Revista Brasileira de Educação do Campo
The Brazilian Scientific Journal of Rural Education
ARTIGO/ARTICLE/ARTÍCULO
DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.2525-4863.2018v3n3p1037
Tocantinópolis
v. 3
n. 3
p. 1037-1063
set./dez.
2018
ISSN: 2525-4863
1
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A aprendizagem da docência de acadêmicas em formação
inicial: novas temporalidades
Ana Cláudia da Silva Rodrigues
1
, Rayane Pereira Santos
2
, Adriege Matias Rodrigues
3
1
Universidade Federal da Paraíba - UFPB. Departamento de Fundamentação da Educação/Centro de Educação. Cidade
Universitária, Castelo Branco III. João Pessoa - PB. Brasil.
2
Universidade Federal da Paraíba - UFPB.
3
Universidade Federal
da Paraíba - UFPB.
Autor para correspondência/Author for correspondence: anaclaudia@ce.ufpb.br
RESUMO. O foco temático deste artigo são as ações de um
projeto de extensão desenvolvido em escolas do campo do brejo
paraibano. O objetivo foi o de compreender como ocorre a
aprendizagem da docência de acadêmicas a partir das ações
desenvolvidas no projeto de extensão intitulado ‘A formação
continuada de professores para o campo: currículo escolar e
fortalecimento da identidade campesina’, aplicado em escolas
localizadas no campo. Sob o ponto de vista da metodologia,
adotamos os pressupostos da pesquisa qualitativa e utilizamos o
estudo de caso e a entrevista semiestruturada para constituir os
dados. Participaram da pesquisa 11 acadêmicas em formação e o
coordenador do curso. Os resultados indicaram que a
aprendizagem da docência não se concretiza sem a articulação
dos diferentes espaços formativos da prática pedagógica a partir
de novas temporalidades.
Palavras-chave: Aprendizagem da Docência, Formação Inicial,
Prática Pedagógica.
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The learning of academic teaching in initial training: new
temporalities
ABSTRACT. The present article has as its thematic focus the
actions of an extension project developed in schools of the
countryside of the paraibano swamp. The objective was to
understand how the learning of the teaching of the academics
occurs from the actions developed in the extension project titled
"Continuing Teacher Training for the Countryside: School
Curriculum and Strengthening Peasant Identity", which worked
with schools located in the countryside. The methodological
course was developed based on the assumptions of the
qualitative research, using the case study as a method and the
semi-structured interview as a technique for data collection. The
subjects that participated were 11 trainees and the coordinator of
the course. It is emphasized that teaching learning does not
materialize without the articulation of the different formative
spaces of pedagogical practice, starting from new temporalities.
Keywords: Teaching Learning, Initial Formation, Pedagogical
Practice.
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El aprendizaje de la docencia de académicas en formación
inicial: nuevas temporalidades
RESUMEN. El foco temático de este artículo son las acciones
de un proyecto de extensión desarrollado en escuelas del campo
del brejo paraibano. El objetivo fue el de comprender cómo
ocurre el aprendizaje de la docencia de académicas a partir de
las acciones desarrolladas en el proyecto de extensión titulado
'La formación continuada de profesores para el campo: currículo
escolar y fortalecimiento de la identidad campesina', aplicado en
escuelas ubicadas en el campo. Desde el punto de vista de la
metodología, adoptamos los presupuestos de la investigación
cualitativa y utilizamos el estudio de caso y la entrevista
semiestructurada para constituir los datos. Participaron de la
investigación 11 académicas en formación y el coordinador del
curso. Los resultados indicaron que el aprendizaje de la
docencia no se concreta sin la articulación de los diferentes
espacios formativos de la práctica pedagógica a partir de nuevas
temporalidades.
Palabras clave: Aprendizaje de la Docencia, Formación Inicial,
Práctica Pedagógica.
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Introdução
A atuação docente é uma ação
complexa por requerer do profissional, por
meio do processo de formação e ao longo
de sua ação, conhecimentos gerais e
específicos. Nas últimas décadas, as
transformações sociais, políticas, culturais
e econômicas têm ocasionado a
apropriação de novos saberes que devem
nortear a ação educativa, para que esses
docentes possam agir mediante um
cotidiano desafiador.
Atualmente, o professor da educação
básica tem que lidar com a transitoriedade
do conhecimento e da tecnologia. Esse é
um desafio para sua atuação e que o faz
refletir sobre a importância dos
conhecimentos ensinados para uma
sociedade em constante mudança. Por sua
vez, os pais, os gestores e a comunidade
pressionam, consciente ou inconsciente, a
atuação desse profissional da educação,
inclusive por meio das avaliações
institucionais promovidas pelo Estado. Os
índices locais e nacionais têm ocasionando
uma instabilidade na formação do
profissional, que necessita se atualizar
constantemente para atender a essas
demandas.
Assim, se a formação que o
pedagogo adquirir nos cursos
universitários não se aproximar da
realidade em que ele irá atuar, não será
significativa. Por isso, ao longo da história,
os Cursos de Pedagogia têm assumido
diferentes configurações, principalmente
em seu formato curricular. Mudam-se
perfis, objetivos, conteúdos, aportes
teóricos, metodologias e formas de avaliar,
mas ainda existe uma dificuldade explícita
nos currículos de tornar os professores
profissionais que devem diagnosticar o
contexto de trabalho, tomar decisões, atuar
e avaliar a pertinência das atuações, a fim
de conduzi-las ao sentido adequado
(Zabala, 1998).
Não podemos deixar de nos referir
aos novos sentidos atribuídos à formação,
como função da evolução humana, que não
se restringe aos locais específicos de
profissionalização, mas como uma “função
vital essencial a ser exercida
permanentemente” Pineau (2006, p. 153).
Por isso, para se pensar na formação de
professores para a educação básica, é
preciso compreendê-la na constituição de
novas temporalidades. Ao acadêmico, os
espaços-tempos de formação não devem se
restringir aos espaços físicos institucionais.
A formação permanente não é fixa e está
em constante transformação, com espaços-
tempos distintos e muitas conexões.
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Então, considerando essas questões
imergentes na formação do profissional,
alguns cursos de formação de professores
têm direcionado suas ões para promover
a aprendizagem da docência com outras
atividades que não apenas a formação em
sala de aula e o estágio supervisionado. A
interlocução de ações de pesquisa,
extensão e ensino tem aproximado os
acadêmicos em formação inicial da
realidade da escola de educação básica.
Visualizar a ação docente por lentes que
conduzem à problematização do ato
pedagógico e transformar o professor em
pesquisador da ação educativa, além da
experiência de conhecer comunidades que
consolidam parcerias e traspõem muitas
barreiras para proporcionar aos seus alunos
um ensino público de boa qualidade leva o
acadêmico a refletir sobre a necessidade de
contextualizar a realidade em que se
propõe a intervir.
Ressalte-se, no entanto, não se tem
uma reflexão mais profunda sobre a
aprendizagem de acadêmicos em formação
inicial que participam de ações de pesquisa
e extensão em cursos de formação de
professores. Por isso, nosso intuito é de
saber quais as contribuições das práticas
educativas desenvolvidas pelas acadêmicas
em formação inicial através do projeto de
extensão intitulado ‘A formação
continuada de professores para o campo:
currículo escolar e fortalecimento da
identidade campesina’, executado entre os
anos de 2014 a 2016, em parceria com as
escolas do campo da região do brejo
paraibano. A questão central que orientou
nossa discussão foi: como a ação docente
das acadêmicas em formação inicial que
participaram de um projeto de extensão
contribuiu para ampliar suas aprendizagens
em um Curso de Pedagogia?
