Revista Brasileira de Educação do Campo
The Brazilian Scientific Journal of Rural Education
THEMATIC DOSSIER / ARTIGO/ARTICLE/ARTÍCULO
DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.v4e5786
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e5786
10.20873/uft.rbec.v4e5786
2019
ISSN: 2525-4863
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Da teimosa resistência nasce a Escola Estadual do Campo
Madre Cristina
Sandra Maria Soares
1
, Ronaldo Eustáquio Feitoza Senra
2
1
Secretaria Estadual de Educação - SEDUC. Departamento de Educação. Assentamento Roseli Nunes. Mirassol D’Oeste -
MT. Brasil.
2
Instituto Federal de Mato Grosso - IFMT.
Autor para correspondência/Author for correspondence: sandramariasrs@gmail.com
RESUMO. O presente artigo apresenta reflexões sobre as lutas
e os enfrentamentos vivenciados pelos/as educadores/as para a
continuidade da Escola Estadual Madre Cristina-EEMC, uma
escola do/no campo. Também citam-se elementos para entender
o perfil deste/a educador/a e o processo de formação, suas lutas
e vivências nesse Assentamento. Os objetivos desta pesquisa
foram: Identificar o surgimento da Escola Estadual Madre
Cristina; diagnosticar quais as dificuldades encontradas pelos/as
educadores/as do campo em permanecer no campo; analisar o
processo de auto-organização dos/as educadores/as e dos/as
assentados/as na luta para a continuidade da escola no
Assentamento Roseli Nunes-MT. A metodologia utilizada
fundamentou-se na pesquisa bibliográfica, pesquisa documental
do Projeto Político-Pedagógico-PPP da escola e pesquisa de
campo com a aplicação de entrevistas semiestruturadas com
cinco educadores/as da EEMC e na participação em reuniões
pedagógicas, numa abordagem qualitativa, utilizando-se a
pesquisa participante. A escola é o coração do assentamento e
ser educador/a do campo é estar voltado às diversas dimensões,
constatamos com este estudo que os/as educadores/as da escola
têm conseguido permanecer no campo, com o apoio dos/as
assentados/as e dando continuidade à escola do/no campo, no
entanto vivenciam muitos desafios na luta pela sua permanência
na escola.
Palavras-chave: Educação do Campo, Assentamento Roseli
Nunes, Escola Madre Cristina, Educadores e Resistências.
Soares, S. M., & Senra, R. E. F. (2019). Da teimosa resistência nasce a Escola Estadual do Campo Madre Cristina
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From stubborn resistance is born the State School of
Countryside Madre Cristina
ABSTRACT. This article presents reflections on the struggles
and confrontations experienced by the educators for the
continuation of the Madre Cristina-EEMC State School, a
school in the countryside. There are also elements to understand
the profile of this educator and the formation process, their
struggles and experiences in this Settlement. The objectives of
this research were: To identify the emergence of the Madre
Cristina State School; diagnose the difficulties encountered by
the educators in the field in staying in the field; to analyze the
process of self-organization of the educators and of the settlers
in the struggle for the continuity of the school in the Roseli
Nunes-MT settlement. The methodology used was based on the
bibliographical research, documentary research of the School's
Educational-PPP Project and field research with the application
of semi-structured interviews with five EEMC educators and
participation in pedagogical meetings, in a qualitative approach,
using participant research. The school is the heart of the
settlement and being an educator of the countryside is to be
oriented to the different dimensions, we verified with this study
that the educators of the school have been able to stay in the
field, with the support of the settlers and giving continuity to the
school in the countryside, nevertheless they experience many
challenges in the fight for their stay of the school.
Keywords: Rural Education, Nesting Roseli Nunes, Madre
Cristina School, Educators and Resistance.
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De la obstinada resistencia nace la Escuela Estadual del
Campo Madre Cristina
RESUMEN. El presente artículo presenta reflexiones sobre las
luchas y los enfrentamientos vivenciados por los/las
educadores/as para la continuidad de la Escuela Estadual Madre
Cristina-EEMC, una escuela del/en el campo. También se citan
elementos para entender el perfil de este/la educador/a y el
proceso de formación, sus luchas y vivencias en ese
Asentamiento. Los objetivos de esta investigación fueron:
Identificar el surgimiento de la Escuela Estadual Madre Cristina;
diagnosticar cuáles las dificultades encontradas por los
educadores/as del campo en permanecer en el campo; analizar el
proceso de auto-organización de los/as educadores/as y de los
asentados/as en la lucha por la continuidad de la escuela en el
Asentamiento Roseli Nunes-MT. La metodología utilizada se
basó en la investigación bibliográfica, investigación documental
del Proyecto Político Pedagógico-PPP de la escuela e
investigación de campo con la aplicación de entrevistas
semiestructuradas con cinco educadoras de la EEMC y en la
participación en reuniones pedagógicas, en un abordaje
cualitativo, utilizando la metodología utilizada investigación
participante. La escuela es el corazón del asentamiento y ser
educador/a del campo es estar orientado a las diversas
dimensiones, constatamos con este estudio que los/as
educadores/as de la escuela han logrado permanecer en el
campo, con el apoyo de los asentados/as y los asentados/as
y/dando continuidad a la escuela del/en el campo, sin embargo
vivencia muchos desafíos en la lucha por su permanencia de la
escuela.
Palabras clave: Educación del Campo, Asentamiento Roseli
Nunes, Escuela Madre Cristina, Educadores y Resistencias.
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Introdução
Este trabalho é fruto de reflexões de
estudos propiciados pela especialização em
Educação Ambiental Campesina,
promovido pelo Grupo Pesquisador em
Educação Ambiental, Comunicação e Arte
GPEA-UFMT em parceria com o
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra-MST, com educadores/as e com
pessoas assentadas que têm vínculo com o
Campo e que durante dois anos de estudos
abordou questões referente à Educação
Ambiental, visando possibilidades de
transformação, especialmente na realidade
local de cada estudante.
Sou camponesa
i
, e doze anos
assentada no Roseli Nunes
ii
, educadora na
Escola Estadual do Campo Madre Cristina
EEMC e militante no MST e vivencio os
conflitos e enfrentamentos para que o/a
educador/a do campo seja valorizado, seja
reconhecido, de acordo com suas
especificidades. Este trabalho tem
relevância tanto pessoal e coletiva, quanto
acadêmica, pois a partir da
contextualização desta realidade poderá
contribuir com novos debates e novos
estudos.
Atualmente estamos vivenciando
momentos de perda de direitos, e
constatamos estas perdas especialmente na
educação. A educação enquanto
organizadora e produtora da cultura de um
povo e enquanto produzida por uma
cultura - a cultura do campo - não pode
permanecer seguindo a lógica da exclusão
do direito à educação de qualidade para
todos e todas. A educação de modo geral
vem sendo pensada como forma de
dominação, tendo como objetivo obter um
ser humano patriótico, segundo as regras,
servindo à pátria, e atender à evolução e às
necessidades da produção econômica do
país, indo contra os valores humanos,
formando somente mão de obra que
privilegiam alguns.
A escola do campo tem como
proposta contrapor este sistema, no entanto
a grande maioria das escolas do campo não
prepara as crianças nem para o mundo
urbano e nem para o mundo do campo
(com suas diferentes expressões culturais,
de organizar a vida, de convivência), mas
sim para serem subservientes à gica do
capitalismo, ou para serem explorados,
espoliados e nada mais.
A escola do campo, muitas vezes vai
perdendo esta identidade e o faz relação
com os conteúdos propostos no currículo
com a realidade camponesa, com a
construção do saber camponês, seus
valores, com atitudes voltadas para a
realidade local.
Neste trabalho destacaremos o
surgimento da EEMC, que com práticas
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pedagógicas diferenciadas vem
possibilitando uma maior reflexão-ação
neste projeto de construção de uma
sociedade mais justa e igualitária, em que
os povos do campo tenham vez e voz na
formulação das políticas, principalmente
valorizando os saberes e a cultura do povo
camponês, promovendo a produção de suas
próprias expressões culturais e vinculando
a pesquisa e a produção do conhecimento.
