Revista Brasileira de Educação do Campo
The Brazilian Scientific Journal of Rural Education
THEMATIC DOSSIER / ARTIGO/ARTICLE/ARTÍCULO
DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.v4e6247
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
1
Este conteúdo utiliza a Licença Creative Commons Attribution 4.0 International License
Open Access. This content is licensed under a Creative Commons attribution-type BY
Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em
escola do campo: o caso de egressos da CEPE na Ilha de
Cotijuba, Belém, Pará
José Bittencourt da Silva
1
1
Universidade Federal do Pará - UFPA. Núcleo de Estudos Transdisciplinares em Educação Básica. Rua Augusto Corrêa,
Número 1, Guamá. Belém-PA. Brasil.
Autor para correspondência/Author for correspondence: josebittencourtsilva@gmail.com
RESUMO. O presente artigo objetiva analisar o
desenvolvimento socioeconômico e educacional de egressos
escolarizados na Casa Escola da Pesca (CEPE), uma escola
pública municipal do campo, em regime de tempo integral na
modalidade EJA, com habilitação profissional técnica na área da
pesca, correspondente aos níveis de ensino fundamental e
médio. Tomou-se como referência empírica a atual realidade
vivida por ex-alunos moradores da ilha de Cotijuba, Belém, Pará
que concluíram a formação básica no ano de 2015.
Metodologicamente, o trabalho baseia-se em pesquisa
qualitativa de campo, com recolhimento de documentos,
aplicação de questionários, realização de entrevistas e
observações in loco. Conclui-se que as condições materiais
objetivas dos sujeitos da pesquisa, associada à ausência de
ralações cotidianas em contextos organizativos condicionam
negativamente o desenvolvimento socioeconômico e
educacional dos egressos da CEPE o que pressuporia que a
escola tivesse o associativismo como princípio educativo.
Palavras-chave: Casa Escola da Pesca, Escola do Campo,
Desenvolvimento, Egressos.
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
2
Schooling, professionalism and development in the rural
school: the case of ex-students from the CEPE in the
Island of Cotijuba, Belém, Pará
ABSTRACT. The objective of this article is to analyze the
socioeconomic and educational development of students
enrolled in the House School of Fisheries (CEPE), a full-time
municipal public rural school in the EJA modality, with
professional qualification in the fishing area, corresponding to
Elementary School and High School levels. The current reality
of ex-students living on the island of Cotijuba, Belem, Para, who
completed basic training in the year 2015, was taken as an
empirical reference. Methodologically, this work is based on
qualitative field research, with collection of documents,
application of questionnaires, interviews and local observations.
It’s concluded that the material conditions of the interviewees,
coupled with the absence of day by day relations in
organizational contexts, negatively affect the socioeconomic and
educational development of the CEPE graduates, which would
imply that the school had the associativism as an educational
principle.
Keywords: House School of Fisheries, Rural School,
Development, Ex-Students.
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
3
Escolarización, profesionalización y desarrollo en escuela
del campo: el caso de egresos de la CEPE en la Isla de
Cotijuba, Belém, Pará
RESUMEN. El presente artículo tiene como objetivo analizar el
desarrollo socioeconómico y educativo de egresados
escolarizados en la Casa Escuela de la Pesca (CEPE), una
escuela pública municipal del campo, en régimen de tiempo
completo en la modalidad Educación de Jóvenes y Adultos, con
habilitación profesional técnica en el área de la pesca,
correspondiente a los niveles de enseñanza fundamental y
media. Se tomó como referencia empírica la actual realidad
vivida por ex alumnos de la isla de Cotijuba, Belém, Pará que
concluyeran la formación básica en el año 2015.
Metodológicamente, el trabajo está embasado en investigación
cualitativa de campo, con investigación documental, aplicación
de cuestionarios, realización de entrevistas y observaciones in
situ. Se concluye que las condiciones materiales objetivas de los
sujetos de la investigación, asociada a la ausencia de relaciones
cotidianas en contextos organizativos condicionan
negativamente el desarrollo socioeconómico y educativo de los
egresados de la CEPE, es esta eduque con base en el
asociativismo como principio educativo.
Palabras clave: Casa Escuela de Pesca, Escuela del Campo,
Desarrollo, Egresos.
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
4
Introdução
A Casa Escola da Pesca (CEPE) é
uma escola pública municipal de tempo
integral na modalidade Educação de
Jovens e Adultos (EJA), correspondente
aos níveis de ensino fundamental e médio.
Está localizada em Outeiro, área insular do
município de Belém do Pará, com uma
proposta integradora dos processos de
escolarização básica com a
profissionalização de seus/suas discentes.
De acordo com o Projeto Político
Pedagógico (Belém, 2017) e sua Portaria
de criação (Funbosque, 2010), a CEPE está
voltada para a formação de filhos/as de
pescadores/as e trabalhadores/as da pesca
na região das ilhas de Belém. Sua
finalidade maior é contribuir com o
desenvolvimento local, reduzindo a
pobreza e melhorando as relações
comunitárias ribeirinhas com o meio
ambiente.
Do ponto de vista pedagógico, a
Escola se propõe a trabalhar os conteúdos
de maneira interdisciplinar, utilizando a
Pedagogia da Alternância como método de
ensino. Neste contexto, o trabalho é
colocado como um princípio educativo
estruturante das relações entre professor e
aluno, a partir de eixos temáticos e da
pedagogia de projetos, tudo
transversalizado pela Educação Ambiental.
A ideia é a de que a CEPE consiga
implementar uma escolarização
respeitando dois tempos formativos
distintos a saber: os/as discentes passam
quinze (15) dias estudando os conteúdos
escolares/profissionalizantes em regime de
internato (tempo escola) e quinze (15) dias
em seus espaços de convívio familiar e
comunitário (tempo comunidade),
buscando colocar em prática as vivências,
experiências e práticas do tempo escola.
Objetiva-se neste artigo expor e
analisar a questão do desenvolvimento
socioeconômico e educacional de egressos
da CEPE a partir da realidade de ex-alunos
residentes na ilha de Cotijuba, afinal a
escola se propõe a contribuir para a
formação de “sujeitos empreendedores,
ecológicos e multiplicadores de
informações e tecnologias, bem como
atuantes como profissionais técnicos em
recursos pesqueiros” (Belém, 2013, p. 18).
Neste sentido, têm-se alguns
questionamentos acerca desta realidade, a
saber: a CEPE e seu atual processo
formativo tem se constituído em um meio
relevante para o desenvolvimento de seus
egressos e do local onde moram ou ela está
apenas certificando jovens e adultos que
procuram escolas na modalidade EJA? A
CEPE tem contribuído ao desenvolvimento
das condições sociais, econômicas,
culturais e ambientais de seus egressos?
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
5
Além desta introdução, da conclusão
e das referências, o trabalho está
estruturado da seguinte maneira: Primeiro
tem-se uma breve discussão teórica sobre o
conceito de desenvolvimento numa
perspectiva crítica; posteriormente,
apresentam-se os materiais e o método da
pesquisa; em seguida apresenta-se uma
caracterização da CEPE, enfocando seus
aspectos históricos, geográficos e legais
que deram a esta escola existencial formal
enquanto estabelecimento de ensino. Em
seguida, tem-se uma apresentação de
aspectos administrativos e pedagógicos da
escola, em que se pretendeu expor
brevemente o modo como a CEPE se
constitui do ponto de vista da gestão e das
práticas pedagógicas, com especial
destaque para a proposta da alternância
pedagógica. Ao final, fez-se uma
exposição empírica e analítica da atual
realidade de egressos da escola, com
enfoque prioritário naqueles moradores da
ilha de Cotijuba.
Desenvolvimento: o que é isso?
Todo conceito apresenta certa
processualidade sócio-histórica e, portanto,
filia-se a uma perspectiva ideológica. O
conceito de desenvolvimento (e sua versão
atual de desenvolvimento sustentável) é
emblemático neste sentido. Em muitos
dicionários on line da língua portuguesa
(Dicionários, 2018; Dicionário, 2018), a
palavra desenvolvimento aparece como
sinônimo de desenvolver, acrescentar ou
de melhorar/aperfeiçoar algo em uma
pessoa, uma família, comunidade, região
ou país. O conceito pode ser relacionado
também a processos tecnológicos e
econômicos e, neste caso, assemelha-se à
ideia de crescimento. Pode-se então dizer
que a palavra desenvolvimento nega o
movimento de introspecção, pretendendo
reverter uma possível realidade reprimida,
oprimida, acanhada em uma ação de
expansão, em um movimento de reação
para fora.
