Revista Brasileira de Educação do Campo
The Brazilian Scientific Journal of Rural Education
ARTIGO/ARTICLE/ARTÍCULO
DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e7097
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e7097
10.20873/uft.rbec.e7097
2020
ISSN: 2525-4863
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As condições de trabalho do professor de Ciências em
classes multiano em uma escola do campo
Maria de Fátima Matos de Souza
1
, Ana Lúcia Barreto da Silva
2
, Maria Francisca de Miranda Adad
3
, Renato Pinheiro da Costa
4
1, 4
Universidade Federal do Pará - UFPA. Programa de Pós-Graduação em Currículo e Gestão da Escola Básica. Rua Augusto
Corrêia, 1, Bairro do Guamá. Belém - PA. Brasil.
2
Prefeitura Municipal de Pacajá - PA.
3
Universidade Federal do Oeste do
Pará - UFOPA.
Autor para correspondência/Author for correspondence: fmatoz@gmail.com
RESUMO. Este artigo tem por objetivo discutir as condições de
trabalho do professor de Ciências Naturais, em classes multiano,
em escolas do campo. A metodologia utilizada neste estudo
pautou-se em pesquisa qualitativa. As cnicas de coleta de
dados foram as observações diretas intensivas nas aulas da
disciplina de Ciências e entrevistas semiestruturadas, realizada
na Escola Municipal de Ensino Fundamental Sonho de Criança,
localizada no município de Pacajá/PA. A entrevista foi realizada
com o único professor da disciplina de Ciências, com a
coordenadora pedagógica e com o diretor de ensino, sendo que
os dois últimos atuam na Secretaria Municipal de Educação e
orientam os trabalhos docentes nessa escola. Os dados revelaram
as condições de precarização em que o professor vem passando
na classe multiano e as dificuldades enfrentadas para trabalhar
os conteúdos de ciências em turma composta por séries
diferentes, devido à falta de recursos didáticos adequados e em
quantidade suficiente para realização do seu trabalho docente.
Concluímos que o trabalho do professor de Ciências nessa classe
tem se pautado na utilização do modelo seriado urbano de
ensino, havendo a necessidade da inclusão nas escolas desse
município de metodologias de ensino específicas para classes
multiano, que favoreçam o ensino-aprendizagem e facilite a
atuação do docente em sala de aula.
Palavras chave: Educação do Campo, Classe Multiano, Ensino
de Ciências, Metodologia de Ensino.
Souza, M. F. M., Silva, A. L. B., Adad, M. F. M., & Costa, R. P. (2020). As condições de trabalho do professor de Ciências em
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The working conditions of the Science teacher in various
years in a rural school
ABSTRACT. This article aims to discuss the working
conditions of the Professor of Natural Sciences, in classes of
several years, in rural schools. The methodology used in this
study was based on qualitative research. The data collection
techniques were intensive direct observation in science classes
and semi-structured interviews, conducted at the Municipal
School of Primary Education Sonho de Criança, located in the
municipality of Pacajá/PA. The interview was conducted with
the only teacher of the Science discipline, with the pedagogical
coordinator and the director of education, the last two work in
the Municipal Department of Education and guide the teaching
work in that school. The data revealed the precarious conditions
in which the teacher has been going through the class of several
years and the difficulties faced to work with science content in a
class composed of different grades, due to the lack of adequate
didactic resources and in sufficient quantity to carry out your
teaching work. We conclude that the work of the science teacher
in this class has been based on the use of the serial urban
teaching model, with the need to include specific teaching
methodologies for classes of various classes in the schools of
this municipality, which favor teaching-learning and facilitate
the performance of the teacher in the classroom.
Keywords: Rural Education, Multi-class; Science Education,
Teaching Methodology.
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Las condiciones de trabajo del profesor de Ciencias en
clases varios años en una escuela rural
RESUMEN. Este artículo tiene como objetivo discutir las
condiciones de trabajo del profesor de Ciencias Naturales, en
clases de varios años, en escuelas rurales. La metodología
utilizada en este estudio se basó en la investigación cualitativa.
Las técnicas de recolección de datos fueron la observación
directa intensiva en clases de ciencias y entrevistas
semiestructuradas, realizadas en la Escuela Municipal de
Educación Primaria Sonho de Criança, ubicada en el municipio
de Pacajá/PA. La entrevista se realizó con el único maestro de la
disciplina de Ciencias, con el coordinador pedagógico y con el
director de educación, los dos últimos trabajan en el
Departamento Municipal de Educación y guían el trabajo de
enseñanza en esa escuela. Los datos revelaron las condiciones
precarias en que el maestro ha estado pasando por la clase de
varios años y las dificultades enfrentadas para trabajar con
contenido de ciencias en una clase compuesta por diferentes
grados, debido a la falta de recursos didácticos adecuados y en
cantidad suficiente para llevar a cabo su trabajo de enseñanza.
Concluimos que el trabajo del profesor de ciencias en esta clase
se ha basado en el uso del modelo de enseñanza urbana en serie,
con la necesidad de incluir metodologías de enseñanza
específicas para clases de varias clases en las escuelas de este
municipio, que favorecen la enseñanza-aprendizaje y facilitan el
desempeño del profesor en el aula.
Palabras clave: Educación Rural, Multi-clase, Enseñanza de
Ciencias, Metodología de la Enseñanza.
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Introdução
Este artigo analisa as condições de
trabalho do professor de Ciências, em
classes multiano
i
, em uma escola do campo
do município de Pacajá, Estado do Pará.
As classes multiano são comuns no Brasil,
especialmente em escolas localizadas na
zona rural. Esse tipo de oferta é uma
herança de nosso período colonial, que
privilegiou o ensino apenas aos filhos dos
donos de terras e, somente com o advento
da República, a educação escolar foi se
expandido e sendo ofertada às demais
classes da população brasileira, tanto na
zona urbana, quanto na zona rural.
Contudo, as escolas urbanas e rurais
apresentavam suas diferenças, inclusive na
metodologia de ensino. Essa diferenciação
fica evidenciada nos estudos realizados por
Janata e Anhaia (2015) que afirma que
com a República (1889), foram criados os
Grupos Escolares e com eles se inicia a
adoção do modelo seriado de
escolarização, que se popularizou
inicialmente e principalmente nas cidades.
Ainda, como afirmam Santos e Moura
(2010), nas vilas e povoados e na zona
rural permaneceram as escolas isoladas,
multisseriadas para atender a realidade
local da zona rural, realidade esta que
ainda pode ser vista na atualidade.
Na região Norte, escola multiano se
proliferou, especialmente no Estado do
Pará e permanece até os dias atuais. Esse
modelo de organização em classes
multiano, se mantém porque, o número de
alunos na zona rural é menor e não atinge o
total mínimo definido pelas Secretarias de
Educação, para formar uma turma por
série. A esse respeito, utilizamos a
definição de classes
multisseriadas/multiano, apresentado por
Ximenes-Rocha e Colares (2013, p. 93),
com a qual temos total concordância:
As classes multisseriadas
caracterizam-se por reunir em um
mesmo espaço físico diferentes séries
que são gerenciadas por um mesmo
professor. São, na maioria das vezes,
única opção de acesso de moradores
de comunidades rurais (ribeirinhas,
quilombolas) ao sistema escolar. As
classes multisseriadas funcionam em
escolas construídas pelo poder
público ou pelas próprias
comunidades, ou ainda em igrejas,
barracões comunitários, sedes de
clubes, casas dos professores entre
outros espaços menos adequados
para um efetivo processo de ensino-
aprendizagem.
Contudo, cabe mencionar que a
educação do campo
ii
ao longo de sua
história tem enfrentado diversos problemas
no que diz respeito à garantia dos direitos a
uma educação de qualidade para todos,
conforme preconizando a Constituição
Federal Brasileira (Brasil, 1988). Essas
dificuldades estão relacionadas, por
exemplo, à falta de oferta da educação
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básica em algumas comunidades, fazendo
com que os alunos tenham que se deslocar
em condições precárias, para estudar em
uma escola distante de sua residência;
também é comum a falta de professores; as
instalações físicas não são adequadas para
o ensino, o material didático não adequado
à aprendizagem, entre outros aspectos que
dificultam a efetivação desse direito
contido na Constituição.
