Revista Brasileira de Educação do Campo
The Brazilian Scientific Journal of Rural Education
ARTIGO/ARTICLE/ARTÍCULO
DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.2525-4863.2018v3n1p287
Rev. Bras. Educ. Camp.
Tocantinópolis
p. 287-312
jan./abr.
2018
ISSN: 2525-4863
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A Pedagogia da Alternância no contexto da Educação do
Campo: a experiência do Instituto Educar
Luana Bonavigo
1
, Flávia Eloisa Caimi
2
1
Centro de Ensino Superior Riograndense/Instituto Educar. Programa de Pós-Graduação em Educação. Rua
Duque de Caxias, 990. Ronda Alta - RS. Brasil. luanabbonavigo@gmail.com.
2
Universidade de Passo Fundo -
UPF
RESUMO. Superando-se a visão urbanocêntrica, em que o
campo é tido como lugar de atraso, e ultrapassando-se a
perspectiva de antagonismo entre cidade-campo, busca-se
reconhecer tempos e modos específicos de ser, viver e produzir,
concebendo a educação e a escola segundo diferentes formatos
de organização, de acordo com as necessidades das populações
que vivem do/no campo. Com base nesses pressupostos, a
educação do/no campo circunscreve a temática geral deste
artigo, onde se busca travar diálogo com a Pedagogia da
Alternância como alternativa para viabilizar uma proposta
educativa que possa fazer frente às demandas e especificidades
dessas populações. Trata-se de um estudo de caráter
bibliográfico, que se volta para o entendimento contextual,
histórico e conceitual da Educação do Campo e da Pedagogia da
Alternância, combinado à investigação exploratória das práticas
educativas pautadas na experiência da alternância, que se
realizam no Instituto Educar de Pontão/RS. Conclui-se que o
Instituto Educar assume uma organização metodológica
alternante entre Tempo Escola e Tempo Comunidade, prioriza a
educação dos sujeitos inseridos em uma coletividade e confere
protagonismo aos educandos que ali desenvolvem seus
processos formativos.
Palavras-chave: Educação do Campo, Pedagogia da
Alternância, Tempo Escola, Tempo Comunidade.
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The Pedagogy of Alternation in the Context of Rural
Education: the experience of the Educar Institute
ABSTRACT. Overcoming the urban-centric vision, where the
countryside is considered a place of backwardness and
surpassing the perspective of city-countryside antagonism, this
paper intend to recognize specific times and ways of being,
living and producing, conceiving education and school by
different organizational formats, according to the needs of the
population living in/from the countryside. Based on this
assumption, education in the countryside circumscribes the
general theme of this article, aiming to establish a dialogue with
the Alternation Pedagogy as an alternative to enable an
educational proposal that can meet the demands and specificities
of these populations. This is a bibliographical study focused on
the contextual, historical and conceptual understanding of rural
education and the Alternation Pedagogy, combined with the
exploratory investigation of educational practices based on
alternation experiences carried out at the “Instituto Educar” in
Pontão/RS. The conclusion is that Instituto Educar assumes an
alternating methodological organization between School Time
and Community Time, prioritizes the education of the subjects
inserted in a collectivity and confers protagonism to the students
who develop their formative processes there.
Keywords: Rural Education, Alternation Pedagogy, School
Time, Community Time.
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La Pedagogía de la Alternancia en el contexto de la
Educación del Campo: la experiencia del Instituto Educar
RESUMEN. Superando la visión urbanocéntrica, en que el
campo es considerado como lugar de retraso, y superando la
perspectiva de antagonismo entre ciudad-campo, se busca
reconocer tiempos y modos específicos de ser, vivir y producir,
concibiendo la educación y la escuela según diferentes formatos
de organización, de acuerdo con las necesidades de las
poblaciones que viven del/en el campo. Con base en este
presupuesto, la educación del campo circunscribe la temática
general de este artículo, donde se busca frenar diálogo con la
Pedagogía de la Alternancia como alternativa para viabilizar una
propuesta educativa que pueda hacer frente a las demandas y
especificidades de esas poblaciones. Se trata de un estudio de
carácter bibliográfico, que se vuelve hacia el entendimiento
contextual, histórico y conceptual de la Educación del Campo y
de la Pedagogía de la Alternancia, combinado a la investigación
exploratoria de las prácticas educativas pautadas en la
experiencia de la alternancia, que se realizan en el Instituto
Educar de Pontão/RS. Se concluye que el Instituto Educar
asume una organización metodológica alternante entre Tiempo
Escuela y Tiempo Comunidad, prioriza la educación de los
sujetos insertados en una colectividad y confiere protagonismo a
los educandos que allí desarrollan sus procesos formativos.
Palabras clave: Educación del Campo, Pedagogía de la
Alternancia, Tiempo Escuela, Tiempo Comunidad.
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Introdução
O Instituto Educar é uma escola do e
no campo que nasceu da força do
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST), num contexto de lutas em
prol de uma educação voltada a seus
povos, cuja proposta pedagógica enseja
uma organização na qual o educando
alterna entre períodos de internato em
tempo integral na escola e períodos de
permanência na família/comunidade. Essa
alternância tem como objetivo manter os
alunos próximos do seu local de residência,
vivenciando seus aprendizados na teoria e
na prática, constituindo-se como uma
possibilidade singular de Educação do e no
Campo.
No intuito de cultivar processos
formativos humanos, a Educação do
Campo se constrói gradativamente e
simboliza um feito recente de conquistas
idealizadas pelos trabalhadores rurais e
suas organizações. O movimento que
busca uma Educação do e no Campo vem
se consolidando na sociedade brasileira por
lutas sociais que muito tempo
denunciam os processos de exclusão
enfrentados pelos sujeitos que vivem em
tais contextos. Essa exclusão se caracteriza
diante de seus direitos à terra, à educação,
à moradia, à cultura e à vida.
De acordo com Caldart (2002), a
Educação do Campo, vista a partir da sua
constituição histórica, se efetivou mediante
lutas sociais que buscavam os direitos da
população do campo. Assim, foi se
construindo por meio da pressão social de
povos que se preocupavam com a
consolidação de políticas públicas de
caráter coletivo que visassem à
estruturação de uma educação dos
camponeses e não apenas para os
camponeses.
Situamos nosso estudo sobre o
pressuposto de que a Educação do Campo,
em permanente construção, visa ao
reconhecimento das necessidades, das
capacidades e dos interesses da população
que vive, trabalha e sobrevive do e no
campo. Desse modo, evidencia-se a
necessidade de pensar alternativas
educativas que correspondam às suas
demandas. Uma das práticas educativas
que se destaca nos estudos sobre Educação
do Campo é a Alternância, caracterizando-
se como uma organização que permite a
vivência dos sujeitos intercalando tempos
formativos entre a escola e a comunidade,
podendo ser utilizada como uma pedagogia
em si ou como uma forma de organização
metodológica.