Segundo Silva (2009) a ideia de
desenvolvimento como progresso
econômico tomou força a partir de meados
do século passado, ou mais precisamente a
partir do fim da Segunda Guerra Mundial
em 1945. Foi neste contexto que parte dos
países do ocidente europeu e, mormente os
Estados Unidos da América, passaram a
disseminar um conjunto de pensamentos
teóricos e ideológicos objetivando incluir
os chamados países subdesenvolvidos nos
padrões de industrialização e consumo
alcançados pelas nações capitalistas
centrais. O desenvolvimentismo, como
ficou conhecido, apontava para os fatores
econômicos como o fundamento essencial
para a melhoria da vida coletiva e, a
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
6
indústria, seria a “locomotiva” de todo esse
processo.
Destarte, desenvolver um dado
território seria a mesma coisa que fazer
crescer a sua capacidade produtiva
industrial, aumentar o consumo da
população, gerar emprego e renda. Por isso
os governos dos países periféricos nas
décadas de 1960/70 promoveram políticas
públicas voltadas ao crescimento do
produto interno bruto e ao aumento da
renda per capita
1
da população.
Desenvolver, afirmava Furtado (1961, p.
115-116), era “... basicamente, aumento do
fluxo de renda real, isto é, incremento na
quantidade de bens e serviços por unidade
de tempo à disposição de determinada
coletividade”. Após esse incremento na
produção os outros benefícios (melhorias
socioculturais) apareceriam quase que
“naturalmente”.
De fato, os ideólogos do
desenvolvimentismo Pós-Segunda Guerra
Mundial acreditavam piamente que
possuíam a “formula mágica” para o bem
estar social em todos os países. A chave
para isso estava na economia (progresso
técnico, aumento da capacidade do
trabalho humano para explorar a natureza,
maior produção de bens e serviços, etc.)
(Porto-Gonçalves, 2012). O crescimento
geraria, como que automaticamente,
transformações positivas nas áreas da
saúde, educação, habitação, transporte,
alimentação, lazer, dentre outras. O
crescimento (tecnológico e industrial)
aparece, portanto, como início, meio e fim
para a solução dos problemas sociais e
humanos em um determinado território.
Em linhas gerais pode-se então dizer
que o desenvolvimento nesta perspectiva
seria a mesma coisa que processo de
crescimento, cuja maturidade se dá ao
atingir a capacidade industrial de crescer
sem limites, de maneira continuada,
constante e sustentada. Em nome desse
ideário desenvolvimentista, valores
mercadológicos são levados às últimas
consequências e vão penetrando os mais
variados campos sociais. Singer (2004)
denomina esse modelo de
“desenvolvimento capitalista”, o qual se
realiza determinado pela lógica do capital,
do mercado, da competição, do
individualismo e de um Estado mínimo.
Com o passar do tempo observou-se
que o desenvolvimentismo fez crescer a
riqueza material das nações, mas
concentrou renda, aumentou a pobreza,
recrudesceram as mazelas sociais nos
países periféricos e impactou ferozmente
os processos naturais em escala macro e
micro. Neste contexto, a maior crítica feita
ao discurso do desenvolvimento capitalista
foi realizada na própria Europa pelos
ambientalistas locais nas décadas de
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
7
1960/70. De fato, as contradições internas
entre o crescimento econômico e
manutenção dos ecossistemas naturais
geraram uma das mais contundentes
críticas ao estado de coisas vigentes.
O modelo de produção e consumo
ocidental capitalista, baseado no
crescimento econômico infinito,
agora é posto em cheque do ponto de
vista de sua perdurabilidade material.
Começa a ser colocada a ideia dos
limites do crescimento: o planeta não
é infinito e seus recursos não são
infindáveis. O esgotamento dos
recursos e a entropia gerada pelo
modo industrial de apropriação da
natureza se traduzem em poluição e
deterioração da qualidade ambiental.
(Silva, 2012, p. 206).
Ignacy Sachs, com sua proposta do
ecodesenvolvimento, vai levantar questões
globais que impedem a melhoria de vida
imposta pelo desenvolvimento capitalista,
o qual se impõe aos países do sul e atenta
contra a própria natureza. Sachs (1986) vai
mostrar que a economia baseada no capital
é a fonte geradora dos atuais problemas
socioambientais, pois aumenta a alienação,
promove o individualismo, sufoca a
participação e a democracia
impossibilitando a emergia de modelos
econômicos mais autossuficientes. Esse
ideário do ecodesenvolvimento foi
substituído pelo protagonismo da
Organização das Nações Unidas (ONU)
que mundializou o conceito de
desenvolvimento sustentável como sendo
aquele que satisfaz as necessidades atuais,
sem comprometer a capacidade das futuras
gerações satisfazerem as suas próprias
necessidades (CMMAD, 1988).
Como se pode observar, o conceito
de desenvolvimento e de desenvolvimento
sustentável foi apropriado pelas grandes
organizações e empresas capitalistas,
tornando-o uma ideologia que sustenta os
processos de saqueamento das riquezas
naturais de países periféricos como Brasil,
bem como a proletarização dos
trabalhadores locais e desestruturação das
comunidades e populações tradicionais.
Mas esta ideologia do
desenvolvimento sustentável fica
disfarçada mediante um potente
discurso de ‘Proteção à Natureza’,
com a aparência de ‘bula para
salvação do mundo’, que confere
uma ilusão de um discurso menos
agressor para com o domínio do
homem para com a natureza. Ao
absorver inclusive as classes
dominadas, a ideologia do
desenvolvimento sustentável
configura-se como um mecanismo de
dominação. Com esta plataforma
bem alicerçada, hoje, dificilmente se
permanece imune aos seus reflexos.
A ideologia atinge o seu grande
objetivo quando se torna,
indubitavelmente, senso comum.
(Oliveira, 2005, p. 45).
O ideário do desenvolvimento
sustentável pode ser considerado como a
terceira versão da ideologia do progresso, a
mais atual ideologia legitimadora do
desenvolvimento capitalista.
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
8
Trata-se de explorar, de atribuir
valor, de tirar proveito dos recursos
naturais e humanos. Qualquer que
seja o adjetivo que se lhe acrescente,
o conteúdo implícito ou explícito do
desenvolvimento é o crescimento
econômico, o acúmulo de capital,
com todos os efeitos positivos e
negativos que conhecemos:
competição impiedosa, aumento
ilimitado das desigualdades, saque
incontrolável da natureza. O fato de
se acrescentar o adjetivo ‘duradouro’
ou ‘sustentável’ confunde um
pouco mais as coisas. Justamente
hoje está circulando um manifesto
pelo desenvolvimento sustentável,
assinado por numerosas celebridades,
entre as quais Jean-Claude
Camdessus, ex-presidente do FMI.
(Latouche, 2009, p. 17).
Por isso, os ideólogos do
desenvolvimento sustentável pregam a
economia verde, o consumo verde,
desenvolvimento limpo e a ecoeficiência
produtiva (Layrargues & Lima, 2014).
Todas essas nomenclaturas são colocadas
como novidades e objetivos/metas a serem
alcançados pelos indivíduos, famílias,
poderes públicos etc. em cidades e países
do planeta terra. Esse discurso é repetido
tantas vezes quantas forem necessárias
para que se torne senso comum e, assim,
cumpra com sua função legitimadora do
crescimento e apropriação de riquezas até
que sejam explícitos os defeitos e
contradições dessa nova/velha ideologia do
progresso.
Para efeito analítico neste texto,
partir-se da percepção conceitual de
Singer (2004) que diferencia o
desenvolvimento capitalista do solidário.