Apesar dos avanços significativos em
políticas públicas voltadas para a garantia
de uma educação que atenda as
especificidades dos povos do campo, ainda
muito a ser feito para que tenhamos um
ensino que dialogue com o contexto social
e o modo de vida em que esses povos estão
inseridos. Neste sentido, os movimentos
sociais vêm lutando para que seja garantida
uma educação de qualidade para os
sujeitos do campo. De acordo Hage (2011):
A Educação do Campo tem sido
compreendida enquanto estratégica
para o desenvolvimento sócio-
econômico do meio rural, resultado
das mobilizações dos movimentos
sociais do campo e da apresentação
por parte desses sujeitos coletivos de
proposições e práticas inovadoras,
sintonizadas com as especificidades
que configuram a diversidade sócio-
territorial do campo no Brasil. (Hage,
2011, p. 55).
Neste contexto, entendemos que os
movimentos sociais têm desempenhado um
importante papel na luta por garantias de
direitos, apresentando práticas inovadoras
que valorizam a diversidade dos sujeitos
do campo, levando em consideração o
espaço em que vivem. Por isso, as
organizações dos trabalhadores do campo
em conjunto com outros seguimentos
populares promoveram importantes
embates em vista de refletir sobre a
realidade educacional que lhes era imposta,
como expressa Caldart (2009):
A Educação do campo nasceu como
crítica à realidade da educação
brasileira, particularmente à situação
educacional do povo brasileiro que
trabalha e vive no/do campo. Esta
crítica nunca foi à educação em si,
mesmo porque seu objeto é a
realidade dos trabalhadores do
campo, o que necessariamente a
remete ao trabalho e ao embate entre
projetos de campo que têm
consequências sobre a realidade
educacional e o projeto de país
(Caldart, 2009, p. 39).
A luta por acesso a educação
pública mobilizou as comunidades rurais,
posto, o entendimento que a sociedade
campesina passou a ter do direito a uma
educação de qualidade, voltada para
atender suas especificidades, levando em
consideração seus modos de vida, suas
necessidades e realidades. Essa concepção
de educação, que valorize a realidade local
tem sido um grande desafio para se efetivar
nas escolas do campo, especialmente, no
estado do Pará, devido sua omissão nos
currículos de ensino, na organização
pedagógica da escola e no cotidiano da sala
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de aula do professor, de boa parte das
escolas do campo paraenses,
Essa é uma realidade vivenciada por
diversos professores da escola do campo,
em geral e pelos que ministram a disciplina
de ciências, em classes multiano, objeto de
nosso estudo, em particular. A quebra
desse paradigma de ensino por parte do
professor da disciplina de ciências requer
dele um esforço para compreender o
ensino não como uma sequência de
conteúdos a serem ensinados e sim como
um processo educativo, que leva em
consideração a heterogeneidade dos atores
sociais envolvidos. Dessa forma, o
professor de ciências deve superar a
tradicional aula de repetição de conteúdos,
descontextualizada da realidade de vida
dos alunos, buscando articular o
conhecimento dentro de um contexto
complexo da sala de aula, fazendo uma
aproximação com o cotidiano em sala de
aula (Freitas, 2005) e consequentemente
com o processo e aprendizagem. A esse
respeito Freitas (2005), ao discutir a
dinâmica do processo educativo no ensino
de ciências em classes multiano, conclui
que:
Investigar a dinâmica do processo
educativo no que se refere ao ensino
de ciências no Ensino Fundamental,
em uma classe multisseriada, nos faz,
antes de qualquer coisa, aprendizes
do(a) professor(a) que vai nos ensinar
a compreender como ele(a) é capaz
de lidar com tantas diferenças em
uma classe e como os alunos, tão
diversos, interagem entre si, na
perspectiva da aprendizagem de
novos conhecimentos. (Freitas,
2005, p. 71).
De acordo com esse autor, temos que
mergulhar na rotina das classes multiano,
para compreendermos como funciona o
ensino de ciências em classes compostas
por alunos com faixas etárias diferentes e
interesses diversos. A respeito do Ensino
de Ciências Naturais, os Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCN) salientam
que:
O ensino de Ciências Naturais
também é espaço privilegiado em que
as diferentes explicações sobre o
mundo, os fenômenos da natureza e
as transformações produzidas pelo
homem podem ser expostos e
comparados. É espaço de expressão
das explicações espontâneas dos
alunos e daquelas oriundas de vários
sistemas explicativos. Contrapor e
avaliar diferentes explicações
favorece o desenvolvimento de
postura reflexiva, crítica,
questionadora e investigativa, de não-
aceitação a priori de ideias e
informações. Possibilita ainda a
percepção dos limites de cada
modelo explicativo, inclusive dos
modelos científicos, colaborando
para a construção da autonomia de
pensamento e ação. (Brasil, 1997, p.
22).
Como isso, o ensino de ciências nos
possibilita entender melhor o espaço em
que vivemos, bem como nos impulsiona a
descobrir o novo, para nos tornarmos
sujeitos críticos e investigativos, ou
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melhor, para nos posicionarmos diante de
nossa própria realidade. Porém, para que
isso ocorra, é necessário que o professor
tenha pelo menos uma infraestrutura física
e pedagógica que possibilite criar, inovar e
ensinar, o que representa, dessa forma,
algo raro nas escolas do campo paraense.
Essa realidade das escolas do campo
paraense e a concepção de educação que
tem sido objeto de luta dos educadores e
dos movimentos sociais, em que buscam
por uma educação do campo no campo,
comprometida com a efetivação do direito
a educação de qualidade para o filho do
homem do campo, foi o que motivou esse
estudo. Entende-se que as condições de
trabalho que os professores possuem para
desenvolver sua docência é essencial para
a conquista dessa educação de qualidade.
O município de Pacajá, localizado na
região sudoeste do estado do Pará, é um
desses municípios, que retrata a realidade
apresentada nos estudos de Hage (2001),
cujos professores da escola do campo são
desafiados cotidianamente para atender
esse direito a educação ao cidadão que vive
no campo.
Partindo da compreensão de que não
basta o professor está motivado para o
processo educativo, mas que aliado a essa
motivação ele tenha a sua disposição
condições estruturais para ministrar sua
disciplina na escola, é que nos propomos a
estudar, na disciplina de ciências, da
Escola Municipal de Ensino Fundamental
Sonho de Criança, as condições de trabalho
de que dispões o professor dessa disciplina,
para exercer sua docência. Dessa forma, o
trabalho teve por objetivo discutir as
condições de trabalho do professor de
Ciências Naturais, nas classes multiano, da
escola pesquisada.
Os percursos metodológicos da pesquisa
A pesquisa de cunho qualitativa
orientou o percurso dessa pesquisa, tendo
em vista que a coleta dos dados requereu
uma discussão sobre o objeto de pesquisa.
A esse respeito Chizzotti (2003) afirma
que:
O termo qualitativo implica uma
partilha densa com pessoas, fatos e
locais que constituem objetos de
pesquisa, para extrair desse convívio
os significados visíveis e latentes que
somente são perceptíveis a uma
atenção sensível e, após este
tirocínio, o autor interpreta e traduz
em um texto, zelosamente escrito,
com perspicácia e competência
científica, os significados patentes ou
ocultos do seu objeto de pesquisa.
(Chizzotti, 2003, p. 221).
Com isso, foi realizada uma revisão
da literatura, a qual contribuiu na discussão
e análise do tema pesquisado. Ainda foram
analisados documentos que regem a
Educação do Campo, como as diretrizes
operacionais para a educação básica das
escolas do campo; a matriz curricular da
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escola pesquisada; plano de ensino da
escola; relatórios dos tempos comunidade;
a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional LDB 9394/96 (Brasil, 1996); as
diretrizes operacionais para a educação
básica nas escolas do campo, entre outros,
caracterizando a pesquisa também como
documental.