Assim, neste artigo tem-se o objetivo
de analisar o contexto abrangente, histórico
e social da Educação do Campo e
compreender as possibilidades da
Alternância como prática educativa, para
então investigar as especificidades do
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Instituto Educar. Para tal, abordamos
inicialmente o contexto mais amplo da
Educação do Campo e da Pedagogia da
Alternância para, posteriormente, chegar
aos fundamentos específicos do Instituto
Educar, realizando uma inserção
exploratória com vistas a analisar a
construção cultural e histórica implicada
no desenvolvimento dos processos
educativos.
Da Educação Rural à Educação do
Campo: um histórico de lutas
Segundo Caldart (2002), a Educação
do Campo deve ser compreendida
mediante um olhar voltado às construções
elaboradas ao longo dos anos por
movimentos que lutam pela garantia dos
direitos da população do campo. Como
traço marcante, é possível identificar a luta
constante para que o ensino seja entendido
em dupla acepção, no e do campo: “No: o
povo tem direito de ser educado no lugar
onde vive. Do: o povo tem direito a uma
educação pensada desde seu lugar e com a
sua participação, vinculada à cultura e às
suas necessidades humanas e sociais”
(Caldart, 2002, p. 18).
Segundo informações documentadas
pela Secretaria de Educação Continuada,
Alfabetização, Diversidade e Inclusão
(Secadi), no caderno temático sobre a
Educação do Campo publicado pelo
Ministério da Educação (Brasil, 2007),
desde a colonização do Brasil os
trabalhadores rurais foram explorados e
impedidos de acessar as mesmas condições
que os conterrâneos do meio urbano, o que
gerou
um forte preconceito em relação aos
povos que vivem e trabalham no
campo, bem como uma enorme
dívida social. Ao mesmo tempo, a
suposição de que o conhecimento
“universal”, produzido pelo mundo
dito civilizado deveria ser estendido -
ou imposto - a todos, de acordo com
a “capacidade” de cada um, serviu
para escamotear o direito a uma
educação contextualizada, promotora
do acesso à cidadania e aos bens
econômicos e sociais, que respeitasse
os modos de viver, pensar e produzir
dos diferentes povos do campo. Ao
invés disso, se ofereceu, a uma
pequena parcela da população rural,
uma educação instrumental, reduzida
ao atendimento de necessidades
educacionais elementares e ao
treinamento de mão de obra (Brasil,
2007, p. 10).
O referido caderno temático revela
que durante anos a preocupação
educacional do país priorizou a elite
brasileira que, frente ao crescimento das
favelas na periferia urbana, percebia a
educação rural como meio de conter o
fluxo de migração do campo para a cidade.
Em 1961, a Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (Lei nº. 4.024/61)
afirma esse caráter instrumentalista e de
ordenamento social, adotando a Educação
Rural como forma de favorecer a
adaptação do sujeito ao seu meio para,
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assim, manter a população do campo na
zona rural (Brasil, 2007).
Buscando a participação das camadas
populares, houve a mobilização de
educadores, religiosos e de alguns partidos
políticos para a organização de um
movimento de educação popular que
reivindicava a construção de uma educação
voltada às necessidades e particularidades
culturais dos povos do campo. No contexto
de luta pelo fim da ditadura civil-militar, as
organizações ligadas à educação popular,
na década de 1980, incluíam a Educação
do Campo como tema estratégico para a
redemocratização do país. As organizações
sociais aliam-se a organizações
comunitárias do campo, a sindicatos de
trabalhadores rurais, a partidos políticos de
esquerda e a educadores resistentes à
ditadura militar.
Ganham destaque, na luta por um
sistema público de ensino para o campo, as
ações educativas do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST),
da Comissão Pastoral da Terra (CPT), do
Movimento de Educação de Base (MEB) e
da Confederação Nacional dos
Trabalhadores na Agricultura (Contag). Ao
mesmo tempo, para agregar força às
mobilizações, emergem, inspiradas em
modelos franceses, as Escolas Famílias
Agrícolas (EFA) e as Casas Familiares
Rurais (CFR), instituições que
preconizavam uma proposta pedagógica
para a educação no meio rural a partir da
Pedagogia da Alternância, que
possibilitasse aos educandos a divisão
sistemática do tempo de formação entre o
campo e a escola (Brasil, 2007).
No ano de 1988 é promulgada a nova
Constituição da República Federativa do
Brasil, que reafirma o Estado Democrático
e assegura o compromisso da União em
promover a educação para todos, com
respeito às diferenças culturais e regionais.
Em dezembro de 1996 se estabelece a nova
Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (Lei nº. 9.394/96), que propõe
diretrizes e bases comuns de ensino para
todas as regiões, adequando a educação às
diferenças regionais e rurais (Brasil, 1996).
Essa Lei é considerada um marco que
insere a Educação do Campo na política
educacional.
As lutas pela democratização do
ensino no meio rural são fortemente
protagonizadas pelos militantes da reforma
agrária. O conceito inicialmente foi
explorado como Educação Básica do
Campo em discussões nacionais que
partiram das mobilizações realizadas pelo
MST. Com o pressuposto de construção de
uma escola voltada para a realidade dos
trabalhadores rurais, o referido Movimento
vem, décadas, lutando por políticas
públicas em instâncias locais, estaduais e
nacionais que correspondam às suas
necessidades.
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Um marco histórico representativo
dessa luta pela educação situa-se no ano de
1997, quando o MST em parceria com a
Universidade de Brasília (UnB), com o
Fundo das Nações Unidas para a Infância
(Unicef), com a Organização das Nações
Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura (Unesco) e com a Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB),
organizou o primeiro Encontro Nacional de
Educadoras e Educadores da Reforma
Agrária (Enera). Nesse encontro, os
debates visavam às experiências educativas
do MST, assim, as discussões pautaram-se
pela construção de uma proposta que
atendesse às especificidades dos sujeitos
do campo, ficando explícita, pela
perspectiva dos participantes, a
insuficiência da oferta educacional para
esses povos (Santos, Molina & Jesus,
2010).
O primeiro Enera consolidou um
grupo representativo para tomar frente no
processo de construção de um projeto
educacional que considerasse a perspectiva
dos trabalhadores do campo. Herdeiro
desse encontro é criado no ano de 1998 o
Programa Nacional de Educação na
Reforma Agrária (Pronera), que se
constituiu como uma política pública de
Educação do Campo, instituída no âmbito
do Ministério do Desenvolvimento Agrário
(MDA) e executada a partir do ano de
2001 pelo Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária (Incra)
(Santos, Molina & Jesus, 2010).
No ano de 2001 é aprovado pelo
Conselho Nacional de Educação (CNE) o
Parecer 36/2001 que, ao se referir à Lei
de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (Lei 9.394/96), propõe medidas
de adequação dos sistemas da escola à vida
no campo. As condições apresentadas
nesse parecer revelam as percepções
históricas que circundam a utilização do
termo Educação Rural, deixando explícita
a concepção de Educação do Campo que,
mesmo
tratada como educação rural na
legislação brasileira, tem um
significado que incorpora os espaços
da floresta, da pecuária, das minas e
da agricultura, mas os ultrapassa ao
acolher em si os espaços pesqueiros,
caiçaras, ribeirinhos e extrativistas. O
campo, nesse sentido, mais do que
um perímetro não-urbano, é um
campo de possibilidades que
dinamizam a ligação dos seres
humanos com a própria produção das
condições da existência social e com
as realizações da sociedade humana
(Brasil, 2001, p. 01).
