Revista Brasileira de Educação do Campo
The Brazilian Scientific Journal of Rural Education
ARTIGO/ARTICLE/ARTÍCULO
DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e7305
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
1
Este conteúdo utiliza a Licença Creative Commons Attribution 4.0 International License
Open Access. This content is licensed under a Creative Commons attribution-type BY
A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu
Débora Monteiro do Amaral
1
, Patrícia Hand Littig
2
, Sheiliane Bravim
3
, Amanda Luduvico Breda
4
1, 2, 3, 4
Universidade Federal do Espírito Santo - UFES. Curso de Licenciatura em Educação do Campo / Mestrado Profissional
em Educação. Avenida Fernando Ferrari, 514, Goiabeiras. Vitória - ES. Brasil.
Autor para correspondência/Author for correspondence: deboramdoamaral@gmail.com
RESUMO. O artigo em questão tem como objetivo geral
discutir como a Escola Família Agrícola de São Bento do
Chapéu realiza a formação dos sujeitos que passam pela
instituição ao longo de sua existência e quais as contribuições
para as comunidades campesinas dos municípios de Domingos
Martins, Marechal Floriano e Santa Leopoldina. Trata-se de uma
pesquisa de cunho qualitativo e caracterizou-se como um estudo
de caso. A coleta de dados se deu por meio de duas frentes de
trabalho: a primeira centrou-se no resgate histórico da Escola
Família Agrícola São Bento do Chapéu; a segunda, pela
aplicação de um questionário estruturado contendo questões que
foram respondidas por ex-alunos da instituição. A pesquisa tem
como fundamentação teórica Nosella (2012), Freire (1996) e
Begnami (2006), entre outros. O estudo evidenciou que a
perspectiva da Pedagogia da Alternância como processo
epistemológico e organização metodológica promove a
aproximação entre a escola e a família; articula conhecimentos
práticos e teóricos das comunidades e os que compõem o
currículo escolar. Tais características qualificam e tornam a
aprendizagem mais significativa e a formação dos educandos
mais contextualizada e eficaz.
Palavras-chave: Pedagogia da Alternância; Educação do
Campo; Escola Família Agrícola.
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
2
Alternation Pedagogy in Espírito Santo State and the
Agricultural Family School of São Bento do Chapéu
ABSTRACT. This article has as its general objective to discuss
how the Agricultural Family School of o Bento do Chapéu
conducts the training of the subjects that have passed through
the institution throughout its existence and also which were the
contributions to rural communities of the municipalities of
Domingos Martins, Marechal Floriano and Santa Leopoldina
municipalities. This is a qualitative research, and was
characterized as a case study. Data collection was carried out
through two sources: the first one focused on the historical
rescue of the São Bento do Chapéu Agricultural Family School;
the second one by the application of a structured questionnaire
containing questions that were answered by the institution's
former students. The research has as a theoretical foundation
Nosella (2012), Freire (1996) and Begnami (2006), among
others. The study highlighted that the perspective of the
Alternance Pedagogy as an epistemological process and
methodological organization promotes the approximation
between the school and the families; it also articulates practical
and theoretical knowledge of communities and of those that
make up the school curriculum. These characteristics qualify
and make learning more meaningful and students’ training more
contextualized and effective.
Keywords: Alternation Pedagogy, Rural Education,
Agricultural Family School.
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
3
La Pedagogía de la Alternancia en el estado del Espíritu
Santo y la EFA São Bento do Chapéu
RESUMEN. Este trabajo tiene como objetivo general desvelar
cómo la Escuela Familia Agrícola de São Bento do Chapéu
realiza la formación de sujetos que han pasado por la institución
a lo largo de su existencia y en qué contribuye a las
comunidades campesinas de los municipios de Domingos
Martins, Marechal Floriano y Santa Leopoldina. Esta es una
investigación cualitativa, y se caracterizó como un estudio de
caso. Se realizó la recolección de datos a través de dos frentes de
trabajo: el primero se centró en el rescate histórico de la Escuela
Familia Agrícola São Bento do Chapéu; por otra parte, el
segundo se enfocó en la aplicación de un cuestionario
estructurado conteniendo preguntas que fueron respondidas por
ex alumnos de la institución. La investigación está basada en
Nosella (2012), Freire (1996) y Begnami (2006), entre otros. El
estudio ha demostrado que la perspectiva de la Pedagogía de la
Alternancia como proceso epistemológico y organización
metodológica promueve la aproximación entre Escuela y
Familia; permite la articulación de los saberes prácticos y
teóricos, además de los que componen el programa de los
colegios. Dichas características califican y hacen que el
aprendizaje sea más significativo y que la formación de los
estudiantes sea más contextualizada y eficaz.
Palabras clave: Pedagogía de la Alternancia, Educación del
Campo, Escuela Familia Agrícola.
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
4
Introdução
O presente artigo nasceu de uma
pesquisa de Graduação do Curso de
Licenciatura em Educação do Campo e
tem como objetivo compreender os
processos formativos desenvolvidos pela
Escola Família Agrícola de São Bento do
Chapéu (EFA São Bento do Chapéu),
localizada no município de Domingos
Martins/ES, ao longo de sua existência e
quais suas possíveis contribuições para as
comunidades campesinas. O texto disserta
sobre o contexto em que se deu a criação
da EFA São Bento do Chapéu, assim como
a história da escola, apontado rupturas e
seguimentos ao longo dos vinte e cinco
anos de existência da instituição. Aponta
também uma memória histórica que
pretende contribuir para a manutenção das
escolas do campo, com propostas distintas
das propostas de escolas urbanas e com um
olhar voltado para o homem e para a
mulher do campo, diante de um quadro
político atual que visa ao fechamento de
tais escolas. Também busca divulgar a
contribuição dessa proposta diferenciada
de Educação do Campo, com base na
Pedagogia da Alternância, e, assim,
motivar o desenvolvimento de projetos
educacionais e de pesquisas na perspectiva
de análise e de superação da dicotomia
campo-cidade que é imposta pelo sistema
capitalista. A Educação do Campo assume
sua particularidade, que é o vínculo com
sujeitos sociais concretos, com foco na
formação humana crítica.
Um dos fundamentos da construção
deste projeto é a compreensão da sua
materialidade de origem. E este,
aliás, pode ser um bom ponto de
partida para clarear as concepções
desde o ponto de vista de quem tem
compromisso com sua raiz, sua
memória. (Jesus & Molina, 2004, p.
13).
Segundo o Decreto 7.352, de 4
novembro de 2010:
Populações do campo: os agricultores
familiares, os extrativistas, os
pescadores artesanais, os ribeirinhos,
os assentados e acampados da
reforma agrária, os trabalhadores
assalariados rurais, os quilombolas,
os caiçaras, os povos da floresta, os
caboclos e outros que produzam suas
condições materiais de existência a
partir do trabalho no meio rural.
Trata-se de uma pesquisa de cunho
qualitativo, e caracterizou-se como um
estudo de caso, pois analisa como a Escola
Família Agrícola de São Bento do Chapéu
pensa a formação de homens e de mulheres
que residem no campo e que passaram pela
instituição e quais as contribuições para as
comunidades campesinas. De Acordo com
Gil (2002), o estudo de caso é
caracterizado pelo estudo exaustivo e
profundo de poucos objetos, de forma a
permitir conhecimento amplo e profundo
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
5
destes. Os participantes da pesquisa foram
2 professores da EFA e 13 estudantes. A
escolha dos professores se deu por serem
egressos da EFA São Bento do Chapéu que
hoje atuam nesta. quanto aos estudantes,
a escolha se deu, pois estes eram ex-alunos
da EFA São Bento onde cursaram todo o
Ensino Fundamental e foram cursar o
Ensino Médio na Escola Família Agrícola
de Olivânia. Esses estudantes são do o
terceiro e quarto ano do Ensino Médio,
pois têm maior contato e vivência com a
Pedagogia da Alternância.
