Revista Brasileira de Educação do Campo
The Brazilian Scientific Journal of Rural Education
ARTIGO/ARTICLE/ARTÍCULO
DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.v4e3297
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e3297
10.20873/uft.rbec.v4e3297
2019
ISSN: 2525-4863
1
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Concepções dos estudantes de uma escola do campo sobre
tecnologia
Crisna Daniela Krause Bierhalz
1
,
Eril Medeiros da Fonseca
2
, Izalina Oliva
3
1,
2,
3
Universidade Federal do Pampa - UNIPAMPA. Campus Dom Pedrito. Avenida 21 de Abril, 80. Dom Pedrito - RS. Brasil.
Autor para correspondência/Author for correspondence: crisnabierhalz@unipampa.edu.br
RESUMO. Este trabalho é resultado de uma pesquisa
desenvolvida na Especialização em Práticas Educativas na
Universidade Federal do Pampa - campus Dom Pedrito. Teve
como propósito analisar a concepção dos alunos de uma escola
do campo em relação à tecnologia, bem como verificar questões
relacionadas ao acesso e a sua utilização. É uma pesquisa de
campo, qualitativa e explicativa, desenvolvida com 23 alunos de
e anos de uma escola pública nucleada, situada em um
município do Rio Grande do Sul. Os instrumentos investigativos
foram: questionário e desenhos. Pela análise dos questionários
constatou-se que as tecnologias mais utilizadas são: dio,
televisão e telefone celular. A maioria dos discentes possui
acesso à internet pelo celular, utilizando para acessar as redes
sociais. Com base nos desenhos, constatou-se que a tecnologia
para os referidos alunos relaciona-se a equipamentos que
facilitam a vida cotidiana, tais como: tratores, pulverizadores e
maquinários de irrigação. Conclui-se que a tecnologia deve ser
uma das discussões do projeto político pedagógico de cada
escola, envolvendo todos os autores e pautada na concepção de
Educação do Campo como prática social.
Palavras-chave: Educação do Campo, Escola do Campo,
Tecnologia.
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Conceptions of students of a school of the countryside on
technology
ABSTRACT. This work is the result of a research developed in
the Specialization in Educational Practices at the Federal
University of Pampa - Campus Dom Pedrito. Its purpose was to
analyze the conception of the students of a rural school in
relation to the technology, as well as to verify questions related
to the access and the use. It is a qualitative and explicative field
research, developed with 23 students from 7th and 8th years of a
nucleated public school, located in a municipality of Rio Grande
do Sul. The investigative instruments were: questionnaire and
drawings. By the analysis of the questionnaires it was verified
that the most used technologies are: radio, television and cellular
phone. Most of the students have access to the internet through
the cell phone, using it to access social networks. Based on the
drawings, it was verified that the technology for the referred
students, relates to equipments that facilitate the daily life, such
as: tractors, pulverizadores and machinery of irrigation. It is
concluded that technology should be one of the discussions of
the political pedagogical project of each school, involving all the
authors and based on the conception of education of the
countryside as social practice.
Keywords: Rural Education, School of the Countryside,
Technology.
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Concepciones de los estudiantes de una escuela del campo
a cerca de la tecnología
RESUMEN. Este trabajo es resultado de la investigación
llevada en la especialización en las prácticas educativas en la
Universidad Federal de Pampa - campus Dom Pedrito. El
objetivo fue analizar el diseño de los alumnos de la escuela del
campo en relación con la tecnología y verificar las cuestiones
relacionadas con el acceso y uso. Se trata de una investigación
de campo, cualitativo y explicativo, elaborado con 23 alumnos
de 7º ygrado de la escuela pública nucleada, que se encuentra
en una ciudad en Rio Grande do Sul. Los instrumentos de
investigación fueron: cuestionario y diseños. Por el análisis de
los cuestionarios se encontró que las tecnologías más utilizadas
son: la radio, la televisión y el teléfono móvil. La mayoría de los
estudiantes tienen acceso a Internet a través del teléfono móvil
usando para acceder a redes sociales. Sobre los dibujos, se
encontró que la tecnología para los estudiantes, se refiere a
dispositivos que facilitan la vida cotidiana, tales como tractores,
pulverizadores y máquinas de riego. Se concluye que la
tecnología debe ser una discusión del proyecto político
pedagógico de cada escuela, la participación de todos los autores
y guiando la educación rural como una práctica social.
Palabras clave: Educación Rural, Escuela de Campo,
Tecnología.