A escola é o espaço onde os/as
educadores/as e os/as educandos/as passam
uma boa parte de seu tempo e, por isso,
deve proporcionar não somente a
aprendizagem do conhecimento científico,
mas também, trabalhar na construção de
valores, de solidariedade, de compreensão,
de determinação, de cooperativismo, de
agroecologia, de entusiasmo, de atitude, de
direitos e deveres. Assim, o educando
precisa aprender para compreender a vida,
a si mesmo e a sociedade, como condições
para ações competentes na prática da
cidadania.
Caminhos da Pesquisa
O presente trabalho traz
fundamentações acerca da Educação do/no
campo e sobre a permanência do/a
Educador/a camponês/a no campo, e sobre
as múltiplas relações do/a educador/a com
a realidade que ele/a está inserido/a:
pedagógica, histórica, social, econômica,
política e cultural, e as trajetórias históricas
da Escola Estadual Madre Cristina.
Este artigo fundamentou-se na
pesquisa bibliográfica, pesquisa
documental do PPP da escola e pesquisa de
campo, numa abordagem qualitativa,
utilizando-se a pesquisa participante, e
como instrumento para coleta de dados,
realizamos observação participante,
anotações no caderno de campo, a
aplicação de entrevistas semiestruturadas e
também a participação em reuniões
pedagógicas.
As entrevistas foram realizadas com
cinco docentes do Assentamento Roseli
Nunes. Um homem e quatro mulheres com
aproximadamente vinte anos de docência
na EEMC, da faixa etária entre 45 a 59
anos de idade. Os critérios de escolhas
dos/as pesquisados/as foram educadoras
que participam do coletivo de educação
desde o período de acampamento ou
período do comodato, que estão inseridos
mais tempo no processo e que têm
participação efetiva no desenvolvimento
das atividades na EEMC e nas reuniões
pedagógicas.
Para o desenvolvimento desta
pesquisa optamos por uma abordagem
metodológica qualitativa referendada nos
estudos de Luckesi (1985), Santos (1989),
Brandão (1999, 2007) e Gil (1996), o que
nos permitiu, a partir do ir e vir constante
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entre observações e reflexão teórica,
reordenar e reconceitualizar o objeto de
estudo, tornando visíveis relações e
significados antes opacos.
Desenvolvemos uma pesquisa
participante que, para Santos (1989), é a
“prática social de conhecimento”. Esse
autor reforça o caráter social da atividade
de pesquisa, conferindo-lhe como objetivo
último o conhecimento para a vida social.
Gil (1996, p. 37) complementa essa ideia
ao afirmar:
pesquisa é um procedimento racional
e sistemático que tem como objetivo
proporcionar respostas aos problemas
que são propostos ... A pesquisa é
desenvolvida mediante o concurso
dos conhecimentos disponíveis e a
utilização cuidadosa de métodos,
técnicas e outros procedimentos
científicos ... ao longo de um
processo que envolve inúmeras fases,
desde a adequada formulação do
problema até a satisfatória
apresentação dos resultados. (Gil,
1996, p. 37).
Para Luckesi (1985, p. 51), devemos
pensar no conhecimento não “como um
mecanismo de compreensão e
transformação do mundo”, mas também
“como uma necessidade para a ação e,
ainda, como um elemento de libertação”.
Por sua vez, Brandão (1999) denomina
pesquisa participante como aquela que
permite radicalizar a participação política
dos “participantes”, e tenha como ponto de
partida a articulação entre a produção de
conhecimentos para a conscientização dos
sujeitos e solução de problemas
socialmente significativos. Essa
modalidade de pesquisa tem o propósito de
compartilhar os saberes produzidos pelos
diferentes sujeitos envolvidos no processo
de pesquisa. Aqui os participantes deixam
de ser “objetos” de estudo para serem
pesquisadores, produtores de
conhecimentos sobre sua própria realidade.
O sujeito que vive a realidade
socioambiental em estudo é, portanto, um
sujeito-parceiro das investigações definidas
participativamente; ou, ainda, um
pesquisador comunitário que constrói e
produz conhecimentos sobre essa
realidade, com o objetivo de promover,
pela ação-reflexão-ação, transformações na
realidade socioambiental que investiga.
Neste sentido destaca Brandão:
As pesquisas participantes alinham-
se em projetos de envolvimento e
mútuo compromisso de ações sociais
de vocação popular. Assim,
geralmente, elas colocam face-a-face
pessoas e agências sociais “eruditas”
(como um sociólogo, um educador de
carreira ou uma ong de direitos
humanos) e “populares” (como um
indígena tarasco, um operário
sindicalizado argentino, um
camponês semialfabetizado do
Centro-Oeste do Brasil ou o
Movimento dos Trabalhadores Rurais
Sem-Terra). De modo geral, elas
partem e diferentes possibilidades de
relacionamentos entre os dois polos
de atores sociais envolvidos,
interativos e participantes. (2007, p.
54).
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Dessa forma, cada um tem um papel
no delineamento coletivo e participativo,
nas investigações pretendidas, isto é: as
respostas do que se vai investigar, como se
vai investigar, para quê se vai investigar
são compartilhadas e coletivamente
respondidas. Os temas de pesquisa têm um
importante papel nessa metodologia, e ao
invés de ser o objetivo em si mesmos,
transformam-se em temas geradores da
produção de conhecimentos e das ações
educativas sobre a realidade em estudo.
Na pesquisa realizada elaboramos
alguns objetivos que, ao longo do texto,
serão pautados: Identificar o surgimento da
Escola; diagnosticar quais as dificuldades
encontradas pelos/as educadores/as do
campo em permanecer no campo; analisar
o processo de auto-organização dos/as
educadores/as e dos/as assentados/as na
luta para a continuidade da escola no
Assentamento Roseli Nunes- MT.
Esta pesquisa não teve a pretensão de
encerrar em si as discussões, mas de
promover novos debates e contribuir com
estudos voltados para a temática da
educação do campo e para a permanência
dos/as educadores/as do campo nas escolas
que estão inseridas em suas comunidades.
Educação do/no campo: desafios e
perspectivas
A educação do/no campo precisa ser
uma educação específica e diferenciada.
Mas, sobretudo deve ser educação, no
sentido amplo de processo de formação
humana, que constrói referências para a
intervenção das pessoas e dos sujeitos
sociais na realidade, garantido que todas as
famílias camponesas tenham acesso a uma
educação de qualidade, voltada aos
interesses da vida do campo.
Um dos desafios no processo
educacional das escolas do/no campo é
definir e compreender quais são as
dimensões desse ensino que perpassa pela
valorização da vida no campo e que
contemple a relação com o trabalho na
terra. Os conteúdos propostos pelo sistema
diferenciam muito pouco a educação
voltada para a cidade ou para o campo. No
entanto, o currículo da escola do campo
necessita estar pautado em pedagogias que
atendam às necessidades e aos interesses
dos educandos e educandas, como ressalta
Arroyo, Caldart e Molina quando afirmam
que:
As reflexões que abarcam a
complexidade dos problemas da
Educação do Campo, não podem ser
compreendidas sem se analisar a
dificuldade maior, que é a de
sobrevivência no espaço rural, na
sociedade brasileira. É preciso educar
para um modelo de agricultura que
inclui os excluídos, que amplia os
postos de trabalho, que aumenta as
oportunidades do desenvolvimento
das pessoas e das comunidades, e que
avança na produção e na
produtividade centradas em uma vida
mais digna para todos e respeitadora
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dos limites da natureza. (Arroyo,
Caldart & Molina, 2004, p. 13).
A construção dessa nova escola
precisa constituir projetos pedagógicos
com clareza política, competência técnica e
valores humanistas e socialistas. O PPP da
escola do campo tem que fortalecer novas
formas de desenvolvimento, baseadas na
justiça social, na cooperação agrícola, no
respeito ao meio ambiente e na valorização
da cultura camponesa.
Falar em educação do Campo é
defender uma nova concepção, um
novo jeito de educar que supere o
tecnicismo, o individualismo e a
competitividade pregada pela escola
capitalista. Portanto, falar de
educação do/no Campo é repensar a
organização da educação no
assentamento, na comunidade como
um todo e não apenas na escola, isto
porque a formação para um sujeito
agir e de trabalhar coletiva e
solidariamente é tarefa de toda
comunidade. (Machado, 2011, p. 32).
