Revista Brasileira de Educação do Campo
ENSAIO
DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.2525-4863.2017v2n2p811
Rev. Bras. Educ. Camp.
Tocantinópolis
p. 811-829
jul./dez.
2017
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A construção da categoria analítica “Campo” no Brasil -
Possibilidades à Educação do Campo
Lisiane Costa Claro
1
, Vilmar Alves Pereira
2
1
Universidade Federal do Rio Grande - FURG. Programa de Pós-Graduação em Educação Ambiental - PPGEA.
Avenida Itália, Km 8, s/n. Carreiros. Rio Grande - RS. Brasil. lisianecostaclaro@gmail.com.
2
Universidade
Federal do Rio Grande - FURG.
RESUMO. O texto que segue aborda a construção da categoria
analítica “Campo” no contexto nacional brasileiro. Mais do que
forjar tal categorização, tanto a influência do Ruralismo
Pedagógico na elaboração e efetivação de um projeto
determinado, quanto às pesquisas sobre o contexto campesino,
projetavam a imagem do Campo e seus Sujeitos de maneira a
acolher, ou não, determinados grupos que constroem os espaços
rurais. Por meio da pesquisa bibliográfica e da Análise de
Conteúdo (Franco, 2005), realizamos uma busca sobre os
olhares ao Campo a partir de pesquisas no período entre 60 e 90.
Objetivamos compreender este processo de elaboração do
Campo como categoria da área Educação, instigando
questionamentos frente ao elemento conceitual. Consideramos a
contribuição deste exercício, sobretudo, ao entender este
processo junto às suas repercussões aos estudos e práticas
realizadas no bojo da Educação do Campo. As abordagens
destacadas, contributos primordiais, situadas em seu tempo,
apontam para as diversas relações com a agricultura e sua
constituição. Porém, não evidenciam a possibilidade de outras
atividades e demais peculiaridades que não estejam vinculadas
diretamente a categoria “trabalho” presentes no Campo. O
ensaio possibilita a abertura para novas abordagens, convidando
à reinvenção da categoria analítica “Campo”.
Palavras-chave: Campo, Categoria de Pesquisa, Educação do
Campo.
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The construction of the analytical category Rural in
Brazil - Possibilities for Rural Education
ABSTRACT. The text that follows approaches the construction
of the analytical category "Rural" in the Brazilian national
context. Rather than forging such a categorization, both the
influence of Pedagogical Ruralism in the elaboration and
implementation of a given project, research on the peasant
context, projected the image of the Field and its Subjects in
order to accommodate or not groups that construct the rural
areas. Through the bibliographic research and Content Analysis
(Franco, 2005), we conducted a search of the field from
researches in the period between 60 and 90. We aim to
understand this process of elaboration of the Field as a category
of Education, questions about the conceptual element. It´s
consider the contribution of this exercise, above all, to
understand this process along with its repercussions to the
studies and practices experienced in the Field Education field.
The outstanding approaches, primordial contributions, located in
their time, point to the various relations with agriculture and its
constitution. However, they do not show the possibility of other
activities and other peculiarities that are not directly linked to
the category "work" present in the Rural. The test allows the
opening of new approaches, inviting the reinvention of the
analytical category "Rural".
Keywords: Rural, Research Category, Rural Education.
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La construcción de la categoría analítica “Campo” en
Brasil - Posibilidades a la Educación del Campo
RESUMEN. El texto que sigue aborda la construcción de la
categoría analítica "Campo" en el contexto nacional brasileño.
Más allá de forjar tal categorización, tanto la influencia del
Ruralismo pedagógico en la elaboración y efectividad de un
proyecto determinado, como las investigaciones sobre el
contexto campesino, proyectaban la imagen del Campo y sus
Sujetos de manera a acoger o no determinados grupos que
construyen Los espacios rurales. A través de la investigación
bibliográfica y del Análisis de Contenido (Franco, 2005),
realizamos una búsqueda sobre las miradas al Campo a partir de
investigaciones en el período entre 60 y 90. Objetivamos
comprender este proceso de elaboración del Campo como
categoría del área Educación, instigando Cuestionamientos
frente al elemento conceptual. Consideramos la contribución de
este ejercicio, sobre todo, al entender este proceso junto a sus
repercusiones a los estudios y prácticas experimentadas en el
seno de la Educación del Campo. Los enfoques destacados,
contribuciones primordiales, situadas en su tiempo, apuntan a
las diversas relaciones con la agricultura y su constitución. Sin
embargo, no evidencian la posibilidad de otras actividades y
demás peculiaridades que no estén vinculadas directamente a la
categoría "trabajo" presentes en el Campo. El ensayo posibilita
la apertura para nuevos enfoques, invitando a la reinvención de
la categoría analítica "Campo".
Palabras clave: Campo, Categoría de Investigación, Educación
del Campo.
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Diálogo introdutório
Após quase duas décadas da proposta
da Educação do Campo enquanto pauta
nacional, em consonância com a própria
proposta pedagógica da Educação do
Campo que se anuncia enquanto aberta à
constante (re)construção, consideramos
relevante rever os desafios presentes no
espaço do Campo. Do mesmo modo,
acreditamos necessária a revisão sobre a
própria definição acerca da categoria
"Campo", tendo como horizonte o sujeito
presente nessa construção e, portanto, as
identidades vinculadas a estes.