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Introdução
A produção de conhecimento é uma
atividade humana sócio-historicamente,
que perpassa todos os espaços (Delizoicov,
Angotti & Pernambuco, 2011), tanto na
cidade como no campo, determinando a
problematização da realidade e a percepção
enquanto sujeitos deste processo. Portanto,
os conhecimentos existentes e os novos se
integram, permeados pelas formas de
comunicação e interação entre as pessoas.
Entre as diferentes formas de
comunicação e interação, destaca-se o
papel das Tecnologias da Informação e
Comunicação (TIC), que se renovam de
forma rápida, integram o rádio, a televisão,
os aparelhos telefônicos, chegando aos
computadores e às possibilidades ofertadas
pela internet, tais como videoconferência,
webconferência, ambientes virtuais de
aprendizagem, redes sociais, entre outros.
Pode-se dizer que as TIC são
constituídas pela fusão de três vertentes: a
informática, as telecomunicações e as
mídias eletrônicas. Ao longo do século XX
mudaram o cotidiano das pessoas, a
exemplo dos modos de acesso ao
conhecimento que passaram a ser quase
exclusivos em sítios de pesquisa e as
formas de relacionamento e comunicação,
na qual ganharam destaque as redes
sociais. (Belloni, 2005).
Percebe-se que as TIC estão sendo
utilizadas em larga escala por vários
setores da sociedade, como, por exemplo,
nas indústrias, comércios, bancos e
também nas escolas, com o objetivo de
automatizar e acelerar os processos do
trabalho diário e aos poucos integram os
processos de aprendizagem, através da
utilização de blogs de ensino, sítios para
pesquisas, entre outros. Além dos setores
da sociedade, também modificaram a vida
diária das pessoas, especialmente entre os
jovens que as consideram indispensáveis
no seu cotidiano.
É necessário refletir sobre o impacto
dessas tecnologias na sociedade de forma
geral e principalmente nas escolas do
campo. Para Munarin (2014, p. 62), “um
cuidado necessário é observar que as
tecnologias digitais, tidas como sinônimo
de avanço e de modernidade, não
prometem criatividade e inovação, mas
reproduzem também estruturas de poder
conhecidas, culturas e modos de pensar o
social”.
Para Williams (2011) existe uma
visão bucólica do “campo” que se opõe à
“cidade”, o campo compreendido como
lugar do atraso, da pobreza, da ignorância e
da limitação; em contrapartida à “cidade”
associou-se a ideia de centro de
realizações, do moderno. Partindo dessa
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concepção, as tecnologias digitais chegam
às escolas, muitas vezes, vistas como
poderosas ferramentas formadoras e
capacitadoras de sujeitos que tenderão, um
dia, a se mudar para a cidade em busca de
trabalho para, sim, se tornarem
efetivamente cidadãos. Poderão ser
compreendidas por alguns como
salvadoras das escolas do campo, mas
também percebidas na concepção de atraso
(Munarin, 2014).
Diante do exposto, percebe-se a
necessidade de investigar como os jovens
do campo, compreendem esse avanço
tecnológico, de que forma a tecnologia
aproxima a prática educativa e o contexto
do campo, valorizando suas singularidades,
pois a Educação do Campo configura-se
como uma luta social dos trabalhadores do
campo pela educação (Caldart, 2012).
Este artigo apresenta um recorte da
pesquisa que analisa as concepções de
tecnologia dos alunos de uma escola do
campo de um município da região da
Campanha do Rio Grande do Sul. Foi
desenvolvida no primeiro semestre de 2016
por um grupo de pesquisa vinculado ao
Curso de Licenciatura em Ciências da
Natureza e a Especialização em Práticas
Educativas em Ciências da Natureza e
Matemática, da Universidade Federal do
Pampa (Unipampa) Campus Dom
Pedrito.
Teve como objetivo analisar a
concepção dos alunos de uma escola do
campo sobre a relação existente entre a
tecnologia e o campo, bem como verificar
questões relacionadas ao acesso e à
utilização dessas tecnologias pelos
mesmos.
Foi utilizada para abordar a temática
em questão uma pesquisa de caráter
qualitativo, definida por Moreira como
uma “interpretação dos significados
atribuídos pelos sujeitos à suas ações em
uma realidade socialmente construída,
através de observação participativa, isto é,
o pesquisador fica imerso no fenômeno de
interesse” (Moreira, 2011, p. 76).