A prática pedagógica na formação
inicial de professores
Compreende-se que a teoria e a
prática se configuram como categorias
centrais na formação de professores,
principalmente nos anos iniciais da ação
pedagógica, porque não existe prática sem
embasamento teórico, portanto, a teoria e a
prática são indissociáveis no contexto da
ação pedagógica. Segundo Saviani,
quando entendermos que a prática será
tanto mais coerente e consistente, será
tanto mais qualitativa, será tanto mais
desenvolvida quanto mais consistente
e desenvolvida for a teoria que a
embasa, e que uma prática será
transformada se houver uma
elaboração teórica que justifique a
necessidade de sua transformação e
que proponha as formas da
transformação, estaremos pensando na
prática a partir da teoria (2005, p. 107).
Em sala de aula o professor não deve
utilizar a teoria, em um momento, e a
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prática em outro, porquanto essas ambas
são indissociáveis.
Entre a teoria e a atividade prática
transformadora, se insere um
trabalho de educação das
consciências, de organização de
meios materiais e planos concretos
de ação. Tudo isso como passagem
indispensável para desenvolver ações
reais, efetivas. Nesse sentido, uma
teoria é prática na medida em que
materializa, através de uma série de
mediações, o que antes existia
idealmente, como conhecimento da
realidade ou antecipação ideal de sua
transformação. (Vásquez, 1968, p.
207).
Então, embora a teoria, por si só, não
seja capaz de transformar nossa educação
ou o mundo, contribui para que possamos
organizar as ações práticas em sala de aula.
Segundo Freire (1987), o saber, o saber
sobre e o fazer são a união da práxis que,
consequentemente, pressupõe a teoria e a
prática ao mesmo tempo. No fazer
pedagógico, a teoria e a prática devem
dialogar sempre, para desmistificar a ideia
de separação. Sobre isso, Freire (1987, p.
125) afirma: “É preciso que fique claro
que, por isso mesmo, estamos defendendo
a práxis, a teoria do fazer, não estamos
propondo nenhuma dicotomia de que
resultasse que esse fazer se dividisse em
uma etapa de reflexão e outra, distante de
ação”. O autor enfatiza que não
separação e que é justamente nessa relação
que a práxis será autêntica e possibilitará
ao docente refletir sobre sua ação, que,
consequentemente, proporcionará uma
educação por meio da qual se
compreendam os processos do ensinar e do
aprender dentro de uma realidade.
Nessa perspectiva, devemos
considerar “... a práxis como uma prática
fundamentada teoricamente. Se a teoria
desvinculada da prática se configura como
contemplação, a prática desvinculada da
teoria é puro espontaneísmo. É o fazer pelo
fazer” (Saviani, 2005, p. 141).
Segundo Guedes (2009), defender a
ideia de que é necessário estudar a teoria
para, depois, realizar a prática implica
situá-las em diferentes perspectivas.
A relação efetiva entre teoria e
prática leva a uma ação consciente,
Freire insiste na educação como
conhecimento crítico, pois, somente
através de um posicionamento da
consciência crítica, é que o sujeito
terá noção da realidade e capacidade
de comprometer-se em transformá-la.
O sujeito conscientizado pelo
processo educativo assume, com a
transformação da realidade, a própria
busca pela liberdade. (Fortuna, 2015,
p. 67).
Convém enfatizar que a formação
docente não se constitui apenas na prática,
mas também na teoria, que tem uma
importância fundamental, pois é nesse
aprofundamento teórico que o professor
pratica a reflexão sobre a ação e passa a
compreender diversos contextos. Então,
essa interação entre os saberes da prática e
os da teoria gera uma ação pedagógica
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efetiva, autônoma. Assim, o docente vai se
formando na relação entre a teoria e a
prática. Para o profissional educador, um
dos seus grandes desafios consiste em
compreender as teorias e sua
materialização em novos pontos de vista,
atitudes, posturas e atuação educacional.
Vasquez (1968) explica que,
...enquanto a atividade prática
pressupõe uma ação efetiva sobre o
mundo, que tem como resultado uma
transformação real nele, a atividade
teórica apenas transforma nossa
consciência dos fatos, nossas ideias
sobre as coisas, mas não as próprias
coisas (p. 210).
Por isso a teoria não exerce, sozinha,
seu papel, pois serve de subsídios para que
se compreenda uma prática que será
efetiva e organizada por meio da reflexão,
portanto, a transformação ocorrerá se
compreender esse processo. Essa dimensão
da prática, necessária à formação inicial do
acadêmico, materializa-se no Projeto
Pedagógico do Curso, especificamente, na
carga horária destinada aos estágios
supervisionados. Segundo Pimenta (2002,
p. 147), “o estágio é o espaço por
excelência onde podemos refletir sobre
essas e outras questões alusivas à vida e ao
trabalho docente, na sala de aula, na
organização escolar e na sociedade”.
Assim, é importante refletir sobre o papel
do docente que aproxima os alunos dos
conhecimentos e leva-os a questionar sobre
eles visando compreendê-los. Dessa forma,
descentraliza seu desempenho em sala de
aula e assume diferentes aspectos em
determinado contexto.
O papel mediador do professor
assume diferentes aspectos. É
coordenador e problematizador nos
momentos de diálogo em que os
alunos organizam e tentam justificar
ideias. Aproxima, cria pontes, coloca
andaimes, estabelece analogias,
semelhanças ou diferenças entre a
cultura “espontânea” e informal do
aluno, de um lado, e as teorias e as
linguagens formalizadas da cultura
elaborada, de outro, favorecendo o
processo interior de ressignificação e
retificação conceitual. (Castro, 2001,
p. 130).
Organizar a prática pedagógica com
base no diálogo é trazer a relação de
complementaridade entre a teoria e a
prática, as condições concretas desse
espaço e a realidade social dos diversos
sujeitos que a constituem. Tardif (2002, p.
291) conceitua a prática como um “espaço
de produção da competência profissional
pelos próprios professores”, que se realizar
por meio da reflexão de sua prática,
advinda das experiências coletivas ou não,
como um campo de mobilização dos
saberes e de uma vasta produção de
conhecimentos para reelaborar, além dos
saberes, seu fazer pedagógico. Assim, as
práticas pedagógicas docentes são muito
importantes na construção da identidade
dos sujeitos, por ser um lugar onde se
produzem saberes adquiridos ao se referir à
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própria prática, por meio das atividades
cotidianas de ensino.
Então, considerando que a prática
pedagógica é sobremaneira importante no
processo de ensino e aprendizagem e pode
contribuir significativamente para o
desenvolvimento cognitivo, humano e
social do educando, sua organização, sua
ação e sua reflexão devem ser vivenciadas
cotidianamente.
Vale frisar que, como o professor é o
mediador dessa relação pedagógica, deverá
conhecer as reais necessidades didáticas e
a heterogeneidade da aprendizagem de
seus alunos e desejar que eles aprendam. A
prática pedagógica estará focada no
desenvolvimento da aprendizagem dos
alunos, com atividades contextualizadas,
desafiadoras e significativas para que
adquiram novos saberes.
Se tiver os conhecimentos
necessários sobre a profissão, o docente
compreenderá que precisa considerar o
lugar onde está inserido, para se aproximar
da escola. Isso nos remete a uma educação
que estimula os educandos a encontrarem
sua identidade e a levar para a escola o que
antes era considerado como a parte para a
realidade em que estão situados e trabalhar
em conjunto. Assim, eles passarão a ser
protagonistas rumo ao conhecimento.
Freire enfatiza que a
Pedagogia tem de ser forjada com ele
(o oprimido) e não para ele, enquanto
homens ou povos, na luta incessante
de recuperação de sua humanidade.