Para este autor, as discussões teóricas
sobre o desenvolvimento precisam levar
em consideração a importância dada ou à
competição ou à cooperação como
motivadores dos comportamentos
entendidos como os mais apropriados. O
desenvolvimento capitalista prima
... pelos valores do livre
funcionamento dos mercados, das
virtudes de competição, do
individualismo e do Estado mínimo.
O desenvolvimento solidário é o
desenvolvimento realizado por
comunidades de pequenas firmas
associadas ou de cooperativas de
trabalhadores, federadas em
complexos, guiado pelos valores da
cooperação e ajuda mútua entre
pessoas ou firmas, mesmo quando
competem entre si nos mesmos
mercados. (Singer, 2004, p. 9).
O desenvolvimento local que será
conceitualmente aceito neste texto é aquele
baseado em pequenos empreendimentos
individuais, familiares ou coletivos que
apresentam uma racionalidade ribeirinha
(Silva; Santos & Souza, 2016; Silva, 2009)
e que não visam apenas, nem
principalmente aos lucros. Precisamente, o
conceito de desenvolvimento dos egressos
da CEPE, de suas famílias e comunidades
levará em consideração o fortalecimento e
o uso das forças produtivas peculiares à
pesca artesanal, o aumento de valores que
fortaleçam os laços de confiança e
solidariedade, o favorecimento da
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
9
autorrealização e a melhoria dos aspectos
educacionais, científicos e tecnológicos
dos ex-alunos locais.
Materiais e método
Segundo Pires (2010), no âmbito das
pesquisas qualitativas uma amostra pode
ser entendida como parte determinada da
realidade objetiva, a qual servirá de base
empírica para as análises vinculadas aos
objetivos e questões levantados
previamente. É o resultado de qualquer
operação visando constituir o corpus
empírico de uma pesquisa, este entendido
como o recorte arbitrário de elementos do
real que o pesquisador define para que, ao
aplicar sobre eles uma metodologia, possa
atingir os objetivos traçados.
Nesta perspectiva, foi selecionada
como amostra, a ilha de Cotijuba, a qual
forneceu o corpus empírico desta pesquisa,
materializado nas falas dos sujeitos
educacionais egressos da CEPE, nos
documentos sobre os processos escolares e
nas situações cotidianas do real percebido,
passíveis de serem registradas em caderno
de campo, formulários de pesquisa, em
aparelhos de gravação de voz e em
máquinas fotográficas. Esses dados
ajudaram na compreensão e análise das
mediações e determinações subjacentes à
expressão fenomênica do objeto (Kosik,
1976). Esse material foi imprescindível à
construção crítica da totalidade
(generalização teórica) enquanto unidade
da diversidade ou concreto pensado. “...
síntese de muitas determinações, isto é,
unidade do diverso”. (Marx, 2008, p. 258).
Para a consecução do objetivo
traçado, assim como para as possíveis
respostas às questões levantadas, tomou-se
como referência dados qualitativos
(entrevistas e observações) de uma
pesquisa de campo realizada durante os
meses de janeiro, fevereiro e março de
2018 junto a egressos formados em
dezembro de 2015 pela CEPE, os quais são
moradores da ilha de Cotijuba, Belém,
Pará, Amazônia, Brasil, (Figura 1, a
seguir). Esta investigação faz parte do
projeto de pesquisa intitulado Inovação
escolar e escolas municipais de tempo
integral em Belém do Pará: um estudo nas
ilhas Mosqueiro e Caratateua”. (Silva,
2018).
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
2
Figura 1: Município de Belém e localização da pesquisa de campo com egressos da CEPE.
Fonte: Construído pelo autor a partir de Silva, Santos e Souza (2016).
Em Cotijuba foram aplicados seis
(06) questionários com 12 perguntas
fechadas e abertas que objetivaram
recolher informações referentes às
práticas laborais dos egressos, suas
condões educacionais atuais e alguns
aspectos ligados à questão da
organizão social ou econômica local.
No final, o questionário apresentou uma
indagação deu o mote para uma
entrevista individual que abordou os
sonhos e os desejos dos seis (06)
egressos da CEPE que conclram o
ensino fundamental e dio nesta escola.
Esses discentes foram selecionados
porque possuem uma trajeria formativa
longa, ou seja, passaram quatro (4) anos
ou mais na CEPE para a conclusão do
ensino fundamental e o dio.
Precisamente, são alunos que possuem as
duas certificações, uma em vel
fundamental com certificação em Pesca e
Aquicultura e a outra em nível médio,
com habilitão Técnica em Recursos
Pesqueiros.
O material coletado foi analisado
com base nas ideias de Singer (2004) e
sua proposição dicotômica entre
desenvolvimento capitalista e o
desenvolvimento solirio. Desta
maneira, considerou-se o
desenvolvimento dos egressos (e
famílias) a partir de melhoria das
condições de trabalho, do uso das forças
produtivas peculiares à pesca artesanal,
ao fortalecimento da capacidade
organizativa dos egressos, ao aumento de
valores coletivos que incrementam os
los de confiaa e solidariedade da
categoria, o favorecimento da
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
11
autorrealização e a melhoria dos aspectos
educacionais, científicos e tecnológicos
dos jovens trabalhadores ribeirinhos da
pesca.
Note-se ainda que fizeram parte do
corpus emrico da pesquisa as
informões contidas em documentos,
como o Projeto Político e Pedagógico
(PPP) da CEPE, o marco legal para seu
funcionamento dado pela Portaria nº
031/2010, o PPP da Escola Bosque que é
a mantenedora da CEPE e dados contidos
nos certificados e diplomas auferidos
pelos seus concluintes em vel de ensino
fundamental e médio. Foram tamm
utilizadas as falas da gestora e de
professores/as da escola, conseguidas em
atividades de visita de campo na CEPE
nos meses de outubro e novembro de
2017.
A Casa Escola da Pesca: aspectos
conjunturais
A Casa Escola da Pesca (CEPE) faz
parte do Sistema Municipal de Educão
de Belém e vincula-se
administrativamente à Fundão Centro
de Referência em Educação Ambiental
Escola Bosque Professor Eidorfe Moreira
(FUNBOSQUE), sendo esta sua
mantenedora. A FUNBOSQUE constitui-
se como um óro da administração
indireta, com personalidade jurídica de
direito público, sediada na Av. Nossa
Senhora da Conceição, s/n, Bairro do São
João do Outeiro, na Ilha de Caratateua,
Distrito de Outeiro, Munipio de Belém,
estado do Pará (Belém, 2017).
A CEPE foi legalmente
institucionalizada em 2 de fevereiro de
2010, todavia a sua implantão de fato
data de 17 de abril de 2008 a partir de um
“... Convênio firmado entre essa
Fundação
2
e a Federão dos Pescadores
do Estado do Pará (FEPA)”. Seu objetivo
é ... a formão de filhos de pescadores
e trabalhadores da pesca na Região das
Ilhas com propósito de reduzir a pobreza
e melhorar a gestão dos recursos naturais
do Munipio de Belém/Pa.
(Funbosque, 2010, p. 10).
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
2
Figura 2: Casa Escola da Pesca e alunos do ensino fundamental.
Fonte: Arquivo da CEPE, 2014.
O município de Belém apresenta
áreas contínuas e insulares, estas perfazem
um total de 39 (trinta e nove) ilhas (Silva,
Santos & Souza, 2016), dentre as quais a
Ilha de Caratateua onde a CEPE está
localizada na Rua Evandro Bona,
Passagem São José, 70, bairro Itaiteua,
Distrito do Outeiro. Na Figura 3, a seguir,
tem-se uma representação geral do
Município de Belém. Nesta imagem é
possível observar a parte continental e
insular, em que se pode ver representada a
ilha de Outeiro e um ponto em vermelho
indicando o local onde está sediada a
CAPE. Apesar de atender principalmente a
uma demanda expressiva da ilha onde está
instalada, a Escola possui discentes de
outras comunidades ribeirinhas de Belém,
tais como: Mosqueiro, Santa Cruz, Jutuba,
Paquetá, Urubuoca, Jararaca e outras.
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
13
Figura 3: Município de Belém e localização da CEPE.
Fonte: Construdo pelos autores a partir de Silva, Santos e Souza (2016).
