Revista Brasileira de Educação do Campo
Brazilian Journal of Rural Education
ARTIGO/ARTICLE/ARTÍCULO
DOI: http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e8488
Tocantinópolis/Brasil
v. 6
e8488
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2021
ISSN: 2525-4863
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A Educação do Campo como opção decolonial: a
experiência de construção do Instituto de Agroecologia
Latino-Americano (IALA-amazônico)
Bruno Cezar Pereira Malheiro
1
1
Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará - UNIFESSPA. Faculdade de Licenciatura Plena em Educação do
Campo/Instituto de Ciências Humanas. Rod. BR-230; Avenida Paulo Fonteles Filho, s/n. Cidade Jardim, Marabá - PA. Brasil.
Autor para correspondência/Author for correspondence: brunomalheiro84@gmail.com
RESUMO. Este artigo enfoca a experiência de construção do
IALA-amazônico a partir do curso de especialização em
“Educação do Campo, Agroecologia e Questão Agrária na
Amazônia”, desenvolvido por meio de uma parceria entre a
Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará e a Via
Campesina. A reflexão aponta alguns deslocamentos analíticos
em direção a uma opção decolonial em educação a partir de uma
experiência pedagógica conectada política e
epistemologicamente às lutas sociais e aos territórios em disputa
no sudeste do Pará. A educação como demanda política dos
povos do campo transforma o contexto de conflitos em lugar de
realização da dinâmica pedagógica que, assim, torna-se parte
integrante dos processos de subjetivação política dos sujeitos. O
encontro com as lutas sociais transforma-se, também, no
reconhecimento das formas de negação das possibilidades de
agenciamento epistêmico a sujeitos individuais e coletivos
subalternizados, encaminhando a uma opção pela desobediência
epistêmica, para restituir ao campo do saber essas experiências
desperdiçadas e, assim, ampliar os sentidos da relação entre a
universidade e os movimentos sociais, enfrentando as
contradições dos processos de institucionalização, ampliando as
formas de circulação do conhecimento e o diálogo de saberes.
Palavras-chave: educação do campo, IALA amazônico, opção
decolonial, amazônia.
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Rural Education as a decolonial option: the building
experience of the Institute of Latin American Agroecology
(IALA-amazon)
ABSTRACT. This article focuses on the experience of building
the Amazon IALA, particularly from the specialization course
on “Rural Education, Agroecology and Agrarian Issues in the
Amazon”, developed in a partnership between the Federal
University of South and Southeast Pará and Via Campesina. The
reflection points to some analytical shifts towards a decolonial
option in education from a pedagogical experience connected
politically and epistemologically to the social struggles and
disputed territories in southeastern Pará. Education as a political
demand of the people of the countryside transforms the context
of conflicts rather than the realization of the pedagogical
dynamics that thus becomes an integral part of the subjects'
political subjectivation processes. The encounter with social
struggles also becomes a recognition of the forms of denial of
the possibilities of epistemic agency to subaltern individual and
collective subjects, leading to an option for epistemic
disobedience, to restore these wasted experiences to the field of
knowledge and thus, broaden the meanings of the relationship
between the university and social movements, facing the
contradictions of the institutionalization processes, expanding
the forms of knowledge circulation and ensuring the dialogue of
knowledge as an effective practice.
Keywords: rural education, amazon IALA, decolonial option,
amazon.
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La Educación del Campo como opción decolonial: la
experiencia de construcción del Instituto de Agroecología
Latinoamericana (IALA-amazónico)
RESUMEN. Este artículo enfoca la experiencia de construcción
del IALA-amazónico, a partir del curso en “Educación del
Campo, Agroecología y Problema Agrario en la Amazonía”,
desarrollado en asociación entra la Universidad Federal del Sur
y Sureste de Pará y la Vía Campesina. La reflexión señala
algunos cambios analíticos hacia una opción decolonial desde
una experiencia pedagógica, conectada política y
epistemológicamente a las luchas sociales y los territorios en
disputa en el sureste de Pará. La educación como una demanda
política de la gente del campo transforma el contexto de los
conflictos en lugar de la realización de la dinámica pedagógica
que se convierte así en una parte integral de los procesos de
subjetivación política de los sujetos. El encuentro con las luchas
sociales también se convierte en un reconocimiento de las
formas de negación de las posibilidades del agenciamiento
epistémico a sujetos individuales y colectivos subalternos, lo
que lleva a una opción de desobediencia epistémica, para
restaurar en el campo del conocimiento estas experiencias
desperdiciadas y, por lo tanto , amplían los significados de la
relación entre la universidad y los movimientos sociales,
enfrentando las contradicciones de los procesos de
institucionalización, ampliando las formas de circulación del
conocimiento y diálogo.
