes Culturais. Práticas
Educativas, Escola Nucleada.
Interação campo-cidade.
E. M. Costa
(2012)
A Formação do Educador do Campo: um estudo a
partir do PROCAMPO.
Formação Docente. Educação
do Campo. Políticas Públicas.
R. C. Pereira
(2016)
Saberes culturais e prática docente no contexto da
escola ribeirinha
Educação do Campo. Saberes
culturais. Prática docente.
Escolas Ribeirinhas.
S. M. R. Aleixo
(2017)
Saberes e processos educativos em experiências
de trabalho no contexto rural - ribeirinho
amazônico
Comunidades rural-
ribeirinhas; Trabalho; Saberes;
Processos educativos.
L. C. A.
Quaresma
(2018)
Saberes docentes e a prática pedagógica na
educação infantil ribeirinha em Belém/PA.
Educação do Campo.
Educação Infantil. Prática
Pedagógica. Saberes Docentes.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
H. S. A. Silva
(2017)
Política de formação de educadores do campo e a
construção da contra-hegemonia via
epistemologia da práxis: análise da experiência da
LEDOC-UFPA-Cametá
Política de Formação de
professores. Educação do
Campo. Educação na
Amazônia Tocantina.
Epistemologia da Práxis.
Licenciatura em Educação do
Campo.
M. E. O.
Vasconcelos
(2017)
Educação do Campo no Amazonas: História e
diálogos com as territorialidades das águas, das
terras e das florestas
Educação do Campo. História
da Educação. Movimentos
Sociais. Educação Popular.
Territorialidades.
N. L. Lima
(2017)
Questões epistêmico-historiográficas sobre a
educação do campo no Brasil
Educação do Campo.
Epistemologia. História.
Currículo.
M. D. S. Silva
(2019)
Práticas educativas populares na Licenciatura em
Educação do Campo, no território da Amazônia
Tocantina
Formação de Educadores.
Educação do Campo. Prática
Educativa Popular.
Movimentos Sociais.
D. V. S. Souza
(2020)
Formação de educadoras ribeirinhas no curso
pedagogia das águas: Análise das experiências de
Formação de educadoras.
Ribeirinhas. Educação do
Cardoso, J. L. S., & Darwich, R. A. (2023). O espaço da escola do campo ribeirinha na cidade de Belém do Pará: direções das pesquisas acadêmicas em educação...
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vida e suas contribuições nas práticas educativas
na escola do assentamento São João Batista no
Rio Campompema em Abaetetuba-Pará.
Campo. Experiências de vida.
Práticas Educativas.
Fonte: elaborado pelo autor (2022).
As análises das produções seguiram as percepções gerais sobre a contribuição do espaço
comunicante da escola do campo ribeirinha presentes na Amazônia paraense e sua influência,
na vida e trabalho, de professores e alunos das comunidades investigadas. Nesse processo,
buscam-se as fronteiras dos conhecimentos trilhados, das manifestações dos saberes e
práticas locais, das crenças e valores do lugar que demarcar o espaço geográfico das escolas
às margens dos rios da região Norte, ricas em diversidade e repletas de desafios aos
governantes do Brasil. Para tanto, seguem as reflexões sobre os estudos publicados pelas
entidades investigadas.
Na pesquisa de Cavalcante (2011) o objetivo geral consistiu em mapear os saberes
culturais e sua relação com as práticas educativas. O estudo busca perceber como as relações
entre os sujeitos do campo e da cidade são forjadas em escolas nucleadas, para construção das
identidades e aprendizagens de seus alunos. Os resultados indicam que o projeto político
pedagógico não expressa a diversidade dos contextos que compõem as escolas, bem como
revela “fronteiras simbólicas” entre encontros e desencontros, relegando a escola do campo a
um espaço separado e não privilegiado como o caso das escolas da cidade.
A autora ainda deixa registrado que “Apesar de acolher um quantitativo considerável de
alunos/as do campo, a escola se mostra efetivamente urbana, não por estar localizada na
cidade, mas por suas práticas educativas e porque seu currículo privilegiam a realidade urbana
em sua cultura escolar (Cavalcante, 2011, p. 151).
O estudo de Costa (2012) aborda a questão do processo de oferta da Licenciatura do
Campo promovido pelo Instituto Federal do Pará (IFPA) por meio do Programa de Apoio à
Formação Superior em Licenciatura do Campo (Procampo), e teve como objetivo analisar
como se deu o processo formativo de educadores e educadoras do campo. Aponta nos
resultados que o curso possui limites e dificuldades gerais em termos pedagógicos e
estruturais, o que compromete a qualidade da formação do professor do campo, contudo a
oferta do curso revela uma “vontade” de reconhecer a importância dos sujeitos do campo na
educação nacional. Assim como o primeiro trabalho analisado, aponta para a necessidade da
escola do campo possuir representatividade mais forte para que se ultrapasse a visão
urbanocêntrica do currículo que apresentam.