Existem muitos desafios e problemas
que necessitam ser sanados para que
realmente aconteça uma transformação na
educação do campo, assim, faz-se
necessário o envolvimento de todos/as,
para que tomem parte de todo o processo
escolar e das tomadas de decisões.
No campo, a taxa de analfabetismo
ainda é alta, pois muitas pessoas que não
tiveram oportunidade de estudar quando
crianças, e mesmo com todo o incentivo a
estudar na Educação de Jovens e Adultos
EJA, não entram para a escola e muitos
quando entram ainda desistem, seja por
cansaço do trabalho, época de plantios e
colheitas, dificuldades de locomoção e
motivos pessoais.
Soma-se a todos esses problemas
elencados, a falta de materiais didáticos e
pedagógicos que subsidiem práticas
educativas vinculadas às questões
específicas da realidade do campo, e com
isso vem diminuindo o número de escolas
no campo, as secretarias tanto Municipais
quanto as estaduais alegam que as escolas
do campo são mais caras e, muitas vezes,
inviáveis para o sistema.
A rede de ensino da educação básica
da área rural de acordo com os dados
levantados no Censo Escolar 2016
representa 33,9% das escolas brasileiras,
sendo 7,2% das escolas possuem um único
docente. São 4,5 mil escolas em áreas de
assentamento; 2,4 mil em áreas
remanescentes de quilombos e 3,1 mil em
terras indígenas (Brasil, 2017).
Com a ausência de políticas
educacionais intencionais definidas pelo
currículo, o campo foi se esvaziando de
significação política, histórica, científica e
cultural, uma vez que os saberes da terra se
constituíam em não saberes e, em função
da ausência de políticas públicas de apoio à
agricultura familiar, à formação
tecnológica e profissional, o poder público
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começa a nucleação das escolas do campo,
fechando as escolas menores e levando os
estudantes para uma escola polo. Assim,
grande parte das prefeituras se concentra
em garantir o transporte escolar dos
educandos do campo para as cidades, num
trajeto de horas de viagem, por estradas
precárias, e em muitos casos com uma
frota imprópria, inadequada e sem
condições de segurança e conforto.
Um grande avanço nesse setor
educacional foi a aprovação das Diretrizes
Operacionais para a Educação Básica nas
Escolas do Campo (BRASIL, 2002), que
foram elaboradas e instituídas pelo
Conselho Nacional de Educação, com a
participação dos movimentos sociais e
sindicais, Universidades e ONGs. As
Diretrizes são normas e critérios políticos,
pedagógicos, administrativos e financeiros
que têm fundamentos legais e servem para
orientar a organização das escolas do
campo, cujas regras devem ser
regulamentadas pelos sistemas de ensino
municipal, estadual e federal.
A instituição das Diretrizes resulta
das reivindicações históricas e mais
acentuadas na última década, por parte das
organizações e movimentos sociais que
lutam por educação de qualidade social
para todos os povos que vivem no campo,
com identidades diversas, tais como,
Pequenos Agricultores, Sem Terra, Povos
da Floresta, Pescadores, Quilombolas,
Ribeirinhos, Extrativistas, Assalariados
Rurais.
Ela expressa a luta dos povos do
campo por políticas públicas que garantam
o direito à educação, a uma educação que
seja no campo e do campo, como
explicitam Caldart e Benjamin (2000, p.
26): “No: o povo tem direito de ser
educado no lugar onde vive. Do: o povo
tem direito a uma educação pensada desde
o lugar e com a sua participação, vinculada
à sua cultura e às suas necessidades
humanas e sociais”. O “Caderno de
Memória da Conferência Nacional: por
uma Educação Básica do Campo”
realizada em 1998, nos ajuda a entender
que: “Não basta ter escolas no campo;
quer-se ajudar a construir escolas do
campo, ou seja, escolas com um projeto-
político-pedagógico vinculado às causas,
aos desafios, aos sonhos, a história e a
cultura do povo trabalhador do campo.
(Kolling, Nery & Molina, 1999, p. 29).
Com esta demanda, o sentido de
educação e de escola do campo se torna
mais complexo e requer cuidados
especiais. O/a educando/a o aprende
apenas na sala de aula, mas na escola como
um todo: pela maneira como a mesma é
organizada e como funciona, pelas ações
globais que promove pelo modo como as
pessoas nela se relacionam e como a escola
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se relaciona com a comunidade, pela
atitude expressa em relação às pessoas, aos
problemas educacionais e sociais, pelo
modo como nela se trabalha, dentre outros
aspectos.
Educadores/as do campo: protagonista e
construtores da sua própria história
A Escola Estadual Madre Cristina,
localizada no Assentamento Roseli Nunes
no município de Mirassol D’Oeste-MT,
nasce da luta de um povo que rompe com o
latifúndio do saber e em movimento,
assentados na luta pela reforma agrária e
organizados pelo Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra-MST, se
reúnem e formam o coletivo de educação
para a construção e organização da escola
itinerante, que “... não existe em nenhum
lugar na sua totalidade, mas os seus
principais aspectos estão presentes e em
funcionamento em muitos lugares”. (MST,
1999, p. 199), no dia 17 de março de 1997,
na Fazenda Facão, no município de
Cáceres-MT, com aproximadamente 600
famílias. Estas famílias foram distribuídas
em três assentamentos e aproximadamente
350 famílias foram destinadas para o
Assentamento Roseli Nunes.
A luta pela terra é uma luta em
família. A presença das crianças cria
novas necessidades para a
organização do movimento. Assim, o
espaço e a vivência no acampamento
passam obrigatoriamente a envolver
não somente adultos, mas
necessariamente novos sujeitos: as
crianças. Todo esse processo vai
materializando a preocupação do
Movimento e do Setor de Educação
com esses novos sujeitos, que não
são passivos, muito pelo contrário,
aprendem a mobilizar-se e indignar-
se com o sofrimento e a luta de seus
pais e passam também a incorporá-la,
certamente que não na mesma
dimensão que os adultos, com a falta
do que comer, com a falta de trabalho
para seus pais, enfim, vivenciam
situações concretas de expropriação
social. (Alves, 2001, p. 80).
E todo este processo de luta pela
terra, diante da necessidade de educação, a
escola itinerante é pensada e construída
com o trabalho de todos, e em mutirão
constroem a escola de palha, os bancos e as
mesas de madeira e organizaram os
estudantes por turmas, e convidaram
alguns acampados que tinham experiência
como docentes ou que tinham afinidade
para o exercício da docência para iniciar as
aulas, como é destacada na fala da
educadora 1:
“Fui para o acampamento, e não
tinha muito estudo, mas dos que
estavam acampados e que não tinha
experiência como professora, eu
tinha a maior formação, tinha a 8ª
série, fui convidada para dar aulas, e
organizamos tudo que precisava, na
medida do possível e dentro das
possibilidades que eram possíveis
naquele momento, era uma escola
diferente, cantávamos com os
estudantes, fazíamos mística,
escrevia no chão, e era uma
realidade que aprendia a cada dia
como ser educadora dentro de um
acampamento”. (Entrevista,
02/2018).
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Outra educadora destaca suas
lembranças deste período e da sua
experiência na escola itinerante:
“Quando tinham as mobilizações no
INCRA, chegamos a ficar seis meses,
a escola estava lá, cantávamos,
fazíamos mística, quando eram
despejados e ocupavam outra
fazenda, também estava a escola,
até que saiu o comodato em abril de
1998 e a primeira construção
também foi o espaço da escola”.
(Educadora 3, entrevista, 05/2018).
No acampamento da Fazenda Facão,
o nome da Escola era Roseli Nunes, in
memorian a uma acampada que tombou na
luta, assassinada no Estado do Rio Grande
do Sul em uma mobilização por um
pedacinho de terra, para morar com seus
filhos, a qual tem uma frase dita por ela
muito significativa que diz: “prefiro morrer
lutando, a morrer de fome”. no período
do comodato o nome da Escola passou a
ser Escola Madre Cristina.
Concomitante a ocupação da fazenda
Prata, no ano de 1998, em assembleia
escolheram o nome Madre Cristina para a
escola, em homenagem a Célia Sodré
Dória, mais conhecida como Madre
Cristina, uma freira, psicóloga, militante
política e uma incansável defensora da
liberdade, tendo se tornado uma presença
marcante no cenário político e científico do
país, e que na época da ditadura militar
lutou com todas as forças para salvar vidas
e ideais e sofreu ameaças de prisão e de
morte. Mas nada a fez desistir de sua luta
pela construção de uma sociedade mais
justa.