Palabras clave: educación del campo, IALA-amazónico,
opción decolonial, amazonía.
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Introdução
Este artigo consiste em uma reflexão
crítica acerca da experiência pedagógica do
curso de pós-graduação lato sensu em
“Educação do Campo, Agroecologia e
Questão Agrária na Amazônia”,
desenvolvido por meio de uma parceria
entre a Universidade Federal do Sul e
Sudeste do Pará (UNIFESSPA) e a Via
Campesina
i
, mediante um projeto de
Residência Agrária
ii
. O curso aconteceu a
partir de duas turmas
iii
e teve, dentre seus
principais objetivos, a definição dos
sentidos pedagógicos e políticos do
Instituto Latino-americano de
Agroecologia IALA-amazônico
iv
, uma
estrutura de reflexão-ação ligada à Via
Campesina e situada no assentamento
Palmares II, território conquistado em
junho de 1994 e que é uma referência
histórica ao Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra (MST), localizado no
município de Parauapebas, sudeste do
Pará.
Cada uma das duas turmas
v
, em
termos de organização curricular, possuiu
três etapas, ou seja, três momentos
intensivos de dinâmicas pedagógicas no
espaço do IALA-amazônico, além de um
seminário de finalização. A lógica de
organização metodológica das etapas,
nesse sentido, obedeceu aos movimentos
de problematização, reflexão/diagnóstico e
intervenção/ação, na perspectiva de uma
pesquisa-ação participativa. Convém
ressaltar que a proposta metodológica do
curso, o qual foi realizado em alternância
de tempos e espaços pedagógicos, teve a
pesquisa como princípio educativo e visou
um envolvimento com os movimentos,
organizações e comunidades relacionados
à luta pela terra no sudeste do Pará.
A organização curricular, desse
modo, foi um exercício concreto de uma
pesquisa-ação participante, a fim de
garantir um:
deslocamento proposital da
universidade para o campo concreto
da realidade. Esse tipo de pesquisa
modifica basicamente a estrutura
acadêmica clássica, na medida em
que reduz as diferenças entre objeto e
sujeito do estudo. Ela induz os
eruditos a descerem das torres de
marfim e a se sujeitarem ao juízo das
comunidades em que vivem e
trabalham, em vez de fazerem
avaliações de doutores e catedráticos.
(Fals Borda, 1981, p. 60).
Nestes termos e falando de processos
concretos, os educandos construíram duas
frentes de reflexão-ação, sendo a primeira
ligada às pesquisas individuais, a partir dos
seus lugares de militância, e a segunda
relacionada às pesquisas realizadas em
grupos, que tiveram como foco a realidade
do IALA-amazônico e a realidade das
comunidades de seu entorno. Essas linhas
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gerais referentes ao curso construído pela
relação estreita entre universidade e
movimentos sociais, servem, por ora, para
situar o leitor acerca da experiência
pedagógica que nos servirá de guia de
reflexão. Desta maneira, o objetivo central
desse artigo é produzir uma reflexão crítica
sobre a inserção de uma dinâmica
educativa em territórios de lutas sociais
concretas.