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No fim, a autora ressalta que
... a formação específica defendida pelo Movimento de Educação do Campo passa a ganhar
espaço no âmbito acadêmico, inicialmente com o curso de Pedagogia da Terra, que
subsídio teórico para a aprovação do curso de LPEC implementado pelo MEC por meio do
Procampo, em 2006. Com a licenciatura em estudo, analisamos que a formação específica
pode ser compreendida como estratégia a fim de corrigir distorções históricas, mas, também
é possibilidade de formar o educador comprometido com as matrizes históricas, sociais e
culturais do campo (Costa, 2012, p. 172).
A investigação de Pereira (2016), em particular, nos aproxima ainda mais do objeto de
estudo, na medida em que traz como objetivo geral contribuir com a educação no território
amazônico, em particular nas comunidades ribeirinhas focando nos saberes culturais e sua
contribuição com a prática educativa. Como resultados, o autor aponta que os saberes
culturais movimentam os grupos que vivem às margens dos rios. No entanto, no âmbito da
prática docente estes são inseridos de forma “superficial e assistemática”, dando ênfase dessa
forma, aos saberes escolarizados-científicos. Um ponto importante na pesquisa é que os
professores são formados pelo curso de “Pedagogia das Águas” e que sua prática é
diferenciada por conta dessa formação inicial, contribuindo de fato, para educação do campo
ribeirinha. Porém, nos apontamentos finais o autor enfatiza que os professores:
... foram formados para atender a realidade rural ribeirinha local quanto ao emprego do que é
produzido cotidianamente por esses sujeitos na prática educativa escolar ... prática que ainda
está desarticulada da realidade dos educandos, na medida em que na análise que fiz dos
conteúdos do material didático (cadernos) dos alunos, aspectos do universo cultural
ribeirinho do lugar são pouco ressaltados (Pereira, 2012, p. 166).
As análises de Aleixo (2017) apontam questões do processo educativo em comunidades
rural-ribeirinha, sentido de reconhecer e mapear os saberes e os processos educativos que
se formam na Amazônia paraense. Como resultados encontrados, a autora aponta para os
saberes constitutivos no âmbito das relações e trabalho pelas trocas de experiências dos mais
velhos aos mais jovens, mas também de pessoa à pessoa. Assim, nos dizeres da autora,
A forma de compreensão dos processos educativos aqui evidenciados não coloca em campos
distintos os processos educativos como meios de circulação de saberes de um lado e o
processo educativo compreendido como fruto de acoplamento do outro lado. Mas, os integra
como forma de entendimento da complexa maneira com que as pessoas aprenderam a
desenvolver suas experiências de trabalho (Aleixo, 2017, p. 167).
A literatura produzida por Quaresma (2018) verifica a questão dos saberes docentes
em destaque na educação infantil no contexto da escola ribeirinha, sua prática pedagógica,
estratégias de ensino e aprendizagem e sua inter-relação com os saberes das comunidades em
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que trabalham. Como resultados, a pesquisa aponta para os saberes da experiência que
movem a prática do professor das ilhas. Também nos direciona a questões mais séria da
educação do campo, como a falta de valorização dos professores locais, fragilidades na
formação do professor que atenda às necessidades das comunidade do campo, políticas mais
efetivos no âmbito das escolares na região insular de Belém.
Dante desse cenário, a autora ainda completa,
Isso tudo exige um olhar diferenciado das políticas educacionais para as escolas localizadas
em regiões ribeirinhas, além de propostas de formação docente que contribuam para a
formação inicial e continuada desses profissionais, ressaltando-se que estas devem estar
articuladas aos saberes docentes, visando um atendimento educacional de qualidade, uma
vez que os professores são protagonistas de todo o processo, porque são articuladores de
saberes, autores de sua própria prática pedagógica (Quaresma, 2018, p. 117).
A tese de Silva (2017) investigada a questão da oferta da Licenciatura do Campo
ofertada pela UFPA, Campus Cametá (Pará), no sentido de analisar por meio da política de
formação de educadores do campo, a reflexão sobre os princípios contra-hegemônicos, uma
vez que o curso é focado na realidade local. Os resultados apontaram que o curso, àquela
época, estava em processo de consolidação, revelando verdadeiras tensões haja vista seu
caráter de formação está intimamente vinculado à questão da Educação do Campo. Destacam-
se a prática interdisciplinar, formações específicas, afirmação da identidade docente do campo
e a alternância pedagógica.