Constituem-se como sujeitos de
pesquisa 23 alunos do e anos de uma
escola do campo, pública e nucleada,
identificados neste texto com o nome de
flores. Salienta-se que o percentual de
alunos investigados corresponde a
aproximadamente 29%, pois a escola tinha
80 alunos matriculados em 2016. Foram
aplicados dois instrumentos de coleta de
dados: um questionário com dez questões
objetivas e subjetivas a fim de
compreender o entendimento dos alunos
acerca da tecnologia e realizar um
levantamento sobre o acesso às
tecnologias, e a técnica de desenho a partir
da temática “tecnologia para mim é…”,
com a finalidade de investigar as
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concepções de tecnologia a partir da
representação gráfica.
Educação do Campo e tecnologia
Antes de aprofundarmos a discussão
sobre tecnologias na escola do campo,
torna-se relevante diferenciar os conceitos
de Educação Rural e Educação do Campo,
que são concepções distintas. A
Educação Rural é definida como a que se
apresenta dentro dos interesses
capitalistas e do agronegócio, em que
o campo/território apenas como
um espaço de exploração e lucro,
através da monocultura, onde os
trabalhadores do campo passam a
plantar e a cultivar tão somente para
os fins da exportação, e não para
subsistência da sua família (Oliveira,
2013, p. 50).
Enquadra-se nessa concepção o
município lócus desta pesquisa, pois de
acordo com o IBGE
i
(2016), caracteriza-se
como o quarto município em extensão do
Estado do Rio Grande do Sul, com
aproximadamente 5200 km², economia
baseada na agricultura e pecuária
extensiva, monocultura, com prevalência
de grandes propriedades de terra.
a Educação do Campo considera
vários processos educativos que formam
sujeitos autônomos, críticos, capazes de
compreender seus deveres e lutar por seus
direitos. É definida por Caldart (2012, p.
263) como uma prática social ainda em
processo de constituição histórica, que
“combina luta pela educação com luta pela
terra, pela Reforma Agrária, pelo direito ao
trabalho, a cultura, território e soberania
alimentar”.
Para Arroyo, Caldart e Molina
(2004), o debate que envolve as relações
entre campo e cidade é fundamental para a
compreensão da Educação do Campo, que
nasce de um outro olhar sobre o papel do
campo, que não o rural, em um projeto de
desenvolvimento, de democratização e de
inclusão, no qual os sujeitos são
protagonistas da história.
De acordo com as Diretrizes
Operacionais para a Educação Básica nas
Escolas do Campo, publicada pelo
Ministério da Educação,
a Educação do Campo, tratada como
educação rural na legislação
brasileira, tem um significado que
incorpora os espaços da floresta, da
pecuária, das minas e da agricultura,
mas os ultrapassa ao acolher em si os
espaços pesqueiros, caiçaras,
ribeirinhos e extrativistas. O campo
nesse sentido, mais do que um
perímetro urbano, é um campo de
possibilidades que dinamizam a
ligação entre os seres humanos com a
própria produção das condições da
existência social e com as realizações
da sociedade humana (Brasil, 2012,
p. 7).
Nesse sentido, na sua tese intitulada
as tecnologias digitais nas escolas do
campo: contextos, desafios e
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possibilidades, Munarin (2014) afirma que
o movimento pela Educação do Campo
não pretende reforçar a dicotomia entre
campo e cidade, mas valorizar as
características de cada um desses
contextos, pois eles se complementam.
O movimento pela Educação do
Campo está ligado à luta pela
valorização da agricultura familiar
em vez de às políticas
desenvolvimentistas voltadas a
setores do agronegócio. Está, acima
de tudo, disposto a lutar por um outro
projeto de campo, para que a
agricultura familiar, a solidariedade,
o território e os povos do campo que
constituem sua razão de ser, sejam
legitimados e levados à rio nas
políticas públicas do país (Munarim,
2014, p. 58).
A partir dessa concepção surge uma
perspectiva de “olhar para os povos do
campo, vinculado aos interesses da classe
trabalhadora, que prima por seus valores
instaurados e preserva o significado de sua
própria cultura” (Fonseca & Bierhalz,
2016, p. 262).