A estrutura de organização das ideias
irá se desenvolver a partir dos
deslocamentos teóricos, curriculares e
metodológicos que se tornaram necessários
de serem realizados ao longo da
experiência pedagógica em foco. Nestes
termos, em um primeiro momento,
deslocamo-nos de uma educação
contextualizada à educação como uma
demanda política; em um segundo
momento, partimos do registro de histórias
de vida à leitura de uma dinâmica
pedagógica inserida em processos de
politização da existência, o que nos fará
refletir, na terceira parte deste texto, acerca
dos sujeitos envolvidos nos processos
pedagógicos, como sujeitos inseridos em
processos de subjetivação política. Em um
quarto momento, demonstraremos que os
caminhos metodológicos assumidos pela
experiência aqui em foco nos levaram à
necessidade de uma desobediência
epistêmica e, também, a uma confusão
institucional proposital para impedir que a
demanda burocrática dos processos de
institucionalização da educação na
universidade nos afastasse das realidades
em luta, o que será debatido na quinta parte
desse texto. No sexto momento, discutimos
as rias linguagens que foram
consideradas na elaboração dos produtos
pedagógicos, como outras lógicas de
circulação do saber, sendo que a sétima
parte situa experiências concretas de
diálogo de saberes. O conjunto dos
deslocamentos propostos sugere algumas
palavras finais em que a Educação do
Campo é tratada como uma opção
decolonial.
Da educação contextualizada à educação
como demanda política
O lugar onde se finca nossa
experiência educativa é um tanto
conhecido do grande público, não pelas
pessoas que vivem, mas, principalmente
pelas pessoas que morrem. Falamos do
lugar dos guerrilheiros, camponeses e
indígenas mortos durante a Guerrilha do
Araguaia, dos 19 sem-terra brutalmente
assassinados pela polícia em Eldorado dos
Carajás, de ambientalistas, como José
Cláudio e Maria do Espírito Santo, cujas
vidas foram ceifadas por defenderem a
floresta em pé...
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A formação histórica do sudeste do
Pará é marcada por elevada concentração
fundiária decorrente de um conjunto de
ações do Estado e de atores privados que,
em sua realização, resultou em uma
dinâmica econômica monopolizada por
grandes empresas de mineração, como a
empresa Vale S. A., e grandes empresários
do setor agropecuário. Por outro lado, essa
formação também é marcada por uma
grande organização e mobilização social
em torno da luta pela terra e território, o
que nos indica a coexistência e
simultaneidade de relações com datas
diferentes estruturando um sistema de
acumulação marcado pelo conflito
(Martins, 1997). A expulsão de
camponeses da terra, o saque dos recursos
naturais, a expropriação privada de bens
públicos e dos saberes comunitários
tradicionais é, portanto, um processo
permanente nessa realidade, tal como
descreve Harvey (2004) analisando os
processos de acumulação por espoliação. O
espólio, como processo de despir, despojar
identidades, existências e territórios é o
quadro geral que desenha e sentido às
lutas sociais.
É nesse contexto que a Educação do
Campo ganha significado e vira demanda
política dos movimentos sociais do campo.
O curso de especialização focalizado é,
portanto, um resultado dessas lutas, sendo
muito mais uma resposta possível a
demandas urgentes do que propriamente
uma proposta acabada, o que não quer
dizer que não haja amadurecimento
teórico-epistemológico e político na sua
condução, até porque são mais de vinte
anos de relação estreita entre universidade
e movimentos sociais na região. O que se
está querendo dizer é que quando a
educação (junto com os sentidos e as
formas) é demanda dos movimentos, as
lutas sociais se tornam o dispositivo que dá
sentido ao ato pedagógico.
Dificilmente uma teoria pedagógica
crítica não contempla o princípio de uma
educação contextualizada, em que a
realidade dos educandos deve ser ponto de
partida para a construção do conhecimento.
Entretanto, as experiências aqui enfocadas
nos mostraram uma radicalização deste
princípio. Quando a educação e seus
sentidos são demandas urgentes, o
contexto não é mais adjetivo de um tipo de
educação específica, mas é o lugar de
realização dos processos educativos.
Percebemos que não se tratava
apenas de contextualizar conteúdos
previamente definidos, mas de imergir no
contexto, de modo a dialogar com os
saberes. Começávamos a entender que a
politização do acesso à educação e do
sentido dos processos educativos,
construídos pelos movimentos sociais, não
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nos dava um objeto de conhecimento a se
tornar conteúdo de cursos regulares, pois,
na verdade, tal politização nos indicava a
necessidade de fazer as lutas sociais
falarem, reconhecendo os espaços em
disputa como territórios de
(trans)formação.