Na Escola Família Agrícola, os
conhecimentos dos Componentes
Curriculares são organizados e
desenvolvidos a partir de Temas Geradores
trabalhados em cada trimestre por meio da
coordenação de uma dupla de professores
em cada turma.
Em relação à ética na pesquisa,
foram apresentados aos sujeitos envolvidos
seus objetivos e solicitado que todos
assinassem o Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido.
Para iniciar a contextualização da
Pedagogia da Alternância, é necessário
destacar que esta surgiu na França, em
1935, a partir da insatisfação com sistema
educacional que não supria as necessidades
dos filhos de agricultores. Mais tarde,
expande-se para a Itália, para a África e
para a América Latina, chegando ao Brasil
em 1965, mais especificamente ao Estado
do Espírito Santo:
... teve início no Estado do Espírito
Santo, através de um trabalho
comunitário de base, liderado pelo
Padre Humberto Pietrogrande. Em
1968 surge o Movimento de
Educação Promocional do Espírito
Santo MEPES, para operacionalizar
o projeto da Pedagogia da
Alternância. Em 1969, as primeiras
experiências surgem com a criação
de três Escolas Famílias Agrícola:
Olivânia, Alfredo Chaves e Rio Novo
do Sul. (Schunck et al., 2012, p.
207).
A história das Escolas Famílias surge
de um movimento contra-hegemônico de
uma classe que sempre teve seus direitos
negados, principalmente em relação à
educação escolar. Nas palavras de Nosella
(2012, p. 45):
... foi a ideia de uma escola realmente
para o meio rural e do meio rural;
uma escola que rompesse
radicalmente com o modelo urbano,
não nascida de um estudo teórico,
nem de uma tese pedagógica, nem de
um levantamento sociológico.
Na Pedagogia da Alternância, o
centro do projeto é o estudante como
sujeito inserido numa realidade concreta,
onde o conhecimento é construído por
meio da interação dos sujeitos e dos
sujeitos com a realidade, em uma relação
horizontal. As diversas habilidades e
potencialidades da pessoa humana são
valorizadas por meio das ferramentas
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
6
pedagógicas da Pedagogia da Alternância,
importantes no desenvolvimento do
estudante, que não se limitam a quatro
paredes, e que alternam o tempo-escola e o
tempo-comunidade. Nesse sentido,
... uma das complexidades da
alternância está na diversidade das
relações: - com pessoas que
colaboram como o processo da
formação, - com entidades parceiras,
- com espaços e tempos diferentes
(tempo-escola e tempo comunidade),
- comas diversidades culturais do
campo, - com os diversos campos dos
saberes: práticos, populares,
empíricos e teóricos-científicos, entre
outros. Isto faz da alternância uma
pedagogia dialógica ou uma
pedagogia do encontro. (Begnami,
2006, p. 33).
Com essa pedagogia, os educandos
podem associar os conteúdos básicos com
mais facilidade, uma vez que estes têm
relação direta com a realidade vivida, o
que possibilita maior integração em sala de
aula e a riqueza de saberás que são
trocadas quando se têm dois momentos de
aprendizagem que é na escola e na família.
Para que isso aconteça, a estrutura
das escolas famílias está baseada em
pilares como a associação das famílias dos
educandos, a Pedagogia da Alternância, a
formação Integral dos educandos e o
desenvolvimento local sustentável.
De acordo com Jesus (2007), o
objetivo era a defesa de escola que fosse de
natureza familiar e assumida por elas, que,
com um método apropriado, de
contextualização da educação e que unisse
teoria e prática.
As escolas famílias buscam essa
interação direta com as famílias, pois o
educando vai trazer suas vivências, para
serem parte do contexto escolar e,
posteriormente, serem devolvidos sujeito e
ideias que possam desenvolver a
comunidade e as propriedades de forma
consciente e responsável. Com a
integração da família com a escola e da
escola com a família, os pilares da
Pedagogia da Alternância conseguem se
manter e ser resistência contra o sistema
hegemônico que não leva em conta a
realidade dos alunos.
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
7
Figura 1 - Pilares da Pedagogia da Alternância.
Fonte: Puig-Calvó, P. (2006).
Os pilares da Pedagogia da
Alternância fazem ligações entre si, o que
possibilita ao jovem aprender e abordar
temas que fazem sentido para sua vida,
associando aos conteúdos curriculares e
integrando sua família e sua comunidade
ao projeto de um desenvolvimento local e
sociocultural proposto pelas escolas.
(Jesus, 2007, p. 115).
A primeira Escola Família Agrícola
do Espírito Santo foi a EFA de Olivânia
que está situada no Vale do Corindiba,
localizada a 12 km da BR 101 sul e a 75
km da capital Vitória. A denominação de
Olivânia foi em homenagem ao antecessor
e aos descendentes familiares do Coronel
José Gomes de Oliveira que era pai do
arcebispo Dom Helvécio Gomes de
Oliveira. Este construiu o prédio da escola
no chão onde nasceu, declarando que o
fazia para que seus conterrâneos tivessem
onde se situar.
O prédio foi construído com a
finalidade de funcionar como seminário,
porém este objetivo nunca foi alcançado.
Ficou fechado por vários anos, por
problemas de malária na região. Funcionou
como posto de fomento agropecuário em
alguns anos na década de 1950. Já nos anos
1960, funcionou como educandário para
menores carentes provenientes de Vitória
ES, mantido pelo Governo do Estado. Essa
iniciativa também não obteve êxito.
Posteriormente, passou para a direção da
Legião Brasileira de Assistência Social
(LBA). Também essa iniciativa não
alcançou seus objetivos.
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
8
Nesse prédio, em março de 1969,
iniciou-se a Escola Família Agrícola de
Olivânia (EFAO), ligada ao MEPES
(Movimento de Educação Promocional do
Espírito Santo). O pequeno trabalho de
base, no Vale Corindiba (onde está situada
a escola), começou no ano anterior, através
de alguns agentes sociais, ligados ao
Movimento os quais buscavam por meio
de encontros, de palestras e outros,
organizar as comunidades em vista de
poder participar da vida da Escola Família.
Através de um comodato com a LBA
(Governo do Estado), o MEPES recebeu
em comodato por tempo indeterminado o
prédio e 32 hectares de terra.
Foi nesse prédio velho, mal
conservado, com energia própria (essa
vinha de um gerador alimentado por uma
turbina movida à água), e num terreno todo
cultivável que se instalou a EFA de
Olivânia. A escola começou suas
atividades com duas turmas (uma em
outubro foi transferida para a EFA de Rio
Novo do Sul), com o curso de dois anos
para agricultor técnico, sem
reconhecimento legal.
No período de 1969 a 1975, a EFA
de Olivânia teve como objetivo a formação
de Agricultores Técnicos. A partir do
surgimento da EFA de Olivânia, outras
foram surgindo com o apoio do MEPES.
A história das Escolas Famílias
Agrícolas tem mostrado que o trabalho
educativo tem êxito se realizado a partir
da ação coletiva. Hoje, podemos dizer com
alegria que a Pedagogia da Alternância é
de patrimônio universal. É conhecida e
divulgada no meio educacional e na
sociedade em geral, sobretudo naqueles
setores ligados à educação e ao processo
produtivo no campo. Tendo o MEPES
como o pioneiro na implantação das
Escolas Famílias Agrícolas no Brasil, a
Pedagogia da Alternância cresceu se
dinamizou e se tornou referência para
outras escolas que também se apropriaram
do sentido de fazer uso adequado à sua
realidade.
Segundo MEPES (2016), a
Pedagogia da Alternância tem pressupostos
básicos comungados por todos que a
conhecem em sua gênese e que buscam
manter sua fidedignidade para não perder o
foco. Porém, as apropriações realizadas
pelas diferentes unidades proporcionam o
enriquecimento dessa prática e comprovam
o discurso de que ela, a PA, é viva,
dinâmica, própria e apropriada aos sujeitos
do campo.