Conforme se observa em seu Projeto
Político Pedagógico (Belém, 2013), a
CEPE é uma Unidade de Ensino destinada
a atender, preferencialmente, alunos/as
ribeirinhos/as que, conforme posto pela
LDBN, ... não tiveram acesso ou
continuidade de estudos no ensino
fundamental e médio na idade própria”
(Brasil, 1996, Art. 37). Precisamente, a
CEPE “caracteriza-se como unidade de
ensino destinada a alunos na faixa etária de
15 a 24 anos para o Ensino Fundamental, e
a partir de 18 anos para o ingresso no
Ensino Médio, desde que tenham
concluído o Ensino Fundamental”. (Belém,
2013, p. 27).
Enquanto espaço de escolarização na
modalidade EJA, a CEPE propõe-se a
conjugar a formação escolar em tempo
integral com disciplinas propedêuticas e
qualificação profissional. Assim, em dois
anos de formação os/as discentes do
Ensino Fundamental podem concluir seu
percurso formativo com a certificação em
Pesca e Aquicultura, ou em nível de
Ensino Médio integrado com habilitação
técnica em Recursos Pesqueiros.
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
14
Como se observa nas imagens 4, 5, 6
e 7, a seguir, atualmente a CEPE vem
enfrentando problemas de caráter
infraestrutural, necessitando de reposição
de materiais, consertos e pinturas prediais e
melhorias em geral para seu
funcionamento e acolhimento dos seus
sujeitos educacionais. As imagens mostram
beliches e colchões em péssimas condições
de uso, banheiros com portas e louças
danificadas e tantas outras coisas que
denotam uma conjuntura atual da
precariedade da Escola.
Figuras: 4, 5, 6 e 7: Imagens que denotam um pouco da realidade infraestrutural enfrentada na Casa Escola da
Pesca.
Fonte: José Bittencourt da Silva (2018).
Atualmente, a gestão escolar da
CEPE liga-se ao grupo instalado no poder
governamental local. Realmente, como não
eleição para a escolha dos gestores a
direção da escola depende da indicação do
próprio prefeito municipal de Belém. Por
isso, mudam-se os prefeitos, mudam-se os
dirigentes da escola e, consequentemente,
as percepções e práticas pedagógicas
formativas concernentes ao grupo no
poder. Deste modo, a escola poderá ter um
direcionamento conservador, neoliberal ou
crítico e transformador dependendo do
jogo político que se estabelece fora dos
marcos institucionais da CEPE.
O Projeto Político Pedagógico (PPP)
pode ser considerado como um dos mais
relevantes documentos de gestão,
constituindo-se em um excelente indicador
da proposta administrativa e formativa de
uma escola. Ele indica certas
intencionalidades acerca do percurso
formativo de seus educandos/as e expressa
as possíveis relações que devem ser
estabelecidas entre os diferentes sujeitos
educacionais escolares. O PPP traz consigo
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
15
uma proposta de escola no sentido mais
global do termo, inclusive demonstra as
possíveis interfaces a serem estabelecidas
com o mundo social extramuros.
O projeto político-pedagógico tem a
ver com a organização do trabalho
pedagógico em dois níveis: como
organização de toda a escola e como
organização da sala de aula,
incluindo sua relação com o contexto
social imediato, procurando preservar
a visão de totalidade. Nesta
caminhada será importante ressaltar
que o projeto político-pedagógico
busca a organização do trabalho
pedagógico da escola na sua
globalidade. (Veiga, 2002, p. 3).
O atual PPP da CEPE foi construído
e publicizado em 2013. Sua proposta
pedagógica assenta-se na metodologia da
Pedagogia da Alternância, a qual
pressupõe dois tempos/espaços formativos
diferentes e conjugados entre si. É a
chamada pedagogia da alternância que se
constitui como uma proposta pedagógica
do Movimento Brasileiro por uma
Educação do Campo surgido nas décadas
de 1980/90 no âmbito das lutas do
Movimento Sem Terra (MST).
A formação por alternância no campo
brasileiro foi inaugurada pela Escola
Família Agrícola (EFA) para atender
especialmente aos filhos dos
agricultores. Os movimentos sociais
do campo, ao constatar as demandas
dos jovens e adultos para
continuarem seus processos
formativos por meio da educação
escolar, buscam, nesta forma de
organização pedagógica, uma
possibilidade de elevação da
escolaridade dos jovens e adultos do
campo brasileiro, especialmente com
a conquista do Pronera, em 1998. A
partir desta data, contabilizam-se
inúmeros camponeses que puderam
completar sua trajetória na educação
escolar por meio da EJA/Pronera.
3
(Araújo, 2012, p. 257).
O objetivo maior da pedagogia da
alternância é a possibilidade de unir teoria
e prática no contexto da formação discente,
principalmente daqueles residentes em
meio não urbano cujo desenvolvimento
integral configura-se como a grande utopia
educacional escolar, uma vez que esta
metodologia pretende contemplar as
múltiplas dimensões da condição dos
sujeitos aprendentes, ou seja, seus aspectos
econômicos, sociais, políticos e ambientais
com rebatimentos diretos na sua vida
comunitária local (Estevam, 2001).
Um aspecto muito marcante no PPP
da CEPE é a ideia de que a escola deverá
contribuir com o desenvolvimento da
região ribeirinha. De fato, a palavra
desenvolvimento aprece 44 vezes neste
documento e está sempre relacionada a
processos de melhoria pessoal ou coletivo
de seus educandos/as. Não é raro encontrar
no PPP expressões do tipo “... a
necessidade da educação ser vista como
um conjunto de elementos importantes ao
desenvolvimento intelectual, social e
integral do educando”. (Belém, 2017, p.
11). Ou mesmo,
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
16
As ações educativas irão considerar
todas as possibilidades para
desenvolver as atividades
econômicas e estratégicas para o
desenvolvimento social, cultural da
região, e ainda viabilizar formação
profissional para alavancar o
desenvolvimento das comunidades
ribeirinhas em nível regional, e para
isso serão utilizados os recursos
pesqueiros para geração de trabalho e
renda. (ibidem, p. 12).
Escolarização, profissionalização e
desenvolvimento: um enfoque junto a
egressos da CEPE na Ilha de Cotijuba
Como demonstrado na Figura 1
acima, a ilha de Cotijuba, “trilha dourada”
para os Tupinambá (Fernandes; Fernandes,
2016), faz parte do território municipal de
Belém e integra o Distrito Administrativo
de Outeiro (Belém, 1994). Com acesso
apenas por via fluvial a ilha apresenta uma
paisagem natural de mata e praia
amazônicas. O lugar tornou um atrativo
para o turismo de contemplação da
natureza, o qual vem se constituindo na
principal atividade econômica no local, em
que pese haver em Cotijuba uma produção
pesqueira artesanal importante e uma
agricultura familiar que garante aos
moradores uma fonte de alimento e renda
(Silva, 2014).
Na ilha pode-se observar a existência
física de uma agência administrativa da
Prefeitura de Belém, um pequeno posto de
saúde, unidades pedagógicas de ensino
fundamental, igrejas católica e evangélica,
pousadas, hotéis e bares. Porém, Cotijuba
carece de alguns serviços públicos, como
abastecimento de água potável (a água
consumida pelos moradores é proveniente
de poços), saneamento básico,
recolhimento regular de resíduos sólidos,
pavimentação de ruas e energia elétrica (na
ilha a eletricidade advém de geradores que
funcionam a óleo diesel).
É nessa ilha que moram os egressos
da Casa Escola da Pesca que foram
selecionados para as entrevistas e aplicação
de questionários. Eles são jovens adultos
na faixa etária entre 22 a 30 anos de idade
e concluíram a educação escolar básica na
CEPE no ano de 2015. Do ponto de vista
formal, esses ex-alunos estão com os dois
cerificados oferecidos pela Escola, ou seja,
uma certificação em nível fundamental em
Pesca e Aquicultura e outra em nível
médio, com habilitação técnica em
Recursos Pesqueiros (Figuras 8, 9, 10 e
11).
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
17
Figuras 8 e 9: anverso e verso do diploma de conclusão do ensino médio com formação Técnica em Recursos
Pesqueiros.
Fonte: dado da pesquisa de campo, 2018.
