Revista Brasileira de Educação do Campo
The Brazilian Scientific Journal of Rural Education
ARTIGO/ARTICLE/ARTÍCULO
DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e5889
Tocantinópolis/Brasil
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2020
ISSN: 2525-4863
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Juventude, formação, cultura e política: a experiência do
curso de Residência Agrária jovem em Santa Catarina
Fabiana Fátima Cherobin
1
, Edilaine Aparecida Vieira
2
, Vagner Luiz Kominkiéwicz
3
1, 3
Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC. Programa de Pós-Graduação em Educação. Campus Universitário Reitor
João David Ferreira Lima. Rua Desembargador Vitor Lima, Trindade. Florianópolis - SC. Brasil.
2
Secretaria de Estado da
Educação de Santa Catarina.
Autor para correspondência/Author for correspondence: fcherobin@gmail.com
RESUMO. O artigo apresenta uma reflexão sobre a experiência
do curso Residência Agrária Jovem realizado em Santa Catarina.
Tem como objetivo geral compreender a importância da
formação e da escolarização da juventude ligada ao MST. A
partir do estudo e análise da participação da juventude na
organização e nas lutas da classe trabalhadora, tendo como
referência pesquisas que abordam esta temática, evidenciou-se
que ainda são poucos os estudos e pesquisas que abordam os
jovens do campo vinculados ao MST e que a juventude, assim
como os demais trabalhadores do campo tem vivenciado um
longo processo de exclusão, que se refletem, principalmente, na
ausência do acesso à educação, saúde, cultura. Preocupados com
a formação dos jovens, o MST tem buscado viabilizar por meio
de parcerias a realização de atividades educativas e de formação
para a juventude dos assentamentos e acampamentos. O curso
Residência Jovem possibilitou aos jovens momentos de
formação política, cultural e artística, vivência na universidade,
troca de experiências, perceber e vivenciar as contradições e
limites da vida nos assentamentos e acampamentos do MST,
assim como possibilitou a constituição de coletivos de juventude
e o fortalecimento da identidade Sem Terra.
Palavras-chave: Juventude, MST, Formação Política e Cultural.
Cherobin, F. F., Vieira, E A., & Kominkiéwicz, V. L. (2020). Juventude, formação, cultura e política: a experiência do curso de
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Youth, formation, culture and politics: the experience of
the young agrarian residence course in Santa Catarina
ABSTRACT. The article presents a reflection about the
experience of the Young Agrarian Residence course held in
Santa Catarina. Its general objective is to understand the
importance of training and schooling the youth linked to the
MST. Based on the study and analysis of youth participation in
the organization and struggles of the working class, with
reference to research that addresses this theme, it has been
shown that there are still few studies and research that address
the youth of the field linked to the MST and that youth, as well
as other rural workers, have experienced a long process of
exclusion, which is reflected mainly in the absence of access to
education, health and culture. Concerned with the training of
young people, the MST has sought to make it possible through
partnerships to carry out educational and training activities for
the youth of the settlements and camps. The Youth Residency
course provided young people with moments of political,
cultural and artistic training, living in the university, exchanging
experiences, understanding and experiencing the contradictions
and limits of life in the MST settlements and camps, as well as
making it possible to form youth and the strengthening of the
Landless identity.
Keywords: Youth, MST, Political and Cultural Formation.
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Juventud, formación, cultura y política: la experiencia del
curso de residencia agraria joven en Santa Catarina
RESUMEN. El artículo presenta una reflexión sobre la
experiencia del curso Residencia Agraria Joven realizado en
Santa Catarina. Tiene como objetivo general comprender la
importancia de la formación y la escolarización de la juventud
ligada al MST. A partir del estudio y análisis de la participación
de la juventud en la organización y en las luchas de la clase
trabajadora. Teniendo como referencia investigaciones que
abordan esta temática, se evidenció que todavía son pocos los
estudios e investigaciones que trabajan el tema de los jóvenes
del campo vinculados al MST y que la juventud, así como los
demás trabajadores del campo, han vivido un largo proceso de
exclusión, que se reflejan principalmente en la ausencia del
acceso a la educación, la salud, la cultura. Preocupados por la
formación de los jóvenes, el MST ha buscado viabilizar por
medio de alianzas con universidades públicas la realización de
actividades educativas y de formación para la juventud de los
asentamientos y campamentos. El curso Residencia Joven
posibilitó a los jóvenes momentos de formación política, cultural
y artística, vivencia en la universidad, intercambio de
experiencias, percibir y vivenciar las contradicciones y límites
de la vida en los asentamientos y campamentos del MST, así
como posibilitó la constitución de colectivos de juventud y el
fortalecimiento de la identidad Sin Tierra.
Palabras clave: Juventud, MST, Formación Política y Cultural.
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Introdução
Embora tenha aumentado a
quantidade de estudos e pesquisas sobre a
juventude nos últimos anos devido às
mudanças do mundo do trabalho e a
ampliação de cursos para os trabalhadores
do campo, os quais tem influenciado o
desenvolvimento de pesquisas e estudos
sobre os jovens, Martins (2009), enfatiza
que a maioria dos estudos sobre a
juventude, estão focados na compreensão
dos jovens urbanos, seus problemas e
contradições decorrentes do mundo
urbanizado, sendo reduzido as pesquisas e
estudos que buscam compreender e
analisar os jovens do campo, suas
contradições, características e sonhos.
Elementos que demonstram a importância
de estudos e análises sobre a juventude do
campo.
A migração dos jovens do campo
para a cidade tem merecido destaque
importante entre pesquisadores da área.
Segundo Martins (2009), a maioria dos
jovens do campo tem migrado para as
cidades em busca de melhores condições
de vida para si e, suas famílias, o que tem
provocado um envelhecimento da
população rural.