Deste modo, no texto que
apresentamos, propomos uma revisão
acerca dos estudos considerados clássicos
sobre o espaço do Campo no contexto
brasileiro. Consideramos que estes estudos
contribuem fundamentalmente na
construção do Campo enquanto categoria
de análise das produções de conhecimento
no bojo científico. Trata-se de trabalhos de
historiadoras(es), sociólogas(os),
intelectuais que buscavam delinear o
espaço campesino no âmbito da pesquisa
nacional a partir da década de 1960 até os
anos 90.
Cabe destacar que selecionamos este
período devido ao espaço deste tema no
campo acadêmico, considerando seus
desafios ao adentrar este âmbito, bem
como as mudanças de olhares frente ao
horizonte compreensivo "Campo". Por este
mesmo motivo, consideramos a relevância
destas pesquisas, que se configuram
enquanto esforços significativos ao projeto
de Campo naquele período e que, até hoje,
de algum modo, balizam as produções no
bojo dos estudos vinculados ao espaço do
Campo.
Consideramos pertinente esta revisão
haja vista que tais estudos demonstram as
bases epistemológicas arraigadas às
pesquisas que se propõem a estudar o
contexto campesino; sobretudo,
demonstram indicativos sobre como este
âmbito vem sendo compreendido ao longo
do tempo, conferindo diversos olhares ao
espaço em evidência e constituindo o
sujeito do Campo. Acreditamos que este é
um exercício necessário para a própria
reconstrução e problematização da
Educação do Campo, num sentido
transformador e dialógico, pelo viés
compreensivo.
Além disto, ponderamos que muito
embora a Educação do Campo, enquanto
proposta constituída junto às pessoas que
vivem nos espaços rurais tenha contribuído
decisivamente para as lutas dos
movimentos sociais populares do Campo
(representando uma importante conquista
para esse contexto) ainda é possível
acompanhar uma série de contradições que
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requerem o retorno às bases dessa
proposta.
Como percurso metodológico,
pautamo-nos na pesquisa bibliográfica, que
auxilia na compreensão das variáveis e
autenticidade do estudo. Assim como
contamos com a Análise de Conteúdo, que
viabiliza o manejo com produções textuais
escritas. Neste rumo, seu ponto de partida é
a mensagem, porém considera as
condições contextuais de seus produtores e
precisa estar situada com a concepção
crítica e com os processos de linguagem
para a construção de consensos e pareceres
(Franco, 2005, p. 13).
Com estes suportes abordaremos
uma concepção que fundamenta os
projetos em torno do âmbito campesino,
bem como o processo de pesquisa em
relação ao Campo no contexto nacional.
Sobre o Ruralismo Pedagógico enquanto
concepção e as pesquisas sobre o espaço
do Campo
Ao depararmo-nos com alguns dados
sobre a violência no Campo, como o
avanço do agronegócio e fraudes na
distribuição de terras, além dos processos
que as políticas públicas lidam com o
êxodo, questionamos até que ponto a
Educação do Campo tem sido construída
junto aos Sujeitos do Campo de maneira
em que se compreenda as diversas e
múltiplas relações que tramam as
sociabilidades constituídas pelos grupos
que nem sempre estão articulados aos
movimentos sociais populares do Campo.
Mais cuidadosamente, podemos
perceber os alarmantes índices referentes
aos espaços constituídos por ribeirinhos,
pescadores artesanais, seringueiros,
indígenas e quilombolas situados nos
espaços rurais. Apesar de a Educação do
Campo abarcar estes povos, para além do
grupo que compreendemos por agricultores
familiares, nota-se que as desigualdades e
opressões são mais evidentes nos
territórios constituídos por esses outros
sujeitos (que não agricultores familiares)
os quais também deveriam ser acolhidos,
como as políticas públicas demarcam
i
, na
proposta da Educação do Campo.
Na busca pelos olhares lançados ao
espaço do Campo, a partir do nosso
horizonte compreensivo "Campo"
realizamos uma busca pelo entendimento
do processo pelo qual o Campo foi sendo
concebido nacionalmente. Destacamos
nossa abordagem em duas pautas: 1) O
Campo constituindo-se a partir da
elaboração e efetivação de um projeto
pautado no Ruralismo Pedagógico
(concepção fundamentada nos valores
colonialistas articulada ao ideal de
“desenvolvimento” tecnológico, necessária
a uma proposta opressora dos saberes
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locais dos povos do Campo), a partir do
início do século XX. 2) Busca pela
compreensão de como o âmbito das
pesquisas sobre o contexto campesino
projetava a imagem do Campo e de seus
Sujeitos.
Enquanto a primeira pauta trata da
concepção que influenciaria as práticas
pedagógicas da educação formal no espaço
do Campo, a segunda lança um olhar
atento à forma como é compreendido o
espaço do Campo (e seus sujeitos) no
âmbito da pesquisa. Realizamos esta
análise a partir de três momentos dos
estudos sociológicos e históricos acerca do
espaço campesino (década de 60, o período
dos anos 70 e 80, e, o decênio de 90).