Figuras 10 e 11: anverso e verso do diploma em nível fundamental e com formação inicial em Pesca e
Aquicultura.
Fonte: dado da pesquisa de campo, 2018.
O ensino de EJA na CEPE também
deveria edificar em seus discentes um
desenvolvimento educacional suscetível de
dar condições para seus egressos cursarem
o nível superior (Belém, 2013). Contudo, o
que se observou no período em que as
entrevistas foram realizadas, foi que
nenhum dos egressos ouvidos havia
cursado ou estava cursando o nível
superior de ensino ou participado de cursos
de aperfeiçoamento na área da pesca.
Apenas um egresso afirmou ter participado
de um curso na Capitania dos Portos
voltado à regularização dos condutores de
pequenas embarcações.
Para além dessa expressão
fenomênica observada in loco, pode-se
compreender essa realidade como
reveladora de estruturas que se repete em
outros espaços educacionais escolares em
escala nacional. Para Frigotto (2009) essa
situação não é uma aberração dos sistemas
educacionais que a escola poderia
facilmente resolver. Na verdade, essa
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
18
situação precária da educação de alunos da
EJA/profissionalizante revela o modo
como o capitalismo dependente se
desenvolve de maneira desigual e
combinada.
O Brasil seria uma composição de
uma pequena Bélgica rica, moderna,
e uma Índia atrasada, semianalfabeta,
com valores tradicionais e com um
enorme contingente de trabalhadores
na informalidade. A parte Índia seria
responsável pelo atraso,
subdesenvolvimento e que impediria
de nos tornarmos um país de
capitalismo avançado. Ao contrário,
o pensamento social crítico nos
mostra que se trata de uma
construção social que define a forma
específica de nosso capitalismo
dependente e subordinado. Uma
sociedade cuja opção de
desenvolvimento desigual e
combinado pressupõe o
analfabetismo, a escola dual com
uma educação empobrecida para as
massas, a informalidade e a
desigualdade. (Frigotto, 2009, p. 74).
Do ponto de vista laboral todos
estavam na informalidade, trabalhando sem
carteira assinada como prestadores de
serviços variados, em geral como
condutores de veículos automotores
pertencentes a pequenos comerciantes
locais. Precisamente, os egressos da CEPE
na ilha de Cotijuba têm sua principal fonte
de renda ligada ao turismo, como
motoristas de moto, charretes, motorretes
(uma espécie “hibrida” de moto e charrete)
levando os visitantes para as áreas
turísticas mais requisitadas, como a Praia
do Farol (Figura 12) ou as ruínas do
Educandário Nogueira de Faria (Figura
13). Também desenvolvem atividades na
construção civil, extrativismo do açaí,
como vendedores ambulantes ou como
trabalhadores em lanchonetes de quiosques
e barracas na beira-rio.
Isso resulta de uma proposta de
educação profissionalizante baseada na
ideologia do desenvolvimento capitalista,
que de acordo com Singer (2004) se efetiva
a partir da lógica do capital, ou seja,
determinado pelos ditames do mercado, da
competição, do individualismo etc. Na
realidade, a escola está reproduzindo na
vida prática de seus egressos
O desenvolvimento explorador e
espoliativo do capitalismo, a
massificação das relações sociais, o
descompasso entre o alto
desenvolvimento tecnológico e a
miséria social de milhões de pessoas,
as frustrações com os resultados do
consumo insaciável de bens e
produtos, o desrespeito à dignidade
humana de categorias sociais tratadas
como peças ou engrenagens de uma
máquina, o desencanto com a
destruição gerada pela febre de lucro
capitalista etc. (Gohn, 1992, p. 15-
16).
Com essa perspectiva educacional, a
CEPE acaba cerceando do direito à
educação emancipatória e promovendo um
percurso educativo voltado ao domínio das
habilidades e competências exigidas pelo
mercado, oferecendo aos educandos uma
formação profissional e de conhecimentos
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
19
elementares de leitura, escrita, contas e
noções primárias de ciências para a
empregabilidade em trabalhos precarizados
(Arroyo, 2012).
Pela própria característica da escola,
isto é, um espaço educativo e formativo de
populações ribeirinhas, o que se espera
realmente da CEPE é uma formação a mais
completa possível, uma educação que
objetive plasmar nas pessoas o
desenvolvimento de suas múltiplas
dimensões físicas, intelectuais, afetivas ou
estéticas. Por isso a sua proposta de
integralidade educativa (Belém, 2013)
pressupõe uma formação científica,
artística, literária, filosófica, enfim, de tudo
aquilo que a humanidade produziu de
melhor em seu devir histórico (Libâneo,
2018).
Figuras 12 e 13: Praia do Farol e ruínas do Educandário Nogueira de Faria, Ilha de Cotijuba.
Fonte: Imagem capturada em meio virtual (A Ilha, 2018).
Aqui eu vivo de bico. Pra ganhar a
vida eu faço de tudo. Eu capino,
trabalho de ajudante de pedreiro,
trabalho na motorrete, na charrete
levando as pessoas pras praias mais
longe ... (entrevistado 1).
Eu trabalho na motorrete e também
no período da safra eu ajudo a minha
família que tem açaizal aqui perto.
Eu tenho um sonho de conseguir um
bom emprego, mas pra isso eu acho
que seria melhor se eu fosse um
engenheiro de pesca, mas eu acho
que esse sonho muito difícil.
Porque precisa de dinheiro, aqui tudo
é muito difícil ... (entrevistado 2).
Eu até queria trabalhar com a pesca,
mas tem que ter dinheiro pra comprar
os materiais. Eu queria trabalhar na
marinha mercante pra conseguir
dinheiro pra iniciar um projeto na
área da pesca aqui. Acho que se eu
tivesse uns três mil reais eu
conseguia iniciar o meu projeto. Eu
queria continuar estudando, fazer
uma universidade, mas não tenho
incentivo, nem na minha família nem
dos meus amigos (entrevistado 3).
Eu queria ter um trabalho fixo que
me desse segurança pra mim e pra
minha família. Eu fui agora em
novembro na Amase
4
, eu fui pela
Casa Escola da Pesca. Eu fiz uma
prova lá, mas até agora não me
falaram nada. Aí eu fiquei sabendo
de uma outra empresa de pesca no
Outeiro, mas eu não fui lá, porque eu
fiquei sabendo que eles iam me dar
emprego por três meses, depois
desse período eles iam ver se iam me
contratar. Mas eu não ia receber nada
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
20
nesses três meses. Eu não quis ir lá.
Eu tô trabalhando hoje com
motorrete, mas no momento eu
parado porque eu tive um acidente.
Em me queimei as pernas com
gasolina em um acidente com a
motorrete. Eu queria continuar
estudando, mas pra isso é preciso de
dinheiro. Só eu, meu pai e minha mãe
que mais consegue dinheiro pra gente
se sustentar na minha casa. Então
isso é difícil. Porque se eu for estudar
a coisa vai ficar mais difícil pra
minha família (entrevistado 4).
O nosso desenvolvimento aqui ainda
não conseguimos. Porque nossa
família é de baixa renda, eu ajudo
meu pai na construção civil, no
turismo levando as pessoas pras
praias do Farol, praias da Saudade,
praias do Amor, praia do Vai Quem
Quer ... (entrevistado 5).
Eu nasci em Belém e a minha me
pegou pra criar. Eu vim morar aqui
em Cotijuba, eu gosto muito de
morar aqui. Às vezes eu vou pra
Belém e fico um tempo por lá, às
vezes eu fico aqui. Eu trabalho por
aqui mesmo, ajudo minha família,
faço uns bicos, faço transporte de
aluno ... e assim a gente vai levando
(entrevistado 6).
