Revista Brasileira de Educação do Campo
Brazilian Journal of Rural Education
ARTIGO/ARTICLE/ARTÍCULO
DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e8255
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e8255
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2020
ISSN: 2525-4863
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Juventudes Camponesas das Comunidades Alves e
Laranjal no Município de Poconé-MT: dilemas entre ficar
e sair do campo
i
Jucieli Bertoncello
1
, Michelle Tatiane Jaber da Silva
2
, Regina Aparecida da Silva
3
1
Universidade do Estado de Mato Grosso - UNEMAT. Departamento de Pedagogia. Rodovia Juara Brasnorte, Km 02. Juara -
MT. Brasil.
2, 3
Universidade Federal do Estado de Mato Grosso - UFMT.
Autor para correspondência/Author for correspondence: profjucieli@gmail.com
RESUMO. Este artigo resulta e desmembra da pesquisa de
mestrado intitulada “Conflitos socioambientais e mudanças
climáticas sob o olhar das juventudes camponesas de Poconé-
Mato Grosso”, teve como objetivo compreender as percepções
das juventudes sobre os conflitos socioambientais e as mudanças
climáticas existentes na comunidade tradicional "Nossa Senhora
de Lurdes" (conhecida como Zé Alves) e na comunidade
"Remanescente de Quilombo Laranjal", ambas localizadas no
município de Poconé-MT. Nessa trama, também articulamos
reflexões para compreender os dilemas entre “ficar e sair”
vivenciados pelas juventudes, uma vez que as juventudes
camponesas de ambas comunidades estão sendo invisibilizadas
pelo avanço do agronegócio que transformam os bens naturais
em recursos, para atender a lógica economicista,
impossibilitando a permanência nos territórios. A proposição
investigativa apoiou-se no método qualitativo, tendo como
táticas metodológicas o Mapa Social. Para obter as informações,
foram realizados sete trabalhos de campo, dois seminários de
mapeamento, doze entrevistas semiestruturadas com as
juventudes, ademais fontes secundárias (relatórios, artigos e
censos) sobre as comunidades pesquisadas. Compreendemos
que a migração campo-cidade estão relacionadas,
principalmente com a ausência de escolarização e oportunidades
de trabalho e renda, além da não efetivação das políticas
públicas pensadas para essa realidade.
Palavras-chave: Comunidades Camponesas, Juventudes
Camponesas, Dilemas entre Ficar e Sair do Campo.
Bertoncello, J., Jaber-Silva, M. T., & Silva, R. A. (2020). Juventudes Camponesas das Comunidades Zé Alves e Laranjal no
Município de Poconé-MT: dilemas entre ficar e sair do campo...
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Youth Peasant Communities Alves and Laranjal in the
municipality of Poconé, MT: dilemmas between staying
and leaving from countryside
ABSTRACT. This article results and dismembered the master's
research on "environmental conflict and climate change under
the gaze of peasant youths Poconé, Mato Grosso," aimed at
understanding perceptions of youths on environmental conflicts
and existing climate change on our traditional community Lady
of Lourdes (known as Alves) and the Remnant Quilombo
community Orangery, both located in the municipality of
Poconé, MT. In this plot also articulate reflections to understand
the dilemmas of "getting in and out" experienced by youths
since the peasant youths of both communities are being made
invisible by agribusiness advances that transform natural goods
resources, to meet the economic perspective, making it
impossible to remain in the territories. The investigative
proposition relied on the qualitative method, with the
methodological tactics the Social Map. For information were
conducted seven field work, two mapping seminars, twelve
semi-structured interviews with the youths, besides secondary
sources (reports, articles and census) of the surveyed
communities. We understand that the rural-urban migration are
mainly related to lack of education and job opportunities and
income, as well as non-execution of public policies thought to
this reality.
Keywords: Peasant Communities, Peasant Youths, Dilemmas
Between Staying and Leaving from Countryside.
Bertoncello, J., Jaber-Silva, M. T., & Silva, R. A. (2020). Juventudes Camponesas das Comunidades Zé Alves e Laranjal no
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Comunidades Campesinas juveniles Alves y Laranjal
en el municipio de Poconé, MT: dilemas entre quedarse y
dejando el campo
RESUMEN. Este artículo es el resultado y desmembrado. La
investigación de la maestría en "conflicto ambiental y el cambio
climático bajo la mirada del campesino jóvenes Poconé, Mato
Grosso," dirigido a la comprensión percepciones de los jóvenes
en conflictos ambientales y el cambio climático existente en
nuestra comunidad tradicional Señora de Lourdes (conocido
como Alves) y la comunidad Remanente Quilombo
invernadero, ambos ubicados en el municipio de Poconé, MT.
En esta trama también articular reflexiones para entender los
dilemas de "entrar y salir" experimentada por los jóvenes ya los
jóvenes campesinos de ambas comunidades se hacen invisibles
por los avances agroindustriales que transforman los recursos
naturales de mercancías, para cumplir con el punto de vista
económico, por lo que es imposible a permanecer en los
territorios. La propuesta de investigación se basó en el método
cualitativo, con las tácticas metodológicas del mapa social. Para
obtener información se llevaron a cabo el trabajo de campo y
siete, dos seminarios de mapeo, doce entrevistas
semiestructuradas con los jóvenes, además de fuentes
secundarias (informes, artículos y censo) de las comunidades
encuestadas. Entendemos que la migración rural-urbana están
relacionados principalmente con la falta de educación y
oportunidades de empleo e ingresos, así como la no ejecución de
las políticas públicas cree que esta realidad.
Palabras clave: Comunidades Campesinas, Jóvenes
Campesinos, Los Dilemas Entre Quedarse y Dejando Campo.