Esse parecer provocou a
incorporação de argumentos que
contemplam a mudança do termo
Educação Básica do Campo para Educação
do Campo, visto que o direito à educação
abrange desde a educação infantil até o
ensino superior (Caldart, 2013). No ano de
2003, o Ministério da Educação criou,
através da Portaria nº 137 de 03 de junho, o
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Grupo Permanente de Trabalho (GPT) de
Educação do Campo. O GPT, no ano de
2004, publicou um caderno intitulado
Referências para uma Política Nacional de
Educação do Campo, com o objetivo de
expandir as discussões no âmbito político e
social “com vistas à formulação e
implementação de políticas de educação e
de desenvolvimento sustentável do campo”
(Brasil, 2004, p. 5).
Em 2004 também é criada, no âmbito
do Ministério da Educação, a Secadi
i
,
vinculando uma coordenação de Educação
do Campo. No mesmo ano destaca-se,
ainda, a realização da II Conferência
Nacional por uma Educação do Campo,
com o lema “Educação do Campo: direito
nosso, dever do Estado!” Caldart (2013)
ressalta que o encontro contou com um
número expressivo de participantes das
mais diversas instituições e proporcionou
momentos de explanação de projetos e a
organização de entidades para integrar a
Articulação Nacional por uma Educação
do Campo.
No ano de 2007, a Secadi/MEC
publicou um caderno temático que
descreve a trajetória da Educação do
Campo destacando, naquele momento, a
primazia pela inclusão social e pela
diversidade. Os escritos enfatizam que o
ensino para a população camponesa
deveria abranger as diferenças culturais e
sociais e não apenas geográficas, um
pensamento que reflete um histórico de
lutas sociais pelos direitos da população
campesina (Brasil, 2007).
Em 2010 é criado o Fórum Nacional
de Educação do Campo (Fonec), com o
objetivo de exercer
análise crítica constante, severa e
independente acerca de políticas
públicas de Educação do Campo;
bem como a correspondente ação
política com vistas à implantação, à
consolidação e, mesmo, à elaboração
de proposições de políticas públicas
de Educação do Campo (Fonec,
2010, p. 1).
No mesmo ano é estabelecido o
Decreto 7.352/2010, que dispõe sobre a
política de Educação do Campo e o
Pronera. Efetiva-se, nesse momento, o
comprometimento da União, em
colaboração com os estados e municípios,
com o desenvolvimento de um regime de
ampliação e qualificação da educação
básica e superior às populações do campo
de acordo com o Plano Nacional de
Educação (PNE 2001-2010) (Brasil, 2010).
O Pronera tem o objetivo de
fortalecer a educação na reforma agrária,
desenvolvendo projetos educacionais com
metodologias voltadas à população do
campo, tendo como princípios a promoção
do desenvolvimento e a ampliação das
condições democráticas a esses cidadãos
(Santos, Molina & Jesus, 2010). O público
alvo dos programas é composto por jovens
e adultos dos projetos de assentamentos
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criados pelo Incra. Conforme dados
disponibilizados por essa instituição
ii
, até
maio de 2016 o Pronera contava com
167.648 mil alunos atendidos pela
Educação de Jovens e Adultos (EJA),
9.116 alunos formados em nível médio,
5.347 alunos graduados em nível superior,
1.765 alunos especialistas em nível de pós-
graduação e 1.527 alunos em Residência
Agrária Nacional (Incra, 2016).
A atuação do Pronera se efetiva por
meio de parcerias das instituições públicas
de ensino, das instituições comunitárias
sem fins lucrativos e dos governos
estaduais e municipais com os movimentos
sociais e sindicais de trabalhadores e
trabalhadoras rurais. Em decorrência de
uma dessas parcerias, no ano de 2005 se
consolida a criação do Instituto Educar,
uma escola do campo fruto da conquista
dos Trabalhadores Rurais Sem Terra,
durante uma caminhada de luta pela
reforma agrária, priorizando as mudanças
estruturais na organização e nas relações
sociais no campo.
De acordo com Caldart (2002), a
Educação do Campo prioriza a diversidade
humana em suas dimensões histórica,
política e social, concebendo o sujeito
como protagonista de sua formação. A
escola, nessa perspectiva, é objeto central
de constantes reflexões, tendo os
educadores papel fundamental na
formulação pedagógica. Conforme o
Decreto 7.352/10, são princípios da
Educação do Campo:
I - respeito à diversidade do campo
em seus aspectos sociais, culturais,
ambientais, políticos, econômicos, de
gênero, geracional e de raça e etnia;
II - incentivo à formulação de
projetos político-pedagógicos
específicos para as escolas do campo,
estimulando o desenvolvimento das
unidades escolares como espaços
públicos de investigação e
articulação de experiências e estudos
direcionados para o desenvolvimento
social, economicamente justo e
ambientalmente sustentável, em
articulação com o mundo do
trabalho;
III - desenvolvimento de políticas de
formação de profissionais da
educação para o atendimento da
especificidade das escolas do campo,
considerando-se as condições
concretas da produção e reprodução
social da vida no campo;
IV - valorização da identidade da
escola do campo por meio de
projetos pedagógicos com conteúdos
curriculares e metodologias
adequadas às reais necessidades dos
alunos do campo, bem como
flexibilidade na organização escolar,
incluindo adequação do calendário
escolar às fases do ciclo agrícola e às
condições climáticas;
V - controle social da qualidade da
educação escolar, mediante a efetiva
participação da comunidade e dos
movimentos sociais do campo
(Brasil, 2010, s/p).
Uma educação que se compromete
com a população do campo empenha-se
em fomentar discussões sobre aspectos
trabalhistas e aspectos educacionais, cujo
entendimento não se restringe ao entorno
de uma qualificação para o mercado de
trabalho, mas sim, da preparação ampla
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para a vida. O compromisso é pensar o
trabalho como locus de formação humana,
tendo em vista o educando em interação
com as relações sociais, culturais e
políticas. Trata-se de construir um
processo de formação que não esteja em
consonância apenas com os interesses
capitalistas, mas que seja próximo da
realidade das camadas populares
trabalhadoras do campo (Menezes & Neto,
2009).
A questão pedagógica que se coloca
para a Educação do Campo tenciona a
recuperação do vínculo entre formação
humana e produção material da existência
(Caldart, 2013). Nesse sentido, a
intencionalidade educativa enfatiza
padrões de relações sociais que não
excluem os povos do campo, mas que lhes
garante o direito de pensar a pedagogia
partindo das particularidades de seu
contexto. Caldart (2013) salienta que
pensar os vínculos diante de uma realidade
específica é uma contribuição original da
Educação do Campo, é analisar a relação
“com a produção na especificidade da
agricultura camponesa, da agroecologia; o
trabalho coletivo... Vida humana misturada
com terra... Ciência, tecnologia, cultura,
arte potencializadas como ferramentas de
superação da alienação” (Caldart, 2013, p.