No que diz respeito à pesquisa
documental, Gil (2002) afirma que:
A pesquisa documental assemelha-se
muito à pesquisa bibliográfica. A
diferença essencial entre ambas está
na natureza das fontes. Enquanto a
pesquisa bibliográfica se utiliza
fundamentalmente das contribuições
dos diversos autores sobre
determinado assunto, a pesquisa
documental vale-se de materiais que
não receberam ainda um tratamento
analítico, ou que ainda podem ser
reelaborados de acordo com os
objetos da pesquisa. (Gil, 2002, p.
45).
Os documentos analisados
subsidiaram a compreensão do direito à
educação aos povos do campo e as
condições de oferta aos filhos dos
trabalhadores que vivem nessas regiões.
Partindo deste pressuposto, os documentos
analisados também permitiram uma
discussão a partir dos documentos que
norteiam o funcionamento da escola onde
ocorreu a investigação.
A pesquisa de campo permite
compreender como se estrutura uma escola
multiano, as condições pedagógicas de
ensino e os métodos e técnicas utilizados
pelos professores. Para Lakatos e Marconi
(1996), a pesquisa de campo é “a pesquisa
em que se observa e coleta os dados
diretamente no próprio local que se deu o
fato em estudo, caracterizando-se pelo
contato direto com o mesmo, sem
interferência do pesquisador, pois os dados
são observados e coletados tal como
ocorrem espontaneamente”.
Para a coleta de dados foi utilizado a
entrevista semiestruturada, pois de acordo
Lakatos e Marconi (2003) esse método
permite, ao entrevistador, seguir um roteiro
previamente elaborado e atender ao
objetivo proposto.
Foram entrevistados o coordenador
pedagógico, o diretor de ensino do
município de Pacajá/PA e o professor de
ciências da escola. A escolha dos sujeitos
da pesquisa se deu pelo fato dos mesmos
estarem diretamente envolvidos no
processo educacional e por entender que
estes são os maiores conhecedores da
realidade dessa escola, uma vez que
convivem diariamente com a rotina local,
enfrentando as diversas situações que
surgem nesse ambiente.
Para facilitar a análise, as entrevistas
foram organizadas por categorias
analíticas, definidas previamente de forma
que fosse permitido interpretar os
resultados dos dados mais relevantes,
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levando em consideração os estudos de
pesquisas mais abrangentes, com base no
referencial teórico que fundamentou o
estudo.
As classes multiano no contexto da
educação do campo: uma discussão
teórica
A educação do campo ao longo de
sua trajetória tem desenvolvido inúmeras
articulações, contando com a participação
dos movimentos e organizações sociais
populares do campo, universidades,
organizações da sociedade civil, órgãos do
poder público e instituições internacionais,
buscando melhorias na qualidade da
educação ofertada aos agricultores
familiares, assentados, quilombolas,
extrativistas, ribeirinhos e pescadores.
Estes atores tornaram-se protagonistas
dentro do paradigma da educação do
campo, discutindo propostas de melhoria
no que diz respeito à garantia de uma
educação de qualidade ofertada em escolas
do campo.
Os estudos realizados por Hage
(2011) sobre as condições das classes
multiano no Estado do Pará, constatam que
os professores das escolas do campo
enfrentam grandes desafios, em função da
precarização nesse tipo de escola.
Temos identificado uma ambiguidade
característica da dinâmica das escolas
rurais multisseriadas: o quadro
dramático de precarização e
abandono em que as escolas se
encontram, e ao mesmo tempo, as
possibilidades de atuação e de gestão
dos processos educacionais
construídas pelos professores,
evidenciando situações criativas que
desafiam as condições adversas que
configuram a realidade existencial
dessas escolas. (Hage, 2011, p. 61).
Percebe-se que essas classes
precisam de atenção especial, uma vez que
os professores enfrentam situações
adversas no dia a dia e necessitam de
formação específica para atender as
especificidades da localidade em que
trabalham, dentre outros fatores que são
indispensáveis para o bom
desenvolvimento do trabalho docente. Os
professores que atuam nas classes
multiano, enfrentam diariamente desafios
de toda ordem que os obriga a buscar
novas e variadas práticas pedagógicas, para
que assim possam garantir que o ensino-
aprendizagem aconteça nestas escolas.
As más condições do trabalho
docente em classes multianos são
ocasionadas em decorrência das condições
de trabalho a que os professores são
submetidos, as quais dificultam o bom
desenvolvimento das atividades
pedagógicas nessas escolas. Sobre isso,
Hage (2011) relata que:
São escolas que apresentam
infraestrutura precária: em muitas
situações não possuem prédio próprio
e funcionam na casa de um morador
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local ou em salões de festas,
barracões, igrejas, etc. ... Grande
parte delas tem somente uma sala de
aula, onde se realizam as atividades
pedagógicas e todas as demais
atividades envolvendo os sujeitos da
escola e comunidade ... Além disso, o
número de carteiras que essas escolas
possuem nem sempre é suficiente
para atender a demanda, e o quadro
de giz ou vários quadros existentes
estão deteriorados, dificultando a
visibilidade dos alunos. (Hage, 2011,
p. 99).
Como se constata no estudo de Hage
(2011), é notório que o trabalho nestas
turmas requer do professor uma dinâmica
de trabalho para além da sua formação. O
trabalho docente na escola de campo, de
um modo geral em classes multiano, em
particular, está atrelado a uma série de
responsabilidades para os professores, uma
vez que eles acabam assumindo obrigações
que não fazem parte do trabalho do
professor, conforme ressalta Oliveira
(2004, p. 1132) “O professor, diante das
variadas funções que a escola pública
assume, tem de responder a exigências que
estão além de sua formação”. Esse autor
vai além, mostrando que essa situação não
é tranquila no cotidiano da escola para os
professores que vivenciam essa realidade:
O que temos observado em nossas
pesquisas é que os trabalhadores
docentes se sentem obrigados a
responder às novas exigências
pedagógicas e administrativas,
contudo expressam sensação de
insegurança e desamparo tanto do
ponto de vista objetivo faltam-lhes
condições de trabalho adequadas
quanto do ponto de vista subjetivo.
(Oliveira, 2004, p. 1140).
É notório no estudo realizado por
Oliveira (2004), que essa realidade é
comum em diversos Estado do Brasil,
como o Pará, principalmente nas escolas
do campo, em que o professor, além de
assumir a docência, assume também outras
tarefas, como por exemplo, a gestão, a
administração da infraestrutura física e
material da escola, a articulação entre a
secretaria municipal de educação e a
escola, a relação entre a escola e a
comunidade local, entre outras atividades.
Esta realidade tende a sobrecarregar o
docente. Ainda de acordo com Oliveira
(2004, p. 1140) “O fato é que o trabalho
pedagógico foi reestruturado, dando lugar
a uma nova organização escolar, e tais
transformações, sem as adequações
necessárias, parecem implicar processos de
precarização do trabalho docente”.
A organização do trabalho
pedagógico nas classes multiano requer
uma dinâmica diferenciada, desenvolvendo
suas atividades educativas no modelo de
ajuntamento de várias séries e, elaborando
um plano de ensino para cada série que
compõem a classe, bem como as
estratégias de avaliação diferenciada para
cada série (Hage, 2012).
A organização do trabalho
pedagógico nas escolas do campo, devido
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o distanciamento da sede do município, a
falta de acompanhamento por parte da
secretaria municipal de educação, que raras
vezes vai a escola assessorar o professor
em suas dificuldades pedagógicas, sendo
que as orientações sobre as atividades
pedagógicas geralmente acontece em uma
reunião no inicio do semestre letivo,
realizado pela secretaria, o que acaba
comprometendo o trabalho do professor,
porque não tem com quem dialogar na
própria escola sobre as especificidades que
esse tipo de turma apresenta, muito
diferente das turmas seriadas, cabendo
apenas a ele a tomada de decisões e
escolhas na organização desse trabalho. A
esse respeito, Hage (2011, p. 100) se
manifesta dizendo que.