Pedagogia que faça da opressão e de
suas causas objeto da reflexão dos
oprimidos, de que resultará o seu
engajamento necessário na luta por
sua libertação, em que essa
pedagogia se fará e refará. (Freire,
1987, p. 54).
O papel do docente é de instigar o
aluno a buscar sua autonomia, com
estratégias que o façam sair do papel de
oprimido, seja livre para se expressar e se
aproxime ainda mais de sua realidade,
posicionando-o como centro do processo e
deixando de lado a educação “bancária”,
ou seja, a da repetição, da memorização,
que não possibilitava a contextualização e
as trocas de experiências.
Na visão “bancária” da educação, o
“saber” é uma doação dos que se
julgam sábios aos que julgam nada
saber. Doação dos que se funda numa
das manifestações instrumentais da
ideologia da opressão a
absolutização da ignorância, que
constitui o que chamamos de
alienação da ignorância, segundo a
qual essa se encontra sempre no
outro. (Freire, 2011, p. 81).
O docente deve, ainda, ser de
mediador do conhecimento e disponibilizar
táticas que facilitem a chegada dos
conhecimentos disciplinares necessários de
maneira contextualizada, abordando a
realidade inserida como um meio
articulador do saber, para que ele e os
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alunos consolidem sua identidade, nessa
troca de experiências e de saberes
constituídos social, cultural e
disciplinarmente.
Dessa maneira, o educador não é o
que apenas educa, mas o que,
enquanto educa, é educado, em
diálogo com o educando que, ao ser
educado, também educa. Ambos,
assim, se tornam sujeitos do processo
em que crescem juntos e em que os
“argumentos de autoridades” já não
valem. Em que, para ser-se,
funcionalmente, autoridade, se
necessita de estar sendo com as
liberdades e não contra elas. (Freire,
2011, p. 96).
Para que haja mudança, devem-se,
urgentemente, desenvolver ações de
caráter emancipatório, que valorizem as
especificidades do aluno e as do professor,
pois cada um tem um saber social
diferenciado de acordo com suas vivências,
e essas ações têm que garantir aos sujeitos
o direito à educação e à construção de sua
identidade, valorizando sua cultura, seu
jeito próprio de viver e de trabalhar. A
sociedade tem o dever de incentivar e
colaborar para sua plena efetivação. Uma
educação de boa qualidade não visa
somente preparar o educando para o
mundo (adaptar-se), tampouco transmitir
conhecimentos, mas também formar uma
consciência verdadeira, ou seja, um ser
emancipado, consciente, independente e
não alienado. Para Mello (2000), a
educação escolar é uma política pública
endereçada à constituição da cidadania.
Portanto, o professor tem que se avaliar
diariamente e saber se sua metodologia
está atingindo os objetivos proposto para
aquele alunado.
Os dados aqui trabalhados são
resultados de etapas de avaliação de
práticas oportunizadas aos licenciando por
meio de ações extensionistas
desenvolvidas durante um projeto de
extensão, no ano de 2014, e renovado nos
anos de 2015 e 2016. O objetivo da ação
consistia em reelaborar o currículo escolar
a partir da perspectiva da contextualização.
Para os licenciandos que participaram da
equipe de execução desse projeto,
orientados pelos docentes, suas ações eram
divididas em dois momentos: o de
organização do trabalho pedagógico e o de
formação continuada dos profissionais da
área de Educação da escola onde
ocorreram as ações extensivas.
Especificamente, no momento destinado a
organizar o trabalho pedagógico, as
acadêmicas em formação assumiam as
salas de aula dos docentes da escola, para
que eles pudessem participar da formação
continuada. Nossas indagações, que
nortearam este ensaio, consistiram em
compreender como as acadêmicas
articulavam as aprendizagens adquiridas na
instituição formativa e as ações de
intervenção realizadas nas escolas do
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campo e como as ações de intervenção
contribuíam para a aprendizagem da
docência.
Nesse sentido, o objetivo dessa
etapa de pesquisa sobre os resultados
obtidos com o referido projeto de extensão
foi de compreender como ocorre a
aprendizagem da docência das acadêmicas
a partir das ações desenvolvidas no projeto
de extensão intitulado ‘A formação
continuada de professores para o campo:
currículo escolar e fortalecimento da
identidade campesina’, que trabalhou com
escolas localizadas no campo.
Procedimentos metodológicos
Para conduzir o trabalho, escolhemos
como abordagem metodológica a pesquisa
qualitativa, porque se “preocupa com
aspectos da realidade que não podem ser
quantificados, centrando-se na
compreensão e na explicação da dinâmica
das relações sociais” (Gerhardt & Silveira,
2009, p. 24). Martins (2008) define a
abordagem qualitativa como a que trabalha
com os significados, as crenças, os valores
e as atitudes dos sujeitos investigados, que
não são quantificados nem mensurados por
quantidade, analisados, interpretados e
discutidos, “de modo que possibilite
estabelecer relações entre os sujeitos e o
objeto da pesquisa” (Martins, 2008).
Também recorremos ao estudo de
caso, que, segundo Yin (2010), é uma
técnica por meio da qual o pesquisador
pode examinar eventos contemporâneos,
mas sem manipular os comportamentos
relevantes. Como unidade de análise,
estabelecemos as ações educativas do
projeto de extensão que contribuíram para
potencializar a aprendizagem da docência
de acadêmicos em formação de um Curso
de Licenciatura em Pedagogia. O
instrumento utilizado para a aquisição dos
dados foi à entrevista semiestruturada,
organizada a partir de tópicos guias, com
questões norteadoras para aprofundar o
estudo do tema pesquisado.
Os sujeitos da pesquisa foram 11
acadêmicas em formação inicial, que
estavam cursando entre o e o
períodos, e o coordenador do Curso de
Licenciatura em Pedagogia. A análise das
narrativas advindas das entrevistas foi
disposta em três fases: a da pré-análise,
que consistiu em operacionalizar e
sistematizar as ideias iniciais,
considerando a escolha dos documentos
que atendessem à regra da exaustividade e
à da pertinência; a da exploração do
material, que consistiu em codificar e
categorizar os dados. A codificação é o
processo por meio do qual os dados brutos
são transformados sistematicamente e
agregados em unidades, as quais
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possibilitam uma descrição exata das
características do conteúdo Bardin (2011);
e a categorização consiste em classificar os
elementos constitutivos de um conjunto de
diferenciação e, em seguida, reagrupá-los,
usando critérios previamente definidos e
organizados conforme os objetivos da
pesquisa, que se transformam nos eixos de
análises Bardin (2011); e a terceira fase,
que envolve o tratamento dos resultados, a
inferência e a interpretação.
Análise e discussão dos resultados
Nesta seção, apresentam-se a análise
dos dados e a discussão dos resultados.
Para facilitar a compreensão, as narrativas
dos sujeitos da pesquisa foram analisadas
com base nas seguintes categorias:
‘aprendizagem da docência’, ‘prática
pedagógica’ e ‘práxis docente’. Para cada
categoria, foram expostos os indicadores
advindos do roteiro de entrevista elaborado
e aplicado às acadêmicas sobre o processo
de formação, nas aulas, nas escolas
participantes do projeto de extensão.
As atividades extensivas foram
desenvolvidas em turmas do ensino
infantil, do e do anos iniciais do
ensino fundamental (turma multisseriada) e
do e do ano iniciais. Para prepará-las,
as acadêmicas entravam em contato com as
professoras da escola uma semana antes
das formações do projeto e recebiam os
conteúdos a serem ministrados nas aulas.