Acreditamos que junto a este processo
constitui-se também um Sujeito quando se
refere ao contexto do Campo.
Passamos a abordar brevemente
alguns apontamentos sobre a concepção do
Ruralismo pedagógico. Pires (2012) pontua
que essa concepção foi corroborada pela
ideologia colonialista, que se embasava na
defesa das "virtudes" do Campo e seu
cotidiano, a fim de evitar ou desfiar o foco
de seu esvaziamento populacional,
fragilidade social e política do
patriarcalismo. Além disso, buscava
"remediar" as situações de conflitos
oriundas da oposição dos agroexportadores
ao movimento progressista urbano.
A autora destaca que, junto a esses
objetivos essa proposta teve apoio de
outros segmentos das elites urbanas, os
quais defendiam a fixação da população do
Campo no espaço rural como forma de
evitar possíveis problemas sociais nas
cidades criados pelo êxodo campesino.
Além disso, ressalta:
No início do século XX, o ruralismo
pedagógico conseguiu adesão
também nos movimentos
sociopolíticos e culturais, como o
movimento nacionalista e movimento
católico, os quais valorizavam a
mesma visão fisiocrata em que a
riqueza tem origem na produção
agrícola e que o Brasil tinha um
destino econômico agropecuário.
Essa visão permanece até a década de
1930, quando as transformações no
modelo econômico agroexportador,
como também as tendências escola
novistas e progressistas em educação
... passaram a exigir um novo tipo de
escolaridade (Pires, 2012, p. 83).
Sobre essa visão destacada acima,
em relação ao ideário de riqueza a partir da
produção agrícola, compreendemos o
quanto o Ruralismo Pedagógico toma
corpo, ao objetivar o preparo do
trabalhador do Campo em uma lógica
modernizante. No mesmo sentido, para
Prado (1995) o Ruralismo Pedagógico
pode ser definido enquanto uma tendência
de pensamento articulada por alguns
intelectuais que, ao longo do Estado Novo,
formularam concepções que vinham
sendo discutidas desde a década de 1920
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quais defendiam uma escola adaptada aos
interesses e necessidades hegemônicas.
A partir das decisões tomadas no
pós-guerra pelo centro hegemônico, surge
uma série de investimentos por parte dos
Estados Unidos em relação a programas e
projetos de esfera rural. Assim,
É o caso da Associação Brasileira de
Assistência Técnica e Extensão Rural
(ABCAR) criada em 1956 e
responsável pela coordenação de
Programas de extensão, ao lado de
outras iniciativas, como a criação da
Campanha Nacional de Educação
Rural (CNER) e do Serviço Social
Rural (SSR), os quais visavam à
preparação de técnicos destinados à
educação de base rural cuja tônica
era o desenvolvimento comunitário,
com projetos como a Campanha de
Educação de Adultos e as Missões
Rurais de Educação de Adultos
(Pires, 2012, p. 86).
Essas iniciativas têm como
fundamento uma ideologia do
desenvolvimento comunitário. Neste
sentido, a educação rural em prol da
modernização do Campo repercutia a
lógica da internacionalização da economia
brasileira, disposta aos desmandos do
capital monopolista.
Neste contexto, identificamos a
presença do ruralismo pedagógico como
uma perspectiva que ampara ações de
cunho educativo em grandes projetos os
quais anunciam o objetivo de desenvolver
a economia e o Campo brasileiros. Desde
julho de 2016, propagandas na mídia da
TV aberta brasileira m afirmando que
“Agro é tec; agro é pop” alusão (e ilusão)
ao agronegócio como possibilidade de ser
“sustentável”, “inclusivo”, “necessário”
para a melhoria da economia e vida nos
espaços do Campo.
Consideramos que estas propostas de
grandes empresas, como compensações
ambientais, não estão preocupadas com a
qualidade de vida no sentido do “bem
viver” das populações locais campesinas,
com suas identidades e saberes, mas sim
com os números de uma economia pautada
nas acepções capitalistas, visando o lucro e
certo destaque de um Estado burguês
frente ao setor do mercado.
Sobre o horizonte teórico nacional
acerca do Campo, muito embora autores
como Arroyo, Caldart e Molina (2009)
realizem a crítica acerca da ausência da
temática do Campo nos estudos,
especialmente na área das Ciências
Sociais, cabe destacar que Neves (2009),
apesar de aproximar-se a essa crítica de
escassez e homogeneização, aponta para as
possibilidades desde o legado dos
cientistas sociais. A autora reafirma
sociologicamente a multiplicidade de
condições de integração da força de
trabalho, salientando a constituição do
campesinato e pertinência desse fenômeno
ao campo das pesquisas.
