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Quefazer mecânico e memorizador,
no qual os alfabetizandos são levados
a repetir, de olhos fechados, vezes
inúmeras, sincronizadamente: la, le,
li, lo, lu; ba, be, bi, bo, bu; ta, te, ti,
to, tu, ladainha monótona que implica
sobretudo numa falsa concepção do
ato de conhecer.
Na perspectiva libertadora, que é a da
Guiné-Bissau, que é a nossa, a
alfabetização de adulto, pelo
contrário, é a continuidade do esforço
formidável que seu povo começou a
fazer, há muito, irmanado com seus
líderes, para conquista de SUA
PALAVRA. Daí que, numa tal
perspectiva, a alfabetização não
possa escapar do seio mesmo do
povo, de sua atividade produtiva, de
sua cultura, para esclerosar-se na
frieza sem alma de escolas
burocratizadas ...
A alfabetização de adultos, como a
entendemos, se faz uma dimensão da
ação cultural libertadora, não
podendo ser, por isso mesmo sequer
pensada isoladamente, mas sempre
em relação com outros aspectos da
ação cultural, tomada em sua
globalidade. (Freire, 1978, p. 92).
Na contramão da pedagogia oficial,
Paulo Freire (1978, 1979, 1991) entende o
contexto vigente, integrando-o às
condições do contexto humano, pois visa o
discernimento para responder aos desafios
e transcendê-los. Ou seja, busca lançar o
homem num domínio que lhe é exclusivo –
o da História e o da Cultura. Mas, para
isto, aponta a necessidade de uma atitude
crítica permanente, pois somente assim o
homem poderá exercer sua vocação
ontológica de integrar-se, apreendendo e
dialogando com temas e tarefas de sua
época e cultura. Assim, pode anunciar o
trânsito para uma nova época, para um
tempo de mudança, com novas
significações da cultural e da sociedade
(Souza, 2002).
Paulo Freire anuncia o seu tempo de
mudança. Ainda em contexto político de
regime militar, em 1979, o governo de
João Figueiredo decreta anistia aos
exilados e presos políticos. Assim, em
1980, Freire pode retornar do exílio em
Genebra para o Brasil. Além disso,
conforme registros do Instituto Paulo
Freire, em 28 de agosto de 1993, após 30
anos,
Paulo Freire e sua esposa Ana Maria
Araújo Freire, acompanhados por
dois fundadores do Instituto Paulo
Freire (1991), Carlos Alberto Torres
e Moacir Gadotti, visitam Angicos,
reencontrando-se com antigos alunos
e monitores, entre eles Marcos
Guerra e o ex-analfabeto Antônio
Ferreira que, na histórica visita de
João Goulart a Angicos, discursou
em nome dos colegas.
2002 – Analisando os “efeitos em
longo prazo do método de
alfabetização” da experiência de
Angicos, Nilcéa Lemos Pelandré
(2002), após entrevistar alunos que se
alfabetizaram em 1963, passados 34
anos, evidenciou que os participantes
aprenderam a escrever palavras
isoladas e frases simples e curtas e
alguns escreviam seguindo regras
próprias. A aprendizagem mais
significativa foi a elevação da sua
autoestima e a consciência de não se
sentirem mais excluídos do mundo
letrado. Nesta tese de doutorado em
linguística, a autora conclui que o
segredo da eficácia de Angicos foi a
“promoção humana, professores
preparados e motivados e imersão