A Escola Família Agrícola São Bento do
Chapéu
Nos anos 1980, os órgãos
governamentais passaram a proibir o
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
9
sistema de pousio, gerando revoltas e
insatisfação dos agricultores do município
de Domingos Martins. Não podia sequer
retirar uma árvore, nem para consumo
próprio, ignorando, assim, a boa
consciência ecológica que existia e existe
entre os agricultores. Para continuar
trabalhando a terra no sistema de pousio,
os agricultores familiares, com o apoio de
Pastores luteranos e da CPT (Comissão da
Pastoral da Terra), enfrentaram a polícia
florestal, valendo-se de mutirões, de
pressões diversas sobre o Estado e seus
órgãos.
Os mutirões realizados para a defesa
dos agricultores motivaram a criação da
Associação em Defesa dos Direitos dos
Produtores Rurais de São Bento do Chapéu
(ADDPRUSBEC) que é uma experiência
coletiva. Em sua fundação, em 11 de
agosto de 1990, contava com 250 sócios
espalhados por sete núcleos no município
(arquivos ADDPRUSBEC).
Dentre os objetivos da associação,
um foi o de buscar alternativas de
Educação de acordo com a realidade do
campo com a Fundação de Escolas
Famílias Agrícolas e que tenham a
formação do 1° grau completo.
A mesma insatisfação que acarretou
mudanças no sistema educacional da
França motivou um grupo de agricultores
da comunidade de São Bento do Chapéu,
situada no município de Domingos
Martins/ES, a construir uma escola que
atendesse às necessidades de seus filhos:
... surgiram várias discussões e a
principal delas foi a preocupação
com a educação que não distanciasse
o jovem da sua realidade e de sua
vivência familiar. Desta maneira, os
agricultores estavam preocupados
com os modelos de educação do
meio urbano, uma vez que não
atendiam o desenvolvimento do
campo. Além disso, o êxodo rural era
constante, pois quando os jovens iam
estudar no meio urbano, não
voltavam para suas origens. (Schunck
et al., 2012, p. 207).
O primeiro contato com a Pedagogia
da Alternância foi na Escola Família
Agrícola de Jaguaré, no Norte do Estado
(1º grau na época), por um grupo de
agricultores escolhidos pela Diretoria da
Associação, que firmaram satisfazer as
necessidades educacionais por meio
daquele sistema de ensino. Sem muito
conhecimento burocrático, administrativo e
pedagógico, trabalharam na implantação da
Escola Família Agrícola na comunidade.
Na época, havia também um filho de
agricultor da comunidade que estudava na
Escola Família de Alfredo Chaves que foi
visitada pelos agricultores a fim de
conhecer tal proposta que atendia a seus
anseios. Optou-se por proposta semelhante
por se tratar da Pedagogia da Alternância
que valoriza e potencializa os saberes do
campo. A Diretoria da Associação firmou a
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
10
responsabilidade dos salários dos
funcionários com a Prefeitura Municipal de
Domingos Martins, porém, ao longo do
tempo, o cumpriu com esse
compromisso integralmente.
Estabelecido o acordo com a
Prefeitura, a ADDPRUSBEC “arregaçou
as mangas” e realizou uma construção de
madeira, a qual possuía uma sala de aula,
cozinha e a casa da servente, e a pernoite
era em um paiol na propriedade do Sr.
Floriano Hehr Sobrinho, que cedeu 3
hectares. O Sr. Floriano Hehr era agricultor
e tinha experiência na docência do
primário na comunidade local e defendia
que os jovens não iriam se distanciar da
realidade em busca de educação.
No dia 10 de novembro de 1991, foi
inaugurada a pedra fundamental da Escola
Família Agrícola de São Bento do Chapéu.
A Associação começou a construir
barracos de tábuas e, finalmente, em 1992,
alcançaram o desejo de ver funcionar a
Escola Família Agrícola de São Bento do
Chapéu. Exatamente no dia 09 de março de
1992, iniciaram as aulas, com quatro
professores/monitores e 20 estudantes na 5ª
série. Como reforça Schunck (2012):
... optaram por implantar o sistema da
Escola Família Agrícola que tem
como base a Pedagogia da
Alternância, no dia 10 de novembro
de 1991 foi feito o lançamento da
pedra fundamental da Escola Família
Agrícola São Bento do Chapéu, no
terreno de três hectares, doado pelo
sócio da Associação e produtor rural,
Floriano Hehr Sobrinho. No dia nove
de março de 1992, iniciaram-se as
aulas na Escola, atendendo a 20
alunos da série do Ensino
Fundamental. (Schunck et al., 2012,
p. 207).
A escola foi assim fundada por meio
de doações e de trabalhos voluntários pela
própria equipe da Associação, sendo
apoiada pela CPT, por meio do Pastor
Vitório Krauser da Igreja Evangélica de
Confissão Luterana do Brasil e de sua
esposa Elza Ristow Krauser, que
coadjuvava a Associação através da
elaboração dos projetos. Essa ideia se
fortificava e era divulgava por meio do
Jornal O Braço Sul, que destacava o
esforço dos agricultores. A escola ainda
recebeu o apoio de vizinhos que cederam
moradia para os monitores. Mas funcionou
dessa forma nos primeiros anos de
funcionamento. No dia 15 de dezembro de
1995, formou-se a primeira turma da
Escola Família Agrícola, concluindo a
série do Ensino Fundamental, com nove
educandos.
A Escola Família Agrícola São
Bento do Chapéu, desde a sua criação,
trabalha com a consciência de que o campo
é um lugar de vida, de experiência, de
saberes e de produção. Nesse sentido, a
Escola busca juntamente aos estudantes e
suas famílias, condições para o
desenvolvimento de seu meio, que o
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
11
contexto histórico de sua criação era o
contexto do êxodo rural, em que os
estudantes que concluíam o ensino
fundamental na cidade não viam
perspectivas de vida no campo e acabavam
se mudando.
A Escola tem uma grande
importância na Educação do Campo para
vários municípios por existirem poucas
Escolas Família na região e por estar
atuando 27 anos na região, com a
proposta que possibilita aos estudantes a se
formarem como seres humanos e criando
condições para que possam escolher
qualquer área de atuação profissional, mas
sem esquecer suas raízes e valorizando o
campo.
O currículo e organização da Pedagogia
da Alternância na EFA São Bento do
Chapéu
O currículo, na Pedagogia da
Alternância, dialoga com o que Freire
(2005, p. 79) traz quando critica a
educação bancária, e propõe uma educação
problematizadora e dialógica em que “o
educador não é apenas o que educa, mas
o que, é educado, em diálogo com o
educando que, ao ser educado, também
educa. Ambos assim, se tornam sujeitos do
processo em que crescem juntos”.
O currículo se caracteriza como
“projeto seletivo de cultura, cultural,
social, política e administrativamente
condicionado .... (Sacristán, 2000, p. 34).
Assim, não é composto apenas pelo
conteúdo programático previsto para ser
ensinado, mas implica, entre outros
aspectos, os horários, a disciplina e as
tarefas diárias que se exigem dos alunos
.... (Freire & Macedo, 1994, p. 70).
Afirmar que o currículo é “projeto seletivo
de cultura” significa dizer que nele não
cabe todo o acúmulo de conhecimento da
humanidade e nem de uma determinada
área, que ao organizarmos o currículo
decidimos o que deve compô-lo e o que
ficará de fora, pois nunca conseguimos
abarcar a totalidade de uma área e mesmo
que fosse possível precisaríamos ver se
seria adequado e necessário. O
conhecimento a ser ensinado é selecionado
a partir de definições tomadas após
responder a questões como: Para que
ensinar? Para quem ensinar? O que
ensinar? Quando ensinar? Como ensinar?
O que ensinamos está adequado às
necessidades nossas e às dos estudantes?
