Revista Brasileira de Educação do Campo
Brazilian Journal of Rural Education
ARTIGO/ARTICLE/ARTÍCULO
DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e8279
Tocantinópolis/Brasil
v. 5
e8279
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2020
ISSN: 2525-4863
1
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O que revelam os professores indígenas em início de
carreira? Um estudo da Escola Estadual Intercultural
Guateka Marçal de Souza - Aldeia Jaguapiru no município
de Dourados/MS
Queila Viana da Silva
1
, Andréia Nunes Militão
2
1
Escola Municipal Francisco Meireles. Secretaria Municipal de Educação de Dourados - MS. Aldeia Jaguapiru de Dourados,
746 b. Dourados - MS. Brasil.
2
Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul - UEMS.
Autor para correspondência/Author for correspondence: andreiamilitao@uems.br
RESUMO. O presente artigo origina-se de pesquisa de campo
realizada na Escola Estadual Intercultural Guateka Marçal de
Souza situada na Aldeia Jaguapiru na cidade de Dourados/Mato
Grosso do Sul. Tem por objetivo precípuo identificar elementos
considerados pelos professores iniciantes indígenas como
facilitadores ou dificultadores da sua iniciação na profissão. Para
captar as potencialidades e possíveis dificuldades características
do início da docência, a pesquisa foi organizada em três etapas:
1) análise documental do Projeto Político Pedagógico; 2)
Aplicação de questionário para todos docentes da escola
selecionada; e 3) Realização de entrevistas com cinco
professores iniciantes, ou seja, aqueles que estavam exercendo a
docência a menos de cinco anos. A análise dos dados coletados
indica dificuldades no exercício inicial da docência, dentre elas,
destaca-se a inexistência de material didático na língua guarani e
terena; ausência de apoio dos gestores (coordenadores
pedagógicos e diretores) e falta de solidariedade dos colegas
com mais experiência. Outra dificuldade constatada foi à
rejeição por parte da comunidade e de alunos com relação à
saída de docentes não indígenas para que os docentes indígenas
assumissem o cargo. Depreende-se que a inserção de professores
indígenas, além das dificuldades indicadas pela literatura da
área, revela um cenário com características próprias da realidade
indígena.
Palavras-chave: Formação de Professores, Professor Iniciante
Indígena, Iniciação à docência.
Silva, Q. V., & Militão, A. N. (2020). O que revelam os professores indígenas em início de carreira? Um estudo da Escola Estadual
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What do reveal indigenous teachers at the beginning of
their careers? A study by the Intercultural Guateka
Marçal de Souza State School - Jaguapiru village in the
city of Dourados/MS
ABSTRACT. This article originates from the field research
developed at the Intercultural Guateka Marçal de Souza State
School, in the Jaguapiru Village, in the city of Dourados/Mato
Grosso do Sul. Its main objective is to identify elements
considered by the indigenous beginning teachers as facilitators
or hinders of their initiation into the profession. To capture the
potentialities and possible difficulties characteristic of the
beginning of teaching, the research was organized in three
stages: 1) documentary analysis of the Pedagogical Political
Project; 2) application of a questionnaire to all teachers of the
selected school; and 3) conducting interviews with five
beginning teachers, that is, those who had been teaching for less
than five years. The analysis of the collected data indicates
difficulties in the initial exercise of teaching. Among them, we
highlight the lack of didactic material in Guarani and Terena;
absence of support from managers (pedagogical coordinators
and directors), and lack of solidarity from colleagues with more
experience. Another difficulty found was the community and
students' rejection regarding the departure of non-indigenous
teachers to allow indigenous teachers to assume the position.
Apparently, the insertion of indigenous teachers, in addition to
the difficulties indicated by the literature in the area, reveals a
scenario with specific characteristics of the indigenous reality.
Keywords: Teacher Education, Indigenous Beginning Teacher,
Teaching Initiation.
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¿Qué revelan los profesores indígenas al inicio de la
carrera profesional? Un estudio de la Escuela Estatal
Intercultural Guateka Marçal de Souza - Aldea Jaguapiru
en la ciudad de Dourados/MS
RESUMEN. Este artículo tiene su origen en estudios de campo
realizados en la Escuela Estatal Intercultural Guateka Marçal de
Souza, ubicada en la Aldea Jaguapiru en la ciudad de
Dourados/Mato Grosso del Sur. Su objetivo principal es
identificar elementos considerados por los profesores
principiantes indígenas como facilitadores u obstaculizadores de
su iniciación a la profesión. Para captar las potencialidades y
posibles dificultades propias del inicio de la docencia, la
investigación se organizó en tres etapas: 1) análisis documental
del Proyecto Político Pedagógico; 2) aplicación de un
cuestionario a todos los profesores de la escuela seleccionada; y
3) realización de entrevistas con cinco profesores principiantes,
es decir, aquellos que estaban practicando la docencia desde
hace menos de cinco años. El análisis de los datos recogidos
indica dificultades en el ejercicio inicial de la docencia, entre
ellas destacan la inexistencia de material didáctico en la lengua
guaraní y terena, la ausencia de apoyo de la administración
(coordinadores y directores pedagógicos) y la falta de
solidaridad de los compañeros con más experiencia. Otra
dificultad encontrada fue el rechazo de la comunidad y de los
estudiantes ante la salida de docentes no indígenas para que los
docentes indígenas ocuparan el puesto. Se desprende que la
inserción de profesores indígenas, además de las dificultades
señaladas por la literatura en el área, revela un escenario con
características propias de la realidad indígena.
Palabras clave: Formación del Profesorado, Profesor
Principiante Indígena, Iniciación a la Docencia.
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Introdução
A presente investigação decorre de
dois processos concomitantes.
Inicialmente a investigação realizada
sobre a formação inicial de professores de
duas universidades públicas situadas no
interior do Mato Grosso do Sul (Perboni
& Figueiredo, 2019; Perboni, Militão &
Figueiredo, 2020). Desta investigação
sobre as licenciaturas observou-se que a
conclusão do processo de formação inicial
traz consigo algumas inquietações. Dentre
elas, questiona-se como ocorre a inserção
dos professores indígenas em início de
carreira em uma escola intercultural
indígena? Dada a peculiaridade local da
formação de docentes indígenas nos
cursos de licenciaturas, que por
determinação legal tem preferência para
atuação como docentes nas escolas
indígenas, elegeu-se como lócus de
investigação a Escola Estadual
Intercultural Guateka Marçal de Souza na
Aldeia Jaguapiru situada no município de
Dourados, estado de Mato Grosso do Sul.
Tendo como pressuposto que
formação de professores “compreende um
processo complexo e contínuo que ocorre
ao longo da vida, em diferentes espaços
sociais, e não apenas em cursos de
licenciatura ofertados em instituições de
ensino superior” (Amorim, 2017, p. 277),
trataremos nesse trabalho de uma das
dimensões do campo da formação de
professores, portanto, da inserção de
professores indígenas na docência.
Corroborando com essa perspectiva, Papi e
Oliver Martins (2019) asseveram que:
... a Formação de Professores
enquanto campo de pesquisa pareça
referir-se a um elemento de maior
especificidade, o fato é que múltiplos
aspectos que estão relacionados a ela
podem ser abordados, possibilitando
estudos voltados para a Formação
Inicial e Continuada, o
Desenvolvimento Profissional
Docente, o período de Iniciação na
Docência, a Profissionalização, entre
outros, embora, ao final, eles acabem
convergindo para elementos que
dizem respeito ao professor, sua
formação e ação pedagógica. (Papi &
Oliver Martins, 2009, p. 252).