Diante do exposto, este artigo visa
compreender de que forma as tecnologias
colaboram para o fortalecimento da
concepção de Educação do Campo,
alicerçada com/pelos sujeitos do campo,
preocupada com a formação humana, com
seus direitos e deveres. Dessa forma
compreende-se o conceito de tecnologia
relacionado ao exercício da cidadania,
defendido por Orofino (2005) com base no
pensamento de Freire,
que na tecnologia não um fim em
si mesma, mas sim um poderoso
meio para ressignificação do mundo
através da produção de conhecimento
e para o investimento na autoria das
crianças e adolescentes. Enfim, como
um meio coadjuvante que contribua
com uma pedagogia de ampliação de
vozes, de construção de visibilidade,
da esperança e do reencantamento do
espaço escolar (Orofino, 2005, p. 30).
Tendo em vista a dimensão que as
TIC assumiram ao longo do tempo, é
inegável discutir a sua presença e a sua
utilização nas escolas do campo, seja por
meio dos próprios estudantes ou dos
recursos disponíveis no espaço. Cabe
ressaltar que a tecnologia quando analisada
isoladamente não contribui para atender a
todas as demandas de ensino e aprendizado
e/ou trabalhar com diferentes realidades,
por isso é necessário diversificar as dias
utilizadas para capacitar o aprendizado do
estudante (Moore & Kearsley, 2007).
No entanto, a tecnologia em si não
pode ser vista como a "salvadora" do
processo de aprendizagem, e como a
solução para equiparação entre as escolas
do “campo” e da “cidade”, ela deve ser
encarada como uma possibilidade de
desenvolver estratégias de ensino e
aprendizagem que incentivem o trabalho
colaborativo, reconhecendo a capacidade
que algumas ferramentas possuem em
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desenvolver autoria e protagonismo, mas
sem perder o foco da valorização da
cultura e do respeito às diferenças.
A escola do campo é rica em
costumes e valores, assim se torna de suma
importância a sua preservação e o seu
resgate a fim de contribuir com o
desenvolvimento dos cidadãos que a
compõem. Arroyo, Caldart e Molina
(2004) afirmam que a escola é um lugar
privilegiado de formação, de conhecimento
e de cultura, deve promover e valorizar a
identidade dos sujeitos. Dessa forma a
tecnologia deve colaborar para “pensarmos
o espaço ocupado pelas mídias em relação
às demais dimensões constitutivas da
cultura, das identidades e diferenças
socioculturais, como: classe social, gênero,
raça, etnia, orientação sexual, religião,
dentre outras” (Orofino, 2005, p.32).
Do mesmo modo, Arroyo (2012)
salienta a importância de aliar ciência,
tecnologia, cultura e arte como ferramentas
potencializadoras do desenvolvimento
humano, na perspectiva de formar sujeitos
sociais e coletivos, em um movimento de
universalização de potencialidades e
conflitos humanos.
Concepções dos estudantes em relação à
tecnologia
As concepções sobre tecnologia
foram analisadas a partir dos questionários
e das representações visuais construídas
pelos estudantes do Ensino Fundamental
de uma escola do campo. A utilização de
representações visuais auxilia no processo
de construção conceitual, visto que a
imagem potencializa a produção de
conhecimento e o desenvolvimento do
raciocínio (Nery & Batista, 2004).
A primeira questão do questionário
tinha como pretensão verificar quais as
tecnologias são utilizadas pelos alunos da
escola do campo, apresentadas na Figura 1.
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Figura1. Quantitativo sobre o acesso a Tecnologias.
Fonte: Elaboração dos autores.
Percebe-se pela figura 1, que a
maioria dos estudantes utiliza o rádio, a
televisão, seguido do celular. Se
solicitarmos a um de nossos vizinhos,
colegas de trabalho ou até mesmo a um
familiar, um exemplo de tecnologia, com
certeza as respostas serão semelhantes,
pois tais tecnologias fazem parte do
cotidiano e tornaram-se quase
imprescindíveis. Destaca-se a menção ao
rádio por 17 estudantes, pois esta é uma
tecnologia muito utilizada na região, para
acompanhar a previsão do tempo, notícias
sobre o estado de saúde de pacientes
hospitalizados, recados/mensagens entre
cidade e campo, bem como informativos
gerais.
O fato de não mencionarem a
internet como uma tecnologia (figura 1),
mesmo que a utilizem no celular (figura 3),
pode estar relacionado às condições de
acesso a rede, pois a cobertura de sinal
para celular ainda é ineficiente em muitas
regiões, como é o caso da localidade
investigada, bem como ao fato de
utilizarem a internet esporadicamente
quando estão em um local com rede wifi.
A televisão também consta em sete
dos 23 desenhos (figura 2), levando à
compreensão de que a mesma está presente
na residência da maioria dos alunos, como
um meio de entretenimento e também
como fonte de aquisição de
conhecimentos.