(IN nº 04/2016 da UFES)
Também, no chamado de Plano de
Formação, é onde se encontram os temas
geradores, seus objetivos e metodologia, os
conteúdos e seus objetivos. Assim afirma
Begnami,
Um projeto educativo baseado em
um “Plano de Formação” construído
a partir de um diagnóstico
participativo sobre a realidade
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
12
socioprofissional, política,
econômica, cultura, ecológica etc.,
dos educandos. O Plano de Formação
contém: as finalidades e objetivos
discutidos pela Associação com base
no contexto; temas dos Planos de
Estudos baseados na realidade
apontada por diagnósticos
participativos; Conteúdos
curriculares formais de ensino da
base nacional comum e da educação
profissional trabalhados a partir dos
temas da realidade e de forma
interdisciplinar. (Begnami, 2006, p.
35).
O tema gerador do Plano de Estudo
da unidade ao processo de ensino-
aprendizagem integrando a realidade do
estudante aos assuntos do currículo do
município é o caso da EFA São Bento do
Chapéu. Para o desenvolvimento de cada
Tema Gerador, é feita uma motivação que
pode ser dramatização, mística, filme,
visita de estudo, cursinho e outros. Em
seguida, é elaborado o questionário para a
realização da pesquisa no meio
familiar/comunitário. Ao retornar como
Plano de Estudo respondido para a Escola,
é realizada a correção da escrita das
respostas, a elaboração da redação
ilustrada, a socialização e a sistematização.
A partir do texto-síntese, os conhecimentos
são organizados em cada Componente
Curricular a ser desenvolvido em sala de
aula ou em momentos de aulas práticas em
outros espaços. No final de cada trimestre,
é realizada uma complementação
pedagógica para cada tema gerador que
pode ser palestra, visita de estudo,
cursinho, práticas e outros.
O município de Domingos Martins,
por meio da Secretaria Municipal de
Educação, iniciou em 2009 a formação
continuada de professores com o tema
Educação do Campo. Desde então, demais
escolas começaram a adotar o trabalho por
meio de temas geradores. Esse trabalho
resultou no currículo que segue a
perspectiva sócio-histórica. Foi concluído
em 2017 com a participação coletiva do
corpo docente, discente e comunidade
escolar. O currículo municipal tem como
referência teóricos como Karl Marx,
Vygotsky, Bakhtin e Paulo Freire.
A perspectiva sócio-histórica-cultural
nos desafia a compreender o sujeito,
sob três dimensões: social, histórica e
cultural. A dimensão social demarca
as questões das relações humanas,
pois somos seres situados no mundo
e com o mundo, inseridos nos
contextos sociais. A histórica nos
situa em como chegamos aaqui, os
diversos momentos e épocas que
marcaram a humanidade e a nossa
historicidade, bem como as
influências do tempo sobre o
humano, sobre a natureza, e sobre as
práticas sociais e culturais. E a
dimensão cultural valoriza toda a
produção humana em diferentes
contextos observando tais influências
na temporalidade. (Documento
Curricular de Domingos Martins,
2016).
O currículo da Pedagogia da
Alternância ainda conta com um ciclo da
aprendizagem experiencial que passa por 3
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
13
fases: o meio socioprofissional, o meio
escolar e novamente o meio
socioprofissional. Assim, a alternância tem
foco na experiência, valoriza os saberes e o
processo de ensino aprendizagem se por
meio da realidade observada e retorna com
a intervenção da busca de soluções para os
problemas que essa realidade apresenta.
O processo de formação alternante
inscreve-se numa ação científica
descrita em cinco fases: Observação
da experiência por meio das
pesquisas dos Planos de Estudo e
outras modalidades interação com a
realidade; Descrição reflexiva a partir
das observações expressão
formalização dos dados;
Questionamentos Problematização;
Busca de respostas; Experimentação
ativa para inovar e transformar.
(Begnami, 2006, p. 37).
Esse método privilegia a ação do
aprendiz e a aprendizagem por produção
de saberes, mais que por consumo.
Reforça-se a proposta da autonomia, o
princípio da participação e do
protagonismo dos sujeitos. O currículo é
revisado anualmente por meio do
planejamento coletivo e individual a fim de
se aproximar sempre da realidade dos
estudantes, dos temas geradores e do
currículo municipal.
A Alternância permite ao estudante a
tomada de consciência por meio do
distanciamento proporcionado pelo
internato que tem função pedagógica uma
vez que permite refletir sobre essa
realidade na medida em que toma distância
na sessão escolar que é o período que ele
permanece na escola. De acordo com
Schunck (2010):
O processo educacional da Pedagogia
da Alternância es baseado na
divisão da aprendizagem em dois
períodos e locais diferentes: o da
escola e o da família. No caso da
Escola Família Agrícola São Bento
do Chapéu, cada período destes,
chamados de sessão escola e sessão
familiar, tem uma semana de
duração. (Schunck, 2010, p. 4).
Na semana familiar, os alunos
realizam atividades teóricas
complementares como, por exemplo,
planos de estudos, atividades de retorno e
estágios, as atividades e trabalhos das
disciplinas e as experiências concretas da
relação teoria e prática, além de
acompanhar os pais nos afazeres da casa,
propriedade e vida social, o que possibilita
a interação dos conhecimentos da família e
da escola, fazendo sentido ao educando,
pois sua vida escolar está dialogando com
a sua realidade.
Na sessão escolar, os estudantes têm
aulas de Língua Portuguesa, Matemática,
Ciências, História, Geografia, Arte,
Educação Física e Língua Estrangeira.
também as disciplinas de Agricultura,
Zootecnia e Educação Familiar que são
específicas da Pedagogia da Alternância.
Ao realizar as atividades complementes, o
educando traz suas pesquisas e respostas
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
14
adquiridas na sessão familiar e faz a
socialização das mesmas na turma, o que
possibilita a integração dos conhecimentos,
havendo, assim, o intercâmbio de
informação, em que o aluno aprende na
escola, leva para a família e volta para
escola com seus conhecimentos e de sua
realidade. Na sessão escolar, os educando
participam de palestras, de seminários e de
aulas práticas sobre assuntos pertinentes à
realidade.
Além disso, os estudantes realizam
as tarefas diárias como, por exemplo,
coordenar, garçom, varrer as salas de aula,
refeitório, área e quartos, lavar a louça das
refeições entre outras. também a aula
prática que é realizada diariamente no
horário das 16 às 17h na propriedade da
Escola, bem como o serão noturno, que é
uma atividade planejada pelo professor
responsável. A sessão escolar possibilita,
ainda, a interação entre educandos e
também entre educando e professor, pois a
convivência exige um bom relacionamento
entre todos.
A Pedagogia da Alternância conta
com um conjunto de ferramentas
pedagógicas e atividades necessárias para
uma alternância integrativa que valoriza,
de fato, e prioriza a experiência como lugar
de aprendizagem e formação. Para
Schunck (2010), o modelo pedagógico da
Pedagogia da Alternância utiliza diversos
instrumentos metodológicos, baseados na
vivência do aluno, da família e da
comunidade. Esses instrumentos serão
destacados a seguir. O principal
instrumento metodológico é o Plano de
Estudo. É um método de pesquisa
participativa, que possibilita analisar os
vários aspectos da realidade do educando e
promover uma relação autêntica entre a
vida e a escola. A partir do tema gerador, a
dupla de monitores encarregada pelo tema
irá pensar em uma motivação para iniciar a
conversar com os estudantes, que pode ser
uma palestra, filme, visita, mística, música,
que dialogue com o tema em estudo.
Tomou-se, por exemplo, aqui o tema
gerador “Terra” trabalhado na turma do
sexto ano no segundo trimestre.
Para a motivação, foi utilizada a
parábola do semeador, a música “Cio da
Terra” de Milton Nascimento e uma
mística.
A partir da motivação, foi mediado
um diálogo com a turma a fim de levantar
os tópicos sobre o tema. Em grupos,
elaboraram as perguntas que depois foram
socializadas e sistematizadas de forma que
atendessem aos questionamentos a respeito
do tema. Elaboraram ainda subtema, o
chapéu (introdução do Plano de Estudo) e
o um pensamento.
Os estudantes levaram as questões às
suas famílias, as quais foram respondidas.