Os professores das escolas ou turmas
multisseriadas enfrentam muitas
dificuldades para organizar seu
trabalho pedagógico em face do
isolamento que vivenciam e do pouco
preparo para lidar com a
heterogeneidade de idades, séries e
ritmos de aprendizagem, entre outras
que se manifestam com muita
intensidade nessas escolas ou turmas.
Sem uma compreensão mais
abrangente desse processo, muitos
professores do campo organizam o
seu trabalho pedagógico sob a lógica
da seriação, desenvolvendo suas
atividades educativas referenciados
por uma visão de “ajuntamento” de
várias séries ao mesmo tempo, que os
obriga a elaborar tantos planos de
ensino e estratégias de avaliação da
aprendizagem diferenciadas quantas
forem as séries com as quais
trabalham, envolvendo, em
determinadas situações, estudantes da
pré-escola e do ensino fundamental
concomitantemente.
Esta organização nas classes
multiano vai desde a elaboração dos planos
de ensino a serem aplicados para cada
série, a organização da sala de aula, a
dinâmica de aplicação dos conteúdos
distintos para variadas séries dentro de
uma mesma turma, dentre outros. Dessa
forma, o ensino acaba se limitando apenas
a uma transferência de conteúdos aos
estudantes, dentro de um único espaço
escolar, subdividido por paredes invisíveis
e os estudantes organizados em grupos de
acordo com a série de cada um. Em relação
ao ensino de Ciências, Bizzo (2010)
também faz menção ao ensino mecanizado,
no qual o objetivo se reduz apenas na
transmissão de informações. O autor
salienta que:
Um curso de Ciências, mesmo que
contextualizado no Ensino
Fundamental, não pode ter como
objetivo a simples transmissão de
informações, por mais corretas que
sejam, pois isso comprometeria a
compreensão do que é a própria
ciência como empreendimento
humano. Os alunos que são levados a
memorizar fatos, informações e
termos técnicos desenvolverão uma
noção de ciência como se ela fosse
uma compreensão segura, imutável e
indiscutível, consequência inevitável
do uso da “razão pura”, o que
limitará seu aprendizado em etapas
posteriores de estudos assim como
sua atuação social. (Bizzo, 2010, p.
22).
Souza, M. F. M., Silva, A. L. B., Adad, M. F. M., & Costa, R. P. (2020). As condições de trabalho do professor de Ciências em
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Para o docente desenvolver um bom
trabalho pedagógico, superando o ensino
mecanizado, conforme aponta Bizzo
(2010), é necessário que esse professor seja
valorizado, tendo um ambiente de trabalho
que possibilite inovações pedagógicas, ser
reconhecido como um profissional e não
como mero tarefeiro e que seja
oportunizado a ele participação em cursos
de formação continuada. Dessa forma,
entendemos que a valorização docente
passa pela classificação das três dimensões
importantes na qualificação do professor
indicadas pelo mesmo autor, a saber, a
dimensão real, a simbólica e a formal. Em
relação à dimensão real, é necessário que
haja uma valorização real do professor, ou
seja, que se tenha uma dimensão concreta,
refletida em termos materiais e condições
condignas de trabalho. Quanto à relação
simbólica, a imagem do professor deve ser
valorizada, obtendo o reconhecimento
como de outras profissões prestigiadas pela
sociedade. Na dimensão formal, além da
graduação, a busca por formação
continuada na sua área de atuação, (Bizzo,
2010). No caso específico da professora de
ciências na escola do campo, apesar de ser
licenciado em Biologia, se observou no
decorrer da pesquisa, que falta a ela a
dimensão formal, apresentada por Bizzo
(2010), especialmente no que concerne a
formação continuada.
A falta de qualificação do professor,
ainda é um problema que precisa ser
superado na escola do campo paraense,
porque é comum você encontrar nessas
escolas professores sem formação em nível
superior e ou com formação superior, mas
não na área em que está atuando. Além da
falta de qualificação docente, a
desvalorização do professor de ciências é
uma realidade vivenciada nas escolas do
campo. Neste estudo em particular, nas
observações visuais que realizamos na
escola pesquisada, no período letivo dos
anos de 2017 e 2018, pudemos constatar
que a escola carece de itens essenciais para
uma boa condução de uma aula de
Ciências, como por exemplo, a adequação
do currículo de ensino à realidade da
escola do campo, melhoria nas instalações
físicas da escola, as quais são
extremamente precárias e a falta de
recursos didáticos, o que torna o trabalho
do docente difícil.
As constatações feitas na escola
pesquisada, nos levam a afirmar que essa
dificuldades por qual passa o professor
para desenvolver suas atividades docentes
não condizem com o que garante as
Diretrizes que regem a Educação do
Campo, que seria a promoção de condições
ideais para uma educação em um ambiente
diferenciado, com um ensino que prestigie
os valores locais, preconizados no Decreto
Souza, M. F. M., Silva, A. L. B., Adad, M. F. M., & Costa, R. P. (2020). As condições de trabalho do professor de Ciências em
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7.352, de 4 de novembro de 2010, que
dispõe sobre a política de Educação do
Campo, o Programa Nacional de Educação
na Reforma Agrária PRONERA que visa
fortalecer a educação nas áreas da reforma
agrária; Resolução CNE/CEB 1, de 3 de
abril de 2002, que institui diretrizes
operacionais para a Educação Básica nas
Escolas do Campo para adequar o projeto
institucional das escolas do campo à escola
educação básica.
É inegável que a partir das lutas dos
movimentos sociais, a partir da década de
1980, a aprovação dessas legislações é
fundamental para a conquista de alguns
avanços na escola do campo, tanto em
nível nacional como em nível de estado do
Pará. Em nível nacional, podemos citar a
criação do curso de Licenciatura Plena em
Educação do Campo pelo Decreto
7.352/2010, garantia do reconhecimento
dos dias letivos para a aplicação da
pedagogia da alternância nas escolas do
campo pelo Parecer 01/2006. Em nível
estadual podemos perceber o direito a
educação sendo ampliado para as crianças
das mais longínquas comunidades, seja
com escola localmente ou por acesso via
transporte escolar, Cursos de Licenciatura
em educação do Campo sendo ofertado por
instituições públicas, como é o caso da
Universidade Federal do Pará - UFPA, em
municípios distantes dos grandes centros
urbanos, para formar e qualificar
professores para atuar em classes seriadas
e ou multiano, entre outras conquistas.
Ao mesmo tempo em que
reconhecemos esses avanços, não podemos
deixar de observar também que eles tem se
dado de forma lenta, por falta de política
pública que garanta a efetivação do direito
a educação de qualidade ao filho do
homem do campo. Um exemplo dessa
lentidão na implementação das legislações
na escola do campo, podemos citar A
Resolução nº 2, de 28 de abril de 2008, que
estabelece diretrizes complementares,
normas e princípios para o
desenvolvimento de políticas públicas de
atendimento da Educação Básica do
Campo, a qual em seu art. 10, parágrafo
segundo garante que:
As escolas multisseriadas, para
atingirem o padrão de qualidade
definido em nível nacional,
necessitam de professores com
formação pedagógica, inicial e
continuada, instalações físicas e
equipamentos adequados, materiais
didáticos apropriados e supervisão
pedagógica permanente. (Brasil,
2008).
Observa-se que a legislação
estabelece as normativas para o trabalho
docente em escolas do campo em classes
multiano, contudo, essas prerrogativas não
são postas em prática nas escolas reais,
como as do Estado do Pará, especialmente
no município de Pacajá, lócus dessa
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pesquisa. Entendemos que agora
precisamos de um outro movimento, o de
transformar o artigo das leis em ações
efetivas nas escolas do campo.