O período de oito dias era essencial para
preparar as aulas, visto que as atividades
sempre envolviam aspectos lúdicos, como,
contação de histórias e teatro, e era
necessário selecionar e organizar o
material. Além da orientação para planejar
as aulas, durante as reuniões do grupo do
projeto de extensão (Ver Figura 1), as
acadêmicas conduziam suas atividades
individualmente, com o objetivo de
contextualizar os conteúdos na realidade
campesina (Ver Figura 2).
Figura 1 Reunião do grupo para preparar as atividades de extensão.
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Fonte: Dados da pesquisa 2016.
Figura 2 Acadêmica em sala de aula durante a formação de professores.
Fonte: Dados da pesquisa 2016.
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Figura 3 Partilha das aprendizagens.
Fonte: Dados da pesquisa 2016.
A Figura 3 mostra os docentes da
Educação Infantil de uma das escolas
contempladas na ação de extensão
participando de uma formação. Trata-se de
um momento de partilha de aprendizagens,
em que as crianças observavam o trabalho
realizado por suas professoras, em
conjunto com a especialista na área,
colaboradora do projeto.
Aprendizagem da docência
Para a categoria ‘aprendizagem da
docência’, definimos como descritor o
registro das narrativas das acadêmicas
sobre como estava sendo feita a
transposição dos conteúdos científicos e
pedagógicos para a ação docente na escola.
Essa relação entre o aprender e o ensinar,
entre o ensinar e o aprender ou o aprender
e o ensinar foi estabelecida com base no
que Isaías (2006) chama de processo de
apropriação, em sua dimensão interpessoal
e intrapessoal.
... o impulso que a direciona,
representado por sentimentos que
indicam sua finalidade geral; o
estabelecimento de objetivos
específicos, a partir da compreensão
do ato educativo e, por fim, as
condições necessárias para a
realização dos objetivos traçados,
envolvendo a trajetória pessoal e
profissional dos professores, bem
como o percurso trilhado por suas
instituições (p. 34).
Assim, investigar como as
acadêmicas estavam relacionando as
aprendizagens adquiridas na instituição
educativa e sua materialização nas
atividades desenvolvidas no projeto seria
fundamental para compreendermos como o
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percurso da formação profissional,
orientado pelo projeto pedagógico do
curso, estava conduzindo a apropriação da
autonomia pedagógica na ação educativa.
Assim, vejam-se algumas das respostas das
acadêmicas quando indagadas sobre quais
as suas impressões iniciais ao saber que
iriam desenvolver atividades nas salas de
aula como uma das ações do projeto de
extensão:
Susto, medo tudo junto (Acadêmica
do período, excerto extraída da
entrevista realizada em junho de
2016).
um pouco de medo porque é um
ambiente que você nunca esteve
antes, eu nunca estive então você fica
um pouco apreensiva a gente fica
insegura, mas a partir do momento
que você entra lá... que que não é
um bicho de sete cabeças... que se
você tiver segurança naquilo que
estiver fazendo vai dar certo é uma
boa experiência (Acadêmica do
período, excerto extraída da
entrevista realizada em junho de
2016).
Não tive muito medo porque eu
trabalhei em sala de aula que
não se compara porque eu trabalhei
com adolescente e eu fui para o Sitio
A, foi à primeira vez que eu fui dar
aula pelo grupo foram crianças e
assim eu não tive nenhum medo, não
tive nenhum anseio só que a gente
faz um planejamento que a gente
antecipa o conhecimento sem a gente
ter estado lá, foi o meu caso eu
planejei jogos teatrais para o Sítio A
e reaproveitei para o Sítio B. No Sitio
A, houve aceitação, os meninos
participaram, eles entenderam o
sentido do jogo teatral e eles
representaram com o corpo no Sítio
B eles não entenderam dessa forma,
eles acharam que tava ali mesmo
pra brincar e o jogo teatral por mais
que tenha o nome de jogo não vem
com esse sentido, então quer dizer a
minha primeira impressão quando eu
sabia que ia pra sala de aula foi isso,
eu não tive medo não, pelo contrário
qualquer atividade que tenha que ir
pra sala de aula eu vou porque eu
quero aprender eu sempre acredito
que eu posso melhorar alguma coisa
a mais, erros que eu cometi pretendo
não cometer mais (Acadêmica do
período, excerto extraída da
entrevista realizada em junho de
2016).
Na primeira vez eu fiquei muito
apreensiva, assim como a gente tinha
ido, eu fiz o magistério e tinha
participado do estágio eu já fiquei um
pouco mais aliviada, mas quando
disse assim educação infantil e eu
não tinha ficado ainda com a
educação infantil, então eu fiquei
muito apreensiva e pra mim não foi
nem a pior experiência, mas uma
experiência assim que deixou, que eu
vi que precisava realmente melhorar
(Acadêmica do período, excerto
extraída da entrevista realizada em
junho de 2016).
De acordo com as narrativas, mesmo
as que estão no período sentiram-se
inseguras. Isso é decorrente da forma como
compreendem o ensino. Sabem que é
necessário considerar os sujeitos para os
quais as atividades foram direcionadas - os
alunos - assim como o próprio contexto
campesino onde estavam inseridos.
Destacamos, também, as dificuldades
encontradas no início das atividades do
projeto e como foram sendo minimizadas
ao longo da ação. O fato de conhecerem o
local, os alunos, os professores e os demais
funcionários possibilitou que essa
insegurança inicial fosse sendo
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minimizada, pois passaram a planejar a
partir de suas percepções e dos
conhecimentos da realidade. Pode-se dizer
que a profissão docente é uma prática
social, porquanto é possível intervir na
realidade, e os projetos de extensão
possibilitam esse tipo de ação e que as
extensionistas tenham contato direto com o
chão da escola, com a realidade da
localidade vigente.
O estudo indicou que, no início,
grande parte das extensionistas teve receio
sobre o que ministrar e o que planejar para
aqueles alunos, para que se integrassem,
mesmo assim demonstravam um anseio
pelo contato com a escola. A aproximação
com as escolas possibilitou-lhes realizar
ações concretas, por meio das quais
puderam colocar em prática os conteúdos
aprendidos na teoria dentro da Academia.
Pimenta assevera que “os sujeitos realizam
suas ações nas instituições em que se
encontram, sendo por essas determinadas e
nelas determinando” (2012, p. 42) e que, se
a pretensão é de alterar as instituições com
a contribuição das teorias, precisa-se
compreender a ligação entre sujeitos e
instituições, ação e prática.
Outra questão levantada foi sobre a
relação dos conteúdos estudados na
instituição de formação profissional com as
atividades de preparação das aulas para as
escolas do campo do projeto. Sobre esse
tema, as entrevistadas narraram:
A parte acadêmica me ajudou porque
tive uma base de como fazer um
planejamento então o pouco que eu
aprendi da parte acadêmica
consegui fazer um planejamento e
com as orientações da professora eu
ainda melhorei. Porque digamos
assim, eu não tive uma base teórica
de um planejamento para uma
sequência didática, então senti
dificuldade por isso eu tive que
recorrer a mais uma orientação por
fora, de outro professor, mas assim as
contribuições foram assim, bastante
efetivas ou me efetivou bastante
(Acadêmica do período, excerto
extraída da entrevista realizada em
junho de 2016).
Foi muito proveitoso por causa que a
gente viu, lógico os ensinos como
de português e matemática não
contribuíram... mas a questão das
pesquisas e práticas voltadas pra
educação infantil, pro ensino
fundamental o que foi trabalhado
com a professora foi muito produtivo
pra gente porque eles trouxeram essa
realidade de contexto, de conteúdo
pra sala de aula pra gente trabalhar
isso e a partir disso mais ou menos a
gente sabe como levar como
trabalhar determinado conteúdo... foi
se baseando (Acadêmica do
período, excerto extraída da
entrevista realizada em junho de
2016).