Bertoncello, J., Jaber-Silva, M. T., & Silva, R. A. (2020). Juventudes Camponesas das Comunidades Zé Alves e Laranjal no
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Introdução
Esta pesquisa foi realizada em duas
comunidades localizadas aproximadamente
a 110 km da capital Cuiabá, na MT451
(Rodovia Adauto Leite), município de
Poconé/MT, sendo a comunidade
tradicional "Nossa Senhora de Lurdes"
(conhecida como Alves), localizada às
margens da MT-451 no km 17 e a
"Comunidade Remanescente de Quilombo
Laranjal", às margens da estrada vicinal do
Buriti, a 15 km da rodovia asfaltada MT-
451, com entrada para a comunidade no
km 13. Ambas fazem parte de um conjunto
de aproximadamente 70 comunidades
localizadas na transição entre o Cerrado e o
Pantanal, ficando assim, conhecida por
seus/suas moradores/as que são
quilombolas, tradicionais e assentados
como “Comunidades do Cerrado do
Pantanal”.
Em meio a essa diversidade de dois
biomas, o avanço acelerado dos latifúndios
de monoculturas tem colocado em risco a
biodiversidade e a existência dessas
comunidades e dos grupos presentes neste
território. Muitos se sentem ameaçados,
pois, esse modelo econômico continua
reproduzindo ações de violência, opressão,
exploração e expulsão dos “... povos do
campo, das florestas e das águas ...
(Carneiro & Neto, 2013, p. 09), como o
sistema latifundiário instituído durante o
Brasil colônia, após o fim do regime das
sesmarias. Esse sistema desde quando foi
criado tem conseguido estabelecer o
controle territorial impedindo que esses
grupos tenham acesso e consigam
permanecer nos territórios, mantendo viva
sua cultura, identidade e a forma de
relacionar-se com a natureza.
Na tentativa de permanecerem nos
territórios do campo, as comunidades
inseridas no Cerrado do Pantanal que
possuem uma cultura e identidade muito
particular, assim como os diferentes grupos
sociais mapeados por Silva (2011), estão se
organizando coletivamente e resistindo/re-
existindo a todos os tipos de violência e
violação de direitos provocados por esse
“... moderno-colonial de acumulação
capitalista” (Porto-Gonçalves et al., 2016,
p. 85), que devasta os territórios por meio
dos desmatamentos para a introdução das
monoculturas, e as atividades como
pecuária e extrativismo mineral
consolidada nesta região.
Em Laranjal o quadro de injustiças e
conflitos existem/avançam
aproximadamente 30 anos, quando
fazendeiros ocuparam as terras com a
ajuda de autoridades locais, jagunços e
funcionários públicos que eram por direito
dos quilombolas. Atualmente, essas
famílias encontram-se espremidas entre as
Bertoncello, J., Jaber-Silva, M. T., & Silva, R. A. (2020). Juventudes Camponesas das Comunidades Zé Alves e Laranjal no
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cercas dos grandes latifúndios e a estrada
que acesso ao quilombo, ficando assim,
impossibilitadas de realizar atividades
produtivas para subsistência e
comercialização. Em Alves, por terem
acesso a terra conseguem manter a
identidade com o território que habitam, no
entanto, sentem-se ameaçados pelo avanço
do agronegócio na região.
Em meio a essa realidade distinta
entre Alves e Laranjal, temos como
sujeito dessa pesquisa as juventudes
ii
camponesas invisibilizadas nos territórios
pelo avanço das monoculturas que
transformam a natureza em mercadoria,
impossibilitando a permanência nos
territórios. Em Zé Alves, as juventudes que
permanecem na comunidade estão
estudando ou ajudando a família no
plantio, na colheita e na comercialização
dos produtos como hortaliças, verduras,
frutas, doces, cana-de-açúcar e seus
derivados melado, rapadura e açúcar
mascavo. A grande maioria encontra-se
organizado por meio do associativismo e
cooperativismo para que assim, possam
plantar e colher, e consequentemente
permanecer na comunidade e sobreviver da
terra.
as juventudes de Laranjal sofrem
com a expropriação do território ocorrido
aproximadamente 30 anos, quando
fazendeiros ocuparam as terras com a
ajuda de autoridades locais, jagunços e
funcionários públicos que eram por direito
dos quilombolas. Atualmente, essas
famílias, juntamente com as juventudes,
encontram-se espremidas entre as cercas
dos grandes latifúndios e a estrada que
acesso ao quilombo, ficando assim,
impossibilitados de realizar atividades
produtivas para subsistência e
comercialização. Consequentemente, as
juventudes deixam a escola muito cedo
para vender a força de trabalho e ajudar no
sustento da família como empreiteiro,
mensalista ou diarista para os donos dos
grandes latifundiários da região.
Nessa perspectiva, Molina (2015,
p.13), ressalta que as transformações no
campo, trazidos pela gica de acumulação
do capital, representadas pelo agronegócio
e de suas monoculturas de exportação
transforma ... os alimentos em
commodities intensificam, por diversas
estratégias, a superexploração dos
camponeses e suas famílias, e, entre eles,
dos jovens”. Assim,
... abordar a juventude camponesa
exige compreender o território do
campo para muito além de um espaço
de produção agrícola, em
contraposição à produção industrial,
de uma cultura rústica versus cultura
moderna, ou de um lugar sem
trabalho, para um espaço onde se
pode produzir, para viver com
dignidade, para citar algumas
dicotomias. O campo como lugar de
vida, não se configura estando em
extinção, mas sim como território
Bertoncello, J., Jaber-Silva, M. T., & Silva, R. A. (2020). Juventudes Camponesas das Comunidades Zé Alves e Laranjal no
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onde se forma a juventude
camponesa, de múltiplas
possibilidades, de novas relações
entre seres humanos e entre estes e a
natureza, de novas articulações e
possibilidades de
produção/reprodução da vida. (Leão
& Antunes-Rocha, 2015, p. 26).