O Comodato é o período em que as
famílias aguardam acampadas na fazenda a
homologação legal por parte do Instituto
Nacional de Colonização e Reforma
Agrária-INCRA, local em que depois as
famílias serão assentadas, serão cortados
os lotes e demarcado para que seja
ocupado por cada família que está
acampada naquele território.
Assim, em abril de 1998, a Fazenda
Prata no município de Mirassol D’Oeste
foi ocupada pelos acampados e aguardaram
a homologação, e uma das primeiras
construções foi a escolinha de palha, e o
nome de Roseli Nunes foi escolhido
coletivamente para ser o nome do
Assentamento, que fica na região sudoeste
do estado de Mato Grosso, ao Norte do
município de Mirassol D’Oeste,
aproximadamente 22 km. A área total do
assentamento é de 10.611 hectares sendo
que: 2.170 hectares de área comunitária e
8.441 hectares distribuídos em 331 lotes,
com aproximadamente 350 famílias.
No período do comodato, de abril de
1998 a julho de 2002, e diante de uma
ameaça de perca de território, os/as
educadores/as ocuparam também o outro
lado do rio e construíram uma sala anexa,
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de folha de coqueiro e sempre organizando
coletivos, dando aula no pátio da
prefeitura, para que legalizassem a situação
da educação.
A EEMC foi criada legalmente em
junho de 1998 (ainda na época do
acampamento no comodato), conhecida
como “Botinha”, onde funcionava da
primeira a sexta série, e em seguida foi
feita com tábuas e telhas usadas, e foi
implantada e série (2000/2001) e no
ano de 2002, foi o parcelamento da terra e
cada família foi para seus lotes,
construíram seus barracos, no entanto não
tinha estrada, e grande parte dos estudantes
evadiram da escola, pois moravam longe
das salas, e não tinham condições de
frequentar as aulas.
No ano de 2003, o enfrentamento
aconteceu com a secretaria de educação do
Município de Mirassol D’Oeste, que não
regularizava as turmas, e por vários meses
os/as educadores/as trabalharam
voluntariamente para assegurar a escola, a
proposta da secretaria de educação era que
entrasse um ônibus e levasse os/as
estudantes para uma comunidade vizinha,
mas os/as acampados/as resistiram através
de luta e mobilizando todas as famílias, e
mesmo assim o ônibus começou a pegar os
estudantes da parte norte do Assentamento
e levá-los para estudar na escola São José
da Veredinha que fica a uns 30 km do
Assentamento Roseli Nunes.
Quando saiu a verba para a
construção das casas, em 2003, cada
família doou cinquenta tijolos para a
construção da escola, e iniciaram um
trabalho coletivo no Núcleo número 09 do
Assentamento, hoje chamado Núcleo
Social da Escola, e em junho iniciaram as
construções das casas de alvenaria, das
estradas e das pontes, e em 2004, foi
concluída a construção do primeiro bloco,
com recursos do Governo do Estado, e
após a inauguração passou a ser
reconhecida como Escola Estadual Madre
Cristina, e começaram a disponibilizar dois
ônibus para o transporte dos/as estudantes.
Neste ano foi designada para o cargo
uma professora para ser a diretora da
escola e uma secretária para organização
dos documentos, foram dois anos de
muitas dificuldades, ainda não tinha
energia elétrica e o ensino noturno
acontecia com um gerador movido a diesel
e na maioria das vezes com dinheiro dos
próprios educadores/as, sendo que no final
do ano de 2005 foi inaugurada a energia
elétrica no Assentamento.
No dia 13 de fevereiro de 2006,
aconteceu a primeira votação para a
escolha da nova gestão da escola, sendo
eleita democraticamente outra professora,
que juntamente com o coletivo de
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educadores elaborou metas e projetos, que
possibilitassem um currículo diferenciado,
voltado para as especificidades do campo e
da realidade em que a escola estava
inserida.
No ano de 2008 um educador foi
eleito democraticamente e permaneceu por
dois mandatos e por meio de muitas lutas e
resistências foi construída a quadra
poliesportiva na escola e foi implantada a
educação infantil, em parceria com a
Secretaria Municipal de Mirassol DOeste
e o Estado e atendia as crianças no pré II,
com 5 anos de idade, como destaca a
educadora 2:
Não tínhamos a educação infantil
na escola e há vários anos estávamos
tentando dialogar e fazer acordos
com a prefeitura, e acolhíamos as
crianças de cinco anos na turma da
primeira série, e no ano de 2008,
fizemos uma mobilização na
prefeitura e um abaixo assinado,
fomos na defensoria pública e depois
do período de férias no terceiro
semestre é que foi possível contratar
uma professora para lecionar nesta
turma”, foi uma alegria imensa,
improvisamos o espaço e
organizamos para que começasse as
aulas”. (Entrevista 05/2018).
No ano de 2012, a educadora que
havia sido a primeira gestora se elegeu
novamente, e permaneceu por dois
mandatos, e houve um avanço significativo
com a implantação do Ensino Médio
Diversificado e dois anos depois a
implantação do Ensino Médio Integrado e
Profissionalizante - EMIEP, com o curso
de Agroecologia, que foi muito importante
para que as práticas camponesas fossem
possibilitadas no currículo e também na
prática, como destaca o educador 5:
“O EMIEP, foi uma conquista muito
importante não só para a escola, mas
para o Assentamento e para o MST,
pois é uma possibilidade de
discutirem em sala de aula, conceitos
que tem relação com a nossa
realidade, com a vivência dos
estudantes e de desenvolver na
prática a agroecologia, o trabalho
coletivo, a soberania alimentar, entre
outros”. (Entrevista 05/2018).
No ano de 2016, outra educadora
assumiu a gestão e em conjunto com o
coletivo vem resistindo pela permanência
do EMIEP, da EJA que foi implantada
desde o ano de 1997, no período do
acampamento, pois a cada ano são novas
investidas do Estado em acabar com estas
turmas, e juntamente com os/as
assentados/as e representantes do MST,
marcam audiência na Secretaria de Estado
de Educação, Esporte e Lazer - SEDUC-
MT, fazem atas, justificativas e recolhem
assinaturas, para que estas modalidades de
ensino continuem com salas abertas e
possibilitem uma educação diferenciada e
de qualidade.
No ano de 2018, a escola encontra-se
com 420 estudantes, em três turnos:
matutino, vespertino e noturno, e atende
nas modalidades de ensino fundamental,
do ano ao ano em ciclos de formação
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humana que vem sendo respaldada na
compreensão do ser humano como ser em
permanente processo de educação, um ser
histórico-social, que vai se constituindo na
história das relações que estabelece, de
ensino médio, com uma turma
multisseriada e três turmas de EMIEP, e a
EJA, que atende desde o primeiro
segmento ao Ensino dio, em que todas
as turmas de EJA são multisseriadas, sendo
quatro salas na escola sede, duas salas
anexas no Assentamento Roseli Nunes,
quatro salas no Assentamento Margarida
Alves na Escola Zumbi dos Palmares e três
salas no Assentamento Silvio Rodrigues,
com estrutura construída em coletivo
pelos/as educadores/as e estudantes de lona
e palha de coqueiro.
A EEMC, apesar de ser considerada
uma das melhores escolas do campo desta
região, ainda necessita de adequações na
infraestrutura, como por exemplo,
banheiros com acessibilidade para
estudantes especiais, e que atualmente
encontra-se em local inadequado próximo
da cozinha, reparos na quadra coberta, que
alaga com a água da chuva, a construção
do refeitório, a sala dos/as professores/as,
sala de coordenação, a biblioteca que está
improvisada e um laboratório de ciências, e
a construção de salas de aula, cozinhas,
banheiros e uma infraestrutura adequada
no Assentamento Silvio Rodrigues para os
estudantes da EJA, como destaca a gestora:
“Todas estas melhorias e pedidos de
construções já foram informadas à
SEDUC, por meio de reuniões,
ofícios e abaixo assinados e que estes
afirmam que estão estudando sobre
estas adequações, mas que até o
momento ainda não obtivemos
nenhuma resposta”. (Fala em uma
reunião pedagógica, 02/2018).