As entrevistadas também relataram
que, como estavam perto de concluir o
curso, alguns conteúdos haviam sido
ministrados, e isso ajudou no momento de
planejar as atividades que seriam aplicadas
na escola. Porém, lamentaram pela falta de
conteúdos mais específicos, pois, apesar de
solicitar o auxílio de outros profissionais e
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de obter êxito na ação, essas lacunas não
foram preenchidas.
No tocante à afirmação da
Acadêmica do período de que “os
ensinos como português e matemática não
contribuíram...”, os resultados da pesquisa
organizada por Almeida & Lima (2012)
corroboram com o excerto da narrativa,
pois constataram que:
a formação ofertada no Curso de
Pedagogia relega a formação
matemática para o segundo plano,
sendo totalmente insuficiente para
atender as necessidades da formação
inicial. A investigação nos alerta que
os organizadores do currículo do
curso de Pedagogia precisam
urgentemente repensar a forma como
vem acontecendo a dinâmica de
trabalho referente à formação
matemática de seus alunos ao longo
do curso (p. 451).
A preocupação com as defasagens
nos cursos de formação para professores
em relação ao componente ‘Metodologia
do Ensino em Língua Portuguesa’ também
é constante entre os autores da área,
porquanto não se pode pensar na formação
de professores para os anos iniciais da
Educação Básica sem compreender a
língua como um instrumento político de
fundamental importância na luta contra as
desigualdades sociais que imperam em
nossa sociedade e que estão muito bem
protegidas, através da escola, pela
valorização absoluta da norma culta em
detrimento do dialeto popular” (Sena,
1995, p. 87).
O projeto de extensão foi
desenvolvido em escolas de comunidades
campesinas que apresentavam propostas
pedagógicas elaboradas pela equipe da
Secretaria Municipal de Educação, a partir
de perspectivas de formação urbano-
cêntrica, sem observar as necessidades
locais e contextualizar o currículo, o que
seria necessário para reelaborar e fortalecer
as identidades daqueles sujeitos. Por isso, a
falta de conteúdos ou de componentes
curriculares que contribuam para
potencializar a aprendizagem da docência
dos acadêmicos em formação nas áreas
consideradas essenciais, dentro da
instituição formativa, compromete sua
atuação profissional, como relataram as
entrevistadas. Contudo, o projeto de
extensão propiciou uma reflexão sobre
outros tempos de aprender, pois
impulsionou as participantes a buscarem
outros professores, em outros espaços e em
outros tempos, com novas temporalidades
no ensinar-aprender: “Por isso eu tive que
recorrer a mais uma orientação por fora, de
outro professor (Acadêmica do
período, excerto extraída da entrevista
realizada em junho de 2016).
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Prática pedagógica
O descritor utilizado para a categoria
‘prática pedagógica’ foi a “análise das
intervenções pedagógicas realizadas pelas
acadêmicas em formação a partir das
intenções, das previsões, das expectativas e
da avaliação dos resultados da ão
enquanto docente” (Zabala, 1998, p. 17).
Na entrevista, a acadêmica referiu:
A questão da prática, porque, como a
gente um modelo teórico e uma
prática diferente porque quando a
gente vai no projeto eu vejo uma
prática diferente porque quando a
gente vai para o estágio é diferente,
no projeto é mais espontâneo a partir
do projeto porque isso é uma ação
da brinquedoteca que eu estou
levando vinculado ao projeto, então
essa ação eu tenho uma base
teórica de um curso que eu também
aprendi aqui (Acadêmica do
período, excerto extraída da
entrevista realizada em junho de
2016).
Com certeza eu vou adquirindo
experiência de como planejar uma
aula, experiência de atuar na sala de
aula, na convivência com os alunos
(Acadêmica do período, excerto
extraída da entrevista realizada em
junho de 2016).
Para as entrevistadas que
participavam do projeto, desenvolver essas
atividades foi importante para sua
formação, pois tiveram contato com turmas
de educação do campo e puderam perceber
a realidade da educação nos dias atuais.
Assim, essas atividades contribuíram para
o processo de formação em que elas se
encontravam.
Percebemos que as acadêmicas do
Curso de Formação Inicial conseguem
analisar e perceber as relações entre as
teorias estudadas no curso e as práticas a
serem desenvolvidas em sala de aula, com
ênfase em áreas que aprofundam essas
temáticas, além de conhecer e poder
refletir sobre elas, sabendo das
especificidades existentes no contexto do
campo.
Um dos objetivos de qualquer bom
profissional consiste em ser cada vez
mais competente em seu oficio.
Geralmente se consegue essa
melhora profissional mediante o
conhecimento e a experiência: o
conhecimento das variáveis que
intervém na prática e a experiência
para dominá-las. (Zabala, 1998, p.
13).
A prática pedagógica, segundo as
entrevistadas, vai se construindo na
interação, ou seja, nas experiências
formadoras na escola, na família, no
convívio com o professor na educação
básica, nas relações que estabeleceram
com os colegas de classe, com os
funcionários da escola, com os próprios
professores, que são fortes influentes nesse
processo profissional. Essa questão é
voltada para a temporalidade
i
, em que
organizaram e memorizaram experiências
educativas marcantes, que contribuíram
para formar o “Eu” profissional e a própria
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formação acadêmica. Nesse processo de
formação inicial, essa constituição também
ocorre, e a qualificação é um momento de
busca de consolidação da identidade.
A ação de planejar também
contribui para essa formação, pois essas
acadêmicas dedicam um período do tempo
para organizar sua prática pedagógica.
Conforme disseram, isso ocorre
semanalmente com a equipe do grupo, e se
reúnem para discutir sobre as ações que
serão desenvolvidas com a própria troca de
experiências. Dessa forma, o planejamento
envolve o processo de refletir e decidir
sobre a estrutura, a organização, o
funcionamento e as propostas pedagógicas.
Segundo Libânio (1994, p. 221), “o
planejamento é um processo de
racionalização, organização e coordenação
da ação docente, articulando a atividade e a
problemática do contexto social”.
Ao se planejar ou projetar algo,
parte-se do princípio de que seja efetuado e
que os professores contribuam com a
comunicação, visando à integração
curricular e não desperdiçar as
oportunidades que aparecem em meio ao
que não foi planejado para enriquecer seu
desempenho em sala de aula. De acordo
com Vasconcellos,
se queremos, efetivamente, atingi-lo,
temos que aproveitar da melhor
forma o espaço-tempo de sala de
aula. Um bom planejamento
certamente tem repercussão na
disciplina, uma vez que as
necessidades dos alunos estão sendo
levadas em conta e o professor tem
maior convicção daquilo que está
propondo (1995, p. 35).
Adentrando o conceito de
planejamento e considerando sua
importância para o fazer pedagógico,
Libâneo afirma:
A ação de planejar, portanto, não se
reduz ao simples preenchimento de
formulários para controle
administrativo, é, antes, a atividade
consciente da previsão das ações
político-pedagógicas, e tendo como
referência permanente às situações
didáticas concretas (isto é, a
problemática social, econômica,
política e cultural) que envolve a
escola, os professores, os alunos, os
pais e a comunidade, que integram o
processo de ensino (1994, p. 222).
O autor deixa claro que é preciso
integrar todos os que fazem parte da escola
nesse processo, por isso esse diálogo entre
as acadêmicas e os professores das salas é
tão importante, assim, como a própria
gestão, para articular as atividades que
foram desenvolvidas.