Castro (2012, p. 20), ao referir-se a
questão da migração da juventude do
campo para a cidade, considera que a saída
e ou permanência deste jovem “envolve
múltiplas questões em que a categoria
jovem é construída e seus significados,
disputados”. Existe uma forte tendência em
relacionar a saída do jovem do campo à
falta de interesse em permanecer na terra;
porém, para Castro, a “imagem do jovem
como desinteressado pelo campo contribui
para a invisibilidade da categoria como
formadora de identidades sociais e,
portanto, de demandas sociais”.
De acordo com Janata (2012, p. 119)
a saída do jovem tem relação com a busca
pela independência financeira. Para a
autora, este processo tem ocorrido com
mais frequência “após o término do ensino
médio”, quando os jovens buscam
oportunidades de trabalho/emprego, pois a
produção agrícola do lote não permite a
sobrevivência de toda a família, segundo a
autora “continuar na casa de suas famílias
de origem ainda quando adultos, portanto,
não se ratificou como um horizonte tão
comum aos mesmos” (Janata, 2012). Sem
perder de vista as contradições vivenciadas
pelos jovens do campo Martins (2009),
aponta que o acesso à educação tem se
constituído como um aspecto importante
para a permanência da juventude no
campo, assim como a participação dos
jovens nas definições familiares.
Compreender os jovens como
sujeitos sociais, com características
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específicas dadas pelas condições objetivas
de seu tempo de vida, capazes de assumir
responsabilidades e desafios nos parecem
elementos de motivação para que os jovens
do campo independentemente de suas
escolhas futuras, busquem alternativas de
reprodução de sua existência. Partindo
desta compreensão os jovens, devem ser
compreendidos como sujeitos, aspecto que
independe de sua idade, ou ciclo de vida.
Neste sentido, concordamos com Janata
(2012, p. 112), quando esta afirma que o
conceito de juventude além de estar
vinculado diretamente a um período, ou
faixa etária da vida, deve ser considerado
“uma categoria geracional que encerra na
classe suas questões fundamentais”.
Segundo D’Agostini e Titton (2018),
na atualidade muitos estudos sobre a
juventude, tem provocado uma alteração
na terminologia juventude para juventudes,
no plural, a qual segundo os autores
“fragmentam e individualizam os grupos
de tal forma que obnubilam a totalidade e
as relações de fundo existentes”. Para os
autores, a juventude deve ser
compreendida como
uma condição/ciclo da vida vivida
por todos e as questões estruturais
desta condição são base para todos, a
saber, a produção da existência na
sociedade capitalista. As diferenças
fundamentais estão entre as classes
sociais, e contam com complexas
relações com questões como as
opressões, a desigualdade social, o
racismo, a discriminação de gênero
etc, e, portanto, ao tratar a juventude
no seu devido contexto, e não de
forma idealista e abstrata, a
pluralidade está contemplada.
(D’agostini & Titton, 2018, p. 60).
Considerar o lugar social ocupado
pelos jovens e as condições objetivas de
existência são ao nosso entendimento
elementos importantes, os quais
determinam os limites e as possibilidades
da participação dos jovens, bem como as
relações que estes sujeitos estabelecem
com o trabalho, com seus pares, com a
escola, com suas lutas e com a sociedade.
No sistema capitalista, os jovens da classe
trabalhadora têm como grande desafio a
garantia da própria sobrevivência, que
ocorre na tensão da busca por conquistas
imediatas, desejos e necessidades do
momento e depois por um possível projeto
para o futuro, do que cada um virá a ser.
Os estudos sobre a sociologia da
juventude, que seguem uma concepção
dialética recuperam o caráter social e
histórico da juventude moderna e
contemporânea, enquanto grupos etários
homogêneos, institucionalizados ou
informais. De maneira geral indica a
necessidade de realizar análises tendo
como referência os aspectos sociais e
históricos da juventude em relação direta
com outras categorias sociais, como classe
social, nacionalidade, região, etnia, gênero,
religião, condição urbana ou rural,
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momento histórico, grau de
“desenvolvimento” econômico etc, ou seja,
para analisar a juventude “concretas, é
preciso fazer o cruzamento da Juventude
como categoria social com outras
categorias sociais e condicionantes
históricos”. (Groppo, 2004). Para Groppo
(2004, p. 11), “a juventude é uma categoria
social usada para classificar indivíduos,
normatizar comportamentos, definir
direitos e deveres. É uma categoria que
opera tanto no âmbito do imaginário social,
quanto é um dos elementos ‘estruturantes’
das redes de sociabilidade”.
Categorizar os tempos de vida das
pessoas é uma demanda do Estado e das
instituições internacionais, no sentido de
direcionar suas políticas e ações, fazer um
recorte de idade para cada fase ou ciclo
obedece um sentido operacional. A fixação
de um limite mínimo de 15 anos e máximo
29 anos, instituído por organismos
internacionais, com destaque a
Organização Mundial da Saúde (OMS),
procura homogeneizar o conceito de
juventude, considerando a questão da
entrada no mercado de trabalho e o término
da escolarização.