No anverso do diploma de conclusão
do ensino médio (Figura 10 acima),
estipula-se que o concluinte deverá
apresentar saberes e competências quanto à
“confecção de apetrechos de pesca e
outros”. No certificado de ensino
fundamental (Figura 12 acima) e no PPP
da escola (Belém, 2013, p. 20) aponta-se
que o egresso deverá possuir expertise
quanto ao exercício da “pesca sustentável
de acordo com o código de conduta da
pesca responsável”. Ao ser indagado sobre
esses saberes e conhecimentos sobre a
pesca artesanal, os entrevistados 4 e 6
afirmaram que:
Na Casa Escola da Pesca nós
tínhamos mais aula teórica do que
prática. Por exemplo, nós íamos ter
uma formação pra construir uma rede
pesca. o professor dava uma aula
teórica, no data show. Mas se o
senhor pedir pra mim fazer uma rede
de pesca, uma tarrafa, um espinhel,
um matapi eu não sei fazer. Porque
nós não tivemos prática dessas
coisas. O que eu posso dizer que
tenho um pouco mais de
conhecimento é sobre a criação de
peixe em tanque, principalmente
porque eu estagiei na UFRA
5
. Mas
mesmo assim eu preciso de mais
formação hoje, porque nós não
praticamos depois que a gente sai da
escola e a gente vai esquecendo
(entrevistado 4).
Nós estudamos todas essas matérias,
matemática, história, sociologia ... e
também matérias sobre a pesca, mas
tudo muito teórico. Se o professor
fosse falar sobre o tamanho da malha,
os tipos de peixe, os tipos de maré,
essas coisas, era tudo de boca. Não
tinha nada de prática (entrevistado 6).
A ilha apresenta certa organização
social bastante interessante do ponto de
vista formal. De fato, existem em Cotijuba
a Associação dos Produtores da Ilha de
Cotijuba (APIC), a Associação dos
Moradores da Ilha de Cotijuba e Ilhas
Adjacentes (AMICIA), Movimento de
Mulheres das Ilhas de Belém (MMIB),
Cooperativa dos Charreteiros da Ilha de
Cotijuba e outras. Tudo isso seria um
input a ser considerado como capaz de
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
21
gerar as condições objetivas para um
desenvolvimento comunitário local,
baseado nos princípios do
desenvolvimento solidário.
Apesar disso nenhum dos egressos
disse fazer parte de alguma colônia de
pescadores, associação ou cooperativa de
trabalhadores voltada à pesca ou
aquicultura. Também não são filiados a
nenhum partido político e apresentam certa
rejeição quanto a essa esfera da vida
humana. De todos os entrevistados, apenas
um disse estar associado à Cooperativa dos
Charreteiros da Ilha de Cotijuba, mas não
informou as garantias que ele possui
enquanto cooperado. Sabe apenas que essa
é uma condição para que possa
desempenhar sua atividade de charreteiro
com maior segurança.
Quadro 1: Participação dos egressos da CEPE em organização coletiva na ilha de Cotijuba.
Identificação
N. de organização
econômica ou social que
participa
Identificação da organização que participa
Entrevistado 1
0
Entrevistado 2
0
Entrevistado 3
1
Cooperativa dos Charreteiros da Ilha de Cotijuba
Entrevistado 4
0
Entrevistado 5
0
Entrevistado 6
0
Fonte: pesquisa de campo (2018).
Ao serem indagados sobre a questão
do associativismo enquanto aprendizado
no contexto de sua formação, todos os
egressos se mostraram sem nenhuma base
conceitual ou prática acerca deste assunto.
Sobre as cooperativas nós tivemos
muito pouco estudo sobre isso. Eu
nem lembro muito bem sobre isso.
Foi no ensino médio que nós
vimos isso muito rápido. Eu não me
lembro de muita coisa sobre isso. O
que eu me lembro mais ou menos é
que as cooperativas têm que ter mais
pessoas pra funcionar e a associação
não precisa de muita gente. Eu não
lembro muito bem, praticamente não
sei nada. Era o nosso professor de
pesca que falava pra nós sobre isso
(entrevistado 4).
Efetivamente, o que se observou em
campo foi a precarização do trabalho dos
egressos, refletida principalmente na
insegurança jurídica de suas relações
laborais. De fato, eles apresentam
remuneração aviltante, direitos trabalhistas
inexistentes e nenhuma garantia de
assistência previdenciária. Por outro lado,
os egressos não possuem condições
monetárias iniciais para o tão propalado
empreendedorismo individual (Belém,
2013), muito menos crédito para a compra
dos materiais necessários às viagens para
alto mar, tampouco conseguem comprar os
instrumentos de captura do pescado,
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
23
logística para o armazenamento, transporte
e comercialização de peixes em mercados
locais ou alhures.
A alternativa seria a constituição de
empresas cooperadas, o que exigiria, além
de capital e crédito, certo acumulado de
valores de confiança e solidariedade
mútua, capacidade de formação de redes de
cooperação, mecanismos de sanção e
regras de comportamento que podem
melhorar as ações coletivas (Putnam,
1996). Visto como um bem de todos os
pertencentes à dada comunidade, estes
valores coletivos são gerados
historicamente no contexto de práticas
organizativas horizontais (sindicatos,
cooperativas, associações, clubes etc.), nos
quais se estabelecem relações face a face
que melhoram a confiança entre as
pessoas. Quanto maior o tempo despendido
na participação organizativa, ou seja, em
reuniões, deliberações, encontros, tarefas
para a resolução de questões comunitárias
etc., mais os grupos se fortalecem em
termos de confiança, solidariedade,
reconhecimento mútuo, autoestima e
interferindo positivação nas ações
coletivas.
É neste sentido que as vivências
cotidianas nas organizações sociais,
políticas e econômicas são fundamentais
no processo de construção de laços
societárias que contribuam para as ações
coletivas necessárias ao desenvolvimento
local. Como não um habitus
organizacional, os egressos conseguem
pensar em empreendimentos individuais,
nos mesmos moldes das relações sociais
patronais das grandes empresas capitalistas
pesqueiras, e acabam ficando presos a
sonhos cada vez mais distantes de sua
efetivação. Note-se que habitus aqui deve
ser entendido como “princípio gerador de
nossas práticas, de nossas ações no mundo,
fundamento da regularidade de nossas
condutas”. (Araújo, Alves & Cruz, 2009, p.
38). Para Bourdieu (1983) o Habitus
constitui-se na disposição que as pessoas
individualmente possuem em relação a
determinadas estruturas sociais que são
introjetadas de maneira consciente ou
inconscientemente, as quais condicionam
seus sentimentos, visões sociais de mundo,
suas ações coletivas dentro dos campos
sociais dos quais as pessoas fazem parte.
Conforme posto por Gohn (1992,
2011), as organizações e os Movimentos
Sociais são, por princípio, educadores
coletivos da sociedade, entendida a
educação como um componente da cultura
(Brandão, 2006), ou seja, parte
fundamental do processo de hominização
dos indivíduos na coletividade.
Para nós, a educação não se resume à
educação escolar, realizada na escola
propriamente dita. aprendizagens
e produção de saberes em outros
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
24
espaços ... Um dos exemplos de
outros espaços educativos é a
participação social em movimentos e
ações coletivas, o que gera
aprendizagens e saberes. um
caráter educativo nas práticas que se
desenrolam no ato de participar, tanto
para os membros da sociedade civil,
como para a sociedade mais geral, e
também para os órgãos públicos
envolvidos quando negociações,
diálogos ou confrontos. (Gohn, 2011,
p. 333).
Quanto ao caráter educativo dos
movimentos sociais, a autora afirma de
maneira conclusiva que eles são espaços
férteis para a inovação e fontes geradoras
de saberes. Por isso, seria de grande valia
que a CEPE colocasse o cooperativismo ou
associativismo como componente
estruturante do percurso formativo de seus
educandos, efetivando aquilo que está
colocado no anverso do diploma de
conclusão do ensino médio da CEPE
(Figura 10, acima). Nele pode-se ler que o
perfil profissional do concluinte desse
nível de ensino, deveria garantir ao egresso
saberes e competências quanto às
diferentes formas de organização social
dos profissionais da pesca.
No concernente ao ensino
fundamental, vale destacar que os alunos
concluintes deveriam estar aptos, dentre
outras coisas, a “... conhecer e distinguir as
diferentes formas de organização dos
profissionais da pesca, em associações,
sindicatos, cooperativas, colônia e
federação de pescadores”. (Belém, 2013, p.