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
15
Retornaram à escola onde as respostas
foram corrigidas (erros ortográficos e
concordância) e transformadas pelos
estudantes em redação ilustrada, conforme
figura 5.
Figura 2 - Redação ilustrada do plano de estudo de uma estudante. 2018.
Fonte: Pesquisa de campo.
Depois, as respostas são
sistematizadas em forma de um documento
comum chamado de síntese que é
disponibilizado para todos os estudantes e
docentes.
A síntese serve de base para o
planejamento dos docentes em suas
disciplinas, pois a síntese consiste na
realidade daquela turma e apresenta as
problemáticas vivenciadas por ela servindo
de ponto de partida para o trabalho em
sala.
Através do Plano de Estudo, as
potencialidades de Alternância se
viabilizam, tornando-se um ato concreto e
fonte de reflexão. O Plano de Estudo é o
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
16
canal de entrada da cultura popular para a
EFA e é o responsável de levar para a vida
cotidiana as reflexões, as questões e as
conclusões.
Guia elaborado pelos professores e
educandos em uma sessão escolar, o Plano
de Estudo permite que os temas ligados ao
contexto vivido pelo educando se tornem o
eixo central de sua aprendizagem. A
princípio, o educando desenvolve temas
mais simples ligados ao cotidiano familiar,
para depois caminhar em direção a temas
mais complexos de caráter
socioeconômico.
O Plano de Estudo é o instrumento
que permite desencadear a motivação e a
compreensão do significado político e
social dos conteúdos curriculares. O Plano
de Estudo é o elemento em que reina a
interrogação e o diálogo, que organiza a
reflexão e desperta o interesse para um
aprendizado dinâmico. É único e
intransferível para cada grupo de
educando, pois cada grupo vive situações e
interesses distintos.
As Atividades de Retorno consistem
na fase conclusiva de um tema do Plano de
Estudo. É o momento da aplicação/ação. A
escola planeja com os jovens a forma de
retornar a pesquisa à família, à comunidade
local.
Uma Atividade de Retorno poderá
ser, por exemplo, a realização de uma
palestra na comunidade, o
desenvolvimento de uma campanha, a
demonstração de uma técnica. Consiste na
realização de uma pesquisa, ou de uma
demonstração mais complexa. Exige
preparação e acompanhamento para se
obter os resultados esperados.
As visitas de estudos têm por
finalidade levar o educando a observar na
prática, em ambiente externo àquele em
que vive experiências existentes, seja no
campo agrícola ou social. Visam ao
conhecimento de novas realidades e de
novas técnicas, confrontando realidades
diferentes da sua e realizando intercâmbio
com outras comunidades.
Durante a Visita ou Viagem de
Estudo, o educando observa, se informa,
questiona a respeito do assunto. Essas
visitas e viagens, motivadas sempre pelo
Plano de Estudo, são planejadas
antecipadamente pelos professores. As
visitas e viagens possuem estreita relação
com o Tema Gerador em estudo. Ao
finalizar a visita ou viagem, todo o relato
será registrado do Caderno da Realidade.
O Plano de Estudo é organizado no
Caderno da Realidade que por sua vez
acumula o registro de conhecimentos sobre
a realidade. Nasceu da necessidade de
sistematizar a pesquisa. Nele, o jovem
registra todas as suas reflexões e estudos
aprofundados. É o elemento que permite a
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
17
sistematização racional da reflexão e a
ação provocadas pelo Plano de Estudo.
“Lugar” onde ficam ordenadas as
informações, experiências realizadas em
casa e na escola.
Em nível didático, o Caderno da
Realidade representa:
Tomada de consciência e uma
particular percepção da vida
cotidiana do educando;
Desenvolvimento da formação geral,
porque retrata a história da família da
terra que trabalha, da comunidade e
de outros aspectos que compõem a
estrutura familiar; Representa um
elemento de orientação profissional
porque as reflexões que são
registradas são fruto do trabalho do
jovem, da vida profissional e social
da família. (Ferreira, et al., 2014).
Outra ferramenta pedagógica é o
Estágio. Este constitui mais um dos
recursos utilizados na estrutura pedagógica
orientada pelo coordenador pedagógico. É
uma atividade programada a partir do
ano que proporciona ao educando um
momento com a família de um colega
durante dois dias no mínimo, passando a
conhecer a realidade do colega a partir do
roteiro de pesquisa. No ano, existe a
possibilidade de conhecer outra
comunidade no período de 3 dias e no
ano, o educando escolhe um tema de seu
interesse para pesquisar e desenvolver seu
estágio técnico social com carga horária de
5 dias. O estágio também funciona como
uma extensão da escola, expandindo os
objetivos de estudo dos educando para
além de seu meio e da escola. De volta
para a escola, ao finalizar o estágio, o
educando relata sua experiência para os
colegas, para os professores e para os pais.
Todo o registro do estágio fará parte do
Caderno da Realidade.
Os serões de estudos, conhecidos
também como estudos complementares,
são indispensáveis no ambiente educativo
do internato é um dos recursos utilizados
para reflexão sobre temas diversos de
interesse dos educandos, promovendo
debates e interrogações de questões que
promovem tanto o crescimento individual
do educando como o do grupo. Acontecem
no horário de 19 horas e 40 minutos às 20
horas e 40 minutos de segunda a quinta-
feira. As atividades são planejadas e
orientadas pelo monitor responsável do
dia.
As visitas às famílias são realizadas
no mínimo uma vez por ano, quando
geralmente dois monitores/professores se
deslocam da Escola até a família como o
objetivo de socializar informações
relevantes sobre o estudante previamente
levantadas em reunião de equipe escolar
relacionadas ao desempenho escolar e,
assim, possibilitar o diálogo direto e
conhecer a realidade e acompanhar as
famílias e os jovens em suas atividades
produtivas e sociais. Representa a extensão
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
18
da Escola em seu meio. Além dos
objetivos citados, ainda se destacam:
Facilitar o conhecimento entre
professor e educando bem como do
ambiente em que este vive com sua
família;
Criar condições para o
estabelecimento do diálogo entre
professores e pais, proporcionando
condições para discussões de questões
técnico-pedagógicas da escola.
Além das visitas às famílias, outro
instrumento que viabiliza o diálogo com as
famílias é o Caderno de Acompanhamento.
É um meio de comunicação entre a escola
e a família. Com ele, a família se implica
no processo, acompanhando e orientando
seus filhos sobre o que fazer durante a
estadia em casa, na realização de um Plano
de Estudo, de um estágio, de uma
experiência, de uma atividade de retorno,
de uma pesquisa por matéria. Dessa forma,
a página correspondente à sessão familiar
vem assinada pelo responsável do aluno.
Dessa forma, a família se informa de tudo
o que ocorreu na EFA, inclusive avaliação
de convivência, habilidades práticas e
aprendizagem, podendo também opinar,
sugerir, questionar, quando achar
necessário. Por outro lado, o Caderno de
Acompanhamento traz informações sobre a
vida em casa e implica mais os alunos na
realização de suas tarefas e atividades
comunitárias. Nele, devem constar todas as
atividades realizadas com o
acompanhamento dos responsáveis pelo
educando em casa e na Escola:
acompanhamento semanal Escola e
Família, avaliação bimestral feita pela
Família, avaliação bimestral feita pelos
colegas, autoavaliação e avaliação
bimestral dos funcionários.
A avaliação de habilidade e
convivência consiste primeiramente em
uma autoavaliação pelo aluno que é uma
prática importante para responsabilizá-lo
pelo seu processo educativo. É uma das
formas de prepará-lo para a cidadania. Em
todos os aspectos avaliativos apresentados,
os alunos deverão participar por intermédio
da autoavaliação. A Escola deverá
encontrar meios criativos para realizar a
autoavaliação e torná-la algo responsável,
de grande valor no processo educativo.
O aluno avalia o plano de formação,
toda a equipe, o conselho administrativo, a
comissão de formação, enfim ele participa
do processo avaliativo de todo o projeto. O
êxito da escola está intimamente ligado ao
bom êxito dos alunos, das famílias e das
comunidades atingidas pela escola.