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A socióloga aborda que o
campesinato possui magnitude com relação
à presença produtiva seja a partir de uma
condição na qual os camponeses estejam
em integração sob tutela imediata ou na
condição de produtores parcelados
autônomos. A articulista justifica que, no
presente contexto, reconhecer as diversas
abordagens de constituição do campesinato
é evidenciar parte dos fundamentos das
lutas pela expansão dos territórios
camponeses:
É tornar compreensíveis alguns dos
princípios de idealização da vida
social que instituem o imaginário de
projetos familiares; ou do sonho
coletivo de muitos dos trabalhadores
que, insistentemente, nos períodos de
vigência de formas democráticas ou
de ditaduras, buscaram e buscam a
conquista e a reafirmação do acesso a
lotes de terra para se instalarem como
produtores autônomos (Neves, 2009,
p. 308).
A partir desta compreensão, são
discutidas algumas linhas interpretativas
que influenciariam os estudos da área.
Como uma primeira polêmica citada pela
autora, está a compreensão dualista e
generalista através da contraposição entre
feudalismo e capitalismo mercantil - bases
analíticas encaradas como organizativas da
sociedade agrária. Neves (2009) aponta
que essa pauta controversa marca a
produção intelectual nos anos de 1960, um
período no qual a elaboração de
distintos projetos à sociedade brasileira,
assim como projetos de dissolução das
formas tuteladas camponesas. Neste
panorama:
Como o olhar interpretativo que
reconhecia a subsumida produção
agrícola baseada na gestão familiar
imputava-lhe os qualitativos da
ausência, ela foi por isso explicada
por elementos que não continham ou
não a abarcavam como traço
fundamental: não-capitalista, de
subsistência, minifúndio, pequena,
etc. Portanto, foi então compreendida
pelo distanciamento para com a
forma de organização produtiva
contextualmente reconhecida como
moderna e hegemônica porque
capitalista (Neves, 2009, p. 304-305).
Ao contrariarem esta interpretação
por um viés de polarização, o qual tende a
simplificar os processos de constituição do
campesinato, alguns estudiosos passaram a
redefinir os termos reflexivos dessa
temática. A autora coloca que alguns
desses pesquisadores realizavam um
recorte que supervalorava uma análise da
expropriação massiva, enquanto outros
buscavam compreender a natureza social
da diversidade das manifestações sociais,
políticas e econômicas camponesas.
Nesta dinâmica, torna-se possível
desmistificar a visão do Campo e suas
produções num entendimento fadado à
dissolução definitiva e imediata; o Campo
passa a ser enxergado por meio das
condições sociais necessárias à existência
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dessa categoria. Ainda assim, com a
predominância desta linha interpretativa de
precarização das condições sociais da
produção no campo em relação aos
pequenos agricultores (como a situação
social brasileira campesina encontrava-se),
que de certo modo anunciava a morte
inevitável das formas de produção
campesinas mais tradicionais, apontava-se
como solução o deslocamento das unidades
familiares e do produtor independente para
o trabalho produtivo em larga escala
(Neves, 2009).
A autora salienta que o amparo
institucional mais efetivo de incentivo à
criação de agentes intelectuais de novos
olhares ao Campo ocorre somente com a
estruturação de cursos de pós-graduação,
os quais apresentavam muitas pesquisas
que contavam com estudos de caso. No
âmbito político,
este novo olhar esteve coadunado a
imposições políticas, decorrentes da
mobilização e da construção de
visibilidade social de trabalhadores
que, por questionamentos coletivos a
regras jurídicas e a formas de
dominação exacerbadas, integraram a
cena política, mediante
questionamentos de formas ilegítimas
de exercício da autoridade pelos
proprietários de terra a que estavam
vinculados. Desse questionamento,
apresentaram-se socialmente como
portadores de mediados projetos
políticos, contrapostos para a
ordenação da vida social e da
estrutura de poder na sociedade
brasileira, mormente no que diz
respeito à concentração fundiária.
(Neves, 2009, p. 305-306).
Junto a este movimento questionador
às opressões presentes na constituição do
campesinato, a autora destaca que os
sujeitos vinculados a esse espaço rural e as
diversas formas de produção nesse
contexto constituem-se enquanto
estudiosos do tema. Alguns desses
configuram-se enquanto agentes
interventores - seja na busca pela
modernização da agroindústria ou na
defesa das tradições do Campo que
conheceram.
A autora registra que, ao longo deste
movimento, é possível acompanhar um
crescimento da produção intelectual dos
estudos da vida social camponesa
brasileira, reconhecendo sujeitos
considerados sitiantes, colonos, moradores,
meeiros, parceiros, extrativistas, entre
outros, sob um olhar que os considera
"agentes econômicos fundamentais". Em
um movimento que estende a forma pela
qual diferentes grupos, que integram o
espaço em evidência, surgem alguns
estudos que buscavam o entendimento
sobre a constituição desses agentes sociais,
ultrapassando o caráter economicista das
pesquisas. Contudo, Neves (2009) sublinha
que essas pesquisas tendem a ser realizadas
com relação aos grupos imigrantes
europeus.
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A partir destas colocações, na década
de 60 destacamos os estudos de três
autores pertinentes ao tema da constituição
do Campo e de seus Sujeitos: Maria Isaura
Pereira de Queiroz; Manoel Correia de
Andrade; e Otávio Guilherme Alves
Velho.
Com a proposta de desenhar um
breve panorama desse período, para
melhor situar os estudos a serem
compreendidos por meio desses autores,
cabe lembrarmos de alguns pontos do
contexto que se busca evidenciar.