20; Figura 12, acima). Essa é uma
realidade que precisa ser construída e a
CEPE não pode se eximir de seu papel de
edificadora dessa base associativa para
seus/suas alunos/as. Caso contrário essa
realidade precária dos egressos, moradores
de Cotijuba, será replicada para as outras
comunidades ribeirinhas de Belém
assistidas pela Escola.
Conclusão
A CEPE é uma escola pública
municipal na modalidade EJA
profissionalizante correspondente aos
níveis fundamental e/ou médio,
desenvolvendo suas atividades
educacionais na ilha de Outeiro
(Caratateua), Belém, Pará desde 2008. Seu
público alvo são filhos e filhas de
pescadores/as e trabalhadores/as da pesca
das áreas ribeirinhas do município de
Belém. Do ponto de vista formal, seus
egressos da EJA/ensino médio podem
continuar estudando em nível superior e/ou
desenvolver atividades pesqueiras em suas
comunidades.
No PPP desta escola pode-se
observar que a palavra desenvolvimento
constitui-se como uma categoria fundante
quanto aos seus objetivos educacionais. De
fato, a palavra desenvolvimento aparece
grafada 44 vezes, sempre associada a
aspectos individuais e coletivos de
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
25
melhoria socioeconômica ou cultural-
ambiental de seus/suas educandos/as. Para
tanto, propõe-se a implementação de um
percurso educacional integrando a
formação básica com a profissional, tendo
a atividade da pesca como referência
laboral. Para a efetivação formativa dos/as
discentes, a CEPE se propõe a contemplar
integrativamente os tempos escolares com
os saberes e práticas locais comunitárias
com base na Pedagogia da Alternância.
A se tomar a escola isoladamente, é
possível afirmar que a CEPE apresenta
totais e objetivas possibilidades para a
realização de uma educação de qualidade e
inovadora para os filhos e filhas dos/as
trabalhadores/as das áreas insulares de
Belém, não apenas no que concerne a sua
autonomia pedagógica, como também em
relação ao compromisso e qualidade
formativa de seus sujeitos educacionais.
Todavia, o que se observou com a
pesquisa de campo junto a egressos da
CEPE foi que um hiato muito grande
entre os objetivos de desenvolvimento
local, proposto pelo PPP desta escola, e a
realidade vivida por seus egressos. O caso
tomado como referência para as análises, a
ilha de Cotijuba, constituiu-se uma amostra
da atual situação vivida pelos egressos da
CEPE, demonstrando que realmente um
fosso entre o dito e o percebido.
Na prática o que se viu foi a
precarização do trabalho dos egressos, com
insegurança jurídica em suas relações
laborais, remuneração aviltante, direitos
trabalhistas negados, nenhuma garantia de
assistência previdenciária e distantes
daquilo que estudaram durante anos como
alunos da Casa Escola da Pesca.
Precisamente, os ex-alunos da CEPE
trabalham como condutores de charretes,
de motocicletas e “motorretes”, na
construção civil, limpeza de árias
residenciais, vendedores ambulantes e até
mesmo como garçons em barras e
quiosques de bebidas e comidas nas áreas
de praia.
Os egressos não conseguem acessar
o nível superior de ensino, nem tampouco
conseguem as condições financeiras
iniciais para empreender individual ou
coletivamente negócios empresariais. Por
isso têm na prestação informal de serviços
a única possibilidade de garantir renda para
seu sustento e de suas famílias. Como se
não bastasse tudo isso, eles apresentaram
baixíssima capacidade organizativa e, por
conseguinte, de formação de rede de
confiança e solidariedade para além da
realidade doméstica familiar.
A escola não pode se furtar a sua
condição de espaço de aprendizagem e,
portanto, precisa ensinar aos seus/suas
educandos/as o modo como estão
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
26
inseridos/as nas estruturas sociais, políticos
e econômicos de uma formação social
determinada (a sociedade capitalista).
Os/as alunos/as precisam entender
criticamente a maneira como esta
sociedade funciona, suas relações sociais
de produção e racionalidade acumulativa
de riqueza dominante e, assim, poder
observar a realidade conjuntural concreta
dos ribeirinhos amazônidas em seu
conjunto e, em particular, a belenense.
A CEPE certamente não resolverá os
problemas relativos ao desenvolvimento
socioeconômico e educacional de seus
egressos, tampouco das comunidades
ribeirinhas assistidas. outras variáveis
que precisam ser colocadas neste
contexto. Todavia, a escola não pode
negligenciar o aprendizado
problematizador, crítico e criativo,
desvelando a realidade social de seus/suas
educandos/as, inclusive mostrando que o
desenvolvimento é uma visão de mundo, a
qual pode ser capitalista ou solidária, e
neste sentido pode ser mais individualistas
ou associativista. Essas informações são
essenciais para a análise qualificada dos
problemas locais e possíveis proposições e
alternativas ao desenvolvimento
comunitário ribeirinho, para que seja
socialmente justo e ambientalmente
sustentável.
Referências
A Ilha de Cotijuba. (2018). Recuperado de
http://www.vilacotijuba.com.br/p/sobre.ht
ml
Araújo, F. M. B., Alves, E. M., & Cruz, M.
P. (2009). Algumas reflexões em torno dos
conceitos de campo e de habitus na obra de
Pierre Bourdieu. Revista Perspectivas da
Ciência e Tecnologia, 1(1), 31-40.
Recuperado de:
http://revistascientificas.ifrj.edu.br:8080/re
vista/index.php/revistapct/article/viewFile/
14/14
Araújo, M. N. R. (2012). Educação de
jovens e adultos (EJA). In Caldart, R. S., et
al. (Orgs.). Dicionário da Educação do
Campo (pp. 252-259). Rio de Janeiro:
Escola politécnica de saúde Joaquim
Venâncio, Expressão Popular.
Arroyo, M. G. (2012). Tempos humanos
de formação. In Caldart, R. S. et al.
(Orgs.). Dicionário da Educação do
Campo (pp. 735-742). Rio de Janeiro:
Escola politécnica de saúde Joaquim
Venâncio, Expressão Popular.
Belém (Município). (2017). Projeto
Político Pedagógica da Escola Bosque.
Belém: Secretaria Municipal de Educação,
Fundação Centro de Referência em
Educação Ambiental Escola Bosque
Professor Eidorfe Moreira.
______. (2013). Projeto Político
Pedagógica da Casa Escola da Pesca.
Belém: Secretaria Municipal de Educação,
Casa Escola da Pesca.
Belém. (1994). Lei 7682 de 05 de
janeiro de 1994. Dispõe sobre a
regionalização administrativa do município
de Belém, delimitando os respectivos
espaços territoriais dos distritos
administrativos e outras providências.
Diário Oficial do Município. 05 de janeiro
de 1994. Recuperado de: http://cm-
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
27
belem.jusbrasil.com.br/legislacao/583592/l
ei-7682-94
Bourdieu, P. (1983). Questões de
sociologia. Rio de Janeiro: Marco Zero.
Brandão, C. R. (2006). O que é educação.
48º Ed. São Paulo: Brasiliense (Coleção
Primeiros Passos).
Brasil. (2000). Lei 9.985 de 18 de Julho
de 2000. Institui o Sistema Nacional de
Unidades de Conservação da Natureza-
SNUC. Brasília. Recuperado de:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L
9985.htm
Brasil. (1996). Lei 9394, de 20 de
dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes
e bases da educação nacional. DOU.
Brasília, DF, 20 dez. 1996. Recuperado de:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l
9394.htm
Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento (CMMAD). (1988).
Nosso futuro comum. Rio de Janeiro:
Fundação Getúlio Vargas.
Dicionários Porto Editora. (2018).
Desenvolvimento. Recuperado de:
https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingu
a-portuguesa/desenvolvimento
Dicionário Online de Português. (2018).
Desenvolvimento. Recuperado de:
https://www.dicio.com.br/desenvolvimento
/
Estevam, D. O. (2001). Casa Familiar
Rural: a formação com base na Pedagogia
da Alternância. 2001. (Dissertação de
Mestrado). Universidade Federal de Santa
Catarina, Florianópolis. Recuperado de:
https://repositorio.ufsc.br/xmlui/handle/12
3456789/81745?show=full
Fernandes, A. P. C. S., & Fernandes, A. S.