As aulas práticas acontecem na
propriedade das 16 horas às 17 horas em
diversos setores da propriedade da Escola
onde os estudantes são divididos entre
esses setores pelo professor responsável da
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
19
propriedade. Em cada setor, tem um
professor responsável que orienta os alunos
nas atividades necessárias. Essa
metodologia busca partir da realidade dos
alunos que, em sua maioria, vive, convive
e lida com a terra. Propicia o estudo sem
perder o vínculo com o meio rural. Ajuda a
família, além de trabalhar a teoria em sala
de aula, comprovar a realidade a partir de
práticas na propriedade.
Quando volta da alternância, o aluno
é encaminhado para outro setor. A
atividade possibilita a valorização da
agricultura sustentável a fim de produzir os
alimentos de forma natural. É um momento
destinado à realização prática dos
conhecimentos abordados em sala. As
atividades são desenvolvidas na
propriedade escolar, abrangendo
experiências agrícolas.
No Projeto Teórico-Prático, o aluno
vai amadurecendo ao dos anos o que
pretende desenvolver no campo da
produção, da transformação ou de serviços,
bem como continuação dos estudos. No
último ano, ele sistematiza o projeto a
partir da orientação dada pela equipe de
monitores.
O projeto teórico e prático é
desenvolvido no oitavo ano da Escola
Família Agrícola São Bento do Chapéu a
fim de aprofundar os conhecimentos
técnicos, teóricos e práticos sobre uma
criação ou cultura de ciclo anual a partir da
vivência e experiência dos alunos na
família e na EFA. O projeto tem início com
a escolha do tema que acontece em
fevereiro, perpassa a pesquisa, a produção
escrita e a prática em suas propriedades.
O projeto vem ao encontro da
educação do campo, uma vez que
possibilita ao aluno vivenciar uma
atividade de planejamento e de
administração das atividades agrícolas.
Além disso, proporciona o
desenvolvimento da leitura, da escrita, da
pesquisa e da oralidade.
O projeto desenvolvido na 8ª série
possibilita a práxis, já que a reflexão crítica
sobre a prática se torna uma exigência da
relação Teoria/Prática, sem a qual a teoria
pode ir virando blábláblá e a prática,
ativismo (Freire, 1996). Além disso, o
projeto acontece mediante a pesquisa
abordada, assim em Freire, “não ensino
sem pesquisa e pesquisa sem ensino”.
(Freire, 1996, p. 29) e acrescenta que
“ensinar não é transferir conhecimento,
mas criar as possibilidades para a sua
produção ou a sua construção”. (Freire,
1996, p. 47).
Em sala de aula, foi motivada a
escolha da criação ou da cultura de ciclo
anual; em seguida, realizou-se a elaboração
do projeto (capa, introdução, dados gerais
da propriedade, objetivos, justificativa,
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
20
metodologia, cronograma de execução e
referências). Na semana de alternância,
iniciou-se a execução prática do projeto
nas propriedades. Alguns projetos foram
contemplados com a visita técnica dos
professores. A culminância é a
apresentação dos projetos no mês de
novembro para os colegas, rie e
funcionários da Escola.
De acordo com os objetivos
propostos, foi possível proporcionar
condições para que o aluno desenvolvesse
o planejamento das atividades agrícolas,
acompanhando o ciclo de uma cultura ou
criação de ciclo anual por meio de
observação, de registro e de
desenvolvimento da escrita, da leitura, da
pesquisa e da prática.
As principais conquistas se devem ao
envolvimento das famílias e dos alunos no
desenvolvimento prático do projeto; alunos
como sujeitos da construção do
conhecimento, identificação e valorização
da atividade desenvolvida na propriedade,
entre outros. De acordo com Freire,
... ainda podemos destacar a
construção do conhecimento em que
o educando busca a aprendizagem:
nas condições de verdadeira
aprendizagem os educandos vão se
transformando em reais sujeitos da
construção e da reconstrução do
saber ensinado, ao lado do educador,
igualmente sujeito do processo.
assim podemos falar realmente de
saber ensinado, em que o objeto
ensinado é aprendido na sua razão de
ser e, portanto, aprendido pelos
educandos. (Freire, 1996, p. 26).
Outra conquista que se destaca é o
despertar da autonomia nos educandos,
uma vez que se tornam sujeitos da própria
aprendizagem, responsabilizando-se pelo
projeto, por meio de observações e de
registros, desde a pesquisa teórica até a
execução prática. Além disso, o projeto
contribuiu nas diferentes áreas do
conhecimento, partindo da leitura e da
escrita, perpassando por diversos
conhecimentos, dentre estes, o
reconhecimento de dados geográficos da
propriedade, o estudo histórico da criação
ou da cultura, aprofundamento técnico de
manejo, noção prática de medida de área e
cálculo de produção e custos, entre outros.
O Conselho de Classe se baseia na
Avaliação de Habilidade e Convivência
que acontece em três etapas: a família
avalia o estudante durante o trimestre,
destacando seu desenvolvimento, seu
comprometimento e suas
responsabilidades. No segundo momento,
o estudante faz autoavaliação e é avaliado
por seus colegas, ainda avalia a equipe de
funcionários da Escola. No terceiro
momento, a equipe de professores faz a
socialização das avaliações de cada
estudante e é dada a nota pelas
potencialidades do estudante, sendo feita a
devolutiva a este. É no Caderno de
Acompanhamento que as etapas são
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
21
registradas, pois é uma ferramenta da
Pedagogia da Alternância que possibilita a
comunicação entre a família e Escola. Por
meio desse caderno, é possível fazer um
acompanhamento semanal do
desenvolvimento do estudante.
A auto-organização/tarefas diárias é
um método de trabalho educativo e
formativo, em que os educandos são os
responsáveis pela organização que parte de
necessidades reais e comuns. Os objetivos
desse método devem estar bem claros para
que se alcance o resultado desejado. Na
Escola Família Agrícola todos os
educandos participam de tarefas diárias
essenciais à organização da Escola, tais
como lavar louça, servir o alimento,
coordenar as demais tarefas, lavar
banheiros, limpar as salas de aula, fazer
café, entre outras. A cada sessão escolar, o
educando troca de tarefa.
Como essa organização dos
educandos, a convivência se torna mais
coletiva e estes aprendem a fazer tarefas, o
que contribui para um bom andamento das
atividades escolares e para o convívio em
equipe. Independentemente do gênero,
fazem as mesmas atividades. Dessa forma,
a auto-organização forma pessoas mais
humanas e menos individualizadas, pois,
na realização das tarefas, os educandos se
ajudam e se revezam. A auto-organização é
um dos pilares que sustenta a Pedagogia da
Alternância, pois tem o princípio da
formação humana e de um trabalho em
coletividade.
Ao desenvolver as atividades, os
educandos aprendem e aprimoram sua
prática e, além de fazê-la na escola, ainda
contribuem nas tarefas de casa/ tempo
comunidade, o que possibilita o
intercâmbio entre a escola e a família.
Os educando também se organizam
para as provas da gincana, e demais
atividades extras que a escola promove.
Por conviverem uma semana inteira
permanecendo em internato, têm livre
acesso aos professores para discutir,
questionar e propor melhorias para escola,
além de ajudar em projetos da Escola.
Contribuições formativas da Pedagogia
da Alternância para as comunidades
campesinas: visão de egressos da EFA
São Bento do Chapéu
De acordo com Gil (2002), a
investigação e a análise qualitativa dos
dados podem ser definidas de maneira
relativamente simples. Complementa,
ainda, que:
A análise qualitativa depende de
muitos fatores, tais como a natureza
dos dados coletados, os instrumentos
de pesquisa e os pressupostos
teóricos que nortearam a investigação
... Pode-se, no entanto definir esse
processo como uma sequência de
atividades, que envolve a redução
dos dados, a categorização desses
dados, a categorização desses dados,
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
22
sua interpretação e a redação do
relatório. (Gil, 2002, p. 133).