Trata-se, portanto, de período
complexo, pois como destacam Cunha,
Braccini e Feldkercher (2015, p. 74), “a
preparação que tiveram não responde às
exigências da docência e não foram para
ela preparados”, podendo inclusive levar a
“deserção” ou abandono da profissão por
parte dos professores iniciantes.
Ao mapearem as tendências das
pesquisas sobre professores iniciantes,
Cunha, Braccini e Feldkercher (2015)
identificaram oito dimensões: experiências
de acompanhamento e formação dos
iniciantes; construção dos saberes dos
professores iniciantes; saberes de
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professores/alunos na formação
inicial/estágios; inserção profissional,
políticas públicas e trabalho docente;
professores principiantes em contextos
desfavoráveis; professores iniciantes e a
educação digital; formação de formadores
dos iniciantes; iniciação à docência e a
pesquisa, e avaliação. Ao abordarmos a
inserção de professores indígenas em início
de carreira estamos tratando da dimensão
“professores principiantes em contextos
desfavoráveis”.
Considerando que “os primeiros anos
de docência são fundamentais para
assegurar um professorado motivado,
implicado e comprometido com a sua
profissão” (Marcelo Garcia, 2009, p. 20),
problematizar esse contexto pode
configurar contribuições para o campo da
formação de professores, bem como para a
melhoria das condições de trabalho
docente.
Ao contrário de outras profissões, ao
docente principiante, muitas vezes,
cabe o exercício profissional em
contextos complexos e exigentes na
sua dimensão político-social e
pedagógica. O abandono da profissão
é particularmente alto em escolas
interiorizadas e de zonas
desfavorecidas, pois os docentes
principiantes esmorecem frente às
dificuldades e as inseguranças
próprias de sua condição. Os
ambientes de trabalho são precários e
a valorização profissional muito
relativa. (Cunha, Braccini &
Feldkercher, 2015, p. 80).
Para Martins e Papi (2010, p. 01), o
termo professor iniciante “Refere-se ao
professor que se encontra no período
inicial de exercício da docência”. A
literatura indica tempos diferentes para
caracterizar o início da carreira, sendo
comum localizarmos o período de três a
cinco anos. Para Huberman (1992), o
período de inserção na carreira abrange os
três primeiros anos de exercício
profissional marcada pelos estágios de
sobrevivência, descoberta e desistência,
enquanto que Marcelo Garcia (2012)
considera os cinco primeiros anos.
Considerando que o contexto de
atuação profissional influencia e interfere
no exercio profissional, cada “professor
vivencia de forma diferenciada a
aprendizagem da profissão, processo esse
que se mediante as contradições
presentes na realidade educacional e
escolar” (Papi & Martins, 2010), optamos
por investigar o início da docência dos
professores indígenas. Para além das
dificuldades enfrentadas ao longo da
formação inicial, tínhamos como hipótese
que as dificuldades não cessam ao
ingressarem nas escolas indígenas.
Para Lima (2017, p. 64), O início
da vida profissional dos professores é um
período de grande expectativa, medos e
incertezas e pode ser considerada como a
fase de passagem do sujeito da condição
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de estudante para a condição de
professor”.
Importante ressaltar que a inserção
do professor ingena envolve am das
questões recorrentes aos demais docentes, a
dimensão da interculturalidade
caracterizada pelas diferenças culturais e
linguísticas entre seu espaço de formão
na universidade, espo de vincia na
comunidade e seu espaço de atuação
profissional nas escolas indígenas.
Em mapeamento da produção
acadêmica sobre professor iniciante não
se localizou nenhum trabalho sobre
professor iniciante em escolas indígenas
ou professores indígenas atuando em
escolas indígenas e não indígenas. A
ausência de trabalhos com esse foco
amplia a importância dessa investigação,
configurando um tema ainda pouco
explorado. Para tratar dessa
especificidade, recorreu-se ao uso de
questionários e de entrevistas com
professores indígenas. Assim, a próxima
seção apresenta os procedimentos
metodológicos adotados para a
investigação e a sistematização dos dados
coletados.
O que pensam os professores indígenas
da Escola Estadual Intercultural
Guateka Marçal de Souza da Aldeia
Jaguapiru sobre o início de carreira?
Após aplicação do questionário com
foco no perfil de formação e atuação dos
professores, respondidos por 18 dos 23
docentes da escola, foram selecionados
para a entrevista aqueles que tem menos
de cinco anos de atuação, caracterizando
o que a literatura da área situa como fase
inicial da carreira ou período de inserção
profissional.
Sobre o perfil dos professores
entrevistados, três eram pertencentes à etnia
terena e dois da etnia guarani atuando na
escola com vínculo empregatício celetista
e/ou contratado pelo Estado de Mato
Grosso do Sul. Perfil semelhante foi
identificado em pesquisa nacional por
Romanowski e Oliver Martins (2013, p.
06) “O ingresso na carreira da educação
básica ocorre de diversos modos, a saber:
eventual, precário/provisório/temporário e
por nomeação”.
As entrevistas foram balizadas por
questões atinentes a diversas temáticas. O
primeiro bloco versava sobre a decisão de
exercer a docência e a percepção sobre o
preparo para a atividade após a conclusão
da licenciatura. Por que decidiu ser
professor? Você se sente preparado para
exercer a docência?
Um segundo bloco de questões
problematizou as dificuldades enfrentadas
no início do trabalho docente e as
percepções iniciais sobre a escola, sobre
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os alunos e sobre os colegas de trabalho,
procurando traduzir a recepção inicial da
escola aos novos professores. Quais são
as principais dificuldades enfrentadas no
exercício da docência? Como foi sua
acolhida ao chegar a escola com
professor? Na sua chegada à escola, quem
o recebeu e orientou sobre o trabalho?
Você ministrou aula no seu primeiro dia
de trabalho à escola? Quais
foram suas
maiores descobertas no início da carreira
docente? Quais sugestões você daria para
quem está iniciando a carreira? Quais são
as vantagens dos seus trabalhos? Quais
são os
aspectos negativos do seu
trabalho?
Na sequência, tratou-se da prática
profissional em si, considerando esse
momento inicial da carreira, indagou-se
os entrevistados sobre as parcerias e
atividades realizadas com colegas de
trabalho, com a comunidade, com a
direção da escola ou com a universidade,
além das questões de infraestrutura do
espaço.
Nos momentos de dúvidas e
dificuldades a quem recorre? Você tem
conseguido realizar parceria com os
colegas na escola? Você mantém
vínculo/contato com a universidade onde
se formou? A infraestrutura da escola
interfere na realização do seu trabalho?
Como são os estudantes da escola/sala de
aula que trabalha?
Na sequência apresentamos os
dados coletados, organizados a partir da
sistematização destes três eixos: a opção e
o preparo para a docência; as percepções
iniciais sobre a inserção na docência e a
atuação profissional enquanto professores
iniciantes.