No Brasil, a definição da faixa etária
da juventude segue as orientações das
instituições internacionais, está posta no
Estatuto da Criança e do Adolescente
(Brasil, 1990), o qual define a adolescência
como o período dos 12 aos 18 anos de
idade, momento compreendido como
aquele em que os jovens começam a se
inserir nos processos produtivos por meio
da “Lei do Aprendiz” (Brasil, 2000), a qual
determina a proibição de qualquer trabalho
para menores de 16 anos, com exceção da
condição de aprendiz que segundo a Lei Nº
11.180 de 2005 o “contrato de
aprendizagem”, abrange dos 14 aos 24
anos (Brasil, 2005a). Hoje os limites de
idade para configuração da juventude,
utilizado pelo poder público e por
organismos internacionais é de 15 a 29
anos (Brasil, 2005a). Castro (2012, p. 438)
alerta no sentido de “observar os limites
destas definições e questionar a
naturalização da associação entre
juventude e uma faixa etária específica”,
pois os jovens são vistos em muitos casos
como sujeitos capazes de transformar a
sociedade e isso faz com que eles sejam
objetos de disputa, de acordo com o
modelo de sociedade na qual estão
inseridos. Portanto, ser jovem em
determinada realidade implica reconhecer
as relações sociais da sociedade capitalista,
ao acionar juventude como forma de
definir uma população, um
movimento social ou uma cultura, ao
usar a palavra jovem para definir
algum ou para se auto definir,
estamos também acionando formas
de classificação que implicam
relações entre pessoas e entre classes
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sociais, relações familiares e relações
de poder (Dayrell, 2007, p. 109).
Para D’Agostini e Titton (2018), a
“mudança conceitual da faixa etária” da
juventude é “social e contextualizada” e se
relaciona com o desenvolvimento social
das sociedades e demonstra a dependência
econômica, de emprego e de moradia que a
juventude possui na atualidade. Para os
autores isso não significa que os jovens
não trabalham, mas que muitas das funções
desempenhadas pelos jovens não são
remuneradas e na maioria das vezes não
são considerados como trabalho, nem pelos
jovens e tampouco por suas famílias,
assumindo caráter de “ajuda” que as
atividades desenvolvidas não são
remuneradas e estão vinculadas a
atividades familiares.
Nesta mesma direção Abramo (2005,
p. 45), menciona que na atualidade a
grande maioria dos jovens urbanos
possuem uma “relação de
dependência/independência da família de
origem”. Ou seja, os jovens passam para a
fase adulta sem se tornarem independentes,
pois as condições objetivas da sociedade
não permitem. os jovens do campo,
segundo pesquisa realizada por Janata
(2012, p. 117), demonstra “que quase
metade dos jovens solteiros, portanto os
mais novos, havia se tornado
independente da família, ao menos
economicamente”. Foracchi (1972) ao
analisar a juventude e sua inserção no
mundo do trabalho, menciona que a crise
que os jovens veem enfrentando é uma
crise da sociedade e nesta relação os jovens
são afetados por estarem na busca por
postos de trabalho.
Compreendendo a juventude como
protagonista de seu tempo histórico, os
jovens têm se constituído como agentes de
importantes lutas sociais. No Brasil as lutas
mais recentes empreendidas pelos jovens
foram as ocupações das escolas realizadas
no ano de 2013 em vários Estados do país,
as quais demonstraram o poder e a
importância que os jovens organizados
possuem. Este engajamento e participação
da juventude nas questões políticas
organizativas da sociedade está
diretamente ligado, segundo Abramo
(2005, p. 22), ao acesso a escolarização e
as informações decorrentes dos meios de
comunicação que a juventude tem tido,
mas principalmente porque os jovens tem
sido fortemente atingidos pelos processos
de modernização e expansão das
desigualdades sociais, que estão no
processo de inserção no mercado de
trabalho. Embora haja esta compreensão
sobre a importância e o papel
desempenhado pelos jovens, o autor
destaca que os jovens da classe
trabalhadora e do campo não o vistos
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como protagonistas, mas sim como
“marginalizados” e em muitos casos
excluídos de sua condição juvenil
(Abramo, 2005).
Para Martins (2009), a juventude do
campo embora tenha sido excluída por
muitos anos do acesso à educação
escolarizada, têm participado ativamente
na organização de muitos movimentos
sociais, com destaque para a constituição
do Movimento dos Trabalhadores Rurais
Sem Terra (MST). Para o autor a maioria
da juventude que passou a organizar o
MST, eram jovens ligados à Igreja
Católica. Os primeiros acampamentos
organizados pela Comissão Pastoral da
Terra (CPT) tiveram a participação ativa
dos jovens, os quais passaram a discutir a
organização do movimento desvinculado
da igreja católica e a constituição de um
movimento autônomo e
independentemente de partidos políticos e
da religião, elemento fundamental na
consolidação do MST (Morissawa, 2001).
Considerando o protagonismo que os
jovens do campo possuíram na
configuração e organização do MST na
década de 1980-1990 e, tendo como
referência o programa de formação
desenvolvido pelo Projeto Residência
Agrária Jovem, “Formação de agentes
culturais da juventude camponesa”,
realizado via Programa Nacional de
Educação na Reforma Agrária
(PRONERA), em parceria com a
Universidade do Estado de Santa Catarina,
Centro de Artes (UDESC/CEART), MST e
Instituto Nacional de Colonização na
Reforma Agrária (INCRA), buscaremos
compreender a importância da formação e
da escolarização da juventude ligada ao
MST, como elemento importante na
configuração das lutas sociais realizadas
por este movimento no contexto atual.
O texto está organizado em três
partes: a primeira analisa a importância
que a juventude tem tido nas lutas e
mobilizações em especial para o MST. A
segunda versa sobre a organização do
curso, os estudantes e o método de
formação realizadas no Projeto Residência
Agrária Jovem, “Formação de agentes
culturais da juventude camponesa”. E a
terceira, discute os limites e as
possibilidades do curso para a formação
dos jovens.
Metodologia
Para a realização desta análise,
utilizamos como procedimentos
metodológicos o estudo bibliográfico,
documental e a inserção dos pesquisadores
durante a execução do projeto “Formação
de agentes culturais da juventude
camponesa”. No estudo bibliográfico,
buscamos compreender melhor as
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reflexões e analises que vem sendo
realizadas por pesquisadores que discutem
esta temática. Na análise documental
reunimos materiais relativos às discussões
sobre o projeto e a formação dos jovens,
tais como; relatórios emitidos pelo MST e
materiais produzidos pela universidade. A
participação dos pesquisadores se deu em
momentos distintos de formação, por meio
da assessória de atividades, do
acompanhamento político pedagógico do
curso, coordenação política, pela
observação e pela inserção que os mesmos
possuem nos espaços onde os jovens estão
inseridos.