Considerando que essa pesquisa teve
como objetivo compreender quais as
contribuições formativas da escola para os
sujeitos que passaram pela instituição ao
longo de sua existência, trazemos nesta
parte do texto as respostas que os sujeitos
envolvidos na investigação apresentaram
nos questionários.
Categorizamos os questionários,
inicialmente, em ordem numérica de um a
quinze e damos continuidade pela
sequência de perguntas que se davam pela
caracterização pessoal dos respondentes e
logo após pelas questões específicas.
Em uma primeira análise, diz
respeito ao projeto prático, que é um
requisito para a conclusão das séries finais
do ensino fundamental. É interessante
perceber que há uma unanimidade nas
respostas, pois os quinze respondentes
afirmaram que o projeto realizado na
escola tem uma importância considerável
em suas vidas até hoje. No entanto, desses
quinze, apenas cinco o continuidade ao
projeto prático:
“O projeto de série foi realizado
sobre a cultura do morango, onde
foram plantados 1000 pés de uma
espécie chilena selecionada (melhor
variedade do estado) e quem
continuidade a esse projeto e a minha
avó, mas hoje em dia e para
consumo familiar”. (Respondente
05).
“Na época o projeto era apenas
teórico não havia a prática. Mas
pesquisei sobre as EFA no estado e
no Brasil e também o surgimento da
Pedagogia da Alternância. Penso que
esta pesquisa me acompanha até
hoje, pois foi realizando-a que me
apaixonei pela Pedagogia da
Alternância”. (Respondente 08).
“Fiz o projeto prático, aprendi muito
sobre a cultura, aperfeiçoei minhas
práticas para me garanti no campo”.
(Respondente 13).
“O tema foi sobre a cultura da
abóbora, foi escolhido devido a
necessidade do resgate desta cultura
na propriedade. A partir deste projeto
foi feito ao longo dos anos o uso da
cultura em consórcio”. (Respondente
14).
“O projeto era de canário belga, eu
tinha 20 casais no meu projeto e
depois cheguei 44 casais”.
(Respondente 15).
Pudemos perceber que o projeto
permite e proporciona condições para que
o estudante desenvolva o planejamento das
atividades agrícolas acompanhando as
etapas de uma cultura ou a criação de ciclo
anual, por meio da observação, do registro,
do desenvolvimento da escrita, da leitura,
da pesquisa e da prática. Possibilita, ainda,
o envolvimento das famílias e torna o
estudante sujeito da construção do
conhecimento, da identificação e da
valorização da atividade desenvolvida na
propriedade.
Analisando as questões levantadas,
recorremos aos estudos de Freire (1996)
que defende a ideia de que ensinar exige
pesquisa.
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
23
Não ensino sem pesquisa e
pesquisa sem ensino. Esses fazeres se
encontram um no corpo do outro.
Enquanto ensino continuo buscando,
reprocurando. Ensino porque busco,
porque indaguei, porque indago e me
indago. Pesquiso para constatar,
constatando, intervenho, intervindo
educo e me educo. Pesquiso para
conhecer o que ainda não conheço e
comunicar ou anunciar a novidade.
(Freire, 1996, p. 29).
os outros dez alunos, relatam que
o projeto foi muito significativo e
possibilitou conhecimento em suas vidas,
mas que não continuaram com o projeto
por uma série de motivos:
“Foi sobre peixes (tilápia), mas por
ser feito em região fria não se
desenvolveu bem, por isso hoje não
trabalho mais com peixes”.
(Respondente 12).
“Meu projeto foi da cultura do
quiabo e não foi a frete pela falta de
tempo, tanto minha como da
família”. (Respondente 07).
“O tema do projeto foi sobre a
cultura da abóbora jacarezinho,
cultura na qual foi implantada na
propriedade a partir do projeto
prático. Hoje não está em execução
por ser uma cultura anual”.
(Respondente 04).
“Executado teve uma excelente
produtividade enquanto estava na
escola, infelizmente não dei
continuidade”. (Respondente 06).
Diante das dificuldades apresentadas
pelos estudantes, o projeto atingiu o
objetivo inicial que foi o de implantar e
experienciar uma nova cultura ou criação
na propriedade, despertando, assim, a
autonomia dos educandos, uma vez que se
tornam sujeitos da própria aprendizagem,
responsabilizando-se pelo projeto, por
meio de observações e de registros desde a
pesquisa teórica até a execução prática.
Uma segunda análise se reporta a
entender as questões específicas de como o
estudante obteve o conhecimento sobre a
EFA. A maioria dos entrevistados relata
que conheceu a EFA, principalmente, por
meio dos familiares e dos amigos que
estudaram e também pela própria
comunidade. Isso fica evidente na fala de
dois entrevistados.
“Obtive conhecimento através do
padrinho do meu pai, pois seu filho
se formou e com isso me animei
em fazer uma experiência, na escola
gostei da recepção e convivência”.
(Respondente 2).
“Conheci a escola pelo trabalho
desenvolvido dentro da própria da
comunidade que é consolidado”.
(Respondente 9).
Contrariando os modelos da
educação em que somente as escolas
urbanas medeiam conhecimento
significativo, os entrevistados das questões
dizem que a referida escola proporcionou
condições e conhecimentos para além
daqueles curriculares, pois vem cumprindo
seu papel social por capacitar para a vida
em sociedade, por formar cidadãos críticos
e por promover relações entre os
conhecimentos que são comuns às
disciplinas com a realidade do campo.
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
24
Frisamos que o objetivo da
Pedagogia da Alternância (P.A.) não é e
nunca foi “fixar” o estudante no campo.
Ela oferece possibilidades e condições
para potencializar o caminho percorrido
pelo estudante em relação ao conhecimento
que a P.A. oferece uma formação
integral do ser humano.
Assim reforça a respondente 08:
“A formação obtida na EFA ajuda
muito no relacionamento
interpessoal. Faz-nos observar uma
situação por vários ângulos. Nos faz
colocar no lugar do outro, respeitar as
diferenças. Penso que tudo isso é
importante para ser bom
profissional”. (Respondente 08).
O trabalho da escola acontece na
perspectiva de formação de um sujeito
crítico por meio de sua pedagogia
oferecendo condições psicológicas e
afetivas, permitindo um clima facilitador
de convivência e de aprendizagens com
qualidade de vida.
Para Freire (1996):
Como prática estritamente humana
jamais pude entender a educação
como uma experiência fria, sem
alma, em que os sentimentos e as
emoções, os desejos, os sonhos
devesse ser reprimidos por uma
espécie de ditadura racionalista.
(Freire, 1996, p. 145).
Além de favorecer um crescimento
pessoal e profissional, a escola possibilita
um crescimento social que promove uma
formação humana diferenciada, como se
destaca a seguir:
“Creio que o principal recurso que a
escola me forneceu foi a
adaptabilidade a diversos ambientes e
a diversas pessoas”. (Respondente
14).
“Passar pela EFA foi uma
experiência muito boa, pois não
aprendi somente a trabalhar na minha
propriedade, mas viver em grupo e dá
mais valor minha família”.
(Respondente 15).
“A escola aprendi técnicas para
trabalhar na agricultura”.
(Respondente 11).
“Foi útil, pois aprendi a conviver
com pessoas diferentes. Quando
estive lá fiz uma segunda família”.
(Respondente 06).
“Aprender a lidar e trabalhar em
grupos. Dar valor a nossa terra e
nossos princípios de educação e vida
social”. (Respondente 13).
A terceira e última questão menciona
como foi ter estudado em uma escola que
adota a Pedagogia da Alternância e o que
aprenderam. Ao ver as respostas,
evidencia-se que a experiência foi
satisfatória.
“Está sendo uma boa prática. Posso
pôr em prática o que aprendo na
escola, além de aconselhar a família
em casa como cuidar do solo.
Aprendo a viver em comunhão com o
campo e com a sociedade”.
(Respondente 13).