Ao serem questionados sobre as
motivações que os levaram à optar pela
docência as respostas indicam as seguintes
motivações: influência de professores do
ensino médio, a condição de oferta em
tempo parcial da licenciatura em Letras,
influência do período de estágio e ainda a
facilidade de conseguir trabalho
posteriormente. As falas dos sujeitos
entrevistados traduzem esses elementos:
Começou no ensino médio sexto
ano e nas aulas de língua inglesa,
com a professora Silvana até hoje eu
lembro o nome dela, despertou em
mim de querer aprender a falar a
ngua inglesa i a partir daí
surgiu, mas só que foi passando i
quando eu terminei 2005 , ensino
médio prestei vestibular i fiz o curso
de química, não deu certo em 2010,
eu voltei fiz letras e inglês terminei
em 2014, na Universidade Estadual
de Mato Grosso do Sul. (PI-01)
Na verdade, quando eu entrei na
universidade, eu queria ter feito,
sempre foi um sonho da minha mãe,
enfermagem mais na época meu
bebê era recém-nascido, então eu
optei, por fazer letras porque era
meio período. (PI 02)
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Sou professora na rede estadual da
Guateka daqui da aldeia e faz
então pouco tempo que eu como
professora formada né atuando em
sala de aula e tem sido uma
experiencia, não vou dizer
inovadora por que todo o ano tem
que pensar em alguma coisa
diferente aquilo que não deu certo
no primeiro ano, tentar ajeitar para
outro ano e então porque que eu
quis ser professora é na verdade
meio que aconteceu assim ser
professora, primeiro que eu não
queria ser professora, é das últimas
profissão que eu ia querer ser
porque eu tenho tias, irmãs que são
da área da licenciatura assim
atuando na área da educação infantil
e eu não achava nada interessantes,
com o passar do tempo, parece que
a vida vai te levando para os cursos
da licenciatura no meu caso não é
bem o que eu queria, mas quando eu
entro em sala de aula período de
estágio e as coisas vão acontecendo,
vou substituindo algumas aulas eu
fui me percebendo enquanto
professora e hoje eu olho e digo
que não seria não faria o que eu faço
hoje como professora eu me
encontrei mesmo a parte que eu
mais gosto é de estar atuando em
sala de aula na parte do campo por
isso que eu decidi ser professora. (PI
03)
Pelo campo de trabalho aqui ser
mais fácil, pra gente aqui
principalmente agente morador da
aldeia a saúde e educação são as
duas áreas que a gente consegue
serviço com mais facilidade
pensando nisso visando isso eu
optei por essa área. (PI 04)
É uma pergunta bem engraçada
porque na verdade eu não decidi ser
professora, eu me descobri
professora depois da graduação e no
primeiro contato com a sala de aula,
na verdade eu me descobri
professora eu não planejava ser
professora, não era meu projeto. (PI
05)
Ao inquirirmos sobre a preparação
para a docência, os cinco professores
expressaram que o tempo de duração da
licenciatura permitiu a apropriação de
conteúdos metodológicos e, como lidar
com os alunos, corroborando que ... as
dificuldades advêm mais das condições de
realização do trabalho pelo professor e do
que geradas por uma formação inicial
deficitária” (Romanowski, Oliver &
Martins, 2013, p. 13).
Um aspecto que chama atenção na
fala de PI-01é a concepção de formação
contínua, expressa na fala “professor não
pode parar no tempo, que você tem que
ficar sempre se atualizando vamos dizer
assim”. Entre as dificuldades, ressaltaram a
questão do não domínio da língua e da
ausência de material didático em línguas
indígenas e com foco na modalidade de
Educação de Jovens e Adultos. Para PI-03,
a segurança advém da experiência.
Sim, 2014. Eu penso assim que é na
prática que a gente aprende, porque
é nos quatro anos de graduação,
assim nós aprendemos a
metodologia como que a gente tem
que lidar com aluno o conteúdo todas
essas coisas mas meu primeiro ano
em 2016 como professora logo de
cara, assim não tive experiência,
ensino fundamental no município,
eu fui direto para o ensino médio eu
levei um choque porque no primeiro
dia, não sabia nem o que falar e foi
muito assim aos poucos fui me
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familiarizando com os alunos,
aprendi também que o professor não
pode parar no tempo, que você tem
que ficar sempre se atualizando
vamos dizer assim. (PI 01)
Não eu não acho, que não é a mesma
porque na coisa, quando você es
dentro aprende mais a teoria quando
você está dentro de uma faculdade,
sala de aula, lá você aprende mais a
teoria e quando você vem pra sala
de aula, a prática é diferente a
minha maior dificuldade que eu
encontrei com os falantes da língua,
porque o material didático que vem
não te suporte, pra você trabalha
com os alunos do EJA também tem
vários alunos não são alfabetizados,
então o material que vem da sede,
eu acho que não é adequado assim,
pra auxiliando o professor. (PI
02)
Agora depois desse tempinho
eu acho que a experiência de ano a
ano te um pouquinho mais de
segurança e eu acho que a cada ano
que passa eu acho um pouquinho
mais preparada, não totalmente
preparada sabe? Cabeça de aluno,
cabeça de cada ano que você recebe
os primeiros anos, segundo ano até
quando chega o terceiro ano estão
acostumados com você, quando
chega no primeiro ano eles chega de
maneira bem diferente então eu
digo, quando algo que não deu certo
ano passado eu tento não reproduzir
esse ano eu me adequo na sala, eu
me adequo na sala em cada sala é
uma discussão diferente tem coisa
que produz em cada sala produz,
outra não produz acho que estou um
pouquinho preparada. (PI 03)
Em relação a preparação do docente
na escola: Agora sim mas no início
foi bem complicado, por que você
aprende uma coisa na universidade,
chega na prática é totalmente
diferente, agora como já digamos
assim com cinco anos de docência
eu já estou preparada de novo
digamos assim você tem que estudar
constantemente, não pode parar
nunca, principalmente dos alunos do
ensino médio onde os conteúdos o
mais complexos tem que estar
estudando e se preparando sempre e
a falta de recursos né? (PI 04)
Hoje eu posso dizer que sim, a sala
de aula te uma estrutura para
você se encontrar na docência e eu
posso dizer que eu estou preparada
para exercer a função de professora.
(PI 05)
Ao perguntarmos quais são as
principais dificuldades, enfrentadas no
exercício da docência, obtivemos as
seguintes respostas:
A questão de a gente não para, não
para porque isso varia muito em
questão do período, tem suas
especificidades matutinas,
vespertino trabalho como professora
de língua portuguesa de manhã são
alunos bem críticos, como se a
gente vai passar o conteúdo assim
procuro me preparar, pesquisa
muito, porque naquela aula vai
surgir pergunta é diferente do
período vespertino que são mais
retraídos. (PI 01)
Foi difícil porque nós indígenas,
quando entramos na Guateka, não
fomos bem aceito, nem pela gestão
diretor digamos assim e também os
alunos, quando nós entramos
tivemos muita dificuldade porque os
alunos não aceitavam assim: que os
professores brancos saíssem, para
s podermos assumir. (PI 02)
Acho que uma das coisas assim
você fica pensando como é que
você vai dar a tua aula é pela falta
dos próprios recursos mesmo,
mesmo que seja mais dinâmico
material, como estamos vivendo
momentos de crise é um momento
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que se não tem o material suficiente
assim mesmo para criar uma boa
aula então acho não tem um
tempo esse momento que está
vivendo acaba querendo fugir da
maneira tradicional, mas acaba
caindo na mesma situação e lá na
frente falando com o giz e é isso.