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Figura 2. Representação da televisão como tecnologia do aluno Girassol.
Fonte: Elaboração dos autores.
De acordo com Orofino (2005, p.
40), “a televisão e o rádio cobrem 98% do
território brasileiro, levando informação,
entretenimento, valores éticos e políticos
aos mais distantes recantos do país.
Portanto não escola, por mais distante e
diversa que seja que não conviva com esta
presença”.
Essa mesma autora destaca que a
televisão é a maior fonte de informação das
crianças e adolescentes que frequentam as
escolas, também se caracterizando como a
principal fonte cultural da maioria da
população do nosso país, fornecendo
padrões de comportamento e incentivando
representações dominantes que sustentam
o ideário de uma sociedade de consumo,
classista, patriarcal e excludente (Orofino,
2005).
Esta discussão é corroborada pela
pesquisa divulgada pelo Centro de Estudos
sobre as Tecnologias da Informação e da
Comunicação - CETIC.br (2012), feita
entre outubro de 2012 e fevereiro de 2013
envolvendo 61,3 milhões de domicílios
rurais e urbanos, sendo possível constatar a
diferença de acesso às tecnologias digitais
entre populações do campo e da cidade no
país. Nessa pesquisa, aponta-se que as
tecnologias mais utilizadas no campo são a
televisão, o celular e o rádio. O quadro a
seguir demonstra o acesso, por regiões
brasileiras, a diversos aparelhos
eletrônicos, distribuídos também entre a
população residente na cidade e no campo.
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Quadro 1. Proporção de domicílios que possuem que possuem equipamentos TIC.
Fonte: Adaptado de CETIC.br (2012).
De acordo com Munarin (2014, p.
85) “a televisão e o rádio ainda imperam
nas residências de áreas rurais, seguidos de
perto pela telefonia celular”. Destaca-se
que os dados apresentados na figura 1, no
qual os alunos indicam a televisão, o rádio
e o celular como as tecnologias mais
utilizadas, são reforçados pelas
informações do quadro 1, no qual
prevalecem nos domicílios dos gaúchos as
mesmas tecnologias. Dessa forma, mesmo
que a pesquisa tenha sido realizada a nível
local corrobora numa perspectiva regional
e nacional.
Nas representações visuais foram
elencadas tecnologias que não constavam
no questionário, ampliando-as, como se
observa na figura 3.
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Figura 3. Quantitativo das representações visuais sobre tecnologia
Fonte: Elaboração dos autores
Constata-se a prevalência de
tecnologias relacionadas ao entretenimento
e a comunicação, tais como a televisão e o
celular, já mencionadas anteriormente, mas
ocorre a ampliação, incorporando o tablet e
o mp4. Torna-se interessante ressaltar as
respostas que definem o GPS como uma
tecnologia importante no campo, pois o
equipamento é utilizado para demarcar as
lavouras e para localizar o gado.
Na categoria “outros” apareceu a
representação de um pulverizador, um
trator e um irrigador, no qual o aluno
destaca: “tecnologia no campo é levar a
água às lavouras no período de estiagem”
(Figura 4).
Figura 4. Representação sobre tecnologia do aluno Rosa.
Fonte: Elaboração dos autores.
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A necessidade de diálogos entre a
tecnologia, a vida, o trabalho e os costumes
fica evidente nas representações dos
alunos, demonstrando que a vida no campo
evolui, integra as tecnologias ao cotidiano,
adaptando-se às características locais, tais
como solo, clima e principalmente
utilidade.
Na figura 5, observam-se dois
momentos históricos do trabalho com a
terra: agricultores trabalhando com seus
arados puxados a boi, ou a cavalo, e este
trabalho sendo realizado na maior parte por
tratores e maquinários agrícolas de última
geração.
Figura 5. Representação sobre tecnologia do aluno Lírio.
Fonte: Elaboração dos autores.
Analisando a imagem percebe-se que
o aluno Lírio tentou representar a evolução
tecnológica no campo, sendo que no lado
direito, observa-se o trabalho com a terra
no qual são utilizadas tecnologias como a
enxada, o arado, o carro de boi, no qual
existe uma estreita relação entre a terra, o
homem e os animais. Também possibilita
identificar o plantio mais voltado para
subsistência familiar.