Nessa caminhada de lutas e resistências por uma educação justa, a autora confirma que
o curso de Licenciatura em Educação do Campo,
... se apresenta como uma ação contra-hegemônica ao assegurar os princípios da educação do
campo vem contribuindo para a formação crítico-emancipadora dos sujeitos e afirmando a
epistemologia da práxis como referencial centrado nas lutas sociais, políticas, econômicas,
culturais e educacionais como caminho para a transformação e emancipação humana (Silva,
2017, p. 263).
A produção de Vasconcelos (2017) problematiza o “asssistencialismo” a que foi
relegada a Educação do Campo no Brasil, contudo a partir da década de 1990 com a
intensificação dos movimentos sociais de luta por uma educação de qualidade, a modalidade
de ensino recebeu o reforço das políticas públicas no cenário nacional. A tese teve como
objetivo analisar a construção histórica da Educação do Campo no Estado do Amazonas sob a
perspectiva dos sujeitos do campo em sua diversidade sociocultural e as territorialidades das
águas, terras e florestas que representam. Destacam-se nos resultados a articulação dos
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movimentos sociais e organizações populares, o movimento ribeirinho do Amazonas até as
instituições de educação, como a Universidade Federal do Amazonas, na busca pelo direito de
estudar e aprender nas comunidades do campo, que se encontra em construção, debate e
movimento.
Para além, a autora afirma que esta luta é importante:
Definir-se como ribeirinho, extrativista, agricultor familiar, assentado, quilombola nos
remete a uma noção de identidade que se articula às territorialidades específicas, à
diversidade do mundo do trabalho dos povos do campo e ao movimento social, que é político
e educativo ... valorizar os saberes ribeirinhos que estão enraizados nas territorialidades das
águas, das terras e das florestas, e nas experiências cotidianas de vida e de trabalho em
movimento com os saberes das florestas, com os saberes tradicionais, com os saberes da
educação popular e com os saberes da resistência coletiva (Vasconcelos, 2017, p. 249-251).
a inquirição de Lima (2017) visou levantar quais foram as abordagens de pesquisa
bem como as epistemologias que estão presentes em Educação do Campo, e para isso,
investigou as teses defendidas pelos programas de pós-graduação em educação que estão no
banco de teses da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), e
no Banco Digital Brasileiro de Teses e Dissertações (BDTD). Destaca-se o resultado
encontrado que aponta a Educação do Campo como área não contemplada pelo Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), sendo investigado a partir de
muitas temáticas, a exemplo dos tempos históricos e dos espaços geográficos.
No fim, o autor evidencia que:
Os conhecimentos produzidos nas investigações sobre escola, educação, formação, formação
docente, trabalho pedagógico, prática docente, pedagogia da alternância, identidade e
cultura; após análise crítica, deixou claro que a educação do campo é um campo em disputa;
envolvido em uma complexa teia de interesses políticos, sociais, econômicos, ideológicos
cuja construção segue em curso em uma tensa relação de forças; de reconhecida conquistas,
resistências, mas também de negociações, cedência (Lima, 2017, p. 145).
O trabalho de Silva (2019) aborda novamente, a questão da Licenciatura em Educação
do Campo oferecido pela UFPA no Campus Cametá, relacionando o curso às práticas
educativas populares exercidas nas organizações, associações, movimentos sociais e sindicais
na busca pela formação e transformação social dos sujeitos do campo. Os resultados dessa
caminhada são interessantes pois apontam para questão territorial que vive em conflitos e
resistências na atuação dos professores, o curso atende as demandas sociais do povo do
campo e contribuem para as práticas educativas de maneira singular.
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Como contribuição para os estudos da formação de professores do Educação do Campo,
é necessário:
Promover a formação de sujeitos que possam contribuir para o desenvolvimento de um
território com base na produção da vida econômica, cultural e social é um dos grandes
desafios do Curso de Licenciatura em Educação do Campo. Para tanto, o compromisso social
deve ser estimulado na formação dos educadores para que possam contribuir com o processo
de organização, mobilização e reivindicação de políticas públicas que melhorem a vida da
população (Silva, 2019, p. 206).
Por fim, a tese de Souza (2020) buscou mostrar as experiências e vivências de
educadoras ribeirinhas egressas do curso de Pedagogia das Águas ofertado pela UFPA -
Campus Abaetetuba, no estado do Pará, como resultado do Programa Nacional de Educação
na Reforma Agrária (PRONERA), no sentido de perceber como as práticas educativas
contribuíram para escola de um assentamento no interior do referido estado. A tese traz
resultados significativos para a construção da profissionalização docente do campo, na
medida em que as “memórias das educadoras” são importantes para (re)significar o vivido e
fortalecer a identidade ribeirinha reforçada pelo curso de Pedagogia das Águas.