O trabalho docente nas classes multiano
da escola municipal de Ensino
Fundamental Sonho de Criança,
Pacajá/PA
Para a melhor compreensão do
contexto da escola pesquisada nesse
estudo, faremos uma breve caracterização
do município de Pacajá, o qual está
localizado na Rodovia Transamazônica, na
região sudoeste do Pará, no km 282, BR
230, no Estado do Pará. De acordo com o
Instituto de Geografia e Estatística (IBGE):
O núcleo urbano de Pacajá teve
origem na iniciativa pessoal de um
colono que instalou em seu lote, que
se situava de frente para a estrada,
um pequeno restaurante e bar que
como ocorreu com outras localidades
da Transamazônica, começou a servir
de ponto de apoio para caminhões e
ônibus que trafegavam por ... No
final da década de 70 e início da de
80, a população já estava concentrada
e começou a sentir, de certo modo o
descaso da Prefeitura de Portel,
devido à distância do Município para
o lugar Pacajá, surgindo, então, os
primeiros movimentos para a
emancipação de Pacajá, que tiveram
à frente Geraldo Franco (padre de
Pacajá), Antônio Maria de Abreu,
Antônio Chapéu de Couro e outros ...
Pacajá obteve sua autonomia no
Governo Hélio Motta Gueiros,
através da Lei 5.447, de 10 de
maio de 1988. Tem sua sede na vila
de Pacajá, que passou,
consequentemente à categoria de
cidade, com a mesma denominação
... O nome Pacajá é em homenagem
ao rio Pacajá que corta a rodovia
Transamazônica. (IBGE, 2017).
Em relação à comunidade do
Lontrão, lócus da pesquisa, a mesma está
localizada no km 300, ao sul da Rodovia
Transamazônica, no município de
Pacajá/PA. Essa comunidade teve seu
processo de criação por volta do final dos
anos 70 para o início dos anos 80, época
em que o Governo Militar procurava
enviar famílias para ocuparem a região
Transamazônica, caracterizada pelo
slogan: "Homens sem-terra para uma terra
sem homens". A comunidade está situada
em uma região cercada por grandes áreas
de fazendas, com a presença significativa
de agricultores familiares.
A Escola Municipal de Ensino
Fundamental Sonho de Criança situa-se
48 km da sede do município de Pacajá/PA,
na comunidade do Lontrão, no km 300 ao
sul, na qual a modalidade de ensino
ofertado é o Ensino Fundamental de 9
anos, organizado no modelo de classes
multiano, tanto nos anos iniciais (1º ao
ano), quanto nos anos finais (6º ao 9º ano).
Considerando que esse estudo tem
como objetivo caracterizar as condições de
trabalho do professor de Ciências em
classes multiano, a pesquisa foi realizada
com o único professor dessa disciplina da
escola, com o diretor de ensino do
município de Pacajá e a coordenadora
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pedagógica, sendo que os dois últimos são
lotados na Secretaria Municipal de
Educação (SEMED) do município. A
opção para que eles participassem da
pesquisa se deveu ao fato de serem os
responsáveis pedagógicos da escola, haja
vista que ela não possui direção e nem
coordenação pedagógica própria.
As entrevistas realizadas com os três
profissionais foram fundamentais para
discutir sobre as condições em que os
professores das classes multiano estão
desenvolvendo o trabalho pedagógico, na
disciplina de Ciências nas escolas do
campo, tendo como lócus a referida escola
estudada.
Na entrevista realizada com a
professora de Ciências da escola,
constatou-se que ela faz parte do quadro
efetivo da Prefeitura Municipal de
Pacajá/PA, residindo na própria
comunidade e sua formação acadêmica é
em Licenciatura em Biologia.
Segundo afirmou o Coordenador
Pedagógico, o surgimento da educação
escolar na comunidade iniciou no ano de
2000, com uma professora que resolveu
lecionar em sua residência, em uma turma
multisseriada, com alunos de a série
do Ensino Fundamental. Contudo, as
condições não atendiam as necessidades
básicas dos educandos e da professora,
que as aulas não eram ofertadas em local
próprio e sim em uma residência. O
surgimento de ambientes escolares
improvisados é uma realidade nas escolas
do campo em diversos locais no Estado do
Pará, principalmente as criadas nas
comunidades localizadas ao longo da
Transamazônica, conforme foi constatado
nos relatórios de pesquisa realizados pelos
alunos que cursaram o componente
curricular “Tempo Comunidade
iii
”, do
Curso de Educação do Campo da
Universidade Federal do Pará, Campus de
Altamira.
Após a reivindicação dos morados da
própria comunidade, junto à prefeitura de
Pacajá, a escola ganhou sede própria,
porém sua construção é em madeira com
cobertura de telha de barro, piso de
cimento, possuindo apenas uma sala de
aula, cozinha, depósito e uma área ao ar
livre para recreação.
No componente curricular “Tempo
comunidade”, foi realizado uma pesquisa
exploratória, para conhecer a história da
comunidade, do surgimento da escola e as
condições estruturais e operacionais da
referida escola. Nesse estudo, foi
identificado que a mesma não possui
Projeto Político Pedagógico - PPP, diretor
escolar e pessoal de apoio técnico-
administrativo, apenas a figura da
professora, que responde por todas as
atividades da escola junto à comunidade e
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a Secretaria Municipal de Educação. A
escola possui uma sala de aula, uma
cozinha e um banheiro, além de acesso à
internet banda larga, aberta para uso
interno e também da comunidade.
A professora de Ciências trabalha
nessa escola, na classe multiano, que é
composta por alunos dos anos finais do
Ensino Fundamental (6º ao ano). Além
dessa escola ela também é professora em
outra escola, na mesma comunidade, com
uma turma multiano, de ao ano do
Ensino Fundamental, apesar de sua
formação ser em Licenciatura em Biologia,
e o requisito para ser professor dos anos
iniciais do Ensino fundamental é ter
formação em Pedagogia. Essa é mais uma
característica de precarização do trabalho
docente nas escolas do campo paraense,
considerando que essa realidade não está
presente apenas nas escolas do município
de Pacajá.
No que concerne à questão
pedagógica do ensino na escola, no
decorrer da pesquisa, procuramos verificar
junto à professora de Ciências, diretor de
ensino e coordenador pedagógico da
Secretaria Municipal de Educação, sobre a
participação dessa professora na escolha
dos conteúdos de Ciências a serem
trabalhados nas classes multiano, os quais
se posicionaram da seguinte forma:
Esporadicamente participo da
elaboração dos conteúdos de
ciências trabalhados na escola.
(Professora).
São elaborados em encontros
pedagógicos com os professores
que trabalham com a disciplina,
normalmente esses encontros são
realizados no início de cada ano
letivo. (Diretor de Ensino).
É elaborada pelos coordenadores
do campo, os mesmos são
professores que estão lotados na
Secretaria Municipal de
Educação para levarem propostas
que facilitem os trabalhos dos
professores (Coordenadora
Pedagógica).
Como podemos observar, a
professora não participação ativamente da
elaboração dos conteúdos de Ciências
trabalhados nas classes multiano, ou
porque não participa dos encontros
pedagógicos semestrais, mencionado pelo
diretor de ensino, ou porque eles realmente
chegam prontos para os professores,
como se posicionou a Coordenadora
Pedagógica. Sendo que esse último caso é
o mais frequente nas escolas do campo
paraense, conforme mencionado em
estudos realizados por Hage (2004), o que
retira do professor a autonomia sobre seu
trabalho docente. A participação do
professor na elaboração dos conteúdos de
Ciências contribui para o bom
desenvolvimento do seu trabalho em sala
de aula, tendo em vista que ele é agente no
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processo de ensino, o que requer maior
espaço para seu envolvimento na
elaboração do currículo.
Em classes multiano é predominante
a aplicação do modelo seriado, onde as
aulas são organizadas de tal forma que,
para cada ano, é ensinado um conteúdo
específico, como se cada série funcionasse
em sala distinta. Podemos perceber este
fato na fala da professora de Ciências
entrevistada neste estudo ao afirmar que:
são trabalhados conteúdos específicos
para cada série”.