Os desafios vivenciados na EEMC,
para dar continuidade à escola do/no
campo, são muitos, como falta de
infraestrutura adequada, falta de transporte
de qualidade, pontes que caem nos
períodos de chuva, estradas ruins nos
períodos chuvosos, no entanto a bandeira
de luta por direito à educação de qualidade
para todos está alicerçada em práticas
pedagógicas diferenciadas e na resistência
dos/as educadores/as e dos/as
assentados/as nos diferentes
enfrentamentos para abrir turmas, contratar
professores/as e possibilitar um currículo
que seja coerente com a realidade do
campo dentro dos princípios do MST, que
tem como princípio central buscar
condições de vida que favoreçam a
permanência da família no campo e o
redimensionamento da estrutura fundiária
do Brasil. A luta pela educação é tão
importante como a luta pela reforma
agrária dentro da organização.
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A democratização do conhecimento é
considerado tão importante quanto a
reforma agrária no processo de
consolidação da democracia. Além
dos acampamentos à beira de
estradas, das ocupações de terra e de
marchas contra o latifúndio, o MST
luta desde 1984 pelo acesso à
educação pública, gratuita e de
qualidade em todos os níveis para as
crianças, jovens e a adultos de
acampamentos e assentamentos. Os
nossos esforços nessa área buscam,
sobretudo, alfabetizar todos os
companheiros e companheiras de
acampamentos e assentamentos, e a
conquista de condições reais para que
todas as crianças e adolescentes
estejam na escola ... A educação
acontece de maneira permanente, em
um movimento continuado de
formação das pessoas. (MST, 2010,
p. 23).
Neste sentido, uma das lutas na
EEMC e dos/as assentados/as é a
permanência dos/as educadores na escola,
especialmente aqueles que vêm deste
processo de luta, desde o acampamento,
como também aqueles que foram se
inserindo neste processo, e que se
identificaram como educadores/as
camponeses/as, pois em vários momentos
por meio da contagem de pontos ou
atribuição dos novos concursados, a
Assessoria Pedagógica do município
atribuía profissionais para trabalhar na
escola, simplesmente por não ter vaga na
cidade, e que a partir do enfrentamento,
com resistência da comunidade e do
coletivo de educadores/as acabavam
encontrando outras vagas para estes/as
profissionais e contratando os/as
educadores/as da escola.
Na escola estão lotados/as 47
(quarenta e sete) educadores/as, sendo 31
(trinta e um) docentes, 12 (doze) na função
de apoio nutricional, limpeza e vigilância,
01 (um) bibliotecária, 02 (dois) técnicas
administrativas e 01 (uma) secretária.
Quadro1: Demonstrativo do quantitativo dos/as educadores/as da Escola Estadual Madre Cristina
Educadores da Escola Estadual Madre Cristina
Total
Docentes
Apoio nutricional
Limpeza
Vigilância
Bibliotecária
Técnicas
administrativas
Secretária
31
12
01
02
01
47
Fonte: Elaborado pelos autores (2018).
Dos/as 31(trinta e um) docentes, 15
(quinze) vêm do processo de luta pela
terra, seja como educador/a desde o início
ou como educando/a que estudou no
período da Escola Itinerante, fizeram
formação e hoje são educadores/as.
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Figura 1: Docentes da Escola Estadual Madre Cristina.
docentes que
vieram desde o
acampamento
docentes que
vieram depois
Fonte: Elaborada pelos autores (2018).
Dos/as 31 (trinta e um) docentes, 21
(vinte e um) são assentados/as, 02 (dois)
no Assentamento Santa Helena, 01 (uma)
no Assentamento Silvio Rodrigues, 16
(dezesseis) no Assentamento Roseli Nunes,
e 02 (duas) no Assentamento Margarida
Alves.
Figura 2: Docentes assentados e não assentados da Escola Estadual Madre Cristina
docentes
assentados
docentes não
assentados
Fonte: Elaborada pelos autores (2018).
dez anos tinha cinco
educadores/as com graduação, atualmente
todo o coletivo tem graduação, e somente
três não têm especialização, pois estão
finalizando, e duas estão cursando
mestrado em educação. A preocupação
com a educação não é somente para os/as
acampados/as, como também no coletivo
de educadores/as, em que a preocupação
não é individual, tanto acadêmica quanto
formação permanente na escola, sempre é
um compromisso do coletivo, que
possibilita ao educador/a a realização de
cursos, mesmo em período de ano letivo
escolar, em que os professores que ficam
na escola assumem a turma daquele que
vai estudar.
O acesso a graduações e pós-
graduação em alternância permite que o/a
educador/a estude e continue trabalhando,
como destaca Lima:
A Pedagogia da alternância que
propõe o estabelecimento de formas
de ensino possam se alternar entre a
família, a comunidade rural e a
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escola. Tal proposta vislumbra a
formação de novos sujeitos sociais, e
não se restringe a escola, pois a linha
educativa que sustenta a identidade
dos Sem Terra abrange processos
sociais mais amplos. A Pedagogia da
Alternância parte do princípio de que
a aquisição de conhecimentos não se
reduz ao aprendizado da leitura e da
escrita. (Lima, 2001, p. 116-117).
A grande maioria dos cursos que
os/as educadores/as da EEMC fizeram
foram em regime de alternância ou
educação à distância. E destacamos que
dos 31(trinta e um) docentes somente 03
(três) não cursaram graduação ou pós-
graduação relacionada com o campo, os
demais tiveram a oportunidade de realizar
formações que tinham relação com o
campo, como esta especialização em
“Educação Ambiental Campesina-UFMT”,
em que 7 (sete) educadoras e uma técnica
administrativa estão finalizando. Esta
possibilidade de cursar uma especialização
voltada aos/às camponeses/as contribui
para a formação e para a constituição do/a
educador/a camponês/a, e em sala de aula
possibilita reflexões e ações voltadas para
a sua própria realidade, valorizando os
saberes camponeses e um planejamento de
acordo com o currículo da EEMC.
O planejamento é um conjunto de
atividades desenvolvidas, com a estratégia
de intervenção na realidade, por isso deve
ser constante, participativo e democrático,
abrange todos os momentos do processo
educativo, ela acontece tanto em
discussões coletivas com os/as
educadores/as quanto em reuniões com os
pais e comunidades, quanto em sala com
os estudantes envolvendo todos os sujeitos
inseridos neste processo dentro de cada
espaço de discussão, permitindo que todos
possam ser ouvidos, e que contribua
também para que este planejamento
contemple ações de interesse coletivo.
A avaliação também é muito
importante na escola do campo, e um dos
procedimentos desenvolvidos é a
autoavaliação, para que os sujeitos
envolvidos se auto avaliem e avaliem os
outros. A elaboração do Projeto Político-
Pedagógico-PPP é feita de forma
participativa, e sua concretização depende
do esforço conjunto e da vontade política
dos/as estudantes, educadores/as,
pais/mães e assentados/as, e tem por
filosofia:
A formação integral do sujeito com
base nos seguintes princípios;
Educação de qualidade social para
todos (as); compromisso com a
educação básica do campo que
contribua na transformação social
dos sujeitos envolvidos; com uma
educação voltada para as várias
dimensões da pessoa humana;
educação que cultiva valores
humanistas; educação para o trabalho
e a cooperação; educação como
processo permanente de formação e
transformação humana, tendo em
vista o desenvolvimento social,
economicamente justo e
ecologicamente sustentável conforme
preceitua as diretrizes operacionais
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para as escolas do campo. (PPP,
2018, p. 3).
Tendo em vista que na educação do
campo não se tem uma fórmula ou receita,
para dar certo ou errado, grande parte das
práticas pedagógicas se consolidam pela
vivência, o que deu certo continua se
praticando e o que não deu certo, muda,
pensa, e faz de uma maneira nova. Nesta
construção de conhecimento a valorização
dos saberes dos/as assentados/as, e da
própria construção do MST, é muito
importante, pois é uma educação que brota
das lutas dos movimentos e das
organizações sociais do campo, através de
resistências e enfrentamentos de quem não
conforma com a situação social em que
estamos e que luta por uma educação
da/para a classe trabalhadora e não da
classe dominante para a classe
trabalhadora.