A participação da juventude nas lutas e
mobilizações do MST
Segundo Martins (2009), a juventude
tem participado ativamente nas
mobilizações realizadas no Brasil desde a
década de 1950, vinculada a um grupo
progressista da Igreja Católica, contrário
ao regime político, social e econômico no
Brasil, teve participação ativa nas lutas
realizadas durante a Ditadura Militar e na
constituição de movimentos sociais do
campo e da cidade, com destaque para a
criação da União Nacional dos Estudantes
(UNE), a qual teve papel fundamental das
lutas travadas pela juventude durante a
Ditadura Civil Militar no Brasil. Do ponto
de vista das lutas realizadas no campo, a
discussão central naquele período girou em
torno da luta pela implementação da
Reforma Agrária. Como demanda desta
bandeira de luta os jovens trabalhadores do
campo organizados em sindicatos de
trabalhadores rurais e no Partido
Comunista Brasileiro, fundaram dentre
várias organizações em 1945 as Ligas
Camponesas, um movimento de
contestação a exploração vivida pelos
trabalhadores do campo e em defesa da
Reforma Agrária.
As Ligas Camponesas foram
duramente reprimidas durante a Ditadura
Civil Militar, porém sua luta e forma de
organização influenciaram, na década de
1980, o surgimento do MST, o qual se
constituiu inicialmente vinculado a
Comissão Pastoral da Terra (CPT), a qual
era vinculada a Igreja Católica. A
característica inicial da luta empreendida
pela CPT, era que os trabalhadores do
campo tivessem acesso à terra (Martins,
2009). Dados as proporções que esta
bandeira de luta tomou em 1984 durante
um encontro dos Trabalhadores Rurais
Sem Terra, o MST foi criado (Morissawa,
2001).
Como mencionado anteriormente, a
juventude foi fundamental na constituição
e organização do MST. Por terem tido uma
formação que criticava o modelo de
desenvolvimento do Brasil e por não terem
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muitas perspectivas de trabalho, os jovens
que estavam organizados em grupos de
jovens ligados a CPT foram inserindo-se
gradativamente nas lutas sociais em torno
da terra.
Inicialmente, a CPT começou a
desenvolver-se mais no Norte e
Centro-Oeste do país, em virtude da
grande onda de violência que atingia
os posseiros dessas regiões. Logo foi
estendendo-se por todas as outras
regiões brasileiras e contribuindo,
através do trabalho de base,
especialmente por meio das
Comunidades Eclesiais de Base
(CEBs)
i
, na organização dos
trabalhadores rurais atingidos pelo
processo de modernização da
agricultura brasileira. Foi assim que,
contando com a motivação e o apoio
da CPT, trabalhadores rurais dos
estados do Rio Grande do Sul, Santa
Catarina, Paraná, Mato Grosso do Sul
e São Paulo iniciaram,
simultaneamente, várias lutas em
seus estados para continuar no campo
e na atividade agrícola. Essas lutas
assinalam o início do
desenvolvimento do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra
como movimento de luta pela
reforma agrária no Brasil. (Martins,
2009, p. 110).
Os jovens que se inseriram no MST
naquele primeiro momento, vivenciaram
com mais força a influência das ideias
difundidas pela Teologia da Libertação,
além de viverem a repressão da Ditadura
Civil Militar. No MST, os jovens
aprenderam com o processo de luta e
organização os caminhos para a construção
e a consolidação do movimento em vários
Estados do Brasil. A formação política
neste processo se constitui como elemento
fundamental de compreensão da sociedade,
assim como, uma necessidade de
identificar as contradições e limites nos
acampamentos, buscando alternativas de
superação. A formação e capacitação de
seus militantes e de sua base social sempre
esteve presente no MST, os encontros de
formação eram realizados com toda sua
base, incluindo homens, mulheres, jovens,
adultos, idosos e as crianças, de modo a
possibilitar que todos possam envolver-se
nas diversas tarefas do Movimento.
Neste processo a formação e o acesso
à escolarização dos jovens e das crianças
se constitui ao longo dos anos como uma
demanda que precisava ser superada. Em
1984, quando da organização dos
primeiros acampamentos, teve início um
longo percurso de luta pela garantia do
acesso à educação escolarizada.
Inicialmente estava focada nas crianças
sendo ampliada para a juventude e adultos
(MST, 2005). Na atualidade além do
acesso à educação escolarizada para as
crianças e jovens da educação básica, o
MST vem estreitando sua relação com as
universidades e organizando cursos de
graduação, especialização e mestrado,
como demanda de acesso ao conhecimento
e formação. Além da garantia do acesso à
educação escolarizada, o MST, desde sua
constituição, organizou momentos de
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formação política em escolas,
acampamentos, assentamentos, encontros
de militância, nos cursos de graduação e
pós-graduação, entendendo que a formação
política é elemento fundamental na
elevação da consciência (MST, 2005). Na
atualidade o desafio de formar lutadores e
sujeitos políticos em um período de
descenso das lutas de massa e de
despolitização da vida social” (MST, 2017)
constitui uma demanda emergente, que
ocupa preocupação nas escolas no MST,
nos espaços de formação, ou seja, no
interior da própria organização social.
Neste sentido a formação e a escolarização
dos jovens se constituem como elemento
fundamental na elevação da consciências e
na capacidade de compreensão da
sociedade de maneira crítica, aspectos que
precisam ser estimulados na juventude.