Molina (2015, p. 15) afirma que
“ficar ou sair não é simplesmente uma
escolha ao bel-prazer dos jovens, mas uma
difícil decisão permeada por
condicionantes estruturais sobre os quais
os jovens individualmente não conseguem
incidir no sentido de superá-las”.
Consideramos que ainda existem jovens
que fazem a opção de continuarem a vida
no campo, como é o caso de alguns jovens
de Alves e Laranjal. Porém, as
condições de vida no campo, a falta de
acesso às políticas blicas específicas
para a educação do campo, a falta de
alternativas profissionais que possam
garantir emprego e renda na agricultura
familiar ou fora dela (Freitas & Santos,
2015), somadas às dificuldades
vivenciadas por seus familiares fazem com
que muitos tenham que sair em busca de
novas oportunidades na cidade.
Para uma melhor compreensão desta
pesquisa que resulta de uma dissertação de
mestrado, primeiro apresentamos as
escolhas metodológicas, posteriormente as
políticas públicas para as juventudes
camponesas, algumas percepções sobre os
dilemas entre sair e ficar vivenciados pelas
juventudes camponesas das comunidades
Alves e Laranjal, e por fim, as
considerações dessa trama vivenciadas
pelas juventudes dessas duas Comunidades
localizadas no Cerrado do Pantanal.
Escolhas metodológicos da pesquisa
A metodologia é entendida como o
fio condutor da pesquisa, é a explicação
detalhada de todas as ações a serem
desenvolvidas, ou seja, os instrumentos, as
técnicas, o tempo previsto, a equipe de
pesquisadores/as, o tratamento dos dados
que compõem os resultados, enfim, é o
momento de apresentar detalhadamente
todo caminho percorrido. Em relação ao
fazer pesquisa, Brandão (2003, p. 10)
afirma que existem algumas diferenças
sobre “... como se pensa o fazer pesquisa
científica e como se faz a pesquisa
científica que se pensa”. Deve haver outra
bastante próxima entre “como se faz uma
pesquisa e como nós vivemos a pesquisa
que fazemos”. Compreendemos que não
existe um manual a seguir acerca do
processo investigativo durante a pesquisa,
mas a escolha do método e da metodologia
são fatores determinantes para se chegar ao
que foi proposto. Brandão (2003, p. 23)
acrescenta que nesse fazer e pensar, a
pesquisa “em uma sociedade marinada pela
desigualdade, nenhuma pesquisa é isenta
de neutralidade”.
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Na concepção de Minayo (2009), a
metodologia é o caminho do pensamento,
ou seja, a prática exercida sobre uma
determinada realidade, a ela é incluída a
teoria da abordagem (o método), os
instrumentos da pesquisa (as técnicas) e a
criatividade do pesquisador (sua
experiência, sua capacidade e sua
sensibilidade). Portanto, a metodologia “...
é muito mais que técnicas. Ela inclui as
concepções teóricas da abordagem,
articulando-se com a teoria, com a
realidade empírica e com os pensamentos
sobre a realidade” (ibidem, p. 15). A
realidade deste contexto pesquisado
carrega as marcas da violência, da violação
de direitos, de injustiças sociais e
ambientais e de inúmeros conflitos
socioambientais silenciados. Assim,
utilizamos nesta pesquisa de mestrado o
método qualitativo acompanhado da
metodologia denominada Mapa Social
(Silva, 2011).
O método qualitativo trabalha com
um universo muito particular de
aspirações, crenças, valores e atitudes,
aprofunda-se no mundo das significações,
das ações humanas, respondendo a
questões muito particulares das relações
sociais estabelecidas em sociedade que não
pode ser quantificada (Minayo, 2009). Esse
conjunto de fenômenos é entendido “...
como parte da realidade social, pois, o ser
humano se distingue não por agir, mas
por pensar sobre o que faz e por interpretar
suas ações dentro e a partir da realidade
vivida e partilhada com seus semelhantes”
(ibidem, p. 21).
Esse método faz com que o/a
pesquisador/a tenha uma melhor
compreensão do sujeito estudado,
permitindo a participação em todo o
processo, ou seja, é ao mesmo tempo o
sujeito e o objeto da pesquisa.
Possibilitando ainda uma relação de
proximidade entre pesquisador e
pesquisados, os pesquisados estão livres
para dialogar com o pesquisador sobre os
assuntos relacionados com o objeto de
estudo, além disso, as respostas são
subjetivas, que o propósito não é a
representatividade numérica, mas
compreender um determinado grupo social.
Ao contrário do que muitos pensam, o
envolvimento entre o/a pesquisador/a e
pesquisados/as é de fundamental
importância. Para Moreira (2017, p. 65-
66), os participantes da pesquisa “...o
parceiros/as com quem estabelecemos uma
relação de horizontalidade, quebrando a
lógica hierárquica da ciência moderna de
sujeito (pesquisador/a) e objeto
(pesquisado)”.
A metodologia "Mapa Social" tem
como objetivo dar visibilidade aos
diferentes grupos sociais de Mato Grosso,
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baseia-se na autoidentificação e nas
autonarrativas dos próprios sujeitos
pesquisados (Silva, 2011; Jaber-Silva,
2012). Os mapas criados na perspectiva
dos movimentos sociais, das populações
tradicionais, das comunidades impactadas
pelos projetos desenvolvimentistas torna-se
um mecanismo de luta e resistência (Porto,
Pacheco & Leroy, 2013).