Planejar exige do docente
comprometimento. O simples fato de
preencher formulários, com os conteúdos
programados, metodologias, ou formas de
avaliar não se configura como uma ação
transformadora, mas apenas questões
burocráticas.
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Práxis docente
Na categoria ‘práxis docente’,
utilizamos como descritor o modelo teórico
escolhido e o contexto educacional em que
se desenvolveram as atividades. O
levantamento dos dados a partir das
narrativas dos sujeitos da pesquisa nos
possibilitou entender como essas
acadêmicas ainda em formação se
mobilizam para a aprendizagem da
docência. Para compreender essa categoria,
solicitamos que elas relatassem as
atividades planejadas e desenvolvidas em
sala de aula, durante o projeto, que
contribuíram para que se constituíssem
como “seres docentes”. Sobre isso, seguem
alguns relatos:
Nas turmas de e anos, as
atividades desenvolvidas foram:
Uma das atividades foi desenvolvida
em duas escolas diferentes o mesmo
plano de aula foi utilizado com os
mesmos objetivos e a mesma
metodologia para ser trabalhado nas
diferentes turmas, com isto foi
possível perceber que com uma
mesma atividade não se alcança os
mesmos objetivos e não se alcança os
mesmos resultados em turmas
diferentes, pois os sujeitos são
diferentes e as atividades devem ser
planejadas de acordo com o contexto
de cada turma especificamente. A
atividade envolveu o tema teatro
(Acadêmica do período, excerto
extraída da entrevista realizada em
junho de 2016).
Dramatizar não é somente uma
necessidade individual, na interação
simbólica com a realidade, e que
proporciona condições para um
crescimento pessoal, mas também uma
atividade coletiva, em que a expressão
individual é acolhida. Ao participar de
atividades teatrais, o indivíduo tem a
oportunidade de se desenvolver em
determinado grupo social, de maneira
responsável, legitima seus direitos,
estabelece relações entre o individual e o
coletivo, aprende a ouvir, a acolher e a
ordenar opiniões e respeita as diferentes
manifestações, com a finalidade de
organizar a expressão de um grupo.
Essa atividade foi chamada de ‘Jogo
teatral na educação’, e seu objetivo foi o de
melhorar aspectos como atenção,
autonomia, respeito com o outro, criação,
imaginação etc., atividades desenvolvidas
em turmas de e anos do ensino
fundamental. As acadêmicas em formação
disseram que, em uma escola, “os alunos
ficaram encantados com as técnicas dos
jogos e participaram com bastante
vontade.” Porém, na outra escola, as
mesmas alunas afirmaram:
As crianças acharam que a atividade
não era relevante para elas, pois os
mesmos consideram importante
apenas o que se escreve e por isso a
atividade terminou muito antes do
que imaginavam. As crianças ficaram
muito agitadas e não conseguiam se
concentrar para fazer a produção.
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(Acadêmica do período, excerto
extraída da entrevista realizada em
junho de 2016).
Aplicando essas atividades, as
participantes do projeto tiveram a
oportunidade de compreender que os
sujeitos de diferentes escolas vivenciam
realidades diferentes, razão por que a
forma como aceitam as atividades varia de
turma para turma. Perceber isso, como
acadêmicas em formação, é importante
para entenderem que é preciso relacionar a
realidade das turmas com o planejamento
das aulas que serão ministradas.
Outra atividade relatada foi a
utilização de jogos matemáticos. Para a
turma do ano de uma das escolas
participantes da pesquisa, as acadêmicas
utilizaram um bingo em sala de aula.
Separaram a turma de ano em cinco
grupos, para que houvesse uma interação
entre os alunos. Porém, parte da turma se
recusou a participar da atividade, e as
acadêmicas, extensionistas do projeto,
tiveram que pensar em uma metodologia
que despertasse em todos os alunos o
interesse em construir seus conhecimentos
matemáticos.
Por meio dos jogos as crianças não
apenas vivenciam situações que se
repetem, mas aprendem a lidar com
símbolos e a pensar por analogia
(jogos simbólicos): os significados
das coisas passam a ser imaginados
por elas. Ao criarem essas analogias,
tornam-se produtoras de linguagens,
criadoras de convenções,
capacitando-se para se submeterem a
regras e dar explicações. (Brasil,
1996, p. 35).
A acadêmica do período destacou
o desenvolvimento de uma atividade
interdisciplinar organizada para os
componentes curriculares ‘Língua
Portuguesa’ e ‘Ensino de Ciências’. Foram
escolhidas palavras com som de ‘z’ e de ‘s’
ao mesmo tempo, para trabalhar com
vegetais comestíveis. Essa atividade foi
aplicada a fim de que os alunos
compreendessem o significado do tema
trabalhado para suas vidas e de mostrar a
importância de trabalhar com a
interdisciplinaridade, para se afastar da
educação modular tão criticada por Paulo
Freire. É importante enfatizar essas
preocupações das alunas em relação às
atividades, porque é através dessas
observações que se percebe que, na prática,
a teoria pode surtir resultados positivos.
Antes de planejar as atividades, o
professor deve informar aos educandos que
é para eles que se faz isso, por isso é
fundamental tê-los como base para
planejar. Também é importante ressaltar
que toda e qualquer formação de
professores deve ser pensada e trabalhada
de acordo com a realidade das escolas e
dos seus alunos.
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Os estudantes (crianças, jovens ou
adultos) precisam estar no centro das
discussões sobre a transformação da
escola: é para eles e elas que a escola
deve ser pensada. É o compromisso
com sua formação que deve orientar
nosso debate. E os educandos
precisam aprender agora e não ficar
esperando pela solução dos
problemas da escola, dos educadores
ou pelas discussões pedagógicas
feitas muito longe deles: seu tempo
não volta: eles e elas têm direito de
aprender agora, têm direito a uma
boa educação já e essa deve ser nossa
preocupação sempre que discutimos
a implementação de novas práticas.
(Caldart, 2010, p. 69).
Por isso é importante pensar tanto na
formação de professores que estão
atualmente em sala de aula quanto na dos
que estão se formando. É preciso, ainda,
planejar para o educando e lembrar que os
resultados da educação são espelhados
pelas crianças que estão indo à escola para
trocar conhecimentos com os profissionais
da educação que estão preparados para
recebê-los.
As formações de professores devem
ser pensadas não para emancipar os
alunos, mas também os professores que
estão nas escolas e que precisam se
conscientizar de que não podem ficar para
trás e que devem se atualizar
constantemente para receber novas turmas,
portanto, novos sujeitos. Isso requer que
suas práticas se adéquem a esse novo
contexto, para que a educação continue
emancipando os sujeitos, sejam eles do
campo ou não.
Nós aqui vemos a prática e lá a teoria
então a gente que uma interliga a
outra, a gente que quando se têm
uma base teórica à gente consegue
melhorar a prática, se a gente levar só
a prática talvez deixe a prática
pela prática o projeto ajuda a fazer
essa relação se não fosse o projeto eu
estaria perdida, porque depois do
projeto eu me identifiquei mais com
o curso, eu estava muito perdida
antes do projeto e depois que eu levei
essa ação da brinquedoteca vinculada
com o projeto ficou melhor pra mim
justamente porque eu tive a
oportunidade de me encontrar no
curso. Antes eu achava que muita
coisa não fazia sentido e hoje eu
tenho outro olhar, outra visão em
relação a isso. O projeto me ajudou
muito e eu podendo levar essa ação
através da extensão pra mim foi bem
melhor associar a teoria a prática,
ficou bem mais fácil pra mim
(Acadêmica do período, excerto
extraída da entrevista realizada em
junho de 2016).