262).
Para a efetivação dos princípios
pedagógicos da Educação do Campo,
algumas experiências vêm sendo
efetivadas e se constroem percorrendo a
mesma caminhada de luta por uma
educação que considere as particularidades
da população camponesa. Destacam-se,
nesse sentido, as seguintes organizações:
as escolas localizadas em assentamentos da
reforma agrária, que se pautam nos estudos
do MST, as CFR e as EFA, que seguem os
princípios europeus da Pedagogia da
Alternância.
A Pedagogia da Alternância como uma
modalidade à Educação do Campo
As primeiras discussões da
Alternância como prática educativa no
mundo emergiram no ano de 1935, na
região Sudeste da França (Estevam, 2001;
Begnami, 2003; Gimonet, 2007; Sobreira
& Silva, 2014). Nos anos de 1930 a Europa
transitava por um contexto trágico, entre as
duas guerras mundiais, e a França, nesse
cenário, buscava sua reconstrução diante
das grandes perdas que levaram à
destruição social e econômica do país. Um
dos setores da economia francesa mais
afetados foi a agricultura que, em
decorrência disso, sofreu com o
desinteresse do Estado, vivendo um
período de grandes dificuldades. Além
desses problemas, o sistema de educação
na França estava direcionado aos contextos
urbanos e o ensino para a população rural
se tornava inacessível. Os indivíduos que
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desejavam estudar precisavam abandonar
suas casas e, tendo em vista que a
sobrevivência das famílias dependia da
agricultura, mudar-se para a cidade
significava a perda de uma mão de obra
fundamental (Estevam, 2001).
Begnami (2003) refere que na França
pós Primeira Guerra Mundial enfrentava-se
um grave êxodo rural, os jovens que
escolhiam ficar no campo não possuíam
formação adequada e aqueles que optavam
por estudar deixavam suas propriedades
para morar nas cidades. O sistema
educacional da França não estava
acolhendo as necessidades do meio rural,
razão pela qual moradores rurais franceses,
insatisfeitos com essa situação, se uniram e
iniciaram um movimento em busca de uma
educação que considerasse os ideais do
campo.
O agricultor Jean Peyrat foi um dos
pioneiros na luta camponesa na França
que, depois de se decepcionar ao ver seu
filho Ives abandonar os estudos ao não se
adaptar à escola urbana optando apenas
pelo trabalho no campo, procura o Padre
Granereau, amigo de movimento social,
para expor suas angústias diante da
situação dos povos rurais. Ambos, o
agricultor e o padre, passam a reunir os
povos rurais difundindo uma idealização
de escola alternativa do campo. Os
pioneiros rapidamente ganharam a adesão
do povo, que se juntou na luta por uma
formação integral, humanista e profissional
direcionada ao campo (Begnami, 2003).
O grupo de agricultores franceses
buscava uma educação organizada, que
atendesse às especificidades dos jovens,
com vistas a uma formação que dialogasse
com os preceitos agrícolas fundamentais
para o desenvolvimento de sua região.
Iniciaram com uma experiência organizada
pelo Padre Granereau, que cedeu um
espaço da própria paróquia para as aulas e
assumiu a responsabilidade de ser o
primeiro monitor. A experiência foi
alcançando resultados significativos, de
modo que alunos, famílias e comunidade
assumiram juntos a tarefa de fortalecer
esse processo. No ano de 1937 essa
experiência se oficializou e as famílias
criaram uma associação. Em 1941
adotaram um estatuto independente e
institucionalizaram a primeira Associação
Maison Familiale de Lauzun (Casa
Familiar de Lauzun). Os resultados
positivos começaram a ganhar força e a se
multiplicar em âmbito nacional, passando a
se denominar Maison Familiale Rurale
(Casa Familiar Rural) os lugares dedicados
ao ensino desses povos (Begnami, 2003).
Diante da necessidade de formação
dos jovens agricultores, as Maisons
francesas buscavam ações educativas que
preparassem para uma formação geral e
técnica, cujo objetivo maior girava em
torno da transformação de sua realidade na
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busca constante de interação entre ação e
reflexão. Decorre, a partir desse momento
histórico, um longo processo de progressos
e retrocessos, uma caminhada de superação
que nunca se findou, mas que, baseada em
atender às necessidades do povo rural, se
reconstruiu conforme as exigências da
sociedade.
É importante ressaltarmos que a
construção pedagógica da Alternância não
se baseou em métodos ou teorias
concretizadas, mas, sobretudo pautou-se
nos interesses dos agricultores e foi se
constituindo conforme os resultados das
primeiras experiências. Assim, foi um
processo mediante o qual os alunos,
famílias e comunidades foram porta-vozes
que
perceberam, escutaram e se
conscientizaram dos problemas, das
necessidades. Questionaram-se,
formularam hipóteses e têm
enunciado soluções ... inventaram,
realizaram, agiram, implementaram,
arriscaram. Uma vez engajada na
ação, observaram, escutaram,
olharam as práticas. Analisaram,
destacaram os componentes do
sistema e os fatores de êxito e de
fracasso ... extraíram ideias,
pensamentos, saberes e
conhecimentos ... para entender
melhor, agir melhor a fim de prestar
um serviço educativo, responder às
necessidades, contribuir para o
desenvolvimento das pessoas e do
meio rural (Gimonet, 2007, p. 27).
Dessa forma, a experiência
pedagógica alternante foi aos poucos
logrando êxitos e se multiplicando pelo
mundo. No caso do Brasil, a Pedagogia da
Alternância surgiu no ano de 1969, no
Espírito Santo e, após essa data, percorreu
um longo caminho até ser reconhecida e
efetivada em diversas experiências
educativas do campo. Esse primeiro
movimento foi influenciado por um padre
vindo da Itália para atuar em uma região
ocupada por descendentes italianos, ao
perceber que essa região poderia se adaptar
a um projeto italiano de seu conhecimento
denominado EFA. Em discussão com a
comunidade, inauguraram no ano de 1968
a primeira EFA do Brasil, no mesmo ano
em que foi criado o Movimento de
Educação Promocional do Espírito Santo
(Mepes), para representar os agricultores
com ações na área da educação, saúde e
ação comunitária. As primeiras
experiências educacionais iniciaram, como
dito, no ano de 1969 e se expandiram
para outros estados, o que possibilitou a
criação da União Nacional das Escolas
Famílias Agrícolas do Brasil (Unefab), que
passou a coordenar as atividades,
defendendo os interesses dos agricultores
(Estevam, 2001).
O sistema adotado pelas EFA
brasileiras manteve o regime de
alternância, caracterizado por uma semana
na escola e uma semana na propriedade,
para os estudantes do ensino fundamental;
e de 15 dias na escola e 15 dias na
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propriedade, para os estudantes do ensino
médio. O principal objetivo das EFA era
de atuar sobre os interesses do homem do
campo e, visto que no momento de sua
consolidação o estado do Espírito Santo
passava por uma crise econômica e social,
buscar uma elevação cultural, social e
econômica do seu povo (Estevam, 2001).