“Eu aprendi a valorizar o lugar onde
vivo, que posso fazer a diferença sem
deixar minhas raízes para trás e que a
troca de conhecimento é o caminho
para o desenvolvimento social e
coletivo.” (Respondente 8).
“Além de aprender a base comum,
aprendemos sobre matérias técnicas e
aprendemos a conviver em grupo
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
25
respeitando regras e outros fatores”.
(Respondente 4).
Quem nos ajuda a entender melhor as
características da Pedagogia da Alternância
é Begnami (2006, p. 33), quando afirma
que:
A Pedagogia da Alternância tem se
mostrado como um sistema ativo,
dinâmico e inacabado, que não se
limita aos seus antecedentes
históricos, mas se constrói num
processo de crescimento contínuo em
que o projeto educativo caminha na
base de um movimento participativo,
envolvendo famílias, comunidade,
entidades e profissionais, em vários
países desde a década de 1930, na
luta dos agricultores familiares
franceses. (Begnami, 2006, p. 33).
Pudemos perceber que a Pedagogia
da Alternância valoriza as potencialidades
do sujeito através das ferramentas
pedagógicas, pois o sujeito contextualizado
se torna o centro do ensino de
aprendizagem em que sua realidade é o
ponto de partida para desenvolver o
conhecimento.
Considerações finais
Após o rmino da pesquisa,
pudemos compreender como a Escola
Família Agrícola São Bento do Chapéu
realiza a formação dos sujeitos que
passaram pela instituição ao longo de sua
existência, assim como algumas
contribuições suas para as comunidades
campesinas dos municípios de Domingos
Martins, Marechal Floriano e Santa
Leopoldina. Pudemos, ainda, realizar as
seguintes considerações: a Escola tem
grande importância para as comunidades; a
maior contribuição trazida pela sua
existência está centrada no direito de
aprender dos estudantes bem como de
serem um sujeito coletivo, aprendendo a
conviver em grupos, respeitar as
diferenças, valorizando o lugar de origem,
suas raízes, seu desenvolvimento social,
permitindo uma relação próxima entre
família e estudante, em que grande parte
dessas contribuições traz aspectos
diretamente ligados à Pedagogia da
Alternância que acontece na escola.
Dentre os limites para a pesquisa,
sentimos dificuldades na falta de tempo,
devido ao curto prazo para sua realização,
à distância física entre as pesquisadoras e à
dificuldade de incluir, além de ex-
estudantes, representantes da secretaria
municipal, membros da Associação, pais e
professores devido às atividades
cotidianas.
Esperamos que a leitura deste artigo
evidencie a importância das contribuições
formativas da EFA São Bento para a
Educação do Campo bem como reconhecer
a Educação como um direito de todos e um
dever do Estado, buscando divulgar a
proposta da Pedagogia da Alternância,
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
26
assim como motivar o desenvolvimento de
projetos educacionais, superando entraves
entre campo e cidade presentes em nossa
sociedade. Apontamos que esta pesquisa
não se por encerrada, mas, sim, é o
início para a busca de novos estudos a fim
de legitimar o trabalho da Escola e suas
contribuições educativas.
Referências
Begnami, J. B. (2006). Pedagogia da
Alternância como sistema educativo.
Revista da Formação por Alternância, 32,
4-47. Recuperado de:
http://www.mepes.org.br/nosso-
trabalho/efas
Brasil. Decreto 7.352, de 04 de
novembro de 2010. Dispõe sobre a política
de educação do campo e o Programa
Nacional de Educação na Reforma Agrária
- PRONERA. Brasília, 2010. Recuperado
de:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2
007-2010/2010/decreto/d7352.htm
Documento Curricular da Educação Básica
Uma produção coletiva dos sujeitos.
(2016). Prefeitura Municipal de Domingos
Martins.
Ferreira, A., Wisniewsky, J., Vargas, D.,
Guedes, A., & Bohner, T. (2014). Exemplo
de educação do campo baseada nos
princípios do enfoque agroecológico e na
Pedagogia da Alternância. In IV Fórum
Internacional de Pedagogia. Santa Maria,
RS.
Freire, P. (1996). Pedagogia da
Autonomia: saberes necessários à prática
educativa. São Paulo, SP: Paz e Terra.
Freire, P. (2005). Pedagogia do Oprimido.
Rio de Janeiro, RJ: Paz e Terra.
Freire, P., & Macedo, D. (1994).
Alfabetização: leitura do mundo leitura da
palavra. Rio de Janeiro, Paz e Terra.
Gil, A. (2002). Como elaborar um projeto
de pesquisa. São Paulo, SP: Atlas.
Jesus, J. (2007). Saberes e Formação dos
Professores na Pedagogia da Alternância
(Dissertação de Mestrado). Universidade
Federal do Espírito Santo, Vitória.
Molina, M. C., & Jesus, S. M. S. A.
(Orgs.). (2004). Contribuições para a
construção de um projeto de Educação do
Campo. Brasília, DF: Articulação Nacional
"Por Uma Educação do Campo. Coleção
Por Uma Educação do Campo, nº5.
Nosella, P. (2012). Educação no campo:
origens da pedagogia da alternância no
Brasil. Vitória, ES: EDUFES.
Puig-Calvó, P. (2006). Los Centros de
Formación por Alternancia: desarrol de
las personas y de su médio: la importância
de la formación y de la investigación en
las instituciones (Tesis Doctoral).
Universitat Internacional de Catalunya,
Barcelona.
Sacristán, J. G. O. (2000). Currículo: uma
reflexão sobre a prática. Porto Alegre,
Artmed.
Schunck, C., Rosa, D., Littig, P., Ewald,
V., Schunck, V., & Machado, W. (2012).
Meio ambiente em debate: uma
metodologia vinculada à prática. In Silva,
A. S. et al. (Orgs.). Educação do Campo:
Saberes e Práticas (pp. 205-218). Vitória,
ES: EDUFES.
Schunck, V. (2010) A importância do
Plano de Estudo para enfoques
interdisciplinares. In III Congresso
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L. (2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA São
Bento do Chapéu...
Tocantinópolis/Brasil
v. 4
e7305
10.20873/uft.rbec.e7305
2019
ISSN: 2525-4863
27
Internacional Cotidiano diálogos sobre
diálogos. Domingos Martins, ES.
Informações do artigo / Article Information
Recebido em : 30/07/2019
Aprovado em: 22/10/2019
Publicado em: 19/12/2019
Received on July 30th, 2019
Accepted on October 22th, 2019
Published on December, 19th, 2019
Contribuições no artigo: As autoras foram as
responsáveis por todas as etapas e resultados da
pesquisa, a saber: elaboração, análise e interpretação dos
dados; escrita e revisão do conteúdo do manuscrito
e; aprovação da versão final publicada.
Author Contributions: The author were responsible for
the designing, delineating, analyzing and interpreting the
data, production of the manuscript, critical revision of the
content and approval of the final version published.
Conflitos de interesse: As autoras declararam não haver
nenhum conflito de interesse referente a este artigo.
Conflict of Interest: None reported.
Orcid
Débora Monteiro do Amaral
http://orcid.org/0000-0002-8397-864X
Patrícia Hand Littig
http://orcid.org/0000-0001-7548-2217
Sheiliane Bravim
http://orcid.org/0000-0002-9238-0471
Amanda Luduvico Breda
http://orcid.org/0000-0001-5939-5527
Como citar este artigo / How to cite this article
APA
Amaral, D. M., Littig, P. H., Bravim, S., & Breda, A. L.
(2019). A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a
EFA São Bento do Chapéu. Rev. Bras. Educ. Camp., 4,
e7305. DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e7305
ABNT
AMARAL, D. M.; LITTIG, P. H.; BRAVIM, S.; BREDA, A. L.
A Pedagogia da Alternância no Espírito Santo e a EFA
São Bento do Chapéu. Rev. Bras. Educ. Camp.,
Tocantinópolis, v. 4, e7305, 2019. DOI:
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e7305