Após analisar a matriz curricular da
disciplina de Ciências, elaborada pela
equipe pedagógica da Secretaria Municipal
de Educação de Pacajá/PA, a qual norteia o
planejamento do professor na escola, foi
possível perceber que a mesma está
organizada em três tópicos específicos, a
saber: os temas a serem trabalhados; os
conteúdos; as habilidades. A partir desta
matriz curricular, o professor faz o
planejamento de suas aulas, construindo
um plano de aula para cada rie que
compõem cada turma trabalhada. Essa
forma de conceber o ensino, por parte da
secretaria de educação, transforma o
professor em mero conteudista, sem
preocupação com a aprendizagem e um
currículo fora da realidade do aluno, indo
de encontro com o que estabelece as
Diretrizes Operacionais para a Educação
Básica nas Escolas do Campo (2002).
No que diz respeito aos recursos
didáticos disponíveis na escola analisada,
para trabalhar os conteúdos de Ciências,
conforme afirmações da professora
entrevistada, resumem-se apenas aos livros
didáticos, os quais são insuficientes e
inadequados para atender as necessidades
dos alunos, ocasionando, assim, segundo
ela inúmeras dificuldades para o bom
desenvolvimento da prática pedagógica,
bem como o aprendizado desses alunos.
Isso pode ser confirmado nas falas dos três
profissionais entrevistados, quando dizem
que:
As maiores dificuldades
enfrentadas para trabalhar os
conteúdos de ciências com a
classe multisseriada é a falta de
materiais didáticos adequados
(Professora).
Livros didáticos, papéis
“chamex”, cartolinas, camurças,
crepons. Além do material do
PNAIC e são adequados sim, mas
não são suficientes (Diretor de
Ensino).
Quadro, giz, livros didáticos e
livros paradidáticos. Os recursos
são muito escassos por parte da
SEMED. Cabe ao professor
dinamizar suas aulas com
recursos disponíveis a ele
(Coordenadora Pedagógica)
Muito embora o Diretor de Ensino se
posicione dizendo que materiais
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variados disponíveis para a confecção de
material didático, o que é possível notar é
que estes são instrumentos ínfimos
mediante o que é demandado como
ferramenta didática para a realização de
um processo educacional no campo de
conhecimento, como Ciências. Conforme a
fala da coordenadora escassez desse
material, que não é disponibilizado pela
SEMED, cabendo ao professor usar sua
criatividade para dinamizar suas aulas,
com o pouco que está a sua disposição,
enquanto isso, o professor, que vivencia
cotidianamente o processo de ensino-
aprendizagem evidencia a a falta de
materiais didáticos adequados”. Essa
escassez de material didático é uma
realidade da maior parte das escolas do
campo, cujo recurso didático que o
professor dispõe são apenas os citados pela
coordenadora pedagógica. de se
considerar que os livros didáticos são
totalmente fora da realidade do aluno,
cabendo ao professor ajustar ou não suas
aulas a realidade do aluno.
Sabe-se que a falta de recursos
suficientes e adequados com a realidade
dos alunos do campo interfere no bom
desenvolvimento da prática pedagógica do
professor, assim como, aumenta o grau de
dificuldade na aprendizagem dos alunos.
De acordo com o Decreto 7.352, de 4 de
novembro de 2010, que dispõe sobre a
política de educação do campo e o
Programa Nacional de Educação na
Reforma Agrária PRONERA, em seu art.
4º, inciso VIII garante que:
A União, por meio do Ministério da
Educação, prestará apoio técnico e
financeiro aos Estados, ao Distrito
Federal e aos Municípios na
implantação das seguintes ações
voltadas à ampliação e qualificação
da oferta de educação básica e
superior às populações do campo em
seus respectivos sistemas de ensino,
sem prejuízo de outras que atendam
aos objetivos previstos neste Decreto:
VIII - produção de recursos
didáticos, pedagógicos, tecnológicos,
culturais e literários que atendam às
especificidades formativas das
populações do campo. (Brasil, 2010).
Apesar das legislações brasileiras
assegurarem ações voltadas para a garantia
de uma educação de qualidade nas escolas
do campo, ainda há muito que se fazer para
que estas garantias ocorram de fato. Ainda
se tratando dos recursos didáticos, o
Decreto 7.352, de 4 de novembro de 2010,
em seu art. 6º, garante também que:
Os recursos didáticos, pedagógicos,
tecnológicos, culturais e literários
destinados à educação do campo
deverão atender às especificidades e
apresentar conteúdos relacionados
aos conhecimentos das populações
do campo, considerando os saberes
próprios das comunidades, em
diálogo com os saberes acadêmicos e
a construção de propostas de
educação no campo contextualizadas.
(Brasil, 2010).
Portanto, faz-se necessário o
cumprimento da legislação para que as
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escolas do campo ofereçam educação de
qualidade, que valorize os saberes e as
reais necessidades desse público, como
também garantam condições de trabalho
para os professores em todas as áreas do
conhecimento, levando em consideração as
necessidades de cada localidade.
É sabido que a formação continuada
é imprescindível para que o ensino-
aprendizagem venha ocorrer de maneira
satisfatória no ambiente escolar. Por meio
dessas formações, os docentes têm a
oportunidade de aprimorar seus
conhecimentos e inovar práticas
pedagógicas para uso em sala de aula.
Em se tratando das formações
continuadas que a Secretaria Municipal de
Educação tem oferecido aos professores do
campo que trabalham com a disciplina de
Ciências, os entrevistados afirmaram que:
Não participo de nenhuma formação
continuada (Professora);
A secretaria não oferece cursos,
apenas busca parcerias com as
instituições de ensino superior de
reconhecido trabalho pelo MEC, a
saber: UFPA, UEPA e UFOPA
(Diretor de Ensino).
Pró-letramento, PNAIC (Programa
Nacional de Alfabetização na Idade
Certa), Educação solidária, Educa
Brasil, PCNs em Ação, Mais
Educação (Coordenadora
Pedagógica).
Conforme a fala do diretor de ensino,
a Secretaria Municipal de Educação não
oferta cursos de formação continuada os
seus professores, contudo, busca-se por
meio das parcerias com as instituições de
ensino superior da região promover
encontros para discussão de temas sobre
educação para os professores do
município. Sendo assim, percebe-se que o
município de Pacajá não possui uma
política de formação continuada própria,
em vista da especialização do profissional
da educação para aprofundar e aperfeiçoar
seu conhecimento na área em que atua, o
que contraria o Decreto 8.752, de 9 de
maio de 2016, em seu art. 13, afirma que:
“Os cursos de formação inicial e
continuada deverão privilegiar a formação
geral, a formação na área do saber e a
formação pedagógica específica”. A fala
da professora e da Coordenadora
pedagógica expõem essa fragilidade no
atendimento as normas institucionais e as
demandas do setor educacional, o que
chega a ser um dos fatores do
empobrecimento da educação básica. Pois,
a formação dos professores precisa ser
vista como prioridade, para que o ensino e
aprendizagem ocorram de maneira
satisfatória nas escolas urbanas e rurais do
Brasil.
No que diz respeito ao
acompanhamento da Secretaria Municipal
de Educação à ação pedagógica na escola,
afirmam que:
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É feito através de coordenadores,
sendo bimestralmente (Professora);
O acompanhamento é feito por
coordenadorias gerais e de áreas da
secretaria juntamente com a direção
de ensino (Diretor de Ensino);
É feito pela SEMED, diretor de
ensino e coordenadores
(Coordenadora Pedagógica).