Assim, buscando responder aos
objetivos propostos nesta pesquisa, três
momentos distintos que se complementam
foram realizados. Primeiro, foi realizado o
I Mapeamento Social do Cerrado do
Pantanal seguido das leituras teóricas; o
segundo momento mais introspectivo,
foram realizadas as entrevistas com um
roteiro de perguntas semiestruturadas com
12 jovens, sendo 6 da comunidade
Alves e 6 da comunidade Laranjal, além
das entrevistas com moradores/as
antigos/as para compreender o contexto
histórico das comunidades, posteriormente
no terceiro momento realizamos o II
Mapeamento Social do Cerrado do
Pantanal.
Políticas blicas para as juventudes
camponesas
Historicamente, a inclusão das
juventudes nas políticas públicas
brasileiras é recente, mais recente ainda
refere-se às políticas para as juventudes
camponesas. Freire e Castro (2010, p. 150)
afirmam que esse movimento começa a
ganhar força a partir da década de 1990
quando “... se configurou o foco do poder
público sobre a juventude no Brasil, que
políticas o formuladas e implementadas,
que a sociedade se engaja com mais vigor
no debate e na intervenção social”.
Conforme o Guia de Políticas Públicas de
Juventude (Brasil, 2006, p. 05) “entender
as singularidades e as peculiaridades das
juventudes e garantir direitos a essa
geração são fatores fundamentais para
consolidar a democracia no Brasil, com
inclusão social”. Ressalta também que:
As políticas públicas passaram a
incluir as questões relacionadas à
juventude, de forma mais consistente,
por motivos emergenciais, que os
jovens são os mais atingidos pelas
transformações no mundo do
trabalho e pelas distintas formas de
violência física e simbólica que
caracterizam o século XXI. (Brasil,
2006, p. 06).
Consideramos que na tentativa de
garantir direitos para as juventudes, muitos
foram os programas, projetos e ações
pensados pelo Governo Federal, porém,
muitas dessas ações ainda encontram-se
somente no papel. Segundo o Guia de
Políticas Públicas (2006) existia 19
executados por diferentes Ministérios, que
constituía a Política Nacional de Juventude
no País. Porém, apenas três programas
estavam vinculados ao acesso à terra,
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sendo: o Programa Nacional de Crédito
Fundiário (Programa Nossa Primeira
Terra) desde 2003; o Programa Pronaf
Jovem criado em 2004 e o Programa
ProJovem Campo Saberes da Terra
(2005), e dois ao acesso à educação, entre
eles: o Programa Nacional de Educação na
Reforma Agrária (PRONERA) e o
Programa Nacional de Educação do
Campo (PRONACAMPO).
O Programa Nossa Primeira Terra
correspondia a uma linha de financiamento
dentro do Programa Nacional de Crédito
Fundiário, destinada aos jovens
agricultores e estudantes de Escolas
Agrotécnicas e centro familiares de
formação por alternância, com idade entre
18 a 29 anos que queiram permanecer no
campo juntamente com seus familiares ao
invés de migrarem para as grandes cidades,
promovendo assim, o empoderamento e
incentivo à sucessão no campo (Brasil,
2006).
O Pronaf Jovem configura-se como
uma linha de financiamento do Programa
Nacional de Agricultura Familiar, criada
para atender aos filhos dos agricultores
entre 16 e 25 anos, que tenham concluído
ou estejam cursando o último ano em
centros familiares rurais de formação por
alternância, ou em escolas técnicas
agrícolas de nível médio ou que tenham
participado de curso ou estágio de
formação profissional, incentivando a se
manterem e permanecerem no campo
(Pronaf, 2004).
O Programa ProJovem Campo
Saberes da Terra visava oferecer
qualificação profissional e escolarização
aos jovens de 18 a 29 anos, que não
concluíram o ensino fundamental,
contribuindo para o acesso e a qualidade da
educação à essa parcela historicamente
excluídas do processo educacional,
respeitando as características, necessidades
e pluralidade de gênero, étnico-racial,
cultural, geracional, política, econômica,
territorial e produtivas (Brasil, 2006).
Tínhamos também o PRONERA que era
uma Política Pública que visava garantir a
implementação e manutenção da Educação
do Campo, e o PRONACAMPO, que
consistiu em um conjunto de ações
articuladas para o apoio e implementação
das políticas de educação do campo nos
sistemas de ensino (Porto, 2016).
Consideramos que apesar da
existência dos programas, a grande maioria
dos jovens que tentaram permanecer no
campo não tem ou não tiveram acesso a
esses programas. Ferreira e Alves (2009)
ressaltam que os programas ainda eram
insuficientes para a produção de mudanças
significativas perante os desafios referentes
ao acesso ao trabalho e educação no
campo, ou seja, não possibilitam opções
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viáveis para a construção de seus projetos
de vida. Para Molina (2015), a
impossibilidade do acesso a terra, a
ausência de políticas públicas que lhes
garantam condições mínimas de
sobrevivência nos territórios de origem,
pressionam a continuarem rotas de
migração em busca de espaço para sua
reprodução material.
Juventudes camponesas: dilemas entre
ficar ou sair
Queremos ficar aqui até o resto da
nossa vida,
nascemos e fomos criados aqui, nós
queremos viver aqui [...]
(Jaime Santana Filho, Comunidade
Zé Alves).
Nos caminhos percorridos por
Alves e Laranjal, buscou-se conjuntamente
com as percepções das juventudes sobre os
conflitos socioambientais e as mudanças
climáticas; compreender quais fatores têm
influenciado a permanência ou saída das
juventudes das comunidades pesquisadas.
Consideramos que aos jovens das
comunidades pesquisadas e tantos outros
espalhados pelo território brasileiro foi e
continua sendo negado o direito de
escolher entre ficar ou sair do campo.