Nos anos de 1980 surge no Brasil
uma segunda experiência, desvinculada das
EFA, que visava à implementação das CFR
na região Nordeste. Esse movimento
contou com influência direta das Maisons
francesas que se voltaram primeiramente a
essa região devido ao momento
educacional que estava vivenciando com o
desenvolvimento de programas realizados
pela Superintendência do Desenvolvimento
do Nordeste (Sudene). No Sul do Brasil, o
processo de implantação das CFR iniciou
no Paraná no ano de 1987 e contou com
um expressivo apoio do governo
paranaense. A institucionalização do
projeto permitiu sua rápida expansão aos
outros estados do Sul e culminou na
criação da Associação Regional das Casas
Familiares Rurais do Sul do Brasil
(Arcafar-Sul), que passou a coordenar os
projetos das CFR (Estevam, 2001).
No Rio Grande do Sul, a primeira
experiência que adotou a Pedagogia da
Alternância como proposta metodológica
ocorreu no norte do estado, mediante a
criação da Casa Familiar Rural Santo
Isidoro (CFRSI), que começou suas
atividades no ano de 2002 no município de
Frederico Westphalen. A CFRSI se
constituiu ligada à Associação Regional
das Casas Familiares Rurais do Rio Grande
do Sul (Arcafar-RS) que é filiada à
Arcafar-Sul. Já, no ano de 2009 foi criada,
no município de Santa Cruz do Sul, a
primeira EFA no Sul do Brasil,
denominada Escola Família Agrícola de
Santa Cruz do Sul (Efasc). Essa se
constituiu ligada à Associação Gaúcha Pró-
Escolas Famílias Agrícolas (Agefa) que é
filiada à União Nacional das Escolas
Famílias Agrícolas do Brasil (Unefab) e à
Associação Internacional dos Movimentos
Familiares de Formação Rural (AIMFR).
Aos poucos, as experiências em
alternância foram sendo divulgadas por
todo o país e ganharam ampla adesão dos
movimentos sociais que lutavam pelo
direito dos pequenos agricultores, tendo o
MST como um forte precursor na luta pela
educação campesina. No processo de sua
construção pedagógica constituíram a
chamada Pedagogia do Movimento, que
tem como um de seus pilares de
sustentação a Alternância. Inspirado nas
experiências produzidas em escolas do
campo, o MST incorpora como preceito
fundamental a integração entre escola,
família, sujeito e comunidade (Kolling,
Vargas & Caldart, 2013).
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A Lei 9.394/96, ao estabelecer as
Diretrizes e Bases da Educação Nacional
aborda, no Artigo 23, a possibilidade de a
educação básica se organizar em ries
anuais, períodos semestrais, ciclos,
alternância regular de períodos de estudos,
grupos não-seriados, com base na idade, na
competência e em outros critérios, ou por
forma diversa de organização” (Brasil,
1996, s/p). Mediante respaldo legal,
diversas experiências vêm sendo
vivenciadas no Brasil com base na
Pedagogia da Alternância. Nelas, busca-se
manter os objetivos fundantes da
Alternância, que visam articular atividades
escolares e práticas, tendo em vista a
proximidade do aluno com o seu contexto.
No momento, pesquisadores e entidades
sugerem a utilização da terminologia
Centros Familiares de Formação por
Alternância (CEFFA) ao se referirem às
instituições do campo que assumem a
Alternância como práxis pedagógica
(Teixeira, Bernartt & Trindade, 2008).
Expomos, a seguir, a caracterização
da Alternância como prática pedagógica,
assim como seus pressupostos, organização
metodológica, finalidades, métodos e
instrumentos educativos. De imediato,
compreende-se que a proposta pedagógica
da Alternância se elabora a partir do
pressuposto ideológico de que a
experiência vivida é fundamental na
formação dos jovens (Gimonet, 2007). Sua
metodologia se organiza de modo que o
educando passe um período de contato
direto com a escola e outro período de
contato direto com sua comunidade. Todas
as atividades são articuladas através de um
Projeto Político-Pedagógico (PPP), que
vincula “comunidade e escola, projetos e
currículo, realidade social e escola”
(Martins, 2008, p. 103). O PPP da escola
do campo é o documento que norteia as
práticas de gestão e as ações pedagógicas,
cuja construção simboliza a identidade da
escola camponesa.
Como metodologia de organização
escolar, a Pedagogia da Alternância
articula momentos de ensino entre
atividades escolares e atividades
socioprofissionais. Para compreender seus
objetivos, as disciplinas escolares
abrangem temáticas voltadas às
necessidades da sociedade, relacionando a
vida coletiva, o meio ambiente, a formação
profissional, social, política e econômica
com disciplinas básicas (Teixeira, Bernartt
& Trindade, 2008). As instituições de
ensino que se organizam segundo o regime
da Alternância buscam introduzir em seu
currículo outros saberes que estejam de
acordo com o contexto em que se insere a
escola, os educandos e a comunidade.
Gimonet (2007, p. 28) destaca como
finalidades básicas da Alternância “a
formação integral da pessoa, a educação e,
de maneira concomitante, a orientação e a
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inserção socioprofissional”,
fundamentalmente comprometidas com o
desenvolvimento da comunidade onde está
inserido o CEFFA. Desse modo, as
práticas pedagógicas se comprometem com
os educandos, oferecendo-lhes subsídios
para que articulem teoria, técnica e prática,
com vistas à sua formação global,
preparando-os para o acesso a programas,
empregos ou para prosseguir nos estudos.
Os princípios norteadores da
alternância pedagógica se comprometem
com a primazia da experiência. Segundo
Gimonet (2007), os saberes devem
percorrer a vida e a escola, articulando-se
entre espaços de formação que ocorrem em
um processo de três tempos: 1) o meio
familiar e profissional, que permite a
socialização e a observação; 2) o CEFFA
que possibilita a formalização e
estruturação dos saberes teóricos e formais;
e, 3) o meio em que serão aplicados os
saberes a partir de experimentações. O
autor destaca, conforme demonstra-se na
Figura 1, que esses três tempos estão
imbricados e sua sequência caracteriza a
unidade de formação da Pedagogia da
Alternância. Desde a chegada ao CEFFA,
o educando transita entre os três tempos,
socializando e investigando no meio
vivencial, formalizando os saberes no
CEFFA e aplicando-os posteriormente,
sendo que esse processo é contínuo e tem
como propósito viabilizar ao educando a
ligação e interação entre os dois espaços, o
meio vivencial e o CEFFA.
Figura 1: Sequência de alternância ou unidade de formação.
Fonte: Adaptado de Gimonet (2007, p. 30).