Capacidade de entender
profundamente a realidade,
relacionando a teoria e a prática.
Identificar-se como camponês e
como Sem Terra, valorizar o campo
como espaço de produção da vida e
trabalhar pela superação da
antinomia campo-cidade.
Desenvolver uma postura crítica
(organizar a rebeldia) e criativa
(tomar posição, demonstrar
pensamento autônomo, ser
protagonista). Ter consciência dos
direitos. Desenvolver uma visão de
mundo na perspectiva da classe
trabalhadora. Compreender os
processos de produção da existência
social. Construir sensibilidades e
habilidades específicas relativas ao
mundo da cultura, da arte, dos
esportes ... Construir sensibilidades e
habilidades específicas relativas ao
mundo do trabalho. Realizar uma
ação/atuação política: militância na
organização. Este é um dos traços
reforçados no perfil esperado para os
estudantes dos cursos específicos do
MST. (MST, 2006, p. 153).
Ao discutir a juventude e sua
participação na luta pela terra, a temática
da educação e da formação se faz presente,
seja por meio dos cursos de nível médio
regular, ou em cursos profissionalizantes-
integrados, organizados pelo próprio
Movimento em parceria com outras
instituições de ensino. Segundo Janata
(2012, p. 26), a organização destes cursos
“têm viabilizado a continuidade dos
estudos de muitos jovens, assentados ou
acampados, a partir de um projeto de
formação humana que visa superar as
relações do modo de produção capitalista”.
A preocupação com acesso a
escolarização o MST vem desde 1998,
quando da instituição do PRONERA,
organizando cursos de nível médio,
graduação, especialização e de capacitação
como forma de garantir a escolaridade e a
formação de sua base social,
principalmente da juventude, a qual foi
durante anos excluída do acesso à escola,
que cursar um curso de nível médio para
a maioria dos jovens assentados era um
sonho, pois a maioria dos assentamentos
que possuíam escola ofertavam apenas o
ensino fundamental.
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Na atualidade além da conquista de
vários cursos formais e informais por meio
do PRONERA o MST tem garantido desde
2002, quando instituída a Política de
Educação do Campo a criação e
organização de escolas de nível médio em
áreas de Reforma Agrária. Em Santa
Catarina, além de cinco escolas que
possuem os cursos de nível médio, em
2015 foi criado em área de assentamento o
primeiro campus do Instituto Federal
Catarinense (IFC), localizado no
Assentamento José Maria em Abelardo
Luz Santa Catarina (SC), ofertando cursos
de nível médio direcionado para a
juventude de assentamentos e
acampamentos. Além dos cursos formais
mencionados, o MST em SC, tem
buscado junto às universidades o
desenvolvimento de projetos de formação
focados no desenvolvimento dos jovens de
maneira integral, ou seja, político, cultural
e social. Tendo como objetivo o
desenvolvimento integral dos jovens o
MST, em parceria com a UDESC e o
INCRA, passaram a desenvolver o Projeto
Residência Agrária Jovem, cujo foco foi a
“Formação de agentes culturais da
juventude camponesa”, viabilizado por
meio PRONERA durante dois anos (2015
e 2017), a formação realizada buscou uniu
o estudo teórico vinculado à prática de
militante, ações de trabalho de base e de
lutas práticas, como componentes de
estudo e análise.
A organização do Curso, o método de
formação e os estudantes
O curso de Residência Jovem
também denominado de “projeto de
formação de agentes culturais da juventude
camponesa”, foi realizado pela
Universidade do Estado de Santa Catarina
(UDESC), em parceria com o MST e o
Instituto Nacional de Colonização na
Reforma Agrária (INCRA), viabilizado por
meio do Programa Nacional de Educação
na Reforma Agrária (PRONERA). Surgiu
como demanda do MST, visto a
necessidade de formação política, cultural
e artística dos jovens que vivem nos
assentamento e acampamento do MST em
SC. Teve como objetivo central a formação
de agentes culturais para fomentar,
“articular e produzir atividades de
comunicação, cultura e arte” nos
assentamentos da Reforma Agrária
(UDESC, 2016). O Curso possuiu uma
Coordenação Política Pedagógica (CPP),
composta por professores da UDESC e
militantes do MST, os quais eram
responsáveis pelo planejamento,
organização e desenvolvimento das
atividades do projeto. Os jovens que
realizaram o curso possuíam entre 15 e 29
anos, estavam cursando ou cursaram o
Cherobin, F. F., Vieira, E A., & Kominkiéwicz, V. L. (2020). Juventude, formação, cultura e política: a experiência do curso de
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ensino médio, todos residentes em
assentamentos/acampamentos da Reforma
Agrária no Estado de Santa Catarina, além
de demonstrarem interesse pela formação e
discussão de arte, cultura, política e pela
compreensão da sociedade. A maioria dos
participantes cursava o ensino médio e
carregavam sonhos, expectativas e muita
energia para o estudo e para a luta. O curso
teve início em 2015 e foi organizado em
onze (11) módulos/etapas. Destas, três (3)
realizadas nas estruturas físicas da
UDESC, com a participação de todos os
estudantes e oito (8) etapas realizadas em
seis (6) assentamentos, nestes, os
estudantes foram divididos e agrupados por
regiões próximas (Dos Santos, et al.,
2017).
Tendo por base a alternância como
método de organização e estudo, foi
organizado em Tempo Escola (TE) e
Tempo Comunidade (TC), durante dois
anos, os estudantes vivenciaram a
alternância entre o estudo realizado na
Universidade, nos centros de formação do
MST e as atividades práticas, realizadas
nos assentamento/acampamentos e/ou nas
comunidades e, entre os grupos de jovens
nas regiões. As contradições e vivências
constituíram aspectos importante da
aprendizagem e na formação dos jovens
que participaram do projeto. Segundo
Nogueira (2016, s/p), coordenadora do
Curso e professora da universidade, o
curso “pretende muni-los com
competências que possibilitem a produção
de sua própria cultura, o fortalecimento da
cidadania da população assentada e a
manutenção da juventude no campo”.