Assim, podemos mencionar que as
questões imbricadas entre ficar ou sair são
bem mais complexas do que a simples
lógica naturalizada na grande maioria das
pesquisas que evidencia somente o desejo
dos jovens em não permanecer no campo.
Eu saí e voltei, quando tinha
dificuldade na casa ou no sitio, eu era
o mais velho então era eu que saía
para trabalhar, ver se conseguia
alguma coisa para manter eles aqui,
quando conseguia um emprego o que
eu ganhava dividia, ficava com
metade e mandava metade pra casa.
Daí para ficamos nesse processo
migratório, nunca paro. Antigamente
jovens da minha idade tinha quase
uns trinta, hoje estão quase todos na
cidade, mas é difícil um final de
semana que esses caras não estão
aqui. O mais engraçado que o sonho
de todos eles é ganhar dinheiro e vir
embora, ninguém fala que quer morar
na cidade, eu vou ganhar um dinheiro
e montar um negocinho e voltar para
a comunidade (Edmar Viana Pereira -
Zé Alves).
Eu sempre morei aqui, eu fui morei
seis meses para lá e voltei, porque
não me acostumei cidade, eu não
gostei, não acostumei, eu trabalhava
no mercado. Agora, agora eu não
pretendo voltar para terminar os
estudos” ... Tem muito jovem indo
embora do campo. Os jovens têm ido
embora por falta de serviço, de
estudo, tem bastante jovens sem
estudar, prefere trabalhar ali na
fazenda do que estudar (Maria do
Carmo Moura Ferreira Araújo -
Laranjal).
Na tentativa de desconstruir essa
imagem desinteressada pelo campo serão
apresentadas as narrativas que expressam o
sonho e o desejo das juventudes de
Alves e Laranjal em permanecerem na
comunidade, no entanto, com a falta de
políticas públicas, acesso à terra, ao lazer,
à educação e ao trabalho, muitos acabam
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sendo obrigados a migrarem em busca de
novas oportunidades. Há uma tendência no
contexto brasileiro, marcado por exclusões
e desigualdades com as populações que
vivem no campo, como se fosse uma parte
atrasada e fora de lugar no almejado
projeto de modernidade, assim não haveria
necessidade de políticas públicas
específicas, a não ser do tipo
compensatório à sua própria condição de
inferioridade (Fernandes, Cerioli &
Caldart, 1998).
Para superar essa realidade faz-se
necessário intensas lutas coletivas que
pressionem o Estado e o façam agir por
meio das políticas públicas específicas que
lhes garantam condições mínimas de
sobrevivência nos territórios de origem,
criando de fato condições para que os
mesmos possam realmente escolher entre
viver no campo (Molina, 2015) ou não. Em
Alves alguns jovens encontraram no
associativismo e no cooperativismo uma
forma de obter renda para permanecerem
no campo.
A cooperativa fez com que nós
ficássemos na comunidade, a gente
acreditou que dava certo
comercializar através da cooperativa
(Edmar Viana Pereira - Zé Alves).
A educação da escola e a formação
do movimento, formação de base que
a gente fala na Pastoral da Juventude,
pela CPT, incentivaram que era
possível sobreviver aqui sem você ter
que ir para a cidade, a gente foi
pegando os conhecimentos também,
muitas viagens, muita articulação em
rede, a gente conseguiu buscar esses
caminhos da comercializar por meio
desses programas do Governo
Federal, antes era 4.500 o PAA, logo
em seguida em 2009 entrou o PNAE,
que antes de tudo isso nós
trabalhava com a feira, em 2000 nós
fazia rapadura e entregava para o
mercado. Então começamos a ver
que a rapadura era um potencial,
sempre plantamos mandioca, horta a
mamãe, produzimos banana e
começamos a ir para a feira em
Poconé, depois começamos atender
alguns mercados, levava os produtos
para a feira para atender os feirantes
e um pouco a mais para atender o
mercado, e aí a gente começou a ter
essa renda, nós como jovem não
tinha aquela vidona, mas pelo menos
para atender as necessidades sicas.
Depois começamos a ir para outras
comunidades incentivando o
associativismo e o cooperativismo
(Jaime Santana Filho - Zé Alves).
Para Leão e Antunes-Rocha (2015, p.
21) estar organizado em associativismo e
cooperativismo significa “... organizar sua
existência na possibilidade de produzir e
reproduzir sua vida no território camponês,
entendido aqui como um espaço
material/imaterial de produção da vida ...
e da cultura. As narrativas das juventudes
de Zé Alves demonstram que é possível
permanecer no campo e sobreviver da
produção no próprio território, no entanto,
nem todos possuem acesso à terra e aos
programas governamentais evidenciados
como o PNAE (Programa Nacional de
Alimentação Escolar) e PAA (Programa de
Aquisição de Alimentos).
Bertoncello, J., Jaber-Silva, M. T., & Silva, R. A. (2020). Juventudes Camponesas das Comunidades Zé Alves e Laranjal no
Município de Poconé-MT: dilemas entre ficar e sair do campo...
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Segundo Souza-Esquerdo e
Bergamasco (2014), historicamente, a
agricultura familiar sempre foi excluída
das políticas públicas, uma vez que os
recursos eram centrados apenas na
propriedade privada e na monocultura de
exportação. O programa PAA estimula a
produção pela agricultura familiar e
incentiva a comercialização para que
populações em situação de insegurança
alimentar tenham acesso aos alimentos de
qualidade, e o PNAE obriga as escolas
estaduais e municipais a utilizar no mínimo
30% dos recursos financeiros repassados
pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento
da Educação (FNDE) para adquirir
alimentos da agricultura familiar.
Diferente de Alves, as juventudes
de Laranjal expropriados do território
juntamente com seus familiares não têm
acesso a esses programas, assim são
obrigados a vender a força de trabalho para
os latifundiários ou migrarem para a cidade
em busca de melhores condições de vida.