Conforme podemos notar nas três
falas, o acompanhamento pedagógico na
escola é feito pelos coordenadores de cada
estabelecimento de ensino e direção da
SEMED. Não um acompanhamento
específico para os professores que
trabalham em classes multiano, conforme
podemos constatar na fala do diretor de
ensino e da professora de Ciências:
Especificamente não existe, contudo,
os professores recebem orientação e
acompanhamento dos coordenadores
do Programa Nacional de
Alfabetização na Idade Certa e dos
coordenadores de áreas da
secretaria de educação (Diretor de
Ensino);
Não especificamente, mas temos uma
coordenação que acompanha os
trabalhos a cada bimestre
(Professora).
a Coordenadora Pedagógica
discorda da afirmativa feita pelo diretor de
ensino e pela professora. Ela é enfática em
dizer que não os professores são
acompanhados pedagogicamente, como
também a SEMED promoveu três semanas
pedagógicas, no ano de 2017, dentro da
perspectiva da formação continuada, na
área do ensino de ciências.
Sim, neste ano de 2017, a SEMED
acionou coordenadores na área de
Ciências, onde foram executados
vários trabalhos nestas quatro séries
para os professores. Foram feitas
três semanas pedagógicas, uma no
início do ano com o objetivo de
conhecer todos e apresentar todos os
coordenadores nas suas respectivas
áreas de lotação e o planejamento
anual socializado entre os mesmos.
Na segunda semana pedagógica foi
trabalhado com o coordenador e os
professores de ciências, uma oficina
pedagógica, onde a mesma tinha
como tema “Ludicidades
Pedagógicas de Jogos na Área de
Ciência”. Nessa etapa os professores
confeccionaram seus jogos
relacionados ao bimestre que seria
trabalhado. Sendo que todos os que
participaram levaram os jogos
produzidos para ampliarem a
ludicidade no ensino e
aprendizagem. Na terceira semana
pedagógica houve formadores de
outro município que viabilizaram
trabalhar-se com projetos e jogos no
ensino de Ciências (Coordenadora
Pedagógica).
Como se observa, para a
coordenadora pedagógica as oficinas de
confecções de material didático são
momentos de formação. Vale ressaltar que,
o Programa Nacional de Alfabetização na
Idade Certa (PNAIC) está voltado para a
formação de professores que trabalham
com as turmas de ao ano do Ensino
Fundamental. Neste sentido, entendemos
que as orientações pedagógicas voltadas
para o ensino de ciências, a partir dos
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objetivos do PNAIC não condizem com as
necessidades das turmas compostas por
alunos dos anos finais do Ensino
Fundamental. Essa constatação pode
justificar a fala da professora, quando
afirma não ter recebido formação e
acompanhamento pedagógico específico
para o ensino de ciências em classes
multiano.
Além da falta de formação específica
para professores que atuam no ensino de
ciências nesse tipo de classe, também foi
constatada durante a pesquisa a
precariedade da estrutura física da escola
pesquisada. Conforme ressaltado pela
professora de Ciências, as condições
estruturais da escola, não são adequadas.
Este fato foi percebido no decorrer das
visitas de observação realizada na mesma
A esse respeito, o diretor de ensino e a
coordenadora pedagógica salientaram que
essa realidade é comum também em outras
unidades de ensino do Estado, conforme
suas falas:
Em algumas escolas a estrutura
física é boa e são sim adequadas.
Más uma boa quantidade de
escolas com condições estruturais
bem precárias, isso acontece pela
falta de recursos no município para
adequar todas as unidades de ensino.
(Diretor de Ensino).
A maioria não são adequadas.
Sabemos que, inúmeras escolas da
zona rural não possui nenhuma
condição estrutural, faltando até
mesmo o quadro branco para que os
professores possam ministrar suas
aulas. (Coordenadora
Pedagógica).
Sabemos que para obter bons
resultados na aprendizagem é preciso
garantir condições dignas e favoráveis para
que o professor possa desenvolver as
atividades pedagógicas, em classes
multiano, de maneira que atendam as
especificidades dos alunos e que estas
práticas se relacionem com a realidade do
dia a dia dos mesmos. A esse respeito,
Hage (2005) afirma que:
De fato, estudar nessas condições
desfavoráveis, não estimula os
professores e os estudantes a
permanecer na escola, ou sentir
orgulho de estudar em sua própria
comunidade, fortalecendo ainda mais
o estigma da escolarização
empobrecida que tem sido ofertada
no meio rural, e incentivando as
populações do campo a buscar
alternativas de estudar na cidade,
como solução dos problemas
enfrentados. (Hage, 2005, p. 48).
Neste sentido, entendemos que é
preciso garantir a real efetivação das
políticas públicas voltadas para as escolas
do campo, sobretudo para as escolas com
classes multiano, nas quais as dificuldades
são mais significativas, conforme podemos
perceber nos relatos dos três profissionais
entrevistados nesse estudo.
Em relação ao planejamento das
atividades da escola e da área de Ciências
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em específico, o diretor de ensino e a
coordenadora relataram que:
São realizados mediante
planejamento da coordenação da
área e tem objetivos de melhorar a
qualidade da educação e conta com
a participação dos professores e
coordenadores de áreas da
secretaria de educação. (Diretor de
Ensino).
O planejamento é feito com a
participação dos coordenadores e
professores. É planejado por séries e
disciplinas, PNAIC (1º ao ano),
Fundamental I (4º e anos),
Fundamental II (6º ao ano) e
Educação de Jovens e Adultos (EJA).
Sendo que esse planejamento é
realizado pela SEMED e os
coordenadores de suas respectivas
áreas e disciplinas. Seu principal
objetivo é aprimorar propostas que
viabilizem uma educação de
qualidade no que se refere ao ensino
e aprendizagem, buscando
mecanismos que favoreçam os
docentes e os discentes na integração
de cidadãos conhecedores de seus
direitos e deveres em prol de uma
educação igualitária no nosso
município. (Coordenadora
Pedagógica, grifos nosso).
Fica evidente nas falas desses
profissionais, que o planejamento das
atividades da escola deve estar voltado
para garantir a qualidade da educação
oferecida aos alunos, ou seja, uma
educação igualitária para todos, porém esse
planejamento é feito pela gestão, na
SEMED, onde desenvolvem suas
atividades, ou seja, reafirma a não
participação do professor no planejamento
da disciplina. Porém essa constatação
encontra-se em desacordo com a legislação
pertinente, ou seja, conforme estabelece a
Resolução CNE/CEB 1, de 3 de abril de
2002, que institui as Diretrizes
Operacionais para a Educação Básica nas
Escolas do Campo, em seu art. que
afirma que:
As propostas pedagógicas das escolas
do campo, respeitadas as diferenças e
o direito à igualdade e cumprindo
imediata e plenamente o estabelecido
nos artigos 23, 26 e 28 da Lei 9.394,
de 1996, contemplarão a diversidade
do campo em todos os seus aspectos:
sociais, culturais, políticos,
econômicos, de gênero, geração e
etnia. (Brasil, 2002).
Com isso, podemos constatar que os
planejamentos das escolas devem buscar
uma integração entre o conhecimento e os
modos de vida dos povos do campo em sua
diversidade. Nesse sentido, se observa que
a participação do professor nesse momento
é de fundamental importância porque ele
conhece a realidade da escola onde
trabalha.
No que diz respeito à definição das
classes multiano, foi perguntado ao diretor
de ensino e à coordenadora pedagógica,
como eles as definiriam. Ambos se
posicionaram da seguinte forma:
Classe multisseriada é um modelo de
ensino que usamos em algumas
escolas do campo, consiste em várias
séries/anos estudando numa mesma
turma e horário. Neste modelo de
ensino, o professor precisa atender
todos os alunos do ensino
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fundamental menor, ou seja, alunos
do primeiro ao quinto ano (Diretor
de Ensino).
Defino como um enorme desafio
para os professores que lecionam no
campo. Esses profissionais da
educação sentem o peso de carregar
a responsabilidade de exercer suas
práticas docentes dentro de salas de
aula com alunos de faixa etária e
séries diferentes, sendo alunos de
ao ano. Sem contar com a falta de
infraestrutura que muitos professores
enfrentam como: ambiente inviável
para fazer um bom trabalho; falta de
merenda; estradas péssimas;
ausência de profissionais
capacitados para ajudar os alunos
que tem déficit de aprendizagem
(Coordenadora Pedagógica).