(2016). A (in) acessibilidade nos
transportes e as pessoas com deficiência da
comunidade ribeirinha da Amazônia
paraense. Revista Cocar, 10(19), 240-264.
Frigotto, G. (2009). Teoria e práxis e o
antagonismo entre a formação politécnica e
as relações sociais capitalistas. Trabalho,
Educação e Saúde, 7, 67-82. Doi:
http://dx.doi.org/10.1590/S1981-
77462009000400004
Fundação Escola Bosque (FUNBOSQUE)
(2010). Portaria 031/2010. Cria a Casa
Escola da Pesca. DOM 11.556, de 05
Fev. Recuperado de:
http://www.belem.pa.gov.br/diarioom/inde
x.jsf
Furtado, C. (1961). Desenvolvimento e
subdesenvolvimento. Rio de Janeiro: Fundo
de Cultura.
Gohn, M. G. (1992). Movimentos Sociais e
Educação. São Paulo: Cortez.
______. (2011). Movimentos sociais na
contemporaneidade. Revista Brasileira de
Educação, 16(47), 333-512. Recuperado
de:
http://www.scielo.br/pdf/rbedu/v16n47/v1
6n47a05.pdf
Kosik, K. (1976). Dialética do Concreto.
5
a
Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra.
Latouche, S. (2009). O desenvolvimento
representa o problema e o não o remédio
para a mundialização! In Brune, F. et al.
(Orgs.). Desfazer o desenvolvimento para
refazer o mundo. (Tradução de José Maria
de Almeida). Vargem Grande Paulista-SP:
Cidade Nova.
Layrargues, P. P., & Lima, G. F. C. (2014).
As macrotendências político-pedagógicas
da educação ambiental brasileira.
Ambiente e Sociedade, 1(71), 23-40.
Recuperado de:
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci
_arttext&pid=S1414-
753X2014000100003&lng=en&nrm=iso
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
28
Libâneo, J. C. (2018). Escola de tempo
integral em questão: lugar de acolhimento
social ou de ensino-aprendizagem?.
Recuperado de:
http://professor.pucgoias.edu.br/SiteDocent
e/admin/arquivosUpload/5146/material/Va
ldeniza%20ESCOLA%20DE%20TEMPO
%20INTEGRAL%2023.8.docx
Marialva, M. E. A. (2011). PRONERA:
política pública na educação de assentados
(as) da reforma agrária. 2011. (Dissertação
de Mestrado). Universidade Estadual de
Campinas, Campinas. Recuperado de:
http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/do
cument/?code=000847492
Marx, K. (2008). Contribuição à crítica da
Economia Política. (Tradução e Introdução
de Florestan Fernandes). 2ª. ed. São Paulo:
Expressão Popular.
Oliveira, L. D. (2005). A Ideologia do
Desenvolvimento Sustentável: notas para
reflexão. Revista Tamoios, 2, 41-46.
Pires, A. P. (2010). Amostragem e
pesquisa qualitativa: ensaio teórico e
metodológico. In: Pupart, J. (et al.). A
pesquisa qualitativa: enfoques
epistemológicos e metodológicos (pp. 127-
153). Ed. Petrópolis, RJ: Vozes
(Coleção Sociologia).
Porto-Gonçalves, C. W. (2012). Ambiente
(meio ambiente). In Caldart, R. S. (Org.).
Dicionário da Educação do Campo (pp.
96-104). Rio de Janeiro, São Paulo: Escola
Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio,
Expressão Popular.
Putnam, R. (1996). Comunidade e
democracia: a experiência da Itália
moderna. Tradução de L. A. Monjardim.
Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas.
Sachs, I. (1986). Ecodesenvolvimento:
crescer sem destruir. São Paulo: Vértice.
Silva, C. E. M. (2012). Desenvolvimento
sustentável. In Caldart, R. S. (Org.).
Dicionário da Educação do Campo (pp.
206-211). Rio de Janeiro, São Paulo:
Escola Politécnica de Saúde Joaquim
Venâncio, Expressão Popular.
Silva, G. V. et al. (2014). Percepção
ambiental na área de proteção ambiental na
ilha de Cotijuba, Belém, Pará.
Enciclopédia Biosfera, 10(18), 3977-3985.
Silva, J. B., Santos, J., & Souza, N. S. D.
(2016). Escola básica e comunidades
ribeirinhas em Belém, Estado do Pará:
Problemas e Perspectivas. In KLA
Working Paper, 18, Kompetenznetz
Lateinamerika - Ethnicity, Citizenship,
Belonging; Recuperado de:
http://www.kompetenzla.uni-
koeln.de/fileadmin/WP_Bittencourt.pdf
Silva, J. B. (2009). Populações do campo
na Amazônia brasileira: desenvolvimento,
capital social e o papel da educação.
Revista Margens, 4(6), 39-54.
______. (2018). Inovação escolar e
escolas municipais de tempo integral em
Belém do Pará: um estudo nas ilhas
Mosqueiro e Caratateua. Edital n. 06/2017
PROPESP/UFPA, de 10 de abril de
2017. Belém: Universidade Federal do
Pará.
Singer, P. (2004). Desenvolvimento
capitalista e desenvolvimento solidário.
Estudos Avançados, 18(51). Doi:
http://dx.doi.org/10.1590/S0103-
40142004000200001
Souza, N. S. D. (2015). Na Belém
Ribeirinha, a Juventude e o Direito à
Escolarização com Educação Profissional:
análise da experiência da Casa Escola da
Pesca. (Tese de Doutorado). Universidade
Federal do Pará, Belém.
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e desenvolvimento em escola do campo...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e6247
10.20873/uft.rbec.v4e6247
2019
ISSN: 2525-4863
29
Veiga, I. P. A. (Org.). (2002). Projeto
político-pedagógico da escola: uma
construção possível. 14ª Ed. Papirus.
1
Expressão latina que significa por cabeça.
2
Fundação Centro de Referência em Educação
Ambiental Escola Bosque Professor Eidorfe
Moreira.
3
Programa Nacional de Educação na Reforma
Agrária (PRONERA) foi criado em 1998, a partir
da mobilização dos Movimentos Sociais, em
particular do Movimento dos Trabalhadores Rurais
Sem Terra - MST. Este programa tem como
principal proposta alfabetizar e elevar o grau de
escolaridade de jovens e adultos de projetos de
assentamentos da reforma agrária. Sobre
PRONERA ver Marialva (2011).
4
A Amazônia Seoul Importação e Exportação Ltda
(AMASE) é uma grande empresa voltada à pesca
de crustáceos e moluscos em água salgada e água
doce, com endereço na rua Manoel Barata, 1789,
Icoaraci, Belém, Pará, Brasil.
5
Universidade Federal Rural da Amazônia.
Informações do artigo / Article Information
Recebido em : 05/12/2018
Aprovado em: 14/05/2019
Publicado em: 28/05/2019
Received on December 05th, 2018
Accepted on May 14th, 2019
Published on May, 28th, 2019
Contribuições no artigo: O autor foi a responsável por
todas as etapas e resultados da pesquisa, a
saber: elaboração, análise e interpretação dos dados;
escrita e revisão do conteúdo do manuscrito e; aprovação
da versão final a ser publicada.
Author Contributions: The author was responsible for the
designing, delineating, analyzing and interpreting the data,
production of the manuscript, critical revision of the content
and approval of the final version to be published.
Conflitos de interesse: O autor declarou não haver
nenhum conflito de interesse referente a este artigo.
Conflict of Interest: None reported.
Orcid
José Bittencourt da Silva
http://orcid.org/0000-0002-5393-1170
Como citar este artigo / How to cite this article
APA
Silva, J. B. (2019). Escolarização, profissionalização e
desenvolvimento em escola do campo: o caso de
egressos da CEPE na Ilha de Cotijuba, Belém, Pará. Rev.
Bras. Educ. Camp., 4, e6247. DOI:
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e6247
ABNT
SILVA, J. B. Escolarização, profissionalização e
desenvolvimento em escola do campo: o caso de
egressos da CEPE na Ilha de Cotijuba, Belém, Pará. Rev.
Bras. Educ. Camp., Tocantinópolis, v. 4, e6247, 2019.
DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e6247