Eu fui para cidade, voltei porque
estava cansado da cidade, lá eu só
trabalhava. Estudei até a quarta série,
eu parei porque não tinha condição,
tinha que trabalhar. Eu comecei a
trabalhar na fazenda com 16 anos. Eu
até tenho vontade de estudar, mas
não acho mais tempo, oportunidade
de ir estudar (Gonçalo Araújo -
Laranjal).
... eu já fui para a cidade fiquei três
meses, mas não me acostumei. Eu
estudei até o quarto ano, tinha que
trabalhar para ajudar no sustento da
casa, comecei com 16 anos na
fazenda, na diária e nunca assinou
carteira. Chega no final do ano não
tem direito a nada (Almir José da
Costa - Laranjal).
As narrativas demonstram as
dificuldades das juventudes quilombolas
em alcançar os níveis elevados de
escolaridade, as situações de injustiças e a
violação de direitos. Para compreender a
realidade das juventudes do campo, suas
perspectivas futuras, é preciso levar em
conta que estão inseridos em uma estrutura
social baseada pela concentração de terra e
por uma concepção de desenvolvimento
voltado para a produção agrícola de
exportação. Esse modelo de
desenvolvimento tem contribuído para a
saída das juventudes para os centros
urbanos em busca de qualificação
profissional, trabalho e renda para ajudar a
família. As narrativas acima demonstram a
realidade de dois irmãos que tiveram que
escolher entre estudar e trabalhar.
Outro aspecto importante a ser
sublinhado, refere-se ao fato de
trabalharem desde os 16 anos sem carteira
assinada, revelando um quadro de injustiça
social e econômica que perduram
aproximadamente dez anos. Diante dessa
situação, os jovens nada podem fazer,
que vender a mão de obra para os
latifundiários ainda é a única opção de
emprego na região. Apesar da existência de
Bertoncello, J., Jaber-Silva, M. T., & Silva, R. A. (2020). Juventudes Camponesas das Comunidades Zé Alves e Laranjal no
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políticas públicas para agricultura familiar,
esporte, cultura e educação, essas ainda
não chegaram no quilombo. Esse modelo
de sociedade vigente baseado no acúmulo
de capital por uma pequena parcela da
população gera “... desigualdade na
distribuição da riqueza material e
simbólica produzida no campo, gerando
um quadro de resultados sociais e
educacionais extremamente desfavoráveis
... (Wollz et al., 2014, p. 106) para
quilombolas, indígenas, camponeses dentre
outros que habitam nos territórios.
Entendemos que os jovens quando
deixam o campo não estão negando sua
identidade, não saem porque preferem
viver na cidade, mas pela desvalorização
ou ausência de trabalho, precariedade ou
inexistência de escolas, falta de
oportunidade de qualificação profissional,
perspectiva de vida no campo, e ainda
pelos preconceitos e estereótipos que
multiplicam-se cotidianamente. Em relação
aos preconceitos, os jovens da comunidade
Laranjal sofrem por ser do campo, ser
negro e ser quilombola.
Moreira (2017) afirma que os
quilombolas padecem com consequências
sociais e ambientais deste sistema
econômico desigual, as discriminações,
exclusões e preconceitos evidenciam a
relação entre classe social/poder
econômico e preconceito/racismo,
tornando-se impossível falar de realização
integral da cidadania e plenitude da
democracia em um sistema capitalista
meritocrático que expropria e expulsa os
jovens do campo.
Eu penso em mudar para a cidade
porque aqui não tem como continuar,
aqui não tem como fazer uma
faculdade. Meus pais querem que eu
faça a distância, mas vamos ver o que
fica mais fácil. Eu tenho vontade de
ir para cidade por causa dos estudos
... alguns jovens acabam o ensino
médio e acaba ficando por aqui,
outros vão embora, a maioria vai
embora porque quer trabalhar (Jane
de Oliveira - Zé Alves).
Os jovens vão embora por causa do
emprego, eles vão procurar emprego
melhor na cidade, porque aqui não
tem, quando termina fica em casa
parado, não tem o que fazer. Minha
irmã foi embora porque ela quer
estudar, que ele ainda não
conseguiu, mas fazendo um curso
para poder trabalhar. Tem muita
gente indo embora, os filhos vão e os
pais fica. Antes os pais não deixava
ir, agora deixa para os filhos ter um
futuro melhor ... (Ireni da Silva
Castro - Laranjal).
A migração campo-cidade está
relacionada principalmente a ausência de
oportunidade de escolarização e trabalho, a
Cooperativa Mista dos Produtores Rurais
de Poconé - COMPRUP
iii
representa para
as juventudes uma possibilidade de
melhores condições de vida em um tempo
futuro. O descaso em efetivar políticas
públicas eleva a situação de miséria das
juventudes. Dados divulgados pelo
Bertoncello, J., Jaber-Silva, M. T., & Silva, R. A. (2020). Juventudes Camponesas das Comunidades Zé Alves e Laranjal no
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programa "Brasil sem Miséria" apontam
que de um total de 8,2 milhões de jovens
do campo, 2,3 milhões vivem em situação
de miséria, com uma renda mensal de
aproximadamente 70 reais ou menos
(Wollz et al., 2014). Para os autores a
desvalorização da produção familiar
causada pela produção em grande escala, o
avanço do agronegócio, a distribuição
desigual da riqueza material e a
desvalorização simbólica dos diferentes
grupos sociais nos territórios produzem
efeitos sociais e educacionais
desfavoráveis para os jovens que tentam
viver no e do campo.