Para o diretor de ensino, esse modelo
de ensino é usado em algumas escolas do
campo, no que concordamos com ele,
quando olhamos para a realidade das
comunidades rurais paraenses e
identificamos que a única forma da criança
do campo ter acesso ao direito a educação
é frequentando a única opção que possui, a
escola multiano.
A coordenadora pedagógica por sua
vez, define as classes multiano como um
grande desafio para os professores que
trabalham nas escolas do campo, haja vista
as condições estruturais em que se
encontram boa parte destas escolas. Estas
condições são bastante comuns entre as
escolas do campo no Estado do Pará,
acentuando-se ainda mais nas classes
multiano. Ao discutir a esse respeito, Hage
(2005) afirma que:
Não justificativa para tamanha
desconsideração do poder público e
da sociedade civil para com os graves
problemas de infraestrutura e de
condições de trabalho e
aprendizagem que enfrentam os
professores e estudantes das escolas
multisseriadas, que em geral
encontram-se abandonadas às
situações contingentes próprias das
comunidades em que se localizam,
afinal, delas depende atualmente a
iniciação escolar da maioria das
crianças, adolescentes e jovens do
campo. (Hage, 2005, pp. 54-55).
Portanto, garantir uma educação de
qualidade para os povos do campo não
deve ser caracterizado como favor, mas
como garantia de direitos à educação
igualitária para todos independente de sua
localização geográfica, situação
econômica, social, entre outros fatores. De
acordo com a LDB 9.394/96, que
estabelece as diretrizes e bases da
educação nacional, em seu art. ressalta a
“igualdade de condições para o acesso e
permanência na escola e a garantia de
padrão de qualidade” (Brasil, 1996).
Apesar dessa prerrogativa na legislação
educacional, a oferta da educação do
campo nas escolas paraense, em geral e no
município de Pacajá em particular, ao
longo de sua trajetória histórica tem se
dado de forma não condizente com a
realidade desse público. Essa realidade se
deve ao não cumprimento das políticas
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públicas voltadas para a qualidade do
ensino na escola do campo, negando,
portanto, ao filho do trabalhador esse
direito.
Devido a esses descasos
evidenciados na pesquisa, nas escolas
multiano do município de Pacajá, por
parte, principalmente, dos gestores
públicos, as escolas do campo continuam
não levando à população do campo uma
educação de qualidade. Essa falta de
compromisso político por parte dos
gestores educacionais para com as escolas
do campo, de modo geral, no estado do
Pará, acaba por comprometer o trabalho do
professor, que os impede de levar a esse
público uma educação compatível com a
sua realidade e de qualidade, tendo em
vista que a estrutura e mesmo os materiais
disponíveis não ajudam em seu trabalho
docente. Nota-se também que esse sistema
de ensino sofre com o abandono e descaso
por parte do poder público.
Considerações finais
Nesse estudo, foi possível identificar,
mediante as entrevistas realizadas, que a
Escola Sonho de Criança adota o mesmo
modelo seriado das escolas da cidade, não
havendo um currículo que atenda às
especificidades dos sujeitos do campo e
voltado para a realidade das classes
multiano. Neste sentido, certa urgência
em se adotar práticas educacionais que
contribuam para que o trabalho docente em
classes multiano esteja em consonância
com a realidade dos povos do campo, e
assim os mesmos se sintam parte da escola
a que pertencem e que passem de meros
espectadores, a verdadeiros protagonistas
nesta construção de uma Educação Básica
do Campo de fato e de direito, conforme
preconizados nas legislações brasileira
pertinentes.
A infraestrutura inadequada nessa
escola em específico; a falta de formação
continuada para os professores, incluindo o
professor de Ciências que atuam em
classes multiano; a não participação dos
professores no planejamento dos conteúdos
específicos trabalhados na escola; falta de
material didático adequado e suficiente; e,
o fato dos professores realizarem várias
funções na escola tem dificultado o
trabalho docente em escolas do campo e
também o ensino-aprendizagem. Portanto,
acreditamos que é preciso que o sistema
municipal de ensino de Pacajá desenvolva
política educacional voltada para atender
as especificidades e realidade das classes
multiano, respeitando e valorizando o
trabalho do professor da escola do campo,
bem como esse público do campo em
especial.
As respostas encontradas para
questões que deram base para esta pesquisa
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nos levam ao indicativo de que o professor
da escola multiano, independente da etapa
da educação básica, e da disciplina que
ministre, se torna um profissional
polivalente. Devido às dívidas da
administração pública para com o sistema
de ensino, resta para o docente fazer o seu
melhor para ensinar, mesmo com poucos
recursos didáticos e estruturais disponíveis.
E no caso do professor de Ciências,
disciplina que requer equipamentos e
recursos tecnológicos para um bom
entendimento do conteúdo pelo educando,
verificamos que são mínimos
investimentos dispendidos. Em função de
todas as evidências denota-se que o poder
público precisa se dedicar mais em função
da melhoria da qualidade de ensino, para
que o atual quadro de descaso seja
superado.
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2018. Pacajá.
i
Essa nomenclatura foi alterada, em função da
aprovação da Lei 11.274, de 6 de fevereiro de
2006, que ampliou o Ensino Fundamental para
nove anos de duração. Antes da aprovação dessa
lei, o termo, historicamente utilizado era classe
multisseriada, haja vistas a organização da
educação básica se dar por série.
ii
De acordo a Res. Nº 2, de 28 de abril de 2008, que
estabelece diretrizes complementares, normas e
princípios para o desenvolvimento de políticas
públicas de atendimento da Educação Básica do
Campo, no Art. , a Educação do Campo
compreende a Educação Básica em suas etapas de
Educação Infantil, Ensino Fundamental, Ensino
Médio e Educação Profissional Técnica de nível
médio integrada com o Ensino Médio e destina-se
ao atendimento às populações rurais em suas mais
variadas formas de produção da vida
agricultores familiares, extrativistas, pescadores
artesanais, ribeirinhos, assentados e acampados da
Reforma Agrária, quilombolas, caiçaras,
indígenas e outros (Brasil, 2008).
iii
Tempo Comunidade é um componente curricular
do Curso de Educação do Campo, da
Universidade Federal do Pará, Campus de
Altamira.
Informações do artigo / Article Information
Recebido em : 29/06/2019
Aprovado em: 20/01/2020
Publicado em: 29/07/2020
Received on June 29th, 2019
Accepted on January 20th, 2020
Published on July, 29th, 2020
Contribuições no artigo: Os autores foram os
responsáveis por todas as etapas e resultados da
pesquisa, a saber: elaboração, análise e interpretação dos
dados; escrita e revisão do conteúdo do manuscrito
e; aprovação da versão final publicada.
Author Contributions: The author were responsible for
the designing, delineating, analyzing and interpreting the
data, production of the manuscript, critical revision of the
content and approval of the final version published.
Conflitos de interesse: Os autores declararam não haver
nenhum conflito de interesse referente a este artigo.
Conflict of Interest: None reported.
Orcid
Maria de Fátima Matos de Souza
http://orcid.org/0000-0003-0214-8941
Ana Lúcia Barreto da Silva
http://orcid.org/0000-0002-1522-7801
Maria Francisca de Miranda Adad
http://orcid.org/0000-0003-2636-4390
Renato Pinheiro da Costa
http://orcid.org/0000-0001-7132-0579
Como citar este artigo / How to cite this article
APA
Souza, M. F. M., Silva, A. L. B., Adad, M. F. M., & Costa,
R. P. (2020). As condições de trabalho do professor de
Ciências em classes multiano em uma escola do campo.
Rev. Bras. Educ. Camp., 5, e7097.
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e7097
ABNT
SOUZA, M. F. M.; SILVA, A. L. B.; ADAD, M. F. M.;
COSTA, R. P. As condições de trabalho do professor de
Ciências em classes multiano em uma escola do campo.
Rev. Bras. Educ. Camp., Tocantinópolis, v. 5, e7097,
2020. http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e7097