Nesse período, o capital estrangeiro
configurava uma preferência econômica. O
financiamento dos gastos públicos era uma
prática comum que se dava a partir da
expansão dos meios de pagamento. Outra
ação característica do planejamento, na
virada dos 50 para os 60 era a ampliação
da participação do setor governamental,
além de incentivos a iniciativa privada.
Esses gastos, gerados pelo governo, eram
aplicados em infraestrutura, o que
acarretava o estímulo da demanda geral,
incentivando a oferta. Assim, o Produto
Interno Bruto (PIB) tinha seu índice de
progressivo crescimento. Todavia essa
expansão monetária, gerada pelas dívidas
adquiridas pelo setor público, gerou um
processo inflacionário que atingia
diretamente a população brasileira,
sobretudo os povos vinculados ao Campo
por meio da produção autônoma.
Desta maneira, o Plano de Metas,
apesar de ter ativado a economia e ter
ocasionado o investimento infraestrutural,
acarretou uma inflação que atingia grupos
os quais não participavam dos setores
agroindustriais na esfera campesina. Na
esfera das políticas públicas vinculadas à
Educação no espaço do Campo, é
importante registrar:
É nas décadas de 1950 e 1960 que a
educação rural é considerada mais
seriamente pelo Estado, justamente
em um período de extrema atenção
para as questões urbanas e,
consequentemente, sobre o
desenvolvimento industrial. A
perspectiva de desenvolvimento
econômico e a ideologia do progresso
são expressões pautadas na narrativa
evolucionista, que exigiam o 'fim' do
campo e do camponês, pois estes,
eram considerados sinônimos de
passado e atraso (Pires, 2012, p. 86).
Com este panorama, identificamos
que ainda preconizava uma visão arcaica
sobre as formas de produção no espaço
rural.
Por outro lado, Toledo (2004), ao
abordar os conflitos e as posições
divergentes do governo de João Goulart,
entre os anos de 1961 e 1964, ressalta que
o movimento político militar de abril de
1964 representou um golpe contra as
reformas sociais, que eram defendidas por
amplos setores da sociedade brasileira,
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bem como configurou-se um golpe contra
a incipiente democracia política burguesa
pós 1945 do Estado Novo. O autor aporta-
se em Florestan Fernandes, para destacar
que os setores conservadores buscavam
barrar a ampla participação crescente das
camadas populares, inclusive as do Campo,
nesse processo de reformas.
Contudo, no âmbito econômico,
iniciou-se uma crise política e a estagnação
econômica tornou-se presente num cenário
que apresentou um crescimento econômico
anteriormente de mais de 10% ao ano.
Com a crise, a economia cresceu, no ano
de 1962, o percentual de 5,3; em 1963,
apenas 1,5%; e, no ano seguinte, 2,4 (Baer,
1995). Para além destes índices, cabe
salientar que a vida no Campo era
diretamente afetada.
Com o discurso de combate à
inflação, foi criado o Plano de Ação
Econômica do Governo (PAEG). No
PAEG, foi aplicada uma política cambial
de incentivo exportador, a qual simpatizou
por entrada de capital e renegociações da
dívida externa contraída, além de uma
política de arrocho salarial. Entretanto,
como as políticas monetárias
expansionistas eram incabíveis nesse
programa, uma saída foi o aumento dos
impostos. Apesar de o Plano ter contido a
inflação, novamente a população foi
afetada: desemprego, falências e
concordatas, queda do crescimento e baixa
na indústria de construção foram o
resultado desta política.
É neste contexto que os movimentos
do Campo passam a articular-se de forma a
reivindicar suas pautas a partir das
necessidades dos homens e mulheres que
constituem o Campo. Segundo Pires
(2012), na década de 1960, surgem
importantes atores na constituição de uma
Educação do Campo, tais como: O
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST), Sindicatos, as Federações de
Trabalhadores e a Confederação dos
Trabalhadores da Agricultura (CONTAG),
o trabalho das Ligas Camponesas e a ação
pastoral dos bispos da Igreja Católica, os
Centros Populares de Cultura (CPC) e,
logo, o Movimento da Educação de Base
(MEB) e os Círculos de Cultura Popular,
com Paulo Freire.
Maria Isaura Pereira de Queiroz foi
uma pesquisadora de destaque no horizonte
das pesquisas do Campo, especialmente
com sua publicação, em 1963, ao
problematizar a condição social do Campo
a partir da abordagem a categoria rural
enquanto esquecida. A autora retoma os
estudos de uma década anterior a sua obra,
nos quais Jacques Lambert apontava
dados que demonstravam a quantidade
desproporcional entre o número de
habitantes no país em relação ao número
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de consumidores. Questão que apontava
para a existência de uma população no
Campo, a qual produzia uma "economia
fechada", como era encarada a produção de
subsistência, contrapondo os ideais do
mundo moderno da produção.