No lado esquerdo está a
representação de uma máquina agrícola na
lavoura e um notebook, ficando claro que
estas duas tecnologias facilitaram a vida no
campo, reafirmado pela frase: “Esses
produtos poderão ajudar você o máximo
que puder”, pois são compreendidos pelo
aluno como uma estratégia de economizar
energia humana e tempo, e mudaram a
relação com a terra e com a produção,
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voltada para o plantio de larga escala. A
representação também pode ser analisada
pela diferença conceitual entre Educação
do Campo e educação rural de Oliveira
(2013), no qual diferencia-se a relação com
a terra.
Os modos de produção
caracterizados pelo carro de boi, arado,
enxada e as máquinas agrícolas estão
diretamente ligados ao conceito de
trabalho, que estes instrumentos são
utilizados para controlar e transformar a
natureza em prol dos bens materiais, porém
a principal força ainda é a do ser humano
(corpo, energia, conhecimento).
Com isso criam-se as chamadas
relações sociais de produção, que
consistem na organização social e divisão
de tarefas, entretanto, em meio ao sistema
capitalista na qual estamos inseridos, o ser
humano acaba sendo um próprio produto
destas formas de produção, pois são
criadas hierarquias, acarretando
consequentemente a dominação entre os
próprios homens. Sendo assim, a lógica de
produção capitalista baseada em termos
fabris contribuiu para a maior
produtividade em um menor tempo e
menor área, usando de maquinários,
produtos químicos e novas tecnologias,
contrapondo-se a concepção de Educação
do Campo defendida neste artigo.
a figura 6, possibilita explorar a
concepção de tecnologia aliada à
modernização. Os alunos também
associaram tecnologias a equipamentos
que facilitam o seu cotidiano, que são para
eles considerados “sonhos de consumo”,
como, por exemplo, a máquina de lavar
roupas, o microondas, entre outros. A
agilidade do mercado tecnológico, faz com
que a cada dia sejam lançados novos
produtos com maiores e melhores
especificações e ao consumidor cabe a
decisão de optar pelas que são úteis no seu
dia a dia. (Bierhalz, 2012).
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Figura 6. Representação de tecnologia relacionada a eletroeletrônico/eletrodoméstico do aluno Margarida.
Fonte: Elaboração dos autores.
É possível interpretar a representação
dos alunos através das concepções de
Orofino (2005) sobre a lógica de
convergência do desenvolvimento de
tecnologias, aliado a euforia da economia
de mercado, no qual se impõe novidades
todos os dias; o que ontem era atual, hoje
se tornou obsoleto. “Isto certamente
acentua e mobiliza um contínuo desejo ao
consumo junto a grande maioria das
crianças e adolescentes, tanto aos que
podem ter acesso a estes equipamentos,
quanto aos muitos que são excluídos desta
lógica” (Orofino, 2005, p. 45).
Dos 23 alunos, onze possuem um
computador em suas residências, outros 11
não possuem computadores e apenas um
deles possui mais de 2 equipamentos. Já
em relação ao telefone celular, dois alunos
afirmaram possuir dois aparelhos, sendo
que os outros 21 mencionaram possuir
mais de dois. Percebe-se, com esse dado,
que o telefone celular para os alunos da
escola pesquisada é mais útil que outros
aparelhos portáteis como notebook e tablet.
Em relação à utilização da internet
pelos sujeitos da pesquisa, os dados
constam na Figura 7.
Figura 7. Quantitativo sobre acesso e utilização da internet.
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Fonte: Elaboração dos autores.
A informação relacionada ao acesso
à internet torna-se interessante, pois a
maioria dos alunos da escola do campo,
lócus deste estudo, acessa a internet,
principalmente do aparelho telefônico,
desconstruindo a visão generalista e
reducionista de que todos os indivíduos
que residem no campo estão
“desconectados” da sociedade em geral.
A internet é uma das tecnologias
mais revolucionárias construídas pelo
homem, e de acordo com Sousa (2011, p.
172).
indubitavelmente, entre as várias
novas tecnologias, sobressai aquela
que é sua maior expressão, a Internet,
por amalgamar diversas facetas
tecnológicas até então separadas,
como a escrita, a imagem, o som, etc.
Ela é hodiernamente o mais completo
meio de comunicação criado pela
tecnologia, tem reconfigurado as
culturas e suscitado novas estruturas
de sociabilidade contemporânea.