(PI 03)
Que a gente não tem recurso para
trabalhar na escola pública, falta
muita coisa ainda não tem
laboratório a internet não é
suficiente não atende todo mundo
ainda. (PI 04)
Este primeiro bloco de questões
desvela a compreensão que a
aprendizagem da docência é um
continuum, não cessando com o término
do curso de licenciatura. A esse respeito,
André (2018) defende:
Esse movimento, no entanto, não
pode ficar restrito à iniciativa
pessoal; ele deve encontrar eco nas
instituições de ensino e nas políticas
educacionais. O principiante precisa
receber apoio e orientação no
ambiente de trabalho, de modo que
reconheça que a docência é uma
profissão complexa, que exige um
aprendizado constante e que para
enfrentar as questões e os desafios da
prática cotidiana é preciso continuar
estudando, recorrer a colegas mais
experientes, buscar apoio, dispor-se a
aprender. (André, 2018, p. 06).
Outro elemento importante ao
analisarmos o início da carreira docente,
refere-se a acolhida na escola como
professor. Tínhamos como hipótese que a
acolhida seria positiva, pois os
entrevistados foram alunos da escola e/ou
são pertencentes à comunidade indígena.
Para três sujeitos a acolhida foi positiva
(PI-01, PI-04 e PI-05). Apontam o
trabalho da coordenadora e o fato de ser
ex-aluna da escola como fatores
facilitadores na inserção profissional. Para
PI-01, “Graças à Deus que eu tive sorte de
ter uma coordenadora que me orientou
que é a professora Egiseli no primeiro ano
eu peguei as aulas, leitura e interpretação
de texto LPT, e então eu trabalhei com o
texto a estrutura de um texto dissertativo,
essas coisas mais voltada com a
interpretação do que da gramática”.
Expressa PI-04 que “Foi bem tranquilo,
por parte dos alunos, por parte da direção,
da coordenação foi bem tranquilo” e (PI
05) acrescenta “como eu fui aluna daqui
eu fui bem acolhida porque era um
retorno, então assim, eu fui bem acolhida
e foi bem tranquilo”. No entanto, dois
entrevistados manifestaram terem
vivenciado dificuldades: “Não fomos bem
acolhidos” (PI 02) e “Quando eu
cheguei à rede estadual foi um momento
de transição, vou especificar porque assim
a Escola Guateka ela caminha no perfil
50% indígena e 50% não indígena é o ano
que ela deixa de ser 50% indígena e ela
passa a ser 70% indígena e os outros 30%
não indígena quando eu chego” (PI – 03).
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Ao inquirirmos sobre quem o
recebeu e orientou como deveria ser o
trabalho docente, as repostas apontaram o
coordenador pedagógico, seguido da
direção, dos próprios professores e, por
fim, pela comunidade. O PI 01 destaca
“quem me apoio, ajudou muito no começo
foi a minha coordenadora e o professor
também né, teve um momento que eu
pensei cara, será que eu vou conseguir”. As
falas dos sujeitos apresentam estas
diferentes percepções quanto ao momento
inicial de inserção profissional na escola.
Nós tivemos assim, mais orientação
assim, por parte da coordenação né,
mas assim a gente não teve na
verdade os professores indígenas
tiveram que montar um grupo de
estudo a forma de trabalho
conhecer as dificuldades dos alunos.
(PI 02)
Própria comunidade mais que ao
longo do ano teve que fazer várias
conversas, muita conversa pra
ajudar até agente mesmo ajudar a
própria comunidade porque eu
estava entrando no lugar de alguém
que não era indígena, foi essa
resistência que eu percebi a
dificuldade a hora que tava entrando
mesmo. (PI 03)
Foi a direção, depois a coordenação
também, que estavam sempre
orientando a gente. (PI 04)
Quando eu cheguei quem me
orientou foi a coordenadora, quando
eu entrei em 2016 ela me
apresentou um pouquinho do plano
como funcionava, como era o andar
da metodologia, mas assim, foi bem
bom no meu ponto de vista. (PI
05)
Para compreender esse primeiro
momento do novo docente na escola foi
perguntado se ministraram aula no seu
primeiro dia de trabalho?
No primeiro dia eu levei um texto
deleite e pra com os alunos me
apresentei falei das minhas
metodologias, como é que eu vou
avaliar os alunos, como eu gosto de
fazer, analise eu peguei leitura
deleite e nós fizemos uma breve
análise. (PI 01)
o, primeiro eu conversei com
os meus alunos pra conhecer
eles. Contei um pouco da minha
trajetória também fui aluna da
Guateka então primeiro há uma roda
de conversa com eles. (PI 02)
No primeiro dia de aula não, não
consegui não teve como dar aula,
foi aquele momento de eles me
conhecerem e eu conhecer eles. No
primeiro dia de aula não teve como
dar aula, teve que fazer todo aquele
reconhecimento ainda de eles me
conhecerem. (PI 03)
Eu me apresentei e trabalhei uma
atividade mais dinâmica com eles,
não foi aula em si, mas, a questão
dinâmica foi mais apresentação. A
acolhida também com os alunos. (PI
04)
Eu tentei acho, que eu tentei, mas
assim dar uma primeira aula mas
não fluiu é quando você na tua
visão na sala de aula não é aquilo ali
mesmo quando você sai da
graduação pensando que e um
negócio simples quando você chega
e uma outra coisa bem diferente.
(PI 05)
Percebe-se na fala do PI 05, que
desde os primeiros contatos com a escola
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na condição de professor, existe uma
ressignificação daquilo que pensava antes.
Neste sentido, na procura de vislumbrar
essas percepções os depoentes foram
questionados acerca das possíveis
descobertas no início da carreira docente,
os entrevistados apontaram:
As minhas maiores descobertas é
que as minhas, como eu fui direto
lecionar para os adolescentes e
exige muito da minha parte e de eu
estudar mais, eu não para no tempo
né. (PI 01)
No início da carreira foi assim,
acreditava que poderia estar
mudando, digamos não muita coisa
alguma coisa, por exemplo,
trabalhando com projeto tenho uma
perspectiva de vida melhor na
verdade a gente não consegue
trabalhar, a gente não consegue
sozinho e também a gestão não
apoia a gente. (PI 02)
A essa é boa, porque assim, porque
assim na universidade, a gente tem
aquela coisa assim bonitinha, aquele
esforço gigante que vai dar certo de
montar aquele plano de aula
maravilhoso que vai dar certo
primeiro passo, segundo passo, você
acredita fielmente que vai sair você
acredita que a coisa vai sair, quando
você chega não consegue nem
chegar à metade dos passos que
você tinha proposto no seu plano de
aula, eu percebi o seguinte, que a
gente tem uma meta o assunto a ser
abordado, mas geralmente não vai
seguir aqueles passos do jeito que
agente tava querendo. (PI 03)
Que a gente, que assim não sai
preparada da universidade que você
tem que buscar correr atrás por que
a prática é bem diferente do que
você estuda na teoria. (PI 04)
Olha minha maior descoberta como
professora e que a principal
ferramenta na formação e na vida do
indivíduo porque você ali como
transmissor de conhecimento. Mas
você ali como reflexo tem dois
campos, você e um espelho para o
aluno, você vai transmitir e adquirir
conhecimento, realmente pra mim
fez muito sentido. (PI 05)
As respostas denotam diferentes
formas de encarar esse momento, o PI-02,
destaca um aspecto mais pessimista,
revelando um sentimento desilusão e falta
de apoio para mudar a realidade, ao passo
que os outros entrevistados, apesar das
dificuldades, compreendem esse
momento como um desafio e uma
oportunidade, ou mesmo como
necessidade de aprendizagem.