A gente às vezes faz uma crítica
porque como você sabe tem aula que
é chata demais, aqui é a teoria, teoria
e teoria mais quando você chega
você ver que ela é muito, muito
importante, tanto é que é isso que eu
estou dizendo pra você, fundamentos
de alfabetização a gente viu dentro da
academia, teoria e quando lá na
prática e na realidade eu me baseei
praticamente todas as minhas aulas
(Acadêmica do período, excerto
extraída da entrevista realizada em
junho de 2016).
No âmbito de sua formação e no
exercício da profissão, os professores
desenvolvem saberes específicos baseados
em seu fazer cotidiano e no próprio
conhecimento de seu meio. Esses saberes
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experienciais ou práticos, segundo Tardif,
“incorporam-se à experiência individual e
coletiva sob a forma de habitus e de
habilidades, de saber-fazer e de saber-ser”
(2002, p. 39). O que caracteriza os saberes
práticos ou experienciais, de modo geral, é
o fato de se originarem da prática cotidiana
da profissão e de serem validados por ela
(Tardif, 2002). Logo, são saberes que não
provêm de instituições de formação nem
de currículos, mas do contato com os
alunos, e foi justamente isso que as
entrevistadas apontaram em suas narrativas
- que o contato com os alunos e com a sala
de aula muda a própria forma de pensar
sobre sua formação e a relação
dicotômica entre a teoria e a prática se
configura.
Assim, desenvolver atividades que
coloquem o acadêmico em contato com os
profissionais que atuam na escola a qual
possibilita uma vivência na prática e na
realidade de sua localidade. Tardif alerta
que, “no exercício cotidiano de sua função,
os condicionantes
ii
aparecem relacionados
a situações concretas que não são possíveis
de definições acabadas e que exigem
improvisação e habilidades pessoais”
(2002, p. 49). Somente na prática é que
conseguirá desenvolver tais competências
para lidar com as mais diversas situações
que envolvem a sala de aula.
Essas ações, que são promovidas não
só pelos estágios, os quais são obrigatórios,
mas também pelos projetos de extensão,
como o analisado, possibilitam ao
acadêmico estabelecer contato com o
contexto educacional atual. Então, a
relação de proximidade entre essas duas
instituições formadoras contribui para que
os acadêmicos compreendam como se
materializam as teorias que a universidade
coloca na prática e para que o professor
atuante reflita sobre sua formação e sua
ação e se perceba como sujeito em
constante formação e modificação e que
necessita de informações adicionais para
melhorar a qualidade de sua prática
pedagógica em sala de aula. Então, quando
questionamos o coordenador do curso a
respeito de suas impressões sobre esses
projetos de pesquisa, de ensino e de
extensão e suas contribuições para a
formação inicial, ele assim se expressou:
O que eu percebo: os alunos que se
envolvem em projetos de
determinados professores, eles saem
sim, com outra formação, por
exemplo, um programa que tem feito
uma grande diferença no nosso
campus, por exemplo, é o PIBID, os
alunos que participam do PIBID
iii
,
eles saem sim preparados pra atuar,
porque eles tem outro tipo de
acompanhamento e alunos que
participam de projetos específicos de
professoras que tão ligados a escola
ou a outros laboratórios, como do
próprio curso a brinquedoteca que
não é uma escola, mas que tem um
atendimento a crianças, tem um
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trabalho sistematizado, e isso fica
claro até nas nossas aulas, quando a
gente pega turmas que tem alunos
que participam desses projetos, o
nível da turma é outro, o nível de
discussão, o vel dos trabalhos, tem
um diferencial (Acadêmica do 5°
período, excerto extraída da
entrevista realizada em agosto de
2016).
No discurso do coordenador, ele
demonstra que consegue perceber o
diferencial entre os alunos envolvidos em
projetos e a afirmação de que saem aptos
para atuar na profissão. Esse diferencial se
materializa nas ões que são
desenvolvidas em sala de aula, nas
discussões e nos trabalhos. Assim, as
acadêmicas, por meio desse vínculo com
os projetos de ensino, pesquisa e extensão,
destacam-se por se aproximar do campo
em que atuam, por poderem praticar o que
aprendem no curso, reconhecer-se como
professores e construir sua identidade
profissional.
Considerações
Os cursos de formação de
professores devem estimular os sujeitos a
pensarem sobre a organização da própria
formação durante o curso. Assim, os
profissionais estarão prontos para atuar em
sala de aula. Porém isso requer uma
mudança na educação que, em muitos
âmbitos, está descontextualizada da
realidade das escolas e, por isso, não tem
sentido para os alunos. Tanto os cursos de
nível superior quanto os de ensino básico
devem motivar os docentes a se
atualizarem, cientes de que ensinar não é
uma profissão cujos profissionais saem
prontos para o mercado de trabalho e não
precisarão mais se atualizar. Esse é um
pensamento capitalista, que circunda
muitas pessoas e profissionais.
Na formação de profissionais,
sempre se deve enfatizar que a construção
de conhecimentos é um processo contínuo,
que estamos sempre aprendendo e que falta
muito a aprender, por isso é importante
uma formação continuada que proponha a
atualização frequente dos docentes,
embasada em um ensino contextualizado,
que associe o conhecimento do educando
ao conhecimento epistemológico oferecido
pelas escolas.
É importante, ainda, analisar as
contribuições não apenas do Curso de
Pedagogia para essas graduandas, mas
também da extensão universitária, que
contribuiu para que ultrapassassem os
muros da universidade antes de estarem
formadas.
O curso de formação inicial é o
espaço para as acadêmicas se constituírem
como educadoras e construírem sua
identidade profissional. Para elas, o
conhecimento adquirido por meio dos
referenciais teóricos e das discussões
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acerca de suas próprias práticas e as
reflexões proporcionadas durante a
formação ressignificaram à relação entre a
teoria e a prática. Outro ponto que ficou
bastante evidente foi que, embora a
maioria não tenha tido contato com
metodologias direcionadas à educação do
campo, através de outros meios,
constituíram sua prática docente.
Conforme Nóvoa (1991, p. 11), “estar em
formação implica um investimento pessoal,
um trabalho livre e criativo sobre os
percursos e os projetos próprios, com
vistas à construção de uma identidade, que
é também uma identidade profissional”.
Assim, o estudo mostrou que o fazer
docente das acadêmicas ocorre por meio da
relação dos alunos com o espaço em que
vão atuar e que, depois que iniciam a
atividade profissional, é que conseguem
relacionar os conteúdos estudados a essa
realidade. Essa é uma forma de aproximar
a comunidade da escola, para que
participem ativamente da formação dos
sujeitos. Isso extrapola o próprio estágio,
com os projetos de extensão.
Ressaltamos que o desenvolvimento
das ações do projeto foi marcado por
avanços e retrocessos, limites e
possibilidades. Os avanços se referiram,
principalmente, à conexão entre atividades
caracterizadas, como o ensino, por
exemplo, realizadas em conjunto com as de
extensão; ações voltadas para a formação
inicial de professores, com características
associadas ao estágio curricular
obrigatório, desenvolvidas em escolas do
campo e se articulando com proposições de
pesquisas. Assim, conseguir interligar e
atender às especificidades de cada ação foi
um grande desafio.
Podemos destacar o que,
inicialmente, foi considerado pelas
acadêmicas como um retrocesso por parte
das docentes da educação infantil das
escolas parceiras, ou seja, a resistência em
aceitar a ministração de atividades que
evidenciavam a ludicidade nas aulas,
porque, para essas docentes, a brincadeira
não contribuía para a aquisição de
conhecimentos. Esse comportamento foi
notado em todas as escolas no momento
destinado à partilha das atividades
planejadas. Porém, depois das explicações
e das justificativas sobre a escolha
metodológica, os procedimentos foram
realizados sem obstáculos.