Segundo dados disponibilizados pelo
CETIC.br (2012), entre novembro de 2015
e junho de 2016 em relação a internet,
56% da população urbana do Brasil com
acesso domiciliar contrapondo-se aos 22%
da população rural, demonstrando que os
espaços urbanos ainda se sobrepõem no
que se refere ao acesso e disponibilidade
rápida à internet e a outras tecnologias,
porém, não é uma justificativa para
caracterizar os sujeitos dessas localidades
como um povo “atrasado”, como se o
campo fosse um espaço desvinculado da
cidade.
A despeito do acesso à internet a
maioria dos discentes diz possuir acesso
via celular e alguns utilizam quando estão
na casa de familiares ou amigos na área
urbana. Um dos fatores preponderantes
para alguns sujeitos não possuírem acesso
à internet está relacionado à dificuldade de
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conexão. As operadoras que ampliam seu
atendimento, instalando mais antenas,
acabam fidelizando os consumidores.
Tecnologias na escola do campo
O uso das tecnologias na educação
torna-se cada vez mais usual. Os
laboratórios de informática e as políticas
públicas envolvendo as TIC ganharam
maior espaço nas últimas décadas e os
avanços da internet forçam todos os
segmentos da sociedade, inclusive a escola
a repensar suas práticas. Essa realidade não
deveria ser diferente na escola do campo,
mas na prática, percebe-se uma distinção
em relação aos investimentos educacionais
entre campo e cidade.
Disparidade constatada na análise
das escolas da região pesquisada, onde
destaca-se que das vinte e uma escolas do
campo da rede de ensino, nenhuma possui
laboratório de informática. Apenas duas
possuem computador e impressora, mas
para uso da secretaria e direção,
interessante mencionar que estas duas
escolas são nucleadas, também
evidenciando um tratamento diferenciado
por parte dos órgãos blicos municipais
entre escolas nucleadas e multisseriadas.
Nenhuma escola do campo possui a
antena parabólica disponibilizada pelo TV
Escola e tampouco os equipamentos
disponibilizados pelo Programa Nacional
de Tecnologia Educacional (ProInfo).
Com o intuito de analisar como os
alunos percebem a escola em relação às
tecnologias, questionou-se a respeito da
presença de computadores na escola. Vinte
estudantes responderam que a escola
possui computadores e três responderam
que não.
Nas respostas dadas ao
questionamento, percebe-se que a maioria
dos alunos indica a presença do
computador na escola, pois existe um
computador e uma impressora, de uso
exclusivo da secretaria e direção.
Compreende-se que um dos indicadores
que levou os três alunos mencionaram que
a escola não possui computadores pode
estar relacionado à interpretação de
computadores utilizados pelos alunos ou
pelo fato de desconhecerem, mesmo que a
secretaria tenha um equipamento.
Em outra questão, averiguou-se a
concepção dos alunos a respeito da
importância da disponibilidade de internet
na escola e constatou-se que a maioria, 22
alunos, indicou como importante, pois
facilitaria na realização de pesquisas e
também possibilita ouvir músicas nos
horários livres. Apenas um aluno não
acredita que a internet seja importante na
escola.
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Outra pergunta questionou a opinião
dos alunos em relação à evolução
tecnológica da escola do campo quando
comparada às demais escolas. Todos os
alunos compreendem que a escola do
campo não acompanha a evolução
tecnológica. Um dos alunos justifica sua
resposta afirmando que não tem internet e
laboratório, a prefeitura não investe em
tecnologia na escola do campo”. Já outro
aluno afirmou que: “a prefeitura não
condições e nem investe em escolas do
campo”.
A indignação dos alunos em relação
à falta de investimentos públicos na escola
do campo, corrobora os dados anunciados
pelo Censo da Educação Básica de 2013
ii
,
no qual 48% das unidades públicas ainda
não têm computadores para uso discente;
50,3% têm acesso à internet e um
computador para cada 34 alunos. A banda
larga está presente em 40,7%”.
Mesmo percebendo os significativos
avanços que a tecnologia proporciona à
educação, tais como sítios de pesquisa, uso
de ferramentas, softwares educacionais,
jogos, material educativo interativo, muitas
escolas não disponibilizam infraestrutura,
equipamentos, e acabam tornando a
tecnologia alheia ao mundo educacional.
A problemática encontrada pela
escola e pelos professores para tratar esses
avanços está associada a vários fatores
como: o não pertencimento da escola ao
local no qual está inserido, o despreparo
dos profissionais da educação, a ausência
de ambientes adequados, a falta ou o
sucateamento de recursos tecnológicos,
assim como a manutenção desses, são
alguns dos obstáculos encontrados no
caminho da democratização das TIC nas
escolas, principalmente nas escolas do
campo, alvo deste estudo.