Nesse sentido destacamos que a
educação vivenciada na EEMC, é algo
além do que ter uma escola localizada no
assentamento, é buscar um novo jeito de
educação, que seja capaz de promover
ações pensadas pelos/as trabalhadores/as
do campo para os/as trabalhadores/as do
campo nas suas diversas atividades e
necessidades, também repensar os
pressupostos teórico-metodológicos em
relação à educação do campo, como
ressalta a educadora 4: Nossa escola é
uma troca de experiência entre educandos,
professores, pais e comunidade em geral e
tem o compromisso de resgatar todas as
pessoas”. (Entrevista 02/2018).
A EEMC mantém seus objetivos de
acordo com a proposta Pedagógica, com
conteúdo que atende aos anseios e a
realidade da comunidade, visando integrar
o/a educando/a às mudanças sociais; e
proporciona o desenvolvimento e a
aprendizagem incentivando a continuidade
dos estudos, mostrando ser este o melhor
caminho para a formação geral e
preparação para a vida, promovendo uma
escola participativa e de qualidade. Como é
descrito no PPP:
Tem como objetivo promover a
escolarização e a formação de
crianças, adolescentes, jovens e
adultos que sejam sujeitos da
construção de sua própria história;
desenvolver ões educativas e de
interesse coletivo. Incentivar a
continuidade dos estudos seja no
ensino fundamental, ensino médio,
Ensino Médio Integrado - EMIEP ou
EJA; Propiciar o desenvolvimento de
conteúdos significativos com a
realidade do campo e os conteúdos
curriculares; Promover a
escolarização e a formação social,
moral e cultural dos educandos (as)
do campo. Valorizar e garantir nas
escolas do campo, os educadores do
campo, proporcionando formação aos
mesmos para a sua atuação
pedagógica em especial nas escolas
de assentamento, de modo que sejam
sensíveis aos inúmeros problemas
que compõem o cotidiano de uma
escola do campo. (PPP, 2018, p. 4).
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O PPP apresenta-se articulado ao
compromisso sociopolítico demonstrando
uma preocupação com a formação dos
sujeitos, seja educando/a ou educador/a, e
ao mesmo tempo é pedagógico por definir
ações educativas e caracterizar a escola
do/no campo com seus propósitos e sua
intencionalidade.
Podemos observar que a Escola
Estadual “Madre Cristina” está em
processo de construção e os múltiplos
sujeitos educadores/as, educandos/as,
pais/mães, gestores/as, zeladores/as,
cozinheiras, guardas e comunidade estão
interagindo para construir uma educação
de qualidade; os múltiplos objetivos e
metas que demarcam os horizontes da
proposta deste ano estão sendo
gradativamente buscados e alcançados, e
as medidas pedagógicas e políticas que
alimentam o dia a dia do trabalho estão
sendo exercitadas e aprofundadas. Como
retrata o Caderno de Educação, número 09,
que traz a nossa concepção de escola:
A relação do MST com a educação é,
pois, uma relação de origem: a
história do MST é a história de uma
grande obra educativa. Se
recuperarmos a concepção de
educação como formação humana é
sua prática que encontramos no MST
desde que foi criado: a transformação
“dos desgarrados da terra” e dos
“pobres de tudo” em cidadãos,
dispostos a lutar por um lugar digno
na história. É também educação o
que podemos ver em cada uma das
ações que constituem o cotidiano da
formação da identidade dos sem -
terras do MST (MST, 1999, p. 5).
No processo educativo da EEMC
vivencia-se a Pedagogia do Movimento,
que se forja na luta dos sem-terra,
buscando a humanização, fortalecida em
uma identidade e em movimento, como é
destacada no Caderno de Educação nº 9:
A pedagogia do MST é o jeito
através do qual o Movimento
historicamente vem formando o
sujeito social de nome Sem Terra, e
que no dia a dia educa as pessoas que
dele fazem parte. E o princípio
educativo principal desta pedagogia é
o próprio movimento. Olhar para esta
pedagogia, para este movimento
pedagógico, nos ajuda a compreender
e a fazer avançar nossas experiências
de educação e de escola vinculadas
ao MST. (MST, 1999, p. 5).
Neste sentido, destacaremos algumas
matrizes pedagógicas, as quais as escolas
vinculadas ao MST não têm a obrigação de
assumir nenhuma, mas colocar as
pedagogias em movimento para que diante
das especificidades se vivencie de acordo
com as necessidades do coletivo,
garantindo que a experiência de luta dos/as
acampados/as e assentados/as seja incluída
como conteúdo de estudo. Assim,
elaboramos um quadro com as matrizes
retratadas no Caderno de Educação nº 9:
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Quadro 02: Matrizes Pedagógicas da Pedagogia do Movimento
Primeira
matriz
Pedagogia da
luta social
Ela brota do aprendizado de que o que educa os Sem Terra é o próprio
movimento da luta, em suas contradições, enfrentamentos, conquistas e
derrotas.
Segunda
matriz
Pedagogia da
organização
coletiva
Ela brota da raiz que nasce de uma coletividade que descobre um passado
comum e se sente artífice do mesmo futuro.
Terceira
matriz
Pedagogia da
terra
Ela brota da mistura do ser humano com a terra: ela é mãe, e se somos filhos e
filhas da terra, nós também somos terra. Por isto precisamos aprender a
sabedoria de trabalhar a terra, cuidar da vida: a vida da Terra (Gaia), nossa
grande mãe, a nossa vida.
Quarta
matriz
Pedagogia do
trabalho e da
produção
Ela brota do valor fundamental do trabalho que gera a produção do que é
necessário para garantir a qualidade da vida social e identifica o Sem Terra com
a classe trabalhadora.
Quinta
matriz
Pedagogia da
Cultura
Ela brota do modo de vida produzido e cultivado pelo Movimento, do jeito de
ser e de viver dos Sem Terra, do jeito de produzir e reproduzir a vida, da
mística, dos símbolos, dos gestos, da religiosidade, da arte.
Sexta
matriz
Pedagogia da
Escolha
Ela brota dos múltiplos gestos e múltiplas escolhas que os/as educadores/as e
os/as educandos/as, de que o MST, de que os seres humanos precisam fazer
cada dia. Somos seres de escolhas permanentes e delas depende o rumo de
nossa vida e do processo histórico que estamos inseridos.
Sétima
matriz
Pedagogia da
História
Ela brota do cultivo da memória e da compreensão do sentido da história e da
percepção de ser parte dela, não apenas como resgate de significados, mas
como algo a ser cultivado e produzido. A memória coletiva é fundamental para
a construção de uma identidade.
Oitava
matriz
Pedagogia da
alternância
Ela brota do desejo de não cortar raízes. É uma das pedagogias produzidas em
experiências de escola do campo que buscaram integrar a escola com a família
e a comunidade. (MST, 1999, p. 7-10).
Fonte: Elaborado pelos autores (2018).
As matrizes pedagógicas nos
possibilita a ação-reflexão-ação e nos
desafia a pensar em práticas pedagógicas
que contemplem os valores aprendidos na
luta, e as várias dimensões da formação
humana. As ações pedagógicas levam em
conta não as práticas educativas que
acontecem na EEMC, como também as
que acontecem fora da escola. Assim
descreveremos de que forma cada uma das
matrizes pedagógicas são vivenciadas.
Quadro 03: Matrizes Pedagógicas vivenciadas pelos sujeitos da EEMC
Primeira
matriz
Pedagogia da
luta social
Através das mobilizações, ocupações, seminários, imersões, debates,
caminhadas, da participação dos/as educadores/as em reuniões da direção do
MST, nas prefeituras e na coordenação do assentamento, em místicas em
memória dos que tombaram na luta, em sala de aula com leituras reflexivas e de
indignação diante das injustiças, e em projetos como a Feira de Economia
Solidária e Agroecologia - FEISOL que acontece no barracão e com a
juventude e as mulheres camponesas fortalecendo a autonomia, a esperança e a
permanência no lote.