A primeira etapa foi realizada na
sede da UDESC em Florianópolis e contou
com 50 jovens oriundos de todas as regiões
do Estado de SC. Os estudantes eram
organizados em Núcleos de Base (NB), os
quais eram responsáveis pela realização
dos tempos educativos que variavam
dependendo do local da realização das
etapas, se eram encontros coletivos ou
regionais. De maneira geral, os tempos
educativos eram Tempo Mística, Tempo
Aula, Tempo Leitura, Tempo Estudo,
Tempo Núcleo de Base, Tempo Atividades
Culturais e Tempo Trabalho. Esses tempos
educativos estavam ligados às
necessidades e demandas dos estudantes
que se deslocavam de suas regiões e
permaneciam em alojamentos organizados
pela coordenação do Curso, que variava
entre cinco e quinze dias, a depender no
período escolar, que boa parte dos
jovens eram estudantes do ensino médio.
Para a maioria dos estudantes foi o
primeiro contato com a universidade,
aspecto novo e motivador, já que para a
maioria destes jovens a universidade era
algo distante de sua realidade.
Cherobin, F. F., Vieira, E A., & Kominkiéwicz, V. L. (2020). Juventude, formação, cultura e política: a experiência do curso de
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Além dos NB, os jovens foram
agrupados por regiões, nesses grupos
ocorreram momentos de formação
realizados em seis assentamentos distintos,
sendo eles: Assentamento Pátria Livre,
município de Correia Pinto; Assentamento
José Maria, município de Abelardo Luz;
Assentamento 13 de outubro, município de
Matos Costas; Assentamento 25 de julho,
município de Catanduvas; Assentamento
Conquista na Fronteira, município de
Dionísio Cerqueira e Assentamento Butiá,
município de Rio Negrinho. Esses
assentamentos além de serem em regiões
diferentes geograficamente, possuíam
centros de formação
ii
, ou telecentros
iii
, os
encontros de formação aconteciam nos
finais de semana e durante as férias
escolares. A Coordenação Política
Pedagógica do Curso (CPP), composta por
militantes do MST, estudantes de
graduação da UDESC e a coordenação do
curso pela universidade, era responsável
pela organização e acompanhamento das
atividades do TE e do TC. No TE os
encontros de formação eram realizados por
uma equipe de professores e técnicos da
UDESC; militantes do MST e
pesquisadores de universidades. As etapas
de formações aconteciam de forma
“concomitante e integrada”, a mesma
equipe trabalhou nos seis assentamentos, a
troca de experiência entre os professores
iv
que trabalharam foi um momento de
aproximação da realidade e de formação.
As etapas de formação realizadas no
Tempo Escola (TE) tinha como temas
centrais: a Formação de Agentes Culturais
da Juventude Camponesa, além do tema
central, em cada etapa/módulo eram
trabalhados outras temáticas, as quais
estavam focadas nos aspectos culturais,
políticos e formativos tais como: educação
do campo e educação do MST; história da
luta pela terra; questão agrária e a reforma
agrária popular; como funciona a
sociedade; teatro; música; agitação e
propaganda; Culturas populares, cultura de
massa e indústria cultural; Produção
artístico-cultural; Projetos culturais,
incentivos, leis e direitos; Tecnologias
digitais: comunicação, propaganda e
documentação (UDESC, 2016).
No Tempo Comunidade (TC), os
jovens além das atividades educativas no
curso de nível médio, foram desafiados a
desenvolver projetos culturais em suas
comunidades e
assentamentos/acampamentos. Em contato
com a realidade a maioria dos jovens
passou gradativamente a participar de
outros processos de formação realizados
pelo MST, e se inseriram nas instâncias do
Movimento (Dos Santos, et al., 2017).
Dentre os projetos realizados nos
assentamentos/acampamentos e/ou
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comunidades destacam-se: a organização
de grupos de teatro; oficinas de música;
muralismo; curso para locução em rádio,
entre outras. Embora as atividades tinham
um caráter prático, algumas delas se
mantém na atualidade, como é o caso do
grupo de teatro que embora reorganizado e
com dificuldades tem se mantido
(Kominkièwicz, 2017, mimeografado).
No final do curso os jovens foram
motivados e orientados a produzir um
Trabalho de Conclusão do Curso (TCC),
relatório individual no qual sistematizavam
as atividades desenvolvidas, apontavam as
contradições, os limites, as possibilidades,
desafios e aprendizagem vivenciados nas
famílias e na organização. Aspectos que
estimulavam a escrita, a elaboração textual,
a observação e analise da realidade.
Apesar de o Governo Federal ter
cortado os recursos financeiros, com
bastantes dificuldades o curso foi
concluído em 2017, em um encontro com a
participação dos jovens que permaneciam
envolvidos no projeto “agentes culturais”,
ao todo concluíram o curso
aproximadamente 40 jovens, deste, muitos
estavam também concluindo o ensino
médio e almejavam um curso de graduação
como horizonte a ser seguido.
A formação dos jovens do campo ligados
ao MST: limites e possibilidades do
curso Residência Jovens
O projeto teve como orientação
formar agentes culturais para fomentar,
articular e produzir atividades de
comunicação, cultura e arte, com vista à
manutenção da juventude no campo.
(Nogueira, et al. 2015, Mimeografado).
