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Em diferentes momentos, o interesse de conteúdos e temáticas levantados pela
pesquisa na comunidade, e os conteúdos elencados na BNCC e exigidos para e pela escola,
eram motivo de choques e contradições de interesse nas reuniões de planejamento coletivo
dos residentes, preceptores e docente orientadora; e a solução encontrada foi abarcar os
interesses coletivos e da gestão municipal na construção do conjunto de conteúdo a ser
ensinado. Como se observa no relato do residente bolsista:
No começo foi um problema, a gente trazia a visão de totalidade de conteúdo a ser
trabalhado na matemática, química, ciências biológicas e educação do campo, a preceptora
dizia que tinha que trabalhar as competências da BNCC como estava lá, pois tinham
formação disso no município e havia um padrão de planejamento, e aí, o inventário que
trazia o que a comunidade queria, que exigia conteúdos que a base não trazia... Foi difícil,
tivemos que trabalhar com os da base, e ainda com os elementos e conteúdos
complementares para atender a comunidade, um trabalho enorme.... E nos perguntamos, e
quando as crianças vão aprender esses outros conteúdos que a base cortou? Quem vai
ensinar, se os professores não terão apoio e nem exigência para repassar? (Nunes, 2020, p.
44)
Também pode ser entendido como um movimento intenso de afirmação do
desenvolvimento das habilidades dos estudantes para o sistema produtivo e para as
necessidades do mercado, com uma atualização constante das exigências do momento em
relação ao currículo e aos conteúdos requeridos. Assim:
Não há, portanto, uma preocupação com a formação integral dos indivíduos, sendo ofertado
apenas o domínio de algumas competências próprias ao atendimento rápido das necessidades
do mercado de trabalho e da reprodução capitalista. É incutido à sociedade, e especialmente
a juventude, que os conhecimentos são passageiros, e provisórios e que a prioridade deve
estar na atualização constante, e no atendimento de situações técnicas de rápida absorção e
realização. (Zank & Malanchen, 2016, p. 146).
Estas exigências foram objeto de constante discussão e insatisfação durante as rodas
de conversa e planejamento do trabalho com residentes, preceptores, professores das escolas e
docente orientadora; pois o currículo dos municípios estava passando por adaptações à
BNCC, e muitos professores em suas falas referenciavam mais uma mudança feita de maneira
adaptativa, sem muito preparo e compreensão profunda da proposta. Em relação aos
princípios políticos e filosóficos da educação do campo, que estão entrelaçados nas
necessidades de trabalho e bem-estar da comunidade camponesa, a BNCC relega a um plano
secundário a diversidade e especificidade dessa modalidade em sua constituição, pois o
currículo neste caso fica com a parte "diversificada" reduzida e, na maioria das vezes, sem
condições de efetivação frente às exigências em exames e avaliações externas.