Segunda
matriz
Pedagogia da
organização
coletiva
Através do trabalho coletivo, com a divisão de tarefas. O coletivo de
educadores/as é organizado da seguinte forma: setor político pedagógico, setor
da saúde, setor da infraestrutura (higiene em geral, embelezamento, limpeza e
acompanhamento à cozinha), setor da mística (eventos em geral, ornamentação
e animação), setor da secretaria (manter a secretaria ativa e organizada,
organizar armários, sala dos professores e biblioteca). Em cada sala tem um/a
Soares, S. M., & Senra, R. E. F. (2019). Da teimosa resistência nasce a Escola Estadual do Campo Madre Cristina
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educando/a que foi eleito democraticamente para ser o/a coordenador/a, este/a
educando/a tem que trabalhar no coletivo, juntamente com o educador/a em
prol do respeito, da disciplina, da organização dos trabalhos, buscando e
dialogando com os colegas e professores sobre a melhoria do ensino-
aprendizagem, e também com a participação dos/as educadores/as em
associações e cooperativas.
Terceira
matriz
Pedagogia da
terra
Através de conteúdos que valorizam a importância da terra para o ser humano e
principalmente para o/a camponês/a, e com projetos que levem o/a educando/a
a vivenciar as práticas agrícolas e o trabalho na terra, como o cultivo da horta
agroecológica, com o curso do EMIEP em agroecologia, e com as visitas aos
sítios dos/as assentados/as para conhecer as produções.
Quarta
matriz
Pedagogia do
trabalho e da
produção
Através da prática do trabalho coletivo na horta agroecológica, em que os
produtos são ofertados na merenda escolar com alimentos saudáveis,
produzidos pelos/as educadores/as e educandos/as na escola ou pelos/as
camponeses/as do assentamento e também nos mutirões de limpeza na escola,
pois o trabalho gera a produção e muda a qualidade de vida.
Quinta
matriz
Pedagogia da
Cultura
Através dos gestos, da religiosidade, das festas dos santos, das rezas, festa da
família, com apresentação do artesanato, das poesias, das palavras de ordem, do
punho cerrado, do hino, seja no Assentamento ou em sala de aula, onde é
respeitado o jeito de viver, de produzir e de ser dos Sem Terra e também nas
noites culturais realizadas no barracão comunitário com a apresentação das
místicas, com os símbolos como a bandeira, as ferramentas de trabalho, a
música e a dança.
Sexta
matriz
Pedagogia da
Escolha
Através de tomadas de decisões coletivas em que se respeita a individualidade
de cada sujeito, especialmente em reuniões coletivas, se respeitando, por
exemplo, quando um/a educador/a ou educando/a não quer ser um Sem Terra
ou não quer participar das místicas ou outras atividades do MST.
Sétima
matriz
Pedagogia da
História
Através do cultivo da memória, especialmente nas turmas da EJA, convidando
pessoas mais velhas para falarem de suas vivências para os mais novos, das
místicas levando os Sem Terrinhas a conhecerem o passado, cultivando a
memória coletiva, compreendendo o Movimento e construindo uma identidade
na busca de dias melhores.
Oitava
matriz
Pedagogia da
alternância
Através do processo de formação dos/as educadores/as em cursos de graduação
e pós-graduação, onde se vivencia o tempo escola e o tempo comunidade.
Fonte: Elaborado pelos autores (2018).
As práticas pedagógicas vivenciadas
na escola, como o encontro dos Sem
Terrinha, o Encontro de educadores
camponeses das escolas vinculadas ao
MST, a imersão contra a mineração, a
semana Paulo Freire, a semana Che
Guevara, as festas e noites culturais, são
atividades que têm uma identidade dos
sujeitos ligados ao MST, e que lutam pela
continuidade da escola e pelo direito de
permanecer no seu lote com vida digna, e
em todas estas práticas a presença da
comunidade é constante com interesse e
entusiasmo.
A mística está presente em todos os
momentos da vida dos assentados, na
vivência, no caminhar juntos, no jeito de
ser do Sem Terra e em todas as práticas
pedagógicas da EEMC sempre tem uma
mística fazendo a abertura de uma semana,
de um evento, de uma reunião, de um
encontro e no dia a dia dos/as
assentados/as, pois ela “é a alma de um
povo. A mística do MST é a alma do
sujeito coletivo Sem Terra”. (MST, 1999,
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p. 23), e também é destacado no PPP da
EEMC:
Em todas estas práticas os alunos
participam com interesse e
entusiasmo, as místicas são feitas
todas as semanas por séries
diferentes, com apresentações sobre o
cotidiano da escola, do movimento,
da comunidade e do mundo e ao final
canta-se o hino do Movimento, as
místicas são muito bonitas e de
grande importância para a formação
sendo um dos pilares que nos levam a
reflexões sobre as questões da escola,
da comunidade e do mundo em que
vivemos. (PPP, 2018, p. 10).
Destacamos a Mística como uma
prática pedagógica, a partir da
necessidade de entender melhor
sobre a mística do Sem Terra, e como
se constitui a mística em diversos
espaços no assentamento, com os
símbolos e suas representações. Ela é
um elemento importante e uma das
grandes ferramentas para o
desenvolvimento da aprendizagem,
pois ela condições ao sujeito, de
refletir, criar e vivenciar novas
experiências no espaço educativo,
acontece em vários momentos,
podendo ser planejada tanto pelos/as
educadores/as como pelos/as
educandos/as e consequentemente
explorada na sala, facilitando a
compreensão da realidade e a leitura
do mundo ao mesmo tempo. (PPP,
2018, p. 14-15).
A Mística é realizada em vários
momentos e se coloca em evidência e
reforça os símbolos da identidade Sem
Terra: as palavras de ordem “mais
conhecidas como gritos de ordem’”, são
formas de chamamento que o MST criou
para serem usadas nas ações de luta. São
gritos, palavras, frases/poemas de ordem
que anunciam um pensamento do
momento, anunciam e denunciam”.
(Gehrke, 2010, p. 47), o timbre, a bandeira,
o hino do MST e as ferramentas de
trabalho, pode ser uma dramatização, uma
poesia, uma apresentação teatral, um canto,
um discurso, um ato de protesto, de
enfrentamento ou de esperança e podem
ser representadas experiências locais,
cotidianas e do mundo, e também os
projetos para o futuro.
Na escola também acontecem os
seminários, a partir dos conteúdos
desenvolvidos em sala de aula, em que
os/as estudantes se preparam para
apresentar para a comunidade escolar,
como é destacado pela educadora 1:
Seminário é exposição de trabalho
através de pesquisa, tanto expositiva como
em apresentação teatral. (Entrevista
02/2018).
As noites socialistas envolvem toda a
comunidade escolar e ressaltam a
importância dos mártires, e de todas as
pessoas que lutaram por uma sociedade
justa e solidária para todos como afirma a
educadora 1 nas noites socialistas
convidamos os camponeses para
participar com a gente e conhecer as
memórias dos mártires que são
importantes para nós e continuam nos
fortalecendo através do exemplo de suas
vidas. (Entrevista 02/2018).
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As noites culturais são realizadas
pela comunidade escolar através de
palestras, músicas, teatros, místicas, danças
e atividades interativas, sendo convidados
todos da comunidade para participar e
neste momento resgata a importância do
camponês, os seus valores, a sua cultura,
respeitando o seu jeito de agir e o jeito de
falar como ressalta a educadora 4, “nas
noites culturais a comunidade se reúne,
alguns cantam, apresentam suas poesias, é
um momento de alegria e fortalecimento
na luta”. (Entrevista 02/2018).
As práticas pedagógicas são
planejadas na semana pedagógica, com o
envolvimento do coletivo de educação, são
destacadas no PPP da escola, e
desenvolvidas durante o ano letivo, de
acordo com o planejamento anual de cada
educador/a.
Posso afirmar que a teoria e a prática
pedagógica da EEMC caminham juntas,
levando em consideração a realidade dos
sujeitos envolvidos, garantindo que todas
as pessoas assentadas tenham acesso a uma
educação de qualidade, voltada aos
interesses da vida do campo, como afirma
a educadora 1: procuramos fazer a nossa
escola não com conteúdo dentro da sala
de aula, mas trazer a participação da
comunidade, trabalhando a vida
camponesa, a luta que vivemos através da
foice e do facão e o resgate dos nossos
valores. (Entrevista 02/2018).
Pudemos constatar que o PPP da
escola é fruto da interação entre os
objetivos e as prioridades estabelecidas na
coletividade e que envolve todos/as os/as
educadores/as, equipe técnica,
educandos/as, pais/mães e comunidade
como um todo.