Historicamente, as populações que
vivem no campo foram amplamente
excluídas de atenção por parte das políticas
globais e mesmo específicas para o campo
(Faria & Alves, 2015, p. 156),
principalmente quando se trata das
políticas educacionais. Desta forma, a
educação ofertada no campo que se iniciou
nos anos de 1930, se intensificou nos anos
de 1950-1960, e se estendeu até os anos de
1970 desconsiderava os saberes do campo
e considerava os interesses do mundo
capitalista.
Apenas na década de 1980 com o
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST), que nasce com o apoio de
Igreja Católica, da Comissão Pastoral da
Terra CPT e os Sindicatos Rurais, inicia-
se o processo de redemocratização do país
e as lutas se fortalecem, esse movimento
passou a exigir das autoridades uma
Educação do Campo, que se contrapunha a
educação rural vigente (Arroyo &
Fernandes, 1999; Porto, 2016).
Afirmam que esse movimento
convoca a I
iv
Conferência Nacional por
uma Educação Básica do Campo, a
conferência aconteceu em Luziânia-GO, de
27 a 30 de julho de 1998 e contou com a
participação dos seguintes movimentos
sociais: Conferência Nacional dos Bispos
do Brasil (CNBB), o Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), a
Organização das Nações Unidas para a
Infância (UNICEF), a Organização das
Nações Unidas para a Educação Cultura
(UNESCO) e a Universidade de Brasília
(UNB).
Durante a Conferência a principal
discussão era como garantir que todas as
pessoas que vivem no meio rural possam
ter acesso a uma educação de qualidade, e
voltada para os interesses da vida no
campo, além disso, ficou decidido que a
expressão campo substituiria o termo meio
rural tendo como objetivo:
... incluir no processo da conferência
uma reflexão sobre o sentido atual do
trabalho camponês e das lutas
sociais; e culturais dos grupos que
hoje tentam garantir a sobrevivência
desse trabalho. Mas, quando se
discutir a educação do campo se
estará tratando da educação que se
Bertoncello, J., Jaber-Silva, M. T., & Silva, R. A. (2020). Juventudes Camponesas das Comunidades Zé Alves e Laranjal no
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volta ao conjunto dos trabalhadores e
das trabalhadoras do campo, sejam os
camponeses, incluindo os
quilombolas, sejam as nações
indígenas, sejam os diversos tipos de
assalariados vinculados à vida e ao
trabalho no meio rural. Embora com
essa preocupação mais ampla,
uma preocupação especial com o
resgate do conceito de camponês.
Um conceito histórico e político...”.
(Fernandes, Cerioli & Caldart, 1998,
p. 09).
Os movimentos sociais fortaleceram
a educação do campo que deixou de ser
educação rural para se tornar educação do
campo para os povos do campo, com o
campo e não para o campo, assim, a
educação do campo nasce em
contraposição à educação rural. Uma
educação que seja: “No: o povo tem direito
a ser educado no lugar onde vive; Do: o
povo tem direito a uma educação pensada
desde o seu lugar e com a sua participação,
vinculada à sua cultura e às suas
necessidades humanas e sociais” (Caldart,
1999, p. 25).
a II Conferência Nacional por um
uma educação do Campo conforme Caldart
(2013) foi realizada em julho de 2014, com
mais de mil participantes representados por
39 entidades, incluindo representantes de
órgão de governo, organizações sindicais
de trabalhadores/as rurais e de
professores/as, além dos movimentos
sociais camponeses e escolas de
comunidades do campo. A conferência
teve como lema “Educação do Campo:
direito nosso, dever do Estado”, onde
expressou a “... luta pelo acesso dos
trabalhadores do campo à educação é
específica, necessária e justa, deve se dar
no âmbito do espaço público, e o Estado
deve ser pressionado para formular
políticas que a garantam massivamente,
levando à universalização real e não
apenas princípios abstratos” (ibidem, p.
260). Apesar da existência desses
movimentos de luta, as comunidades
pesquisadas continuam lutando por uma
educação do campo.
Hoje a nossa luta é por uma educação
do campo, uma educação que
respeite os conhecimentos, a cultura
de acordo com a nossa realidade.
que hoje, eu vejo que a educação que
as nossas crianças estão recebendo,
como uma educação no campo, uma
educação jogada. Para começar, eles
saem da comunidade para ir para um
pólo, uma educação pensando pelo
capitalismo que busca desarticular o
campo ... Nós queremos uma
educação voltada para a nossa
realidade, nós lutamos para essa
educação que é do campo, de acordo
com a nossa realidade. A educação
contribuiu e é fundamental para a
permanência dos jovens no campo, a
educação do jovem tem que caminhar
junto com os demais afazeres,
articulada com todos os segmentos
do campo, a educação na associação,
na cooperativa, na produção, no
conhecimento de pesquisa, tem que
estar junta. A gente vai adquirir
conhecimentos, mas a gente tem que
retornar para a base esse
conhecimento, tem que desenvolver
aqui na comunidade, na cooperativa,
na associação. Eu não vejo outro
caminho se não for pela educação, a
única saída nossa e da nação é ter
Bertoncello, J., Jaber-Silva, M. T., & Silva, R. A. (2020). Juventudes Camponesas das Comunidades Zé Alves e Laranjal no
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conhecimento, e a educação ela está
em primeiro lugar ... (Jaime Santana
Filho - Zé Alves).
Diante da narrativa das juventudes,
pode-se reafirmar que a educação ofertada
no campo, na grande maioria, encontra-se
desvinculada dos interesses do campo. A
luta não é para “... uma escola no campo
ou para o campo, nem uma escola da
cidade no campo, mas uma escola do
campo, com a cultura, os valores, a luta do
campo” (Arroyo & Fernandes, 1999, p.