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Conforme demonstra Gimonet
(2007), o primeiro contato do educando
com o CEFFA ocorre em um momento de
preparação, no qual ele passa dias
vivenciando as rotinas e adaptando-se a
esse novo meio. A fase preparatória visa
apresentar aos sujeitos os princípios, os
objetivos e os fundamentos pedagógicos da
alternância para que, assim, optem
conscientemente sobre sua permanência ou
não nesse processo formativo. Além do
mais, a fase preparatória possibilita uma
aproximação inicial com o CEFFA, dando
início à sequência de alternância entre
momentos no meio vivencial e momentos
no Centro de Formação, intercalando-se as
vivências com as comunidades e com as
famílias. Essas servem, primeiramente,
para investigar e observar os saberes
experienciais que, após as vivências diretas
nos centros de formação, permitem a
estruturação e a formalização dos saberes
teóricos, serve também para a
concretização prática desses saberes.
Seguindo essa concepção, a
articulação da teoria com a prática se
efetiva em espaços que alternam entre a
escola e a propriedade, comunidade,
assentamento, acampamento ou
movimento social a que o educando se
vincula. As atividades devem primar por
uma formação contínua de inter-relação
entre os três tempos - família, instituição e
comunidade -, obedecendo a um princípio
formativo integral do sujeito. Isso, tendo
em vista a exigência profissional, humana
e social. Todos os envolvidos - educandos,
educadores, famílias e comunidade -,
tornam-se co-formadores, de modo que,
mediante os princípios de cooperação e
ação, os saberes são partilhados e o
educando tem autonomia na construção de
sua formação (Gimonet, 2007).
Para Gimonet (1998), a perspectiva
da formação por Alternância eleva o
educando ao centro do debate, sendo
considerado como um adulto alternante,
ator de sua própria formação. Conforme
demonstra-se na Figura 2, o autor destaca
seis componentes que estão em constante
interação com o jovem alternante que
busca envolver-se com o lugar de sua
experiência, com os sistemas de gestão e
operação pedagógicos, com as ões de
formação do projeto educativo, com todos
os parceiros dos tempos de formação e
com a rede de formadores do conjunto.
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Figura 2: Esquema dos componentes em interação na formação por Alternância.
Fonte: Adaptado de Gimonet (1998, p. 2).
Os métodos e os instrumentos
pedagógicos são sistematizados segundo as
condições objetivas encontradas em cada
momento enfrentado pelas instituições e
conforme cada turma de educandos. Com
vistas ao permanente movimento da
formação humana, a metodologia está em
constante construção e faz parte da prática
dos educandos e educadores envolvidos no
processo da Alternância. Tais proposições
evidenciam que a Pedagogia da
Alternância não consiste apenas em um
método pedagógico que alterna Tempo
Escola (TE) e Tempo Comunidade (TC).
Essa é uma condição necessária para a
efetivação desse método, mas não a única.
Sua metodologia de organização enfatiza o
processo de aprendizagem centrado no
educando em ação e em interação com sua
família, sua comunidade e a instituição
formadora.
Os estudos apresentados por
Gimonet (1998; 2007) destacam a
Pedagogia da Alternância como um
construto pedagógico completo,
identificando suas finalidades, objetivos e
instrumentos. Essa arquitetura pedagógica
é encontrada nos CEFFA, que seguem as
definições e propostas do método. No
entanto, atualmente, os princípios da
Alternância como prática educativa podem
ser encontrados não apenas no sentido de
uma pedagogia em si, mas também como
um modelo organizativo em interlocução
com outras metodologias.
Sobreira e Silva (2014) destacam que
além das experiências encontradas nas
Escolas Famílias Agrícolas (EFA) e nas
Casas Familiares Rurais (CFR), existe no
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Brasil uma expansão de práticas
alternantes, que pode ser percebida em
programas governamentais como o
Programa ProJovem Campo Saberes da
Terra, desenvolvido no âmbito do
Ministério da Educação e o Programa
Residência Agrária, desenvolvido no
âmbito do Ministério do Desenvolvimento
Agrário, e, também, em Cursos ligados à
Via Campesina oferecidos pela Fundação
de Desenvolvimento da Pesquisa (Fundep)
ou pelo Instituto Técnico de Capacitação e
Pesquisa da Reforma Agrária (Iterra).
Estas práticas conjugam tempo escola e
tempo comunidade e se consolidam na
interação entre teoria e prática, experiência
e reflexão.
Assim, por ser uma metodologia que
permite o acesso e a permanência da
população do e no campo, a Pedagogia da
Alternância atualmente no Brasil é
assumida pela Educação do Campo e está
inserida em diversos programas e projetos
educacionais, sendo adotada por políticas
setoriais, como as defendidas pelo
Ministério do Desenvolvimento Agrário
(MDA), mediante o Programa Nacional de
Educação na Reforma Agrária (Pronera).
Além disso, de acordo com Hage et al.
(2011), o Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra (MST) tem
fundamentado suas propostas educacionais
utilizando princípios da Pedagogia da
Alternância, como é o caso das escolas
localizadas em assentamentos da reforma
agrária, que seguem os princípios
educativos pautados pelo MST.
Após o reconhecimento de algumas
especificidades da Pedagogia da
Alternância, verificando sua construção
histórica e social, prosseguimos o estudo
com vistas a compreender a Alternância
como uma organização metodológica
educativa. Levando em consideração que
nosso campo investigativo é uma escola
localizada em um assentamento da reforma
agrária, o Instituto Educar, se faz
necessário identificar como a prática
alternante se efetiva nesse espaço.
Salientamos, todavia, que as práticas
alternantes, mesmo não se solidificando
como uma pedagogia, buscam manter o
objetivo norteador da mesma,
proporcionando, assim, aos povos do
campo, uma educação que condiz com suas
necessidades, possibilitando ao sujeito
estudante um contato direto com o seu
meio.
O Instituto Educar: uma conquista dos
trabalhadores rurais
O processo de constituição do
Instituto Educar se efetivou diante de um
contexto histórico de ocupações, embates,
lutas e conquistas resultantes dos conflitos
por terra enfrentados por trabalhadores
rurais. O Instituto Educar está localizado
em um assentamento no norte do estado do
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Rio Grande do Sul, fazendo parte de uma
rota de luta pela terra que se situa próxima
aos municípios de Pontão, Ronda Alta e
Sarandi.
Segundo Benincá (2016), foi nessa
região altamente agrícola que em 1981
surgiu o acampamento dos “Sem-Terra”,
com mais de 600 famílias alojadas ao
longo da estrada, provindas de diversos
municípios da região, descendentes de
imigrantes europeus e de caboclos. A
região ficou reconhecida pela expressão
das lutas de classe, quando os povos
atingidos pela ação dos acampamentos,
“conseguiram operar a transformação de
sua concepção de mundo, depositaram sua
noutra filosofia de ação: a filosofia de
transformação da atual estrutura social
(Benincá, 2016, p. 200).