Das histórias de vida à politização da
existência
O registro das histórias de vida dos
educandos é, nos cursos de Licenciatura
em Educação do Campo (seguindo a
tradição dos processos de educação
popular), sempre usado como ferramenta
pedagógica para garantir o vínculo dos
processos pedagógicos com a vida dos
sujeitos, em um exercício de
auto(trans)formação. Neste processo, como
destaca Silva (2014), um dos elementos
centrais da construção das narrativas,
particularmente no sudeste do Pará, é a
reconstrução de uma memória coletiva
que, por meio de uma alteridade, projeta-se
como identidade.
Tendo em vista que o conflito é a
marca fundante da dinâmica territorial
regional, que as memórias coletivas se
politizam a partir de um contato/confronto
com uma alteridade que as nega e, ainda,
sabendo que as turmas eram constituídas
por militantes de movimentos sociais,
começamos toda a dinâmica pedagógica
construindo mapas de conflito; mapas estes
que, na verdade, mais do que mapas, no
sentido tradicional do termo, eram
memórias narradas, isto é, memórias
geográficas e epistemologicamente
situadas e centradas a partir de situações de
politização da vida.
Assim, recontar os processos de
politização da vida consistiu em buscar
formas específicas de reconstrução da
memória coletiva como um processo de
religar as histórias pessoais às dinâmicas
regionais, de modo que as distintas
experiências de vida dos educandos se
transformaram em um mapa regional das
situações de conflito (a partir da
representatividade geográfica das turmas),
envolvendo não apenas os processos de
territorialização hegemônicos expressos
em dinâmicas ligadas ao agronegócio, ao
mineronegócio, ao hidronegócio e ao
negócio dos biocombustíveis , mas
também as diferentes expressões das r-
existências amazônicas. Desta maneira,
pelo encontro das experiências, os
processos de acumulação capitalista
puderam ser mais bem compreendidos em
suas articulações escalares, assim como as
distintas formas de lutar/resistir, as quais,
quando expressadas, encontravam-se tanto
pela maneira de desenhar alianças e pelas
estratégias de defesa dos territórios, quanto
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pela expressividade de distintas
territorialidades.
Pensar através dos processos de
politização da vida parece que significa
reconhecer a existência de um saber que se
forja na dinâmica das lutas, melhor
dizendo, é pensar de forma particular a
compreensão e o sentido da experiência.
Estávamos, portanto, diante de um saber
que:
... entra sem bater na porta e anuncia
mortes, crises de subsistência, guerra
de trincheiras, desemprego, inflação,
genocídio. Pessoas estão famintas:
seus sobreviventes têm novas formas
de pensar em relação ao mercado.
Pessoas são presas: na prisão pensam
de modo diverso sobre as leis. Frente
a essas experiências gerais, velhos
sistemas conceituais podem
desmoronar e novas problemáticas
podem insistir em impor sua
presença. (Thompson, 1981, p. 17).
A ideia fundante era construir um
campo de problematizações a partir do
saber/fazer envolvido nos processos de
conflito e politização da vida, colocando
em relevo experiências, nas quais a vida é
posta em xeque, além de formas de
politização da existência que se forjam
pela necessidade prática de continuar a
viver.
Caminhar pelas experiências de
conflito foi uma escolha metodológica para
efetivamente entrar no campo da ontologia
política
vi
, uma vez que existências
ganhavam sentido a partir da luta; formas
de ser, fazer, agir e pensar foram postas em
questão e exigiam reconhecimento;
maneiras de se apropriar do espaço e do
tempo foram violadas por processos
hegemônicos de um capitalismo que opera
por processos de superexploração do
trabalho e da natureza, que também são de
expropriação das condições objetivas de
vida de múltiplos povos, grupos e
comunidades. Pelas vias das experiências,
portanto, a racionalidade das estratégias e
as táticas de resistência são colocadas no
compasso da subjetividade das memórias.