A teoria amplia os horizontes
intelectuais e cognitivos dos/as
educandos/as em termo de aprendizagem, e
as práticas desenvolvidas no cotidiano
contribuem para a formação para a labuta
do dia a dia do/a educando/a, a relação
teoria e prática em sala de aula colaboram
para a formação integral do educando
enquanto um ser no mundo, mostrando que
a escola não é uma mera instituição que
reproduz somente o conteúdo, mas que
valoriza também os saberes dos
camponeses e viabiliza condições que
levem o educando a agir em sociedade.
A EEMC é uma escola que
proporciona aos educandos a
aprendizagem do conhecimento científico
e a construção de valores como a
solidariedade, compreensão, determinação
e cooperativismo, gerando conhecimento e
relações comprometidas com a própria
realidade. Os desafios são grandes, seja
realizando ações que fortaleçam o processo
de permanência das famílias no campo, ou
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seja, na busca de estratégias para amenizar
as limitações de aprendizagem na leitura e
escrita, inclusão dos/as educandos/as e
participando nas atividades de
fortalecimento da cultura camponesa e da
permanência do camponês no campo.
Considerações finais
Neste artigo, destacamos a vivência
dos/as acampados/as e assentados/as na
luta para a construção da EEMC, e no
enfrentamento para a permanência da
Escola e dos/as educadores/as do
Assentamento. Luta esta que tem o apoio
do MST, dos/as assentados/as e do coletivo
de educação, em que se buscam não só
uma educação de qualidade, mas práticas
pedagógicas, ligadas ao campo e que
valorizem os saberes e as vivências dos
sujeitos envolvidos.
A EEMC é uma escola aberta a todas
as atividades do assentamento, é como se
fosse o coração do assentamento, onde
pulsam os sonhos e a esperança, e onde
acontecem ações de luta e enfrentamento
para a conquista destes sonhos. É uma
escola que acompanha o itinerário das
famílias Sem Terra, garantindo o direito à
educação e à escolarização de crianças,
jovens e adultos, desde o período do
acampamento, que caminhou com as
famílias, que foi itinerante e construída
com o apoio financeiro e trabalho
voluntário dos assentados, e tem como
objetivo, auxiliar na formação humana dos
sujeitos que a compõem e, portanto, busca
socializar os conhecimentos produzidos ao
longo da história e que, tantas vezes, foram
negados.
A luta pela criação da escola foi
marcada por mobilizações, caminhadas,
ocupações no INCRA e na prefeitura de
Mirassol D’Oeste, em que ecoavam os
cantos, os gritos de ordem e os punhos
cerrados dos assentados, na luta não por
educação, mas por reforma agrária,
estradas, saúde, moradia e tantos outros
direitos que lhes eram negados. Destaca-se,
aqui, que a luta pela implantação desta
escola foi efetivada, também, pela
organização dos Sem Terrinha, das
crianças Sem-Terra, que muitas vezes,
saíram em marcha, participando das aulas
em frente ao INCRA, acompanhados de
seus responsáveis, com faixas, cartazes e
gritos de ordem, pautando a legalização da
escola no lugar onde viviam.
Estes enfrentamentos continuam pela
afirmação dos direitos, e se o coletivo
deixar de lutar todas as conquistas serão
em vão. Pois os conflitos como: a
mineração, o agronegócio e as
monoculturas de soja, cana de açúcar,
Teca, e grandes fazendas de gado que
cercam o assentamento, o agrotóxico que é
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despejado pelas aeronaves continua
rondando o assentamento.
A conquista da EEMC vem
acompanhada de contradições, assim que
deixou de ser uma escola Itinerante e se
constituiu uma escola municipal, a
prefeitura não aceitou a contratação dos/as
educadores/as por não serem formados e
estes continuaram lecionando como
voluntários, em seguida lutaram para ser
legalizados junto ao Estado, e passaram a
ter que lidar com a lógica do Estado
burguês que se coloca ao lado oposto da
perspectiva do Movimento, que luta pela
transformação social, em que não quer
abrir salas, contratar professores e todo ano
são inúmeras justificativas e reuniões para
que a SEDUC atenda todas as
especificidades da escola.
As contradições não se revelam
apenas na relação com o Estado, mas
também na própria luta interna pela
conquista da escola, que não se isenta
de tensões e contradições sociais e
culturais. Ainda vivenciamos conflitos
como alguns pais ou estudantes que não
querem estudar na escola e que vão para a
cidade de Curvelândia-MT, pois não
concordam com algumas práticas
pedagógicas desenvolvidas na escola ou
por ela estar ligada ao MST.
Também têm a desconfiança e, por
vezes, questionamento no que diz respeito
aos conteúdos trabalhados na escola, que
incluem questões sobre o MST, e a
formação dos educadores que está, muitas
vezes, ainda em andamento e refletem
alguns dos conflitos que perpassam na
EEMC.
Atualmente o maior desafio a ser
superado é erradicar a evasão escolar
dos/as estudantes das turmas de EJA,
provocada pela necessidade de trabalhar.
Outra deficiência enfrentada é a
infraestrutura da escola, tais como:
banheiros, laboratório de informática;
laboratório de ciências, móveis e
equipamentos necessários para um bom
funcionamento. Afirmamos que a
participação da comunidade na escola é
condição fundamental à materialização da
proposta de educação e de escola no MST.
E que em todos os momentos a
comunidade tem uma presença ativa, seja
no planejamento ou na execução das ações.
Dessa forma, conclui-se que o
coletivo de educação tem organizado a
educação de forma prioritária apesar das
dificuldades enfrentadas, e tem contribuído
na vida dos/as estudantes e de suas
famílias, na perspectiva do
desenvolvimento socioeconômico e
ambiental, bem como na produção de um
conhecimento útil que possibilite uma
vivência digna em seu lote.
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Afirmamos que a EEMC tem
proporcionado novas formas de educação,
vivenciando os princípios destacados no
MST, e as matrizes pedagógicas que
possibilitam práticas pedagógicas que são
caracterizadas pela discussão da conjuntura
nacional e pelo entendimento de que a
educação tem várias dimensões e não deve
ser trabalhada igualmente ou com as
mesmas metodologias. E nestas práticas
tem envolvido a comunidade, educandos/as
e educadores/as num processo pedagógico
democrático traduzido numa gestão
democrática que tem fortalecido cada vez
mais a luta, principalmente em função da
organização dos estudantes.
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i
Neste espaço do texto, utilizamos a primeira pessoa
do singular por nos referirmos a uma das autoras e
sua história de vida, formação e desenvolvimento
profissional.
ii
O Assentamento Roseli Nunes está localizado no
Município de Mirassol D’Oeste-MT, é uma área
fruto de lutas organizadas pelo Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e outros
movimentos sociais tendo a base formadora pela
ocupação de acampamento.
Informações do artigo / Article Information
Recebido em : 23/08/2018
Aprovado em: 23/11/2018
Publicado em: 28/05/2019
Received on August 23th, 2018
Accepted on November 23th, 2018
Published on May, 28th, 2019
Contribuições no artigo: Os autores foram os
responsáveis por todas as etapas e resultados da
pesquisa, a saber: elaboração, análise e interpretação dos
dados; escrita e revisão do conteúdo do manuscrito
e; aprovação da versão final a ser publicada.
Author Contributions: The authors were responsible for
the designing, delineating, analyzing and interpreting the
data, production of the manuscript, critical revision of the
content and approval of the final version to be published.
Conflitos de interesse: Os autores declararam não haver
nenhum conflito de interesse referente a este artigo.
Conflict of Interest: None reported.
Orcid
Sandra Maria Soares
http://orcid.org/0000-0003-4377-448X
Ronaldo Eustáquio Feitoza Senra
http://orcid.org/0000-0003-0801-1970
Como citar este artigo / How to cite this article
APA
Soares, S. M., & Senra, R. E. F. (2019). Da teimosa
resistência nasce a Escola Estadual do Campo Madre
Cristina. Rev. Bras. Educ. Camp., 4, e5786. DOI:
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e5786
ABNT
SOARES, S. M.; SENRA, R. E. F. Da teimosa resistência
nasce a Escola Estadual do Campo Madre Cristina. Rev.
Bras. Educ. Camp., Tocantinópolis, v. 4, e5786, 2019.
DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e5786