Tendo como horizonte esses
aspectos, as atividades de formação
estiveram focadas no fortalecimento da
identidade Sem Terra; nas discussões sobre
a apropriação dos meios de produção
artísticos com ênfase para a agitação e
propaganda, vinculada a estratégia de luta
do MST; no intercâmbio e troca de
experiência com jovens urbanos,
problematizando as relações de trabalho, a
formação da consciência política e
organizativa; estudo de autores clássicos
voltados à teoria do mundo do trabalho;
estudo sobre o papel da juventude na
história e no contexto do mundo do
trabalho, identificando as principais
contradições vividas na luta realizada pelo
MST.
Estas temáticas orientaram as
atividades de estudo realizadas por meio de
aulas, palestras, seminários, estudos
individualizados e em grupos. As
sistematizações e as problematizações da
teoria relacionada à prática da luta dos
trabalhadores foram aspectos presentes no
decorrer dos dois anos. Paralelo a estas
discussões foram organizados momentos
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de análises da conjuntura nacional e
internacional, as quais foram base de
intervenções de agitação e propaganda e
apresentações teatrais desenvolvidas em
encontros do MST, em atividades nos
assentamentos/acampamentos, na
universidade, entre outros.
O projeto proporcionou um grande
avanço no processo de formação e
capacitação nas áreas da arte e da
cultura dos jovens envolvidos com a
Reforma Agrária. A realização do
projeto muniu os jovens com
competências e conhecimentos que
possibilitem a produção de sua
própria cultura, o fortalecimento da
cultura e da produção das famílias
assentadas e a manutenção da
juventude no campo. (Dos Santos, et
al., 2017, p. 17).
A construção do curso ocorreu em
diálogo entre universidade, por meio dos
coordenadores, professores, estagiários
ligados a UDESC, e o movimento social.
Desta forma as discussões foram na
maioria das vezes ao encontro das
demandas da própria organização, em
particular em direção à formação de jovens
capazes de intervir na realidade dos
assentamentos e acampamentos e
contribuir mais precisamente com
atividades envolvendo comunicação,
cultura e arte.
A positividade do trabalho pode ser
percebida em vários aspectos, entre eles
destaca-se a questão da formação em si.
Lembra-se que para o MST desafios
importantes e específicos no sentido da
formação da juventude que precisam ser
enfrentados, pois constituem alicerces para
continuidade da luta. “Os jovens precisam
ser provocados a discutir a situação dos
assentamentos, a partir dessa nova chave
de leitura que é a Reforma Agrária
Popular.” (MST, 2017, p. 163).
Assim os debates construídos durante
o período de formação abordaram esta
questão, que é na verdade estratégica para
a organização e estão relacionadas as
possibilidades de permanecer na terra,
entre as várias discussões circularam o
protagonismo juvenil e a construção de
produção alternativa frente ao modelo do
agronegócio presente nos assentamentos.
As questões teóricas atreladas às
observações realizadas pelos jovens na sua
vivência diária e aquelas orientadas a
serem desenvolvidas em tempo
comunidade, possibilitaram a percepção de
contradições, os limites, mas também as
possibilidades presentes na vida social dos
acampamentos e assentamentos. A
intervenção dos jovens como agentes
culturais demandava, segundo
entendimento da coordenação, mais do que
uma leitura aparente e superficial da
realidade, era preciso se aproximar o
máximo possível, compreende-la em suas
determinações históricas, sociais, políticas
e econômicas. Sem essa leitura totalizante
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da realidade, as chances de ter uma
intervenção significativa era mínima, pois
a intervenção enquanto agentes culturais,
militantes do movimento social, objetivava
mais do que simplesmente intervir com
uma ação voltada a arte e a cultura, como
atitude empreendedora que leva cultura aos
excluídos. Pelo contrário, no cerne da
questão estava a negação dessa
contraditória possibilidade de formação de
jovens empreendedores, mas a formação
de jovens conscientes da necessidade de
elevar a consciência para transformar o
real.
A possibilidade de inserção dos
jovens no espaço da universidade e a
relação estabelecida com professores,
pesquisadores e o conhecimento que
circula neste meio, permitiram aos jovens
alimentar a perspectiva de permanecer
neste espaço rumo a continuidade dos
estudos. Reconhece-se que inúmeras outras
questões estão em jogo quando tratamos do
acesso e permanência do trabalhador no
ensino superior, mas sem dúvida esta
aproximação por meio do curso, faz
estreitar caminhos, tanto que vários deles
hoje estão inseridos em diferentes cursos
em universidades públicas.
A premissa defendida pelo MST, no
sentido de unificação das lutas, da aliança
com trabalhadores da cidade, foi
experimentada durante este período, o
desafio em articular luta e atividade entre
jovens do campo e da cidade foi uma
propositiva do curso, e sua prática foi
vivenciada pelos jovens. Discussões a
partir da conjuntura política e a troca de
experiência em especial no campo da arte,
cultura e comunicação foi uma fértil
experiência, que rendeu discussões
importantes e relações posteriores.
A formação de agentes culturais foi
uma dimensão almejada durante o
processo, os conteúdos, vários
componentes seguiram esta direção.
Durante o curso foi explorado as diferentes
linguagens artísticas, que puderam ser
experimentados e explorados pelos jovens.
Para alguns jovens a formação veio a
qualificar o que estava em
desenvolvimento nos assentamentos, a
exemplo de um grupo de teatro e de
agitação e propaganda. Após este processo
os jovens foram orientados a construírem
trabalhos com as escolas, grupos de jovens,
telecentros, envolvendo os elementos
acessados durante a formação, sendo que a
experiência individual de cada um dos
cursistas foi importante. Na atualidade a
defesa da organização segue no sentido
que relatado no TCC.