De sujeitos pré-definidos à educação
como processo de subjetivação política
Esse conjunto de interrogações
acerca do significado das lutas sociais em
um contexto de avanço dos processos de
acumulação por espoliação, seja por meio
da mineração, do agronegócio, dos
biocombustíveis ou mesmo do
hidronegócio, trouxe a vida dos educandos,
politizada por situações de conflito, como
um primeiro material de reflexão crítica a
ser tratado nos cursos.
A preocupação, contudo, não
consistia em construir as práticas
pedagógicas a partir da classificação dos
educandos em uma identidade pré-
definida, como pela ideia de campesinato,
mas sim pensar a lógica de construção de
múltiplas identidades mediante a dinâmica
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de conflitos, o que nos ajudou a
compreender múltiplos processos de
subjetivação política.
Aguilar (2013) argumenta que o
privilégio dado à classe em detrimento da
luta, nos estudos sociológicos, gerou
dificuldades de compreensão, uma vez que
os sujeitos são classificados previamente à
luta em si. O que a autora propõe,
entretanto, é o entendimento de que é
através das lutas que os sujeitos se
constituem e é pelas relações de força que
subjetividades políticas são forjadas,
identidades são mobilizadas e
coletividades se autodeterminam.
Ver pela luta é politizar a leitura,
uma vez que, tal como propõe Rancière
(1996), entendemos a política via dissenso,
como ação que rompe com a configuração
dada ao estado de coisas. A política não
apresenta sujeitos pré-definidos, pois são
os atos de subjetivação que constituem
sujeitos, o que nos leva a entender que a
política existe no embate de lógicas
heterogêneas entre si e, assim, os sujeitos
políticos se constituem à medida que
colocamos em confronto essas lógicas
(Rancière, 1996).
Desta maneira, cada turma trouxe
uma miríade de conflitos e,
fundamentalmente, uma diversidade de
respostas a esses conflitos. Não se tratava,
portanto, apenas de identificar os conflitos,
mas principalmente pensar a emergência
das estratégias de resistência que
assumiam, pelos saberes apresentados, três
caminhos interconectados: experiências
políticas de organização, mobilização e
luta; experiências educativas que
conduziam a um reforço na organicidade
de comunidades; e experiências produtivas
que conduziam a novas práticas e relações
com a natureza.
Neste sentido, as experiências de
politização da vida construíram três
campos de problematização a partir dos
quais os conceitos, as teorias e, se assim
pudermos dizer, os conteúdos do curso
foram se definindo e ganhando sentido.
O primeiro campo de
problematização era a necessidade de uma
melhor compreensão do que se estava
enfrentando, bem como do papel dos
movimentos e organizações diante da
magnitude dos processos de espoliação na
realidade regional. Este primeiro problema
constituiu um dos eixos temáticos do
curso, chamado de “Questão Agrária na
Amazônia”.
O segundo campo de
problematização colocado pelos
movimentos, ao definirem a educação
como demanda, era a necessidade de
construção de uma forma não
hierarquizada de produção do
conhecimento, considerando que a própria
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dinâmica de organização e luta produz
saber e, metodologicamente, estrutura
caminhos pedagógicos; caminhos estes que
conduzem à consideração da pesquisa e do
trabalho como princípios educativos, mas
também para o diálogo de saberes, sempre
tendo a experiência como fundamento. A
este segundo campo constituiu-se um
segundo eixo temático do curso que, por
sua vez, chamou-se de “Educação do
Campo”.
O terceiro campo de problematização
levantado pelas experiências de conflito foi
a necessidade de construção de uma nova
forma de produção e relação com a
natureza, uma maneira que construísse um
horizonte de sentido às lutas sociais
mediante as experiências acumuladas a
partir das distintas territorialidades
camponesas, indígenas, ribeirinhas, dentre
outras. Ao longo das discussões, ficava
claro que não se buscava um modelo
definido e estável, mas uma proposta de
articulação de múltiplas experiências
produtivas que consubstanciasse um
projeto político contra-hegemônico e
emancipatório, sendo em torno dessa
problematização que se estruturou o
terceiro eixo temático do curso, com o
nome de “Agroecologia”.