Ao perguntarmos sobre possíveis
sugestões você daria para quem está
iniciando a carreira, obtivemos as
seguintes respostas:
Lógico que vai levar certo choque,
vamos dizer assim, porque às vezes
imaginamos uma coisa, mas na
realidade se deparamos né, com
outra realidade, vamos dizer assim,
dentro da sala de aula. (PI 01)
Que não se acomode muitas vezes
nos entramos em sala de aula às
vezes por medo a gente acaba se
acomodando. (PI 02)
Pra quem entrando agora na sala
de aula, não entra com muita
expectativa para não se frustrar uma
aula que a galera vai sair pronto
sabendo tudo seja mais realista pega
seu tema e estuda, estuda mesmo
você e si próprio enfia a cabeça,
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mas não cria aquela expectativa que
todo mundo vai receber você bem
então minha dica é estar se
preparando bastante e crie menos
expectativa. (PI 03)
Eu acho assim: você tem que se
adaptar no ambiente onde a gente
e assim, tem a questão da
desvalorização, tem a questão da
desmotivação tudo isso é um
desafio que a gente tem que
enfrentando. (PI 04)
Comecei a avaliar como eu via
meus professores na minha época
do ensino médio e fundamental e eu
estava convivendo com eles aqui
como colegas de trabalho então e
bem bacana essa ida para sala de
aula traz uma visão bem, bem legal
e bacana. (PI 05)
O segundo bloco de questões que
trata do início do trabalho, da sua inserção
e acolhimento na escola, demonstra que
apesar do “choque de realidade” inicial,
no geral os novos docentes manifestam
uma visão positiva da profissão e um
crescimento pessoal ao exercê-la e um
reconhecimento da comunidade pelo
trabalho desempenhado. Apontaram como
aspectos vantajosos do trabalho docente:
“A gente aprende acaba conhecendo
tendo mais aprendizado do que ensino”
(PI 02); “o salário, que todos estamos
estudando porque querem viver um
pouquinho melhor” (PI 03). O
reconhecimento do trabalho realizado
também foi apontado pelo sujeito PI-03
me encontram na rua me param,
‘professora aquilo que me falou em sala
ela está me dando suporte muito bom na
universidade’ é uma coisa que não tem
preço sabe”?
É que eu tenho com os meus alunos,
eu amo o que eu faço, eu nunca me
imaginei, porque assim no sentido,
que eu sou falante da língua materna
terena, de eu pensar, assim que um
dia vou ser professora de língua
portuguesa, tem que falar bem, tem
que escrever bem agente é muito
cobrado em relação a isso. (PI 01)
Olha as vantagens é que a gente
assim, tem o horário bem e é
reflexivo você pode trabalhar em
diferentes horários, a questão de eu
estar trabalhando na área que eu
gosto que é biologia eu me identifico
com essa área e questão de contato
direto com seu público que é o aluno.
(PI 04)
As vantagens e que eu consigo
transmitir conhecimento e também
adquirir conhecimento. (PI 05)
Essa visão positiva da profissão pode
ser confirmada quando questionados em
relação aos aspectos negativos do trabalho,
percebe-se que as queixas se referem às
condições de trabalho como as cobranças
sobre os resultados e a falta de recursos
materiais e de infraestrutura.
É não seria aspecto negativo, mas
assim dificuldade que eu tenho hoje,
de eu saber lidar, o que acontece
com os meus alunos, se eu trabalho
um texto, da língua portuguesa o
aluno se identifica, onde o aluno
desabafa, coisas que a gente fica
sem palavras, sem reação, eu não
sabendo lidar com isso é nesse
sentido, não seria aspecto negativo,
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de eu assim consegui lidar com isso.
(PI- 01)
Assim a gente quer trabalhar de uma
forma mas a gente não temos
autonomia, pra trabalhando do
jeito que a gente quer em forma de
avalia, os alunos tem vários alunos
que eles não vem, aparece uma ou
duas vezes no semestre do EJA que
é por módulo, não a gente não vai
passar esse aluno ele não apareceu,
muitas vezes quem acaba fazendo a
avaliação é a coordenação. (PI-02)
Muitos primeiros que não para de
estudar não sei se é negativo há uma
cobrança muito grande cobrança
burocrática e essa cobrança
burocrática que eu acho que é o
ponto mais negativo, sem recursos
necessários sem tempo pra ... nos
mesmos, a gente tem vida de casa, a
gente também vive tenta viver o
professor sobrevive. (PI-03)
Ainda falta recursos básicos questão
de folha sulfite, lápis de cor, cola, às
vezes temos que tirar do nosso bolso
pra comprar tirar do nosso direito
que as vezes não tem. (PI-04)
Mais uma vez a questão da falta de
recurso didático questão mediático
sempre falta. E a desvalorização dos
professores que infelizmente a gente
bem desmotivado para trabalhar
com os cortes. (PI-04)
É o cansaço psicológico chega uma
época que você está esgotada, sem
falar do salário que é pior ainda.
(PI-05)
Tem-se assim uma perspectiva
positiva quanto à inserção inicial na
carreira, apesar de manifestarem algumas
dificuldades, insatisfação com
determinadas questões, os professores
indígenas ao adentrarem a escola,
percebem possibilidade de crescimento
pessoal, um desejo de apoio à
aprendizagem dos alunos com apoio da
gestão escolar e dos colegas para se
integrarem aos processos escolares.
Para referendar essa percepção
inicial sobre as falas dos sujeitos,
questionou-se no terceiro bloco de
perguntas, como se desenvolve as
atividades na escola, procurando
compreender, por meio das percepções
dos professores como desenvolve seu
exercício profissional.
Inicialmente foi perguntado sobre
como superam os impasses,
especialmente, nos momentos de dúvidas
e dificuldades, a quem recorrem?
Esperava-se respostas como colegas de
profissão (professores e coordenação
pedagógica), livros, ex-professores da
universidade onde cursou a licenciatura.
Chama a atenção, a fala da PI-03 que
recorre a Deus e ao esposo.
Eu converso muito quando eu tenho
dúvidas hoje com a professora
Marcia que é a professora de língua
portuguesa, e a gente conversa e a
gente se dá bem, às vezes nós
sentamos com a professora Renata,
professora Noemi, professora
Ianara, sobre as dúvidas que vai
surgindo. (PI-01)
Eu sempre procuro livros, o
professor Adilson que me ajuda
bastante, procuro muito ele. Então
são esses assim que eu procuro
quando tenho dificuldade. (PI-02)
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Sobrecarregado fisicamente
emocionalmente, não tem como
deixar de dizer financeiramente
também, eu recorro pra Deus, meu
esposo me ajuda muito querendo ou
não se envolve com a vida do aluno
a vida no seu serviço agora pronto
volta pra realidade, além de Deus
primeiramente é o pessoal da casa
mesmo meu esposo em especial
um chega pra lá no suporte. (PI-03)
A coordenação e também assisto
vídeo aula, procuro também em
internet essas coisas. (PI-04)
Olha eu recorro ao coordenador por
que ele e o que você consegue tirar
dúvidas e dar uma equilibrada. (PI-
05)
Considerando importante
compreender como o professor iniciante se
constitui no espaço escolar, se constitui
redes de apoio ou se isola em suas
atividades, questionou-se sobre as
parcerias desenvolvidas em suas
atividades. Indagados se tem conseguido
realizar parceria com os colegas na escola?