Considerações Finais
Constatou-se que a maioria dos
alunos menciona utilizar em suas
residências o rádio, a televisão e o aparelho
celular. Por isso, destaca-se a importância
da realização de um trabalho crítico frente
a essas mídias, pois de acordo com Orofino
(2005) elas podem banalizar ideias,
mitificar pessoas e explorar estereótipos e
na Educação do Campo poderão reforçar o
sentimento de inferioridade e o desejo de
migrarem para a “cidade” com a ilusão de
uma vida melhor.
Os desenhos também evidenciaram
que a tecnologia para cada um dos alunos
está associada à evolução dos
equipamentos, que trouxeram para o
campo praticidade, facilidade e rapidez.
Logo, a tecnologia para os mesmos é
considerada uma aliada da vida do campo,
e diferente da área urbana, está nas
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pequenas mudanças que facilitam seus
afazeres.
Portanto, a escola do campo deve
conceber a utilização de tecnologia de uma
forma diferente da escola urbana. A ênfase
a outras ferramentas que não somente o
computador e a internet, mas a
equipamentos que até pouco tempo
atrás não tinham acesso, como é o caso da
máquina de lavar roupa, do GPS e de
equipamentos como anemômetro,
pluviômetro, entre tantos outros. E para dar
um verdadeiro significado ao uso das TIC
no processo de aprendizagem é
fundamental o conhecimento do local no
qual se está trabalhando.
É importante ressaltar que as TIC são
aliadas do professor no processo de ensino
e aprendizagem, desde que estejam
ancoradas em um projeto político
pedagógico (PPP) que prevê uma escola
participativa, democrática e cidadã.
Fantin (2011) afirma que as mídias
devem contribuir para a formação de um
usuário ativo, crítico e criativo para a
cidadania e democratização de
oportunidades educacionais e para o acesso
e produção de saber, o que contribui para a
redução das desigualdades sociais.
A partir dessas concepções surge um
novo modo de perceber a tecnologia
relacionando-a aos povos do campo,
integrada aos interesses e valores dos
sujeitos, preservando o significado de sua
própria cultura (Fonseca & Bierhalz,
2016), no qual a educação é ligada aos
tempos da terra (Munarin, 2014),
alicerçada em um projeto popular
(Benjamin & Caldart, 2000).
Conclui-se, portanto, que as
tecnologias quando previstas no PPP da
escola e consideradas como instrumentos
didático-metodológicos tendem a
contribuir com a diminuição de currículos
fragmentados e lineares, que dificultam a
interconexão de saberes. Tornando-se
elementos de valorização de todos os
espaços da sociedade como promotores de
conhecimentos que reforçam a reflexão
crítica e o uso das TIC para o exercício da
cidadania, bem como no fortalecimento
das reivindicações dos sujeitos do campo.
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Informações do artigo / Article Information
Recebido em : 26/02/2017
Aprovado em: 16/03/2017
Publicado em: 28/01/2019
Received on February 26th, 2017
Accepted on March 16th, 2017
Published on January, 28th, 2019
Contribuições no artigo: Os autores foram os
responsáveis por todas as etapas e resultados da
pesquisa, a saber: elaboração, análise e interpretação dos
dados; escrita e revisão do conteúdo do manuscrito
e; aprovação da versão final a ser publicada.
Author Contributions: The authors were responsible for
the designing, delineating, analyzing and interpreting the
data, production of the manuscript, critical revision of the
content and approval of the final version to be published.
Conflitos de interesse: Os autores declararam não haver
nenhum conflito de interesse referente a este artigo.
Conflict of Interest: None reported.
Orcid
Crisna Daniela Krause Bierhalz
https://orcid.org/0000-0002-5117-6415
Eril Medeiros da Fonseca
https://orcid.org/0000-0001-9529-2357
Izalina Oliva
https://orcid.org/0000-0001-8017-5035
Como citar este artigo / How to cite this article
APA
Bierhalz, C. D. K., Medeiros, E., & Oliva, I. (2019).
Concepções dos estudantes de uma escola do campo
sobre tecnologia. Rev. Bras. Educ. Camp., 4, e3297. DOI:
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e3297
ABNT
BIERHALZ, C. D. K.; MEDEIROS, E.; OLIVA, I.
Concepções dos estudantes de uma escola do campo
sobre tecnologia. Rev. Bras. Educ. Camp.,
Tocantinópolis, v. 4, e3297, 2019. DOI:
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e3297