Após anos, uma das consequências
da luta consciente dos pequenos
agricultores nessa região foi à criação do
Instituto Educar. Fundado no mês de
janeiro de 2005, esse educandário se
estabeleceu mediante uma parceria com o
Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia do Rio Grande do Sul (IFRS-
Campus Sertão) e o Pronera, e vem
atuando mais de dez anos na formação
de jovens e adultos que pertencem a
acampamentos, assentamentos,
reassentamentos e movimentos sociais de
diversas partes do país.
Segundo consta no PPP (Instituto
Educar, 2012), o Instituto Educar se
compromete com a formação profissional
do homem do campo, com a preservação
do meio ambiente e com o
desenvolvimento sustentável dos
assentamentos, pautando-se nos seguintes
objetivos:
a) Promover a ação de capacitação de
agricultores assentados e acampados
nas áreas de Reforma Agrária e de
pequenos agricultores, nas mais
diversas áreas do conhecimento
técnico-científico.
b) Propiciar o acesso à escolarização
em todos os níveis, elevando o grau
de escolarização dos povos do
campo.
c) Estimular desenvolvimento rural e
a melhoria de vida do homem e da
mulher do campo, da infância a
velhice e de suas comunidades.
d) Atuar na defesa, prevenção e
conservação do meio ambiente,
incentivar a agroecologia e promover
a visão sistêmica da produção e o
desenvolvimento sustentável.
e) Apoiar iniciativas relacionadas
com a promoção da reforma Agrária,
de um projeto popular de
desenvolvimento do campo de um
modelo de agricultura que garanta a
soberania alimentar e a vida do povo
no e do campo.
f) Formar agricultores, com
especialização técnica em
agroecologia, que contribuam para a
organização de base dos
trabalhadores e a ampliação de um
novo modelo de agricultura de
desenvolvimento para o campo
brasileiro, em vista da manutenção
do homem e mulher do campo e sua
qualidade de vida (Instituto Educar,
2012, p. 8).
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O Instituto Educar oferece
atualmente dois cursos, sendo um de nível
médio, o Curso Técnico em Agropecuária
com Ênfase em Agroecologia Integrado ao
Ensino Médio, em parceria com o IFRS,
campus Sertão e com o Pronera, e outro,
em nível pós-médio, o Curso Superior em
Agronomia com Ênfase em Agroecologia,
em parceria com a Universidade Federal da
Fronteira Sul e o Pronera.
O Instituto Educar segue
metodologias específicas que podem ser
articuladas de acordo com as demandas
locais, procurando sintonizar as práticas
pedagógicas com os movimentos sociais
representados pelos educandos e suas
famílias. Por isso, descrever sua
metodologia pautando-se apenas em uma
forma peculiar de pedagogia se torna
inviável, devido às diversas articulações
existentes para mobilizar uma formação
participativa, de acordo com as
especificidades de cada sujeito que passa
por esse ambiente.
Tendo em vista que o método
pedagógico do Instituto não é
dogmatizado, pois continua em permanente
mudança seguindo as transições de
pessoal, políticas e sociais, estabelecemos
um vínculo com a equipe pedagógica e de
coordenação que nos apoiou para a
descrição da metodologia que se constitui,
neste momento, como guia das práticas
pedagógicas estabelecidas.
Segundo os colaboradores com quem
travamos esse diálogo inicial, o Instituto
Educar foi uma conquista dos
trabalhadores rurais que buscavam uma
educação digna a seus povos. Como um
feito recente, que completou apenas doze
anos em 2017, as diretrizes organizativas
do Instituto Educar se apoiaram em
experiências de outras escolas
estabelecidas mais tempo, que
demonstravam frutos significativos nos
assentamentos. Segundo a manifestação de
um colaborador, todos os sujeitos
envolvidos com o Instituto Educar são
multiplicadores capazes de contribuir com
o processo de formação dos membros do
coletivo. Ainda, destaca que as ações
realizadas nesse contexto são avaliadas em
reuniões semanais, sendo que
quinzenalmente ocorre o que denominam
leitura do processo, que são encontros de
coordenadores pedagógicos e de turma,
organizados para refletir sobre os
processos metodológicos realizados no
Instituto Educar.
A inserção exploratória no campo
investigado nos proporcionou uma
percepção sobre as singularidades
educativas propostas pelo Instituto Educar.
Constatamos, de fato, que as metodologias
adotadas na instituição não são cópias de
manuais e, tampouco estão fielmente
descritas em livros e periódicos. O Instituto
Educar se organiza em instâncias
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representativas, como uma forma
estratégica de manter a dinâmica e o
funcionamento da Escola. Educandos,
educadores, funcionários e todos que
convivem nesse ambiente são inseridos em
algum núcleo, respondem e se articulam
nessa coletividade. A coletividade primária
é denominada de Núcleo de Base (NB),
que assume a função de “ser a instância de
base do processo de gestão (da escola e do
MST), fazer a formação político-
ideológica, implementar as tarefas
determinadas pelas coletividades maiores”
(Iterra, 2004, p. 46). A divisão dos núcleos
busca integrar todos os educandos, para
isso são cumpridos alguns critérios como:
cada NB deve contar com a participação de
uma representatividade feminina; os
educandos oriundos da mesma localidade
são distribuídos em diferentes núcleos; os
educandos de um mesmo movimento são
divididos para que cada núcleo conte com
uma representatividade quando possível.
O Instituto Educar defende uma
metodologia pensada pela coletividade, por
acreditar em uma educação para todos e
todas, uma educação das pessoas inseridas
em um conjunto maior. Os processos
educativos do Instituto Educar são
realizados pelos sujeitos que fazem parte
desse coletivo. Nesse contexto, a
organização ocorre mediante um regime de
alternância, no qual cada turma percorre
um ritmo intercalando períodos entre TE,
de permanência e maior influência da
escola e TC, de permanência e maior
influência da comunidade.
O TE ocorre no Instituto Educar e
constitui-se de momentos em que os alunos
têm aulas práticas e teóricas, oficinas,
atividades de campo, capacitações
técnicas, dentre outras ocupações. A
recorrência dos dias é determinada
conforme cada turma, normalmente, são 90
dias consecutivos em que os alunos
vivenciam diariamente processos coletivos
de ensino. Nesse período os alunos ficam
alojados na escola, divididos em quartos
femininos e masculinos e assumem total
responsabilidade pela organização do
ambiente. As atividades são mantidas
diante de uma disciplina organizativa em
que cada educando fica responsável, junto
com o seu coletivo, por manter a ordem de
determinado setor.
Durante o TE, os horários são
definidos semanalmente, podendo ocorrer
aula nos três turnos e também nos finais de
semana. Não uma carga diária pré-
estabelecida, os dias se efetivam no
decorrer de tempos educativos, que são
momentos onde os alunos se dedicam a
determinadas tarefas. Os tempos
educativos visam à organização e à auto-
organização dos educandos, como forma
de alcançar os objetivos almejados.
Podemos descrever os seguintes tempos
para esse período: tempo aula, tempo
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trabalho, tempo formatura (para turmas
finalistas), tempo oficina, tempo leitura,
tempo estudo, tempo cultura, tempo
notícias, tempo reflexão escrita, tempo
educação física, tempo núcleo de base
(NB), tempo verificação de leitura (VL)
(Iterra, 2004).