Obteve-se as seguintes respostas:
Sim, sim os projetos que eu fiz são
voltados para a disciplina de língua
portuguesa, eu tive o apoio da
direção da coordenadora pra realiza.
(PI-01)
Sim, com os colegas principalmente
que eu tive na e conheci na
faculdade graças a Deus mais uma
vez colocou junto nós pra
trabalhando que é a Neli, Noemi.
enfrentamos dificuldade juntas
então a gente trabalha juntas, temos
parceria sim. (PI-02)
Os trabalhos que a gente resolve
interdisciplinar eles acontecem
por causa disso se não tem parceria
com os outros colegas essa parcela
de contribuição a gente faz com o
outro ele tem muito a dar certo do
que o trabalhar sozinho então a
parceria com os coleguinhas é muito
importante. (PI-03)
Ao serem questionados sobre
vínculos e contatos com a universidade
onde se formou quatro entrevistados
apontaram manter esse vínculo, ainda que
não seja de ordem institucional, mas
pessoal e apenas com alguns ex-
professores: “Com alguns quando vem à
professora A, com o professor B, os quais
são professores da Universidade Estadual
de Dourados - MS, mas assim é um
vínculo, contato direto, com a
universidade o” (PI-01), “Sim” (PI-02),
“Eu ainda tenho esse vínculo sim, porque
estou voltando a estudar de novo depois
desse tempo que me formei” (PI-03), A
o ano passado sim, porque eu estava no
projeto de assistência dos bolsistas da
faculdade” (PI-05). Apenas o PI-04
informou haver pouco contato, mas não
detalhou.
Percebe-se que se organizam a
partir de redes de apoio para o
desenvolvimento de trabalhos coletivos
com outros professores, com apoio da
direção/coordenação escolar e também
por meio de laços de solidariedade com
ex-professores. Esses pontos de apoio,
para os novos professores, são muito
importantes para que se integrem ao dia-
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a-dia da escola evitando o abandono da
profissão.
Diante das históricas deficiências
estruturais e de infraestrutura no espaço
escolar, os depoentes foram indagados da
seguinte forma: A infraestrutura da escola
interfere na realização do seu trabalho?
Percebe-se que entre todos entrevistados
não queixas quanto à interferência das
condições da escola sobre o
desenvolvimento de seu trabalho, como
revelam o PI-04 “Não aqui temos um
espaço bem bacana para trabalhar”,
corroborada pela fala “A estrutura é uma
boa estrutura” (PI-05). De forma mais
detalhada, temos:
Não, eu penso assim, é que se a
escola oferece um suporte para
realizar projeto, até mesmo em sala
de aula, como por exemplo: suporte
em relação a tecnologia quando os
alunos vão apresentar seminários
peço pra eles utiliza, se a escola
oferece, vamos explora nesse
sentido. (PI-01)
É a falta de ter um espaço ali a
infraestrutura dá, ela tenta o nimo
da comunidade a comodidade dos
alunos. Tem ar-condicionado em
todas as salas e as aulas da tarde
melhorou muito melhorou até o
empenho dos alunos melhorou. (PI-
03)
Por fim, ao questionarmos como
são os estudantes da escola, obtivemos
como respostas:
Eu tenho um carinho especial pelos
meus alunos, porque assim o que eu
aprendi com eles ou a gente cobra
dos alunos, o que aconteceu, eu
cheguei à sala de aula, eu pedi pra
eles escreve um texto dissertativo,
argumentativo, de acordo com o que
foi aplicado na sala de aula, quando
eu cheguei lá, li o texto, quando
cheguei ao último parágrafo o aluno
não apresentou proposta, porque
você não entendeu? Eu chamei
atenção, eu não ouvi a parte dele, o
porquê ele não conseguiu, quando
ele voltou nós tivemos um diálogo e
eu descobri o que aconteceu com
ele, e nessa questão a gente aprende
muito com eles, porque um simples
abraço mesmo a gente pode ganhar o
dia. Eu trabalho no período
matutino, vespertino e noturno. (PI-
01)
Eu trabalho com o nono ano eles, e
vejo assim são alunos que querem
aprender tem dificuldade de
aprendizagem quando você propõe
o trabalho coletivo ou individual
eles fazem. (PI-02)
A grande maioria são 100%
estudantes da reserva mesmo, eles
são muito... Uma das coisas que tem
de positivo eles não saem gritando
com os professores quando a gente
uma direção assim eles atendem
bem né eles são um aluno que dá pra
desenvolver estrutura familiar
mesmo do aluno este tipo de aluno
que a gente recebe difícil realidades
que eles enfrentam por serem muito
novos às vezes é o único lugar que
vão comer almoçar um colega
professor que vai dar atenção pra
eles. (PI-03)
Olha eles são alunos assim na
maioria no geral, bom, comportados
que vemos que tem o interesse de
buscar o aprendizado, mas tem
exceções tem aqueles que não
querem nada da vida. (PI-04)
Olha em relação aos alunos que
trabalham eles estão na sala de aula,
mas tem alguns que não tem o
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objetivo para seguir a carreira. (PI-
05)
Nota-se que existe uma percepção
diversificada sobre os alunos, com perfis
diversos, mas em sua maioria são vistos
de forma positiva. A indisciplina e o
desinteresse dos alunos são apontados
como exceção, tendo como regra o
esforço e o comprometimento, apesar de
condições sociais e de vulnerabilidade.
Por compreendermos que são
significativos os relatos coletados, nessa
seção do texto priorizamos uma
sistematização dos dados coletados nas
entrevistas capaz de dar voz aos sujeitos
entrevistados, selecionando elementos
mais significativos para a compreensão
das percepções dos professores indígenas
iniciantes. Amparamo-nos
metodologicamente em Batista (2006, p.
139) “não é fácil dialogar com as pessoas
que não conhecemos, mesmo com os que
conhecemos é difícil manter um diálogo
mais profundo. Mas é importante ouvir as
pessoas” para o processo de escuta que se
deu pela realização de entrevistas.
Na próxima seção apresentamos
análises que estão embasadas no diálogo
destas fontes empíricas com a produção
da área, a partir de alguns autores
selecionados.
As dificuldades dos professores
indígenas no início da carreira docente
Para Cunha (2011), tanto no campo
dos docentes que atuam em universidades
como nas escolas de educação básica, no
início da carreira, sobressaem às
dificuldades com a prática de ensinar,
exige continuar aprendendo e isso é um
grande desafio para a vida dos
profissionais, pois as maiorias dos
docentes acreditam que estão preparados
ao concluir a licenciatura.
O início da carreira docente é um
grande desafio para a vida dos
profissionais, pois configura uma
profunda mudança social para o sujeito
que aprende e para o sujeito que ensina. A
decisão pelo magistério é permeada pela
força de vontade e pelo desejo de se
qualificar cada vez mais, sonhando em
oferecer o melhor de si para sua
comunidade, sonhando em fazer
mestrado, doutorado e se aprofundar nos
conhecimentos, aprender a fazer uma boa
pesquisa.