Na formação da juventude trata-se de
uma dimensão fundamental: aprender
a ser protagonista pela efetiva
participação em práticas sociais que
exijam esse protagonismo. Não se
aprende a tomar decisões sem ter que
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toma-las, muitas vezes, e sem
assumir a prática e os resultados das
decisões tomadas. (MST, 2017, p.
165).
Para além do conteúdo que circulava
durante todas as etapas, ainda como
positividade do curso destaca-se que o
próprio processo organizativo, que
provocou o protagonismo dos jovens e
também amadurecimento. Organizar os
encontros, auxiliar na logística
(alimentação, alojamento, noite cultural,
etc.), sem dúvida exigiu responsabilidade,
compromisso, militância. A necessidade de
resolver problemas diários, imprevistos,
conflitos, foram desafios constantes
enfrentados por eles e podem ser
considerados acúmulos positivos para os
jovens que vivenciaram o curso. Neste
aspecto, considera-se que embora as
dificuldades financeiras tenham afetado a
experiência, vários destes jovens resistiram
com firmeza e mantiveram-se construindo
o curso até o final.
Dentre os limites destaca-se o corte
do financiamento ao projeto. Este fato
influenciou negativamente na conclusão
das atividades propostas, alterando
significativamente as ações desenvolvidas
nos assentamentos pelos jovens. Por outro
lado, podemos considerar que os limites
relacionados a autonomia financeira, ou a
dependência dos recursos do Estado, serviu
para mostrar que a organização dos
trabalhadores possibilita superar a
dependência, mesmo que tenha, a
princípio, maiores dificuldades, condiciona
a um processo de construção de autonomia
necessária a luta dos trabalhadores.
Considerações finais
Pensar e refletir sobre a juventude do
campo vinculada ao MST se constitui com
uma necessidade, pois são poucas as
pesquisas que evidenciam esta temática.
Os jovens, assim como os demais
trabalhadores do campo vivenciam
processos de exclusão, que se refletem na
ausência de acesso à educação, saúde,
cultura, entre outros. Entendendo a
importância da formação e da educação
escolarizada, o MST vem buscando por
meio de parcerias com universidades
públicas e outros movimentos sociais
desenvolver ações, projetos que estimulem
a juventude a pensar e refletir sobre sua
condição de jovem, bem como sua
importância na luta e organização dos
trabalhadores.
O curso Residência Jovem realizado
pela parceria entre UDESC, MST e
INCRA, viabilizado pelo PRONERA,
permitiu o desenvolvimento de momentos
de formação política, cultural e artística, a
vivencia dos jovens na universidade, troca
de experiências entre os jovens, perceber e
vivenciar as contradições e limites da vida
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nos assentamentos e acampamentos do
MST, assim como possibilitou a
constituição de coletivos de juventude e o
fortalecimento da identidade Sem Terra.
A ausência do Estado na garantia do
repasse dos recursos financeiros previstos
na aprovação do projeto, interferiram e
alteraram a execução das atividades de
formação, as ações realizadas pelos jovens
nos assentamentos. Tais dificuldades
exigiu um amadurecimento dos jovens, que
motivados pelas demandas do projeto
buscaram junto ao MST e a universidade,
garantir a finalização das atividades
previstas no curso.
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Paraná. Curitiba.
i
As CEBs, pequenas comunidades eclesiais,
definidas como um novo jeito de ser Igreja,
surgiram em diversos países da América Latina nos
anos de 1960, possuem como caraterística a
solidariedade. Procuram estabelecer uma relação
forte entre e vida, induzindo a organização e
participação política. Cf. Prandi & Souza, 1996;
Martins, 2009.
ii
Estruturas físicas organizadas pelo Próprio MST,
geralmente são estruturas da antiga cede da fazenda
que foram organizadas, reformadas e adaptas para
atender as demandas do Movimento e que se
constituíram como locais de referências, onde o
MST e outros Movimentos sociais realizam
encontros, cursos e/ou etapas de formação.
iii
As estruturas dos telecentros foram organizadas e
viabilizadas por meio do projeto “olho na terra”,
realizado pela Universidade Federal de Santa
Catarina (UFSC) (UDESC, 2016).
iv
Estamos denominando de professores, todas as
pessoas que trabalharam durante as etapas de
formação, independentemente e ser professor,
militante ou pesquisadores.
Informações do artigo / Article Information
Recebido em : 10/09/2018
Aprovado em: 10/05/2019
Publicado em: 29/07/2020
Received on September 10th, 2018
Accepted on May 10th, 2019
Published on July, 29th, 2020
Cherobin, F. F., Vieira, E A., & Kominkiéwicz, V. L. (2020). Juventude, formação, cultura e política: a experiência do curso de
Residência Agrária jovem em Santa Catarina...
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responsáveis por todas as etapas e resultados da
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dados; escrita e revisão do conteúdo do manuscrito
e; aprovação da versão final publicada.
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Conflitos de interesse: Os autores declararam não haver
nenhum conflito de interesse referente a este artigo.
Conflict of Interest: None reported.
Orcid
Fabiana Fátima Cherobin
http://orcid.org/0000-0001-6016-9826
Edilaine Aparecida Vieira
http://orcid.org/0000-0002-3386-0707
Vagner Luiz Kominkiéwicz
http://orcid.org/0000-0002-5818-7184
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Cherobin, F. F., Vieira, E A., & Kominkiéwicz, V. L. (2020).
Juventude, formação, cultura e política: a experiência do
curso de Residência Agrária jovem em Santa Catarina.
Rev. Bras. Educ. Camp., 5, e5889.
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e5889
ABNT
CHEROBIN, F. F.; VIEIRA, E A.; KOMINKIÉWICZ, V. L.
Juventude, formação, cultura e política: a experiência do
curso de Residência Agrária jovem em Santa Catarina.
Rev. Bras. Educ. Camp., Tocantinópolis, v. 5, e5889,
2020. http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e5889