As dificuldades de planejar e de
executar aulas contextualizadas foram
observadas nos anos iniciais do ensino
fundamental. A cada ano, durante as
primeiras semanas de atividades, as
professores titulares costumavam
questionar sobre as ações realizadas em
sala pelas acadêmicas. O principal desafio
era de relacionar os conteúdos do livro
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didático utilizado ao contexto local,
empregando metodologias orientadas com
base em perspectivas teóricas críticas, que
evidenciavam a construção emancipatória
do aluno. Esse fato motivou as acadêmicas
a interagirem com docentes e discentes de
outros cursos de graduação do campus,
especificamente o Bacharelado em
Agroecologia e o Curso de Licenciatura
em Ciências Agrárias, para conseguir
planejar adequadamente suas aulas.
Quando essa atuação foi avaliada no
término da execução do projeto, foi
considerada por todos como salutar, visto
que possibilitou um estudo interdisciplinar
dos conteúdos escolares.
Ao avaliar as atividades no final dos
anos letivos, em conjunto com a
comunidade escolar, fatores internos e
externos foram elencados como limites: o
interno foi a quantidade de acadêmicas
necessária para a consecução das
atividades, porquanto o projeto foi
desenvolvido concomitantemente em três
escolas campesinas, e como previmos
nossa participação quinzenalmente, em
cada escola, a sobrecarga de trabalho foi
um ponto considerado negativo pelas
estudantes; quanto aos externos, foram:
as condições de infraestrutura das
instituições parceiras e da própria
universidade, pois, várias vezes, tivemos
dificuldades de transporte para o translado
da universidade para a escola do campo; o
calendário escolar municipal, porque não
se observavam as especificidades dos
ciclos produtivos dos agricultores e se
marcavam atividades durante períodos de
colheita e de plantio, o que atrapalhava a
participação da comunidade nas ações da
escola; a rotatividade dos docentes das
escolas do campo, visto que sua lotação
dependia de interesses políticos e, a cada
inicio de ano letivo, precisávamos
disponibilizar um período para nova
sensibilização à proposta, pois a maioria
dos interlocutores já eram outros; a aversão
de alguns docentes lotados nas escolas do
campo a mudar seu planejamento, sua
ação, mais precisamente, suas concepções
sobre escola, alunos, professores,
conhecimentos e educação. É certo que
pensar em novas formas de ensinar e de
aprender é possível, mas necessitamos nos
abrir para essas experiências.
Ressalte-se, porém, que os limites e
as dificuldades foram bem menos do que
os benefícios para a formação das
acadêmicas, para a escola campesina e para
a própria universidade. Convém registrar
que todos os objetivos da pesquisa foram
atingidos e que, com essa experiência,
novas proposições deverão impulsionar
pesquisas que visem encontrar novas
formas de pensar sobre a formação
docente.
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Zabala, A. (1998). A prática educativa:
como ensinar/Antonio Zabala. Tradução de
Ernani Rosa. Porto Alegre: ArtMed.
i
A temporalidade é uma estrutura intrínseca da
consciência: ela é coercitiva. Uma sequência de
experiências de vida não pode ser invertida. (Tardif,
2004, p. 69).
ii
Esses condicionantes não são problemas abstratos
como os encontrados pelo cientista, nem técnicos,
como aqueles com os quais se deparam os técnicos
e os tecnólogos. O cientista e o técnico trabalham a
partir de modelos, e seus condicionantes resultam
da aplicação ou da elaboração desses modelos. Com
o docente é diferente (Tardif, p. 49), porque seu
envolvimento vai além da sala de aula e cita o
Programa de Iniciação Científica (PIBID), que,
segundo o Ministério da Educação, oferece bolsas
de iniciação à docência aos alunos de cursos
presenciais que se dediquem ao estágio nas escolas
públicas e que, quando graduados, comprometam-
se com o exercício do Magistério na rede pública. O
objetivo é de antecipar o vínculo entre os futuros
mestres e as salas de aula da rede pública. Com essa
iniciativa, o PIBID faz uma articulação entre a
educação superior (por meio das licenciaturas), a
escola e os sistemas estaduais e municipais. Nesse
sentido, destaca-se o trabalho de conclusão de curso
de duas acadêmicas
ii
sobre o programa PIBID
desenvolvido no campus por docentes da UFPB. O
primeiro analisou o as contribuições do Estágio
Supervisionado e do PIBID para a formação inicial
de professores da UFPB; e o segundo, as ações
desenvolvidas por esse projeto para melhorar a
Educação Básica. Foram trabalhos relevantes para o
curso, porque destacaram a importância do
programa para a formação profissional dos
estudantes, tendo em vista o acompanhamento mais
efetivo das atividades, com uma reflexão mais
ampla sobre as ações, e estabeleceram uma relação
entre a teoria e a prática vistas durante a formação.
iii
Sobre o programa PIBID desenvolvido no
campus por docentes da UFPB. O primeiro analisou
o as contribuições do Estágio Supervisionado e do
PIBID para a formação inicial de professores da
UFPB; e o segundo, as ações desenvolvidas por
esse projeto para melhorar a Educação Básica.
Foram trabalhos relevantes para o curso, porque
destacaram a importância do programa para a
formação profissional dos estudantes, tendo em
vista o acompanhamento mais efetivo das
atividades, com uma reflexão mais ampla sobre as
ações, e estabeleceram uma relação entre a teoria e
a prática vistas durante a formação.
Informações do artigo / Article Information
Recebido em: 01/08/2018
Aprovado em: 06/09/2018
Publicado em: 07/12 /2018
Received on August 01st, 2018
Accepted on September 06th, 2018
Published on December 07th, 2018
Contribuições no artigo: Ana Cláudia da Silva
Rodrigues: Desenho da pesquisa, elaboração do
manuscrito, leitura crítica e revisão do manuscrito. Rayane
Pereira Santos: entrevistas, transcrições e análise dos
dados. Adriege Matias Rodrigues: revisão bibliográfica,
inclusão do artigo nas normas da revista.
Author Contributions: Ana Cláudia da Silva Rodrigues:
writing of the research, preparation of the manuscript,
critical reading and revision of the manuscript. Rayane
Pereira Santos: interviews, transcriptions and data
analysis. Adriege Matias Rodrigues: bibliographical review,
inclusion of the article in the norms of the journal.
Conflitos de interesse: As autoras declararam não haver
nenhum conflito de interesse referente a este artigo.
Conflict of Interest: None reported.
Orcid
Ana Cláudia da Silva Rodrigues
http://orcid.org/0000-0001-6621-1861
Rayane Pereira Santos
http://orcid.org/0000-0003-2835-6722
Adriege Matias Rodrigues
http://orcid.org/0000-0002-1617-5580
Como citar este artigo / How to cite this article
APA
Rodrigues, A. C. S., Santos, R. P., & Rodrigues, A. M.
(2018). A aprendizagem da docência de acadêmicas em
formação inicial: novas temporalidades. Rev. Bras. Educ.
Camp., 3(3), 1037-1063. DOI:
http://dx.doi.org/10.20873/uft.2525-4863.2018v3n2p1037
ABNT
RODRIGUES, A. C. S.; SANTOS, R. P.; RODRIGUES, A.
M. A aprendizagem da docência de acadêmicas em
formação inicial: novas temporalidades. Rev. Bras. Educ.
Camp., Tocantinópolis, v. 3, n. 3, set./dez., p. 1037-1063,
2018. DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.2525-
4863.2018v3n2p1037