Assim, a autora aporta-se em
referenciais os quais reforçam a concepção
de um país fragmentado entre ordem
arcaica e moderna. Além disto, tem como
sustentáculos de sua crítica alguns estudos
os quais consideram diferentes grupos
campesinos, os quais têm semelhanças em
termos de regime econômico como
pertencentes ao "mesmo nero de vida"
(Pereira de Queiroz, 2009, p. 63). Todavia,
a autora faz um aparto sobre as
compreensões da vida de diferentes grupos
no Campo do contexto nacional e
identifica traços específicos acerca da
categoria que estuda. Para tanto, está
ancorada em estudos de sociólogos e
historiadores.
O segundo autor, que acreditamos
contribuir em muito com os estudos sobre
a vida e as lutas do Campo, é Manuel
Correia de Andrade, o qual detalha as
tentativas de articulação das "massas
rurais" (Andrade, 2009, p. 73).
Acreditamos que sua leitura acerca das
ligas camponesas e a sindicalização
vinculada ao trabalho do Campo, bem
ressalta os processos de enfrentamento que
os povos vinculados à agricultura
protagonizaram nesse período.
O estudo em evidência demonstra o
processo de construção da resistência
organizada latente em um período de
significativas opressões no espaço rural.
Aqui é possível compreender o quanto a
categoria do trabalho passa a tomar força
na busca por melhores condições sociais na
vida do Campo. Além disso, o autor, assim
como seus contemporâneos da área,
demarca a divisão nacional
arcaica/moderna, mas atribuindo ao
modelo considerado "arcaico" um caráter
de relevância para a continuidade dos
traços da produção e vida familiar
campesina.
Segundo Neves (2009), Otávio
Guilherme Alves Velho assume um
importante papel nos estudos camponeses
no Brasil durante a década de 60; visava a
demarcação da presença e do deslocamento
de formas camponesas no contexto
nacional. O estudioso realiza uma análise
sob a ótica das condições estruturais dos
mecanismos de dominação política
alimentados pela repressão da força de
trabalho. A partir de um enfoque crítico ao
ideal desenvolvimentista, a obra do
intelectual abarca os investimentos
políticos na integração e expansão
territorial que legitimava formas de
opressão pela falta de mobilidade da força
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de trabalho, assim como pela expulsão dos
trabalhadores pela plantation.
Logo, nas décadas de 1970 e 1980,
abordamos as pesquisas de Ciro Flamarion
Cardoso e Octavio Ianni. Consideramos
necessário lembrar que o início desse
período é marcado pelo chamado "milagre
econômico", o qual foi um período que
correspondeu aos anos de 1968-1973.
Nesse tempo, foi vivenciado o maior
crescimento econômico brasileiro. A
economia, que regeu esse período,
representou a necessidade de legitimação
no poder do regime ditatorial militar.
As práticas comuns, nesse momento,
estavam pautadas nas reduções de juros,
contenção de custos e salários, e incentivos
à demanda por meio de políticas
monetárias expansionistas e através dos
créditos acessíveis. O aumento e a
diversificação das exportações, juntamente
com o aumento das importações de bens de
capital, foram aspectos marcantes desse
tempo. As importações crescentes
significavam maior vulnerabilidade do país
com relação às condições externas.
Nessa época houve um crescimento
da dívida externa e do acúmulo de reservas
internacionais. Esse incentivo ao capital
externo ocorria devido à existência de uma
política cambial não desejosa de
valorização da moeda junto às políticas de
retomada de crescimento e à política
industrial de complemento de substituição
de importação e devido à estabilidade
política que gerava credibilidade às vistas
estrangeiras.
Segundo Oliveira (1989), o
financiamento proveniente do exterior, que
expandiu o país, no primeiro momento
agônico do milagre, acarretaria, sobretudo,
a “limpar o terreno” para o início do
processo de concentração. Essa fase inicial
configurou-se como um período de
empréstimos e não como capital de risco.
Pereira (1986) argumenta que o fato
de o mercado internacional vivenciar uma
baixa nas taxas de juros, durante o período
de grande crescimento interno, o país
adquiriu vantagens frente a essa situação
externa. Dessa forma, devido ao
endividamento elementar, o Brasil cresceu
a níveis altíssimos. Assim, vimos que o
"milagre econômico" de 1967-1973 é um
processo de acumulação apoiado em
endividamento externo. A crise do petróleo
com a multiplicação do seu preço acelera o
processo de endividamento externo e do
país, e a taxa de inflação (Pereira, 1986).
Apesar de o financiamento externo
objetivar dar credibilidade ao governo com
o aumento de reservas, certamente seria
um preço alto a ser pago por muito tempo.
Neste sentido, a classe trabalhadora sentiu
fortemente os desdobramentos dessas
práticas econômicas. Mais uma vez, os
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pequenos agricultores e outros produtores
vinculados ao trabalho rural não encontram
incentivos para uma produção familiar de
subsistência e que possa contribuir com as
economias locais num sentido mais
cooperativo e solidário.
Na constituição desse panorama
socioeconômico do contexto nacional, cabe
destacar que esses desdobramentos, que o
mesmo apresenta, articulam-se com a
chamada Revolução Verde. De acordo com
Gonçalves (2004), este movimento é a
tentativa de despolitizar a pauta da fome.