A experiência da autora na comunidade pontua que:
Nas falas das educadoras ribeirinhas verificou-se a avaliação positiva quanto a realização do
Curso Pedagogia das Águas no que tange a uma proposta específica aos povos do campo,
aos ribeirinhos, enfatizando que houve preocupação e aprendizagem da própria universidade
que se oportunizou dialogar e aproximar-se com/dos movimentos sociais, pensar uma outra
dinâmica de organização para recebimento dos, à época, discentes ribeirinhos, provocar
docentes sem nenhuma identidade com o campo a também repensarem suas práticas ...
(Souza, 2020, p. 174).
É possível perceber nas produções selecionadas um universo bem diversificado acerca
dos espaços comunicantes da escola do campo ribeirinha. É importante destacar que os
estudos realizados em municípios fora da capital do Estado, tem experiência com a
formação de professores específica, a exemplo da Licenciatura em Educação do Campo em
Cametá e Abaetetuba, que também contou com o curso Pedagogia das Águas. Para além
dessas vivências pontuais, os estudos sintetizam a questão da prática pedagógica dos
professores atrelada à experiência nos espaços da escola do campo ribeirinha. Mas, também,
questionam os agentes públicos sobre o urbanocentrismo ainda percebido no currículo escolar
e a falta de uma formação mais sólida em termos teórico-metodológicos para o trabalho,
como professor nas áreas rurais.
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Considerações finais
A reflexão sobre os diferentes lugares e sua influência para formação de professores da
educação do campo, em especial no contexto ribeirinho, é oportuna para evidenciar que a
práxis pedagógica é imbricada no processo de elaboração, sistematização e efetivação de
ações que promovam uma educação de qualidade no contexto brasileiro (Arroyo, 2007). Fato
este que converge para a compreensão de que seja fundamental a discussão constante sobre as
ações governamentais no sentido da formação docente do país, especialmente para este
estudo, voltadas à educação do campo e ribeirinha amazônica na cidade de Belém do Pará,
haja vista sua importância e valor para o cenário nacional.
Como resultados mais expressivos, a partir da análise dos estudos produzidos sobre
formação de professores e o espaço ribeirinho, foi possível perceber que o lugar da escola
ribeirinha é um ambiente formador e difusor de culturas, tanto dos professores quanto de seus
alunos; o espaço das relações escolares ultrapassam os limites físicos das comunidades
locais; as relações entre professores, alunos e comunidade são atravessadas por crenças,
saberes e as diversidades presentes em cada margem de rios; a formação permanente dos
professores é atrelada à vivência local dos alunos como forma de aproximação da realidade
vivida; necessidade de políticas públicas que resguardem o direito à escola no espaço do
campo, inclusive as ribeirinhas; e, por fim, o espaço comunicante ribeirinho é visto, também,
como ambiente de luta por educação pública no Brasil.
Na conclusão, é oportuno afirmar que o espaço comunicante da escola ribeirinha na
Amazônia paraense se configura como inscrição geográfica singular no Brasil e, carente de
políticas públicas mais efetivas que resguardem o direito das populações do campo de viver,
desenvolver e estudar no local em que habitam. Desse modo, o presente estudo contribui
sobremaneira para novos horizontes que investigam o espaço, o lugar e a importância da
escola do campo ribeirinha para os povos tradicionais, que pelo processo de ensino e
aprendizagem e as relações com o espaço comunicante retratadas nas produções acadêmicas
em nível stricto sensu selecionadas , é possível resguardar a cultura, identidade e os saberes
locais com base em estudos que valorizem as relações geográficas das diversas comunidades
que compõem o Brasil.
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Informações do Artigo / Article Information
Recebido em: 02/09/2022
Aprovado em: 26/08/2023
Publicado em: 21/10/2023
Received on September 26th, 2022
Accepted on August 26th, 2023
Published on October, 21th, 2023
Contribuições no Artigo: Os(as) autores(as) foram os(as) responsáveis por todas as etapas e resultados da pesquisa, a
saber: elaboração, análise e interpretação dos dados; escrita e revisão do conteúdo do manuscrito e; aprovão da versão
final publicada.
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production of the manuscript, critical revision of the content and approval of the final version published.
Conflitos de Interesse: Os(as) autores(as) declararam não haver nenhum conflito de interesse referente a este artigo.
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pesquisas acadêmicas em educação. Rev. Bras. Educ. Camp., Tocantinópolis, v. 8, e14836, 2022.
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