10), uma educação que não ocorra apenas
entre quatro paredes, quatro horas por dia e
cinco dias por semana, mas uma educação
pensada a partir das vivências cotidianas,
vinculada na associação, na cooperativa, na
produção e em todos os segmentos da
comunidade.
Algumas considerações da pesquisa
Consideramos nesta pesquisa que o
dilema entre sair ou ficar no campo
vivenciado pelas juventudes das
comunidades Zé Alves, Laranjal e tantas
outras espalhadas pelo território mato-
grossense, não estão relacionadas ao fato
de negarem sua identidade camponesa,
mas a falta de acesso a terra para plantar e
colher, trabalho, educação e as políticas
públicas que garantam a permanência e a
sobrevivência na terra.
Assim, os sujeitos jovens que
permanecem no campo são obrigados a
silenciar e a venderem sua força de
trabalho como mensalistas ou diaristas por
míseros salários para os donos dos
latifúndios. Outros tentaram e tentam
reconstruir suas histórias na cidade, mas a
vida agitada dos grandes centros faz com
que voltem para a comunidade,
permanecendo em condições de
vulnerabilidade.
Portanto, as cenas dessa história
revelam sempre um sofrimento de sujeitos
concretos que perdem seus territórios, suas
casas e precisam resistir para reconstruir
novas histórias. Desse modo, os caminhos
e descaminhos trilhados nessa pesquisa
com as juventudes não foram suficientes
para mudar a realidade desse grupo, que
grita pela terra para poder nela permanecer,
mas possibilitaram desconstruir essa
imagem das juventudes desinteressadas
pelo campo como muitos estudos têm
afirmado.
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i
Pesquisa com resultados parciais publicado como
resumo expandido em anais recuperado de:
http://anais.anped.org.br/regionais/sites/default/files
/trabalhos/5/3380-
TEXTO_PROPOSTA_COMPLETO.pdf
ii
Nesta pesquisa ao adotamos o conceito de
“juventudes” temos como embasamento os estudos
de Novaes (1998, 2006) que destaca que o processo
de construção da categoria juventude está
intrinsecamente ligado aos aspectos sociais,
econômicos, culturais e políticos que permeiam a
sociedade, dessa forma o conceito de juventude
pode estar relacionado a diversos fatores que
influenciam em sua definição. Novais (1998, 2006)
também aponta que a partir dos anos de 1980 e
1990, o debate sobre a juventude no Brasil trouxe o
olhar para além dos cortes etários, assim não se fala
mais em juventude, mas em juventudes no plural. A
partir dessa perspectiva, adotamos o critério da
autoidentificação defendida por Silva (2011) como
um dos princípios da metodologia Mapa Social,
assim como por Trindade (2015), que explicita que
a autoidentificação das “juventudes” deve partir dos
moradores das comunidades pesquisadas.
iii
A COMPRUP surgiu em 1992 como uma
necessidade de fornecer opções de renda para as
populações que vivem nas áreas de reforma agrária
e em comunidades tradicionais de Poconé,
fortalecendo a produção e comercialização dos
produtos. A versatilidade do baru ou Cumbaru
(Dipterys Alata) árvore nativa do Cerrado, chamou
a atenção da cooperativa, que passou a estimular
seus associados a se dedicarem à coleta e ao
beneficiamento dessa planta, garantindo renda extra
para mais de 200 famílias de pequenos
agricultores16da região. A cooperativa possui
equipamentos (forno, mesa, torradeiras,
embaladora, prensa e embalagens) para o
beneficiamento do Cumbaru.
iv
As discussões de preparação da I Conferência
iniciaram-se em agosto de 1997, logo após o I
Encontro Nacional dos Educadores e Educadoras da
Reforma Agrária (Enera), realizado pelo
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
(MST) em julho daquele ano, evento em que
algumas entidades desafiaram o MST a levantar
uma discussão mais ampla sobre a educação no
meio rural no brasileiro (Caldart, 2013, p. 258).
Bertoncello, J., Jaber-Silva, M. T., & Silva, R. A. (2020). Juventudes Camponesas das Comunidades Zé Alves e Laranjal no
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Informações do artigo / Article Information
Recebido em : 16/01/2020
Aprovado em: 07/04/2020
Publicado em: 13/08/2020
Received on January 16th, 2020
Accepted on April 07th, 2020
Published on August, 13th, 2020
Contribuições no artigo: As autoras foram as
responsáveis por todas as etapas e resultados da
pesquisa, a saber: elaboração, análise e interpretação dos
dados; escrita e revisão do conteúdo do manuscrito
e; aprovação da versão final publicada.
Author Contributions: The author were responsible for
the designing, delineating, analyzing and interpreting the
data, production of the manuscript, critical revision of the
content and approval of the final version published.
Conflitos de interesse: As autoras declararam não haver
nenhum conflito de interesse referente a este artigo.
Conflict of Interest: None reported.
Orcid
Jucieli Bertoncello
http://orcid.org/0000-0003-3750-9874
Michelle Tatiane Jaber da Silva
http://orcid.org/0000-0001-6328-5996
Regina Aparecida da Silva
http://orcid.org/0000-0002-2207-8437
Como citar este artigo / How to cite this article
APA
Bertoncello, J., Jaber-Silva, M. T., & Silva, R. A. (2020).
Juventudes Camponesas das Comunidades Zé Alves e
Laranjal no Município de Poconé-MT: dilemas entre ficar e
sair do campo. Rev. Bras. Educ. Camp., 5, e8255.
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e8255
ABNT
BERTONCELLO, J.; JABER-SILVA, M. T.; SILVA, R. A.
Juventudes Camponesas das Comunidades Zé Alves e
Laranjal no Município de Poconé-MT: dilemas entre ficar e
sair do campo. Rev. Bras. Educ. Camp., Tocantinópolis,
v. 5, e8255, 2020.
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e8255