Conta com o apoio de países vinculados à
indústria bélica. O autor destaca o
argumento utilizado pela iniciativa que
apostava no caráter técnico para a solução
da insegurança alimentar.
Sob o discurso de garantia à
alimentação dos países que sofriam com a
fome, esses países, considerados como
"desenvolvidos", instigam a Revolução
Verde como uma forma de modernizar a
agricultura por meio de novas tecnologias,
monocultura, agrotóxicos, sementes
modificadas geneticamente, enfim, uma
série de mecanismos da biotecnologia.
A imposição desta lógica,
modernizante, afeta duramente a vida no
Campo, aumentado à vala das
desigualdades nos espaços rurais. Exemplo
deste fenômeno é a situação que privilegia
os latifundiários, haja vista que, com a
maior produção, proporcional a suas
extensões de terras, investiam nesse
paradigma que viabilizava os resultados
comerciais imediatos da produção em larga
escala.
Além desta posição de injustiça em
termos comerciais, comparando este tipo
de produção à produção do pequeno
agricultor, outro eixo da questão ambiental
fica latente em relação à degradação que
essa lógica trazia ao ambiente campesino:
temos um cenário que marginaliza os
pequenos agricultores; os relega a uma
noção de "Brasil Arcaico" e obsoleto ao
desenvolvimento econômico do país e a
uma lógica que reforça a relação destrutiva
de domínio entre ser humano e natureza.
No que diz respeito às outras formas
de vida vinculadas ao espaço rural,
destacamos as práticas econômicas que
assolavam os pescadores artesanais, os
quais passavam a enfrentar sérios
problemas advindos da falta de incentivos,
em detrimento de uma prática de governo,
ao longo dos anos 70 e 80, de fomento à
pesca industrial, altamente predatória.
O trabalho de Ciro Flamarion
Cardoso agrega em nossa leitura acerca da
constituição do Campo brasileiro e do
sujeito que o compõe, a partir da sua obra
na década de 80, a qual aborda o
campesinato e a escravidão brasileira. O
historiador concebe o trabalho e a
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constituição do espaço campesino a partir
da agricultura e suas relações com a mão
de obra escrava. O autor revisa as
compreensões acerca da escravidão nas
Américas, assim como se dedica ao estudo
sobre as sociedades coloniais que têm
como base o trabalho análogo.
Os estudos desenvolvidos por
Octavio Ianni durante a década de 80
contribuem à compreensão da utopia
camponesa a partir de seu amparo em
diferentes contextos a nível internacional
sobre as lutas e tentativas revolucionárias
agrícolas. Neste sentido, o autor realiza um
olhar delicado, mantendo seu
embasamento na concepção de totalidade,
por uma visão pautada na dialética,
aproximando-se da esfera cultural, quando
o mesmo aborda as questões raciais
presentes na constituição da identidade
nacional.
Neste período, a partir do
reconhecimento das abordagens dos
estudos acima, é possível identificar que a
pauta “trabalho” está estritamente
vinculada à economia, mas vai abrindo-se
às questões culturais oriundas e paralelas a
pauta econômica. Ciro Flamarion traz a
crítica frente ao modelo de sociedade
brasileiro que se constitui a partir do
espaço do Campo num sentido opressor
por meio da colonização, enquanto Ianni
enfatiza as formas de resistência a tais
violências. Ambos os autores enfatizam a
agricultura como atividade de estudo. São
estudos como estes que contribuem para a
identificação do agricultor como Sujeito do
Campo, ideário de certa identidade que
parece prevalecer no imaginário acerca da
construção do sujeito camponês.
na década seguinte, trazemos ao
diálogo teórico as contribuições de Klaas
Woortmann, durante a década de 90. O
antropólogo faz contribuições às
compreensões sobre o cotidiano do espaço
campesino. Neste viés, relaciona algumas
categorias presentes no Campo (como
família, terra, trabalho, liberdade, comida),
relacionando-as com categorias como
honra, hierarquia e reciprocidade
(Woortmann, 1990).
Ou seja, muito embora sua produção
esteja aberta ao campo das representações,
destacando a esfera cultural por meio de
um olhar etnográfico, compreendemos que
ainda assim, sua análise, que foi bem
preponderante à compreensão de parte do
universo campesino, destaca um tipo de
Sujeito que constitui as ordens sociais do
mundo rural: um sujeito vinculado à
produção agrícola.
Considerações (indicativos para a
revisão permanente da Educação do
Campo enquanto proposta libertadora e
da categoria Campo)
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Por este painel, ao encarar de forma
contextualizada acerca da produção
intelectual sobre a educação e sobre os
olhares em torno dos povos do Campo,
acreditamos chegar a uma possível leitura
capaz de identificar o processo de
construção de um Sujeito presente no
espaço campesino. Junto a esta construção,
obviamente, temos a constituição de uma
categoria de análise que é o Campo.
Enfatizamos que, para além da instituição
de um construto de análise, a produção do
conhecimento na academia de algum modo
traz uma série de desdobramentos à própria
referência que os sujeitos que formam (ou
não) o território/espaço/tempo/vida Campo
se compreendem.