Normalmente, o dia inicia com o
café da manhã às 6h30min, sendo que até
às 7h30min deve ocorrer a limpeza do
refeitório, a organização dos quartos e a
higiene pessoal. Às 7h40min começa a
motivação, momento no qual todos os
alunos se encontram para iniciar o dia
cantando o hino do MST, com palavras de
ordem e com a stica, em que alguns
alunos (cada dia um grupo diferente) ficam
responsáveis por realizar uma reflexão,
podendo ser sobre questões políticas,
sociais ou culturais atuais, em memória a
grandes personagens, ou de alerta a
situações de indisciplina. Também nesse
momento são referidos em voz alta os
acontecimentos do dia anterior e as
principais notícias. As aulas iniciam às 8h
e se estendem até às 12h, retornando das
14h às 17h, com intervalos para almoço e
lanches. Podem ser intercalados com o
tempo aula, tempos educativos de leitura,
oficina e estudo.
Como uma continuidade do TE
ocorre o TC, período em que os alunos
retornam aos seus assentamentos ou aos
seus movimentos para não se distanciar
dos vínculos com a comunidade. Da
mesma forma que o TE, o TC ocorre em
um período consecutivo, normalmente de
90 dias, em que o educando vai
experimentar, socializar, pesquisar e
exercitar a liderança. Em cada TC o
Instituto Educar orienta atividades
específicas a serem realizadas, que visam
dar continuidade ao processo formativo de
cada educando. Os tempos educativos no
TC dividem-se em: tempo trabalho, tempo
leitura e estudo, tempo formatura, tempo
NB, tempo reflexão escrita, tempo notícias
e tempo cultura. Nesse momento as
maiores influências são dos familiares e
dos movimentos sociais.
O Instituto Educar estabelece, para
cada etapa, algumas “situações de
aprendizagem” a serem desenvolvidas no
decorrer do curso, são outras
possibilidades, além dos tempos
educativos, que devem ser organizadas,
planejadas e preparadas em conjunto. São
consideradas situações de aprendizagem:
seminário de crítica e autocrítica, trabalho
voluntário, contribuição ao Instituto,
participação em eventos, viagens de estudo
ou visitas educativas, semana dos
clássicos, seminários, mostra cultural. As
situações de aprendizagem contemplam os
objetivos e as demandas de cada turma, e
se efetivam ao cumprir uma
intencionalidade pedagógica que leve em
conta o processo educativo em andamento.
Bonavigo, L., & Caimi, F. E. (2018). A Pedagogia da Alternância no contexto da Educação do Campo: a experiência do Instituto
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Diante do exposto, podemos
perceber que o princípio educativo do
Instituto Educar compreende o educando
como um sujeito que protagoniza o seu
processo formativo. A alternância, os
tempos educativos e as situações de
aprendizagem, atuam como pilares
metodológicos que contribuem para que o
educando exerça esse protagonismo em
seus processos de aprendizagem.
Considerações Finais
Com base na investigação teórica
realizada, identificamos que a Educação do
Campo se efetiva mediante lutas sociais
que buscam os direitos da população do
campo e se consolida como uma educação
que prioriza a diversidade humana em suas
dimensões histórica, política e social ao
conceber o sujeito como protagonista
principal de sua formação. A Pedagogia da
Alternância, por sua vez, se estrutura a
partir das necessidades dos agricultores
como uma prática educativa que busca
atender às peculiaridades e demandas do
povo rural. Atualmente, a Pedagogia da
Alternância é uma modalidade à Educação
do Campo e pode ser utilizada como uma
pedagogia em si ou como uma forma de
organização metodológica.
Em nossa inserção exploratória
constatamos que no Instituto Educar
uma organização metodológica alternante,
que segue o regime da alternância entre
Tempo Escola e Tempo Comunidade e que
prioriza a educação das pessoas inseridas
em uma coletividade. Os processos
educativos do Instituto Educar são
realizados pelos sujeitos que ali vivenciam
e seguem o princípio que compreende o
educando como um sujeito que protagoniza
o seu processo formativo.
O Instituto Educar assim como a
Educação do Campo se constituiu
historicamente mediante lutas sociais que
priorizavam os direitos da população do
campo e, por esse motivo, pauta uma
formação voltada às dimensões histórica,
política e social, na qual o sujeito é visto
como o protagonista de sua formação.
Nesse sentido, a Alternância é utilizada
como uma forma de organização
metodológica visando à experiência vivida
que articula teoria e prática, escola e
comunidade, possibilitando que os jovens
mantenham o vínculo com o campo e,
fundamentalmente, apliquem seus
conhecimentos teóricos em suas
propriedades.
Reconhecemos que esse cenário de
Educação do Campo, com enfoque para a
organização metodológica alternante, tal
como é desenvolvida no Instituto Educar,
garante aos povos do campo os seus
direitos de vivenciar processos educativos
a partir das particularidades de sua cultura.
Mesmo que a prática alternante vivenciada
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nesse espaço não se constitua como uma
pedagogia em si, mantém o objetivo
norteador da mesma proporcionando,
assim, aos povos do campo, uma educação
que condiz com suas necessidades,
possibilitando ao estudante um contato
direto com o seu meio.
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i
No ano de 2016, em razão de uma reestruturação
ministerial, a Secadi foi extinta, causando
desconforto à comunidade que defende a
representatividade da mesma na educação de
direitos humanos, no âmbito da cidadania, inclusão
e combate às desigualdades.
ii
Esses dados estão disponíveis publicamente no
site do Incra, no item Pronera Educação.
Disponível em:
<http://www.incra.gov.br/educacao_pronera>.
Acesso em 12 mai. 2016.
Recebido em: 02/02/2018
Aprovado em: 23/02/2018
Publicado em: 24/04/2018
Bonavigo, L., & Caimi, F. E. (2018). A Pedagogia da Alternância no contexto da Educação do Campo: a experiência do Instituto
Educar...
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Tocantinópolis
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jan./abr.
2018
ISSN: 2525-4863
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Bonavigo, L., & Caimi, F. E. (2018). A Pedagogia da
Alternância no contexto da Educação do Campo: a
experiência do Instituto Educar. Rev. Bras. Educ.
Camp., 3(1), 287-312.
ABNT:
BONAVIGO, L.; CAIMI, F. E. A Pedagogia da
Alternância no contexto da Educação do Campo: a
experiência do Instituto Educar. Rev. Bras. Educ.
Camp., Tocantinópolis, v. 3, n. 1, p. 287-312, 2018.
ORCID
Luana Bonavigo
http://orcid.org/0000-0002-3323-1708
Flávia Eloisa Caimi
http://orcid.org/0000-0001-5509-6060
Declaramos que as autoras Luana Bonavigo e
Flávia Eloisa Caimi foram responsáveis pela
elaboração, análise e interpretação dos dados, pela
escrita e revisão do conteúdo do manuscrito. As
autoras também foram responsáveis pela aprovação
da versão final a ser publicada.