Entretanto, quando inicia a
docência, acaba encontrando barreiras e o
choque de realidade. Nesse momento,
percebe-se que ainda falta
aperfeiçoamento quanto ao exercício da
docência, pois na prática falta
qualificação. Quanto à sua aprendizagem,
percebe que não foi suficiente, pois, em
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cada lugar, o contexto cultural e social é
distinto, tendo que enfrentar a realidade
para a qual não foi devidamente
preparado em sua formação acadêmica,
pois a sua responsabilidade é individual,
porém é um desafio institucional das
políticas educacionais. Como afirma
Marcelo Garcia (2009, p. 20), “os
primeiros anos de docência são
fundamentais para segurar um professor
motivado, implicado e comprometido
com sua profissão”.
Ao ingressar na docência, o
professor indígena encontra dificuldades
comuns ao período inicial do exercício
profissional vivencia de forma
diferenciada sua aprendizagem, todavia
isso ocorrerá por meio das contradições
presentes na realidade educacional e
escolar.
Para Papi e Martins (2009), a
formação de docente é contínua e requer
atenção especial, pois a formação
significa uma etapa concluída pelos
docentes objetivando melhorar sua
atuação como professora, visto que é
através de sua formação que lhe
proporcionará novas práticas, não isso
como lhe ajudará em seu início de carreira
nas suas interações sociais, em relação a
escola, aos alunos e aos pais.
Martins (2004, p. 41) ressalta que as
“... percepções são historicamente
constituídas a partir das relações sociais
estabelecidas por seus sujeitos mediantes
às instruções em que se inserem, para
fazer frente às contradições inerentes à
realidade vivida”.
A partir de pesquisa realizada, o que
se sobressai são as dificuldades encontradas
pelos docentes, em carreira inicial, tanto
para se inserir, quanto para permanecer
na área que é formado, são dificuldades
encontradas nas instituições, que não
garantem o suporte ou acompanhamento
contínuo, como suporte específico para a
inserção e permanência desse professor
iniciante.
Para sanar essa situação se faz
necessário um processo contínuo de
aprendizagem, tanto para o aluno quanto
para o professor em início de carreira,
porque é nessa etapa que o professor
adquire suas primeiras experiências como
discente regente de uma sala de aula, e
não mais como um simples estagiário,
pois anteriormente como acadêmico ele
não teria tantas responsabilidades, já no
momento atual em que se encontra, ou
seja, professor regente, tornando-se
extremamente importante refletir sobre
sua prática e também se apropriar de
novas.
Podemos observar mediante a
pesquisa que a iniciação à docência, pode
ser muito difícil, pois encontrará uma
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realidade um pouco assustadora, onde o
professor em início de carreira não está
habituado. Assim, gerando um choque de
realidade, ao qual lhe evidenciará que
serão grandes os obstáculos a serem
superados no decorrer de sua carreira.
Contudo, podemos observar que uma
falta de políticas púbicas para a formação
de professores iniciantes indígenas, visto
que na maioria das vezes essas políticas
são pensadas de forma homogênea, onde
não condiz com a realidade vivenciada
nas escolas indígenas de nosso país.
Sendo assim, se faz necessário um apoio
maior na formação desse professor, desde
sua formação inicial, ou seja, um olhar
mais amplo das universidades para com
esses professores indígenas, onde eles
possam sentir-se acolhidos e inseridos
realmente nas graduações, isso o ajudará
em sua inserção no espaço escolar, de
modo que, ele estará mais seguro em sua
atuação como docente.
A pesquisa realizada nos ajudou a
desvelar as principais dificuldades
vivenciadas pelos professores indígenas
em início de carreira. As dificuldades
podem ser categorizadas de natureza
pedagógica, uma vez que anseiam encontrar
uma metodologia que possa alcançar o
aprendizado de todos os alunos; de
natureza material, pois três professoras
indicaram a falta de recursos de materiais
didáticos, de tecnologia e de materiais na
língua materna terena e guarani. Entre as
dificuldades relatadas está a aceitação,
por parte dos alunos, da gestão e da
própria comunidade, porque eles não
queriam que os professores não indígenas
saíssem, para os indígenas assumirem o
cargo. Apenas uma das professoras
entrevistadas disse que foi em relação ao
conteúdo, porque os alunos são bem
críticos.
Em uma das falas das professoras
entrevistadas, esta informou que ao
chegar na escola era um momento de
transição, digamos assim, em que a
metade dos professores que ocupavam os
cargos eram não indígenas, e a outra
metade era indígena. Ela chegou num
momento muito importante em que o
percentual de indígenas foi ampliado para
setenta por cento, com o preenchido das
vagas pelos indígenas já com formação
superior. Esse processo gerou alguns
tensionamentos, uma vez que professores
o indígenas ou indígenas sem curso
superior, foram substitdos pelos novos
docentes recém-formados. Algumas das
dificuldades do processo foram explicitadas
quando outra professora disse que não foi
bem acolhida ao chegar à escola, por parte
da coordenação e direção.
Dos cinco professores iniciantes
entrevistados, dois manifestaram
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vivenciarem essa mesma dificuldade, ao
passo que outras três não manifestaram o
mesmo problema, externando que tiveram
boa recepção e acolhida de todos na
escola. Essas narrativas indiciam que esse
processo de tensionamento foi conjuntural
e tanto direção como o coletivo da escola
naturalizou a percepção de que docentes
com a formação adequada ocupariam
todas as funções na escola, atendendo às
determinações legais.
Percebe-se que o acompanhamento
dos egressos por parte das instituições
ainda é insuficiente, pois não dão suporte
para conduzir o docente que entra no
mercado de trabalho, com vontade de
fazer o melhor e fazer a diferença, quando
isso ocorre não tem muita aceitação, não
tem apoio adequado e também tendo que
seguir as normas das instituições e do
sistema, assim ficando decepcionado em
sua tão sonhada carreira profissional, não
é como esperava. Portanto, nesta hora, é
de extrema importância a colaboração dos
professores que atuam na área mais
tempo para mostrar solidariedade com os
docentes que estão ingressando na
docência.
A investigação captou as
percepções das professoras indígenas
entrevistadas sobre o primeiro dia de aula.
Para três professoras, foi um momento de
se conhecer e se apresentar para os alunos,
falar com eles de suas metodologias de
avaliação, mas aula mesmo em si não foi
possível. Nas descobertas das professoras,
que foi uma das coisas mais interessantes,
porque elas disseram que os discentes
passam a ser docente que percebe que não
podem se acomodar e tem que estudar
mais, e também tem que estar preparados,
porque se deparar com coisas, que não são
do seu alcance, por isso vem o choque de
realidade encontrada na sala de aula, pois
quando chega na escola com aquela
vontade de mudar alguma coisa, mas não
consegue porque você é limitado e não
tem apoio por parte da gestão.
Com isso, constatamos que no início
da carreira não se está preparado, pois a
prática é bem diferente da teoria que se
estuda na graduação. Analisando as
vantagens do trabalho, é que a gente
aprende, é uma troca de conhecimento.