Pela análise realizada, consideramos
que a área das pesquisas, principalmente
nas décadas de 60 e 70, enfatiza a questão
econômica, negligenciando outros fatores
que estão presentes na vida do Campo. Por
outro lado, alguns estudos passam a
analisar estas especificidades de âmbito
cultural. Contudo, consideramos que estes
estudos ainda polarizam algumas questões
preponderantes para a compreensão do
espaço do Campo, bem como aos Sujeitos
que o formam.
Ao buscar o cuidado de
compreender, paralelo a esse movimento
que passava a encarar os sujeitos sociais do
Campo, a concepção da pedagogia
ruralista, reconhecemos alguns traços
presentes nessa constituição e
denunciamos quais bases fundamentam a
construção de um ideário, que parte ainda
de uma racionalidade instrumental e que
encara o Sujeito do Campo sob a égide da
passividade, da necessidade de inclusão à
lógica desenvolvimentista, da negação dos
saberes emergentes da experiência do
viver.
Assim, consideramos algumas
possibilidades de revisão da proposta da
Educação do Campo por meio de três eixos
pensados a partir dos estudos
desenvolvidos pelos autores aqui
apresentados: 1) Olhar compreensivo a
partir das especificidades econômicas dos
povos do Campo. 2) Leitura sobre a
diversidade cultural dos diferentes povos
que habitam o espaço do Campo. 3)
Atenção aos fundamentos educativos
presentes nas propostas pedagógicas
presentes nos espaços campesinos.
A sugestão por abordar as
especificidades econômicas não remonta
aos estudos sobre as práticas de uma
economia hegemônica e opressora, mas
exige a abertura à outras formas
manutenção da existência de ordem
material. Possibilita a compreensão de
práticas mais solidárias de viver e inaugura
um campo de viabilidades a partir de, por
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exemplo, autogestão de comunidades
tradicionais.
Com relação à leitura acerca da
diversidade cultural, destacamos o campo
das linguagens e representações, um
espaço de possibilidades e respeito à
multiplicidade mítica e dimensão ética.
Estudos que tratem das identidades das
sociedades presentes no Campo são
imprescindíveis para a própria revisão
acerca do conceito “Campo”: é necessário
lembrar que povos considerados
tradicionais situados no espaço rural
também são considerados camponeses.
Portanto, as políticas públicas precisam ser
constituídas por estas sociedades também
rurais. Reconhecer esta multiplicidade é
também disputar a revisão do significado
do contexto campesino.
Enquanto os fundamentos presentes
no âmbito dos estudos do Campo,
salientamos que os mesmos podem
interferir nas propostas pedagógicas que
estão presentes nas ações do Campo. É
necessário identificar quais as concepções
que estão vinculadas aos projetos de cunho
educativo nos espaços em questão.
Questionar determinadas ações que se
dizem “sustentáveis”, “necessárias”
vinculadas ao “desenvolvimento” do
espaço do Campo. Reconhecer e alimentar
propostas que estejam na contramão das
opressões do Campo é uma postura
necessária à revisão da Educação do
Campo.
As pesquisas sobre o espaço do
Campo no contexto brasileiro, destacadas
neste estudo, enfatizam a categoria do
trabalho muito arraigada a categoria da
agricultura. Apesar dos autores definirem
diferentes enfoques, identificamos o
quanto à academia no período das
produções evidenciadas, contribui para a
compreensão do Campo vinculada ao
Sujeito que trabalha enquanto agricultor.
Os estudos apontam para as diversas
relações com a agricultura, bem como para
sua constituição. Contudo, não evidenciam
de forma específica a possibilidade de
outras atividades e demais peculiaridades
que não estejam vinculadas diretamente ao
horizonte compreensivo “trabalho”
presentes no Campo.
Assim, lembramos que as formas de
dominação em relação aos Sujeitos do
Campo não estão apenas no avanço da
lógica mercadológica do trabalho,
fragmentado e reduzindo seu sentido
ontológico. As formas de opressão também
estão vinculadas ao não reconhecimento
dos saberes, das crenças e da ética das
formas múltiplas de se viver no espaço do
Campo. Portanto, consideramos que a
academia deve também reconhecer outras
formas de saberes, para além do que
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ISSN: 2525-4863
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Recebido em: 24/08/2017
Aprovado em: 16/09/2017
Publicado em: 17/11/2017
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APA:
Claro, L. C., & Pereira, V. A. (2017). A construção da
categoria analítica “Campo” no Brasil - Possibilidades
à Educação do Campo. Rev. Bras. Educ. Camp.,
2(2), 811-829. DOI:
http://dx.doi.org/10.20873/uft.2525-
4863.2017v2n2p811
ABNT:
CLARO, L. C.; PEREIRA, V, A. A construção da
categoria analítica “Campo” no Brasil - Possibilidades
à Educação do Campo. Rev. Bras. Educ. Camp.,
Tocantinópolis, v. 2, n. 2, p. 811-829, 2017. DOI:
http://dx.doi.org/10.20873/uft.2525-
4863.2017v2n2p811
ORCID
Lisiane Costa Claro
http://orcid.org/0000-0003-3113-1380
Vilmar Alves Pereira
http://orcid.org/0000-0003-2548-5086