Assim, duas professoras, que passaram
pela entrevista, disseram a mesma coisa,
que é a troca de aprendizado e também a
adaptação é muito importante a cada sala e
anos são diferentes e as aprendizagens
não são iguais, cada professor tem que se
adaptar em diferentes salas. Contudo,
Marcelo Garcia (2009) considera que:
O início de uma profissão inclui o
reconhecimento de sua cultura, do
estado que ocupa na pirâmide
social e do trabalho, e das
peculiaridades sócio-políticas que
as caracterizam. Contudo, quando a
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transição, passa de aluno para
professor é um grande desafio, por
isso é preciso, manter equilíbrio e
domínio na sala de aula, com isso
os novos docentes tem certa
vantagem por fazer parte dessa
nova era, de aprendizagem, que
inclui a era da tecnologia em todas
as áreas de aprendizagem a
importância dos professores
universitários na sociedade é
indispensável, mas não é o
suficiente. Enquanto docente a
pesquisa faz com que se tornem,
mais crítico em sua visão de mundo
e ver que ainda falta muito a
aprender, por isso não podemos
afirmar que um professor
pesquisador, qualificado será um
bom professor profissional.
(Marcelo Garcia, 2009, p. 86).
Foi explicitada a falta de recurso
didático nas escolas e, ainda, a existência
de cobrança burocrática que surge em
cima do professor, pois, mesmo sem ter
recurso, o professor tem que se virar do
jeito que consegue, e os aspectos que
foram esclarecidos é que devido as
condições de vida dos alunos, as
condições que os alunos indígenas se
encontram, em questão social, quanto à
vulnerabilidade social. Apesar dessas
queixas as entrevistadas relatam os
esforços em superar as dificuldades e a
adaptação ao que é disponibilizado pela
escola.
Nas análises realizadas, as
professoras, falantes da língua terena e
guarani, disseram que os materiais
didáticos não são na língua, aspecto que
dificulta a aprendizagem dos alunos
indígenas, por não ter o material de apoio
na língua materna. Além desta questão,
que indica a existência das barreiras
encontradas pelo caminho, a falta de
autonomia do professor para realizar as
avaliações finais, pois, em vários casos,
quem realiza a avaliação final e acaba
decidindo se passa o aluno ou não é a
coordenação. Um aspecto positivo
identificado nas entrevistas refere-se à
existência de parcerias com os colegas,
eles conseguem desenvolver alguns
projetos juntos e com a comunidade
também. Os professores que passaram
pela entrevista disseram que no estado é a
primeira escola que estão atuando e tem
um espaço bacana para interagir com os
alunos e os mesmos m uma parcela de
contribuição, pois são atenciosos e tem
vontade de aprender e respeitar os
professores, embora com algumas
exceções. Dessa narrativa sobre o espaço
escolar, depreende-se que as docentes,
apesar das dificuldades, têm apoio para
continuarem na profissão, principalmente
dos colegas docentes e da coordenação da
escola, mas também de ex-professores.
Existe, portanto, uma visão crítica da
realidade, acompanhada de um otimismo
quanto à continuidade na profissão
docentes, uma vez que nenhum
entrevistado manifestou a intensão de
abandonar a profissão.
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Considerações finais
Este estudo foi construído a partir
da conceituação de professor iniciante
aportado em Papi e Martins (2009), que
nos norteiam sobre as dificuldades
enfrentadas pelos professores ao se
inserirem na docência. Conquanto não
localizemos na produção científica
investigações que abordem
especificamente a inserção de professores
indígenas em início de carreira, cabe
ressaltar que este processo necessita ser
tratado nos cursos de licenciatura do país
e também no âmbito das políticas
educacionais.
Ao compararmos as dificuldades
dos professores indígenas iniciantes que
atuam em uma escola indígena, com as
dificuldades dos professores iniciantes
não indígenas apresentados pela literatura
da área pode-se compreender algumas
diferenças, relacionadas principalmente
ao contexto de atuação e a inexistência,
ou insuficiências das políticas específicas
para essa realidade.
Denota-se que uma das maiores
dificuldades enfrentadas pelos docentes
indígenas no início da carreira está
diretamente ligado à língua materna.
Muitos dos professores, mesmo sendo
indígenas, distanciaram-se de sua língua
materna devido ao contato com os não
indígenas ao passo que muitos alunos tem
como língua materna o guarani.
Acrescenta-se ainda o fato de que a língua
portuguesa ser vista como uma imposição
da sociedade brasileira. Essas questões
criam diversos tensionamentos em torno
do uso das duas línguas no processo de
aprendizagem.
Observa-se, ainda, a ausência de
políticas educacionais que fomentem e
incentivem o ensino das línguas guarani e
terena nas escolas indígenas brasileiras,
ainda que há pouco tempo fora lançada no
Brasil uma gramática da língua guarani,
ela ainda não chegou às universidades e
escolas públicas. Acreditamos que quando
ela for distribuída, isso supondo que o
Ministério da Educação tenha interesse
em adquirir e distribuir trará alguns
avanços para as escolas indígenas.
Materiais didáticos em língua guarani ou
não, quando existentes são insuficientes
para os processos de ensino.
Pudemos constatar que outro
problema encontrado pelos professores
indígenas iniciantes, diz respeito ao
preconceito dos próprios alunos
indígenas, os quais preferem os
professores o indígenas ao invés dos
indígenas, por acreditar que eles não têm a
mesma capacidade, isso em relação às
questões culturais, pois os professores não
indígenas trazem consigo a sua cultura e
seus diferentes saberes, de um mundo
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tecnológico adverso ao vivenciado por
eles, isso desperta a curiosidade dos
alunos indígenas, pois eles querem
pertencer a esse universo globalizado.
Cabe ressaltar que não é o desejo da
maioria, mas as escolas indígenas
juntamente com as universidades devem
fornecer ferramentas que deem condições
a esses professores indígenas se
capacitarem e atuarem igualitariamente,
assim essas barreiras encontradas por
eles serão superadas. A pesquisa
demonstrou que, além das dificuldades
comuns a todos docentes iniciantes, os
professores indígenas iniciantes,
enfrentam outros desafios e que apesar
das dificuldades mantem uma percepção
positiva da profissão.
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Informações do artigo / Article Information
Recebido em : 21/01/2020
Aprovado em: 01/08/2020
Publicado em: 26/11/2020
Received on January 18th, 2020
Accepted on August 01st, 2020
Published on November, 26th, 2020
Contribuições no artigo: As autoras foram as
responsáveis por todas as etapas e resultados da
pesquisa, a saber: elaboração, análise e interpretação dos
dados; escrita e revisão do conteúdo do manuscrito
e; aprovação da versão final publicada.
Author Contributions: The author were responsible for
the designing, delineating, analyzing and interpreting the
data, production of the manuscript, critical revision of the
content and approval of the final version published.
Conflitos de interesse: As autoras declararam não haver
nenhum conflito de interesse referente a este artigo.
Conflict of Interest: None reported.
Orcid
Queila Viana da Silva
http://orcid.org/0000-0003-3548-8520
Andréia Nunes Militão
http://orcid.org/0000-0002-1494-8375
Como citar este artigo / How to cite this article
APA
Silva, Q. V., & Militão, A. N. (2020). O que revelam os
professores indígenas em início de carreira? Um estudo
da Escola Estadual Intercultural Guateka Marçal de Souza
- Aldeia Jaguapiru no município de Dourados/MS. Rev.
Bras. Educ. Camp., 5, e8279.
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e8279
ABNT
SILVA, Q. V.; MILITÃO, A. N. O que revelam os
professores indígenas em início de carreira? Um estudo
da Escola Estadual Intercultural Guateka Marçal de Souza
- Aldeia Jaguapiru no município de Dourados/MS. Rev.
Bras. Educ. Camp., Tocantinópolis, v. 5, e8279, 2020.
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e8279