Os eixos temáticos do curso
ganharam o corpo das experiências e
suscitaram o caminho para organizar as
discussões teóricas dessa iniciativa, sendo,
também, o ponto de partida para a
construção das pesquisas individuais e
coletivas, realizadas pelos educandos.
Em linhas gerais, pensar a educação
no contexto da luta social exige pensar os
processos de subjetivação política que
constituem os sujeitos envolvidos na luta.
Entretanto, quando a educação é demanda
política, os próprios processos pedagógicos
também são processos da subjetivação
política. É pensando desta forma que a
dinâmica metodológica do curso não
pressupôs apenas tomar as experiências
acima elencadas como ponto de partida da
organização curricular, mas também tentou
construir os processos educativos como
experiência, ou seja, a educação precisava
acontecer, ser aquilo que “se adquire no
modo como alguém vai respondendo ao
que lhe vai acontecendo ao longo da vida e
no modo como vamos dando sentido ao
acontecer do que nos acontece” (Bondía,
2002, p. 27).
Por meio desse caminho, pensamos
um conjunto de trabalhos de campo,
sempre como um segundo momento da
dinâmica pedagógica. As experiências
trazidas pelos educandos, nestes termos,
eram lidas também tendo em vista a
situação regional que dava sentido de
existência ao assentamento de reforma
agrária, Palmares II, no qual as atividades
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pedagógicas eram realizadas. Deste modo,
as experiências de politização da vida,
pensadas no momento inicial, eram
problematizadas a partir do contato, via
trabalhos de campo, com a realidade
regional. Assim, a singularidade de
determinados conflitos era situada diante
de processos em outras escalas, sendo esse
reposicionamento escalar da experiência
um potente instrumento pedagógico, uma
vez que a escala, tal como adverte Moore
(2018), tem uma expressão epistemológica,
pois é um modo de interferência no que
sabemos sobre o mundo, um modo de
percepção/compreensão e cognição a partir
da criação de imagens e imaginações
espaciais.
A partir dessa potência
epistemológica e cognitiva do
reposicionamento escalar, as experiências
dos educandos foram posicionadas diante
do reconhecimento da dinâmica regional
de expansão dos processos de acumulação
por espoliação; da leitura das distintas
experiências de organização, mobilização e
luta de movimentos sociais; da
aproximação com as formas de pensar e
definir o território e as territorialidades de
povos e comunidades tradicionais; além da
compreensão dos processos educativos por
intermédio das escolas do campo e do
contato com as experiências de produção
realizadas por agricultores, quilombolas,
ribeirinhos e demais grupos sociais
envolvidos. Com base na aproximação
proporcionada pelos trabalhos de campo,
os educandos escolheram um
tema/problema em um dos lugares
visitados para ser objeto de reflexão/ação
ao longo do período do curso. Essa
reflexão foi construída a várias mãos por
diferentes grupos das turmas, sendo a
criação de um centro de memória social em
um acampamento do MST, a construção da
horta do próprio espaço do IALA-
amazônico envolvendo os sujeitos do
assentamento, dentre outras pesquisas-
intervenção, os exemplos da materialização
desse processo.
A alternância de espaços e tempos
(entre o tempo/espaço escola, realizado no
IALA-amazônico e em comunidades de
seu entorno e o tempo/espaço comunidade,
realizado nas localidades dos estudantes)
foi consolidada por meio de atividades
curriculares no espaço de formação
(IALA-amazônico), de trabalhos de
campo, mas também de pesquisas
individuais dos educandos realizadas em
suas realidades de vida e de pesquisas
coletivas em comunidades do entorno do
espaço formativo. Além disso, a
manutenção e gestão do espaço (sua horta,
seus espaços educativos, inclusive a
limpeza e organização) faziam parte da
administração do tempo das atividades
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durante o tempo/espaço escola para
educandos, professores e uma equipe de
trabalho indicada pela Via Campesina para
gestar o lugar.
Inserir-se nos territórios em disputa,
pensar através das lutas concretas significa,
antes de tudo, envolver-se numa dinâmica
particular de produção do saber. Isso não
significa, todavia, construir o processo
educativo como um programa militante, no
sentido estrito, militar e obediente que
advém da palavra militante. É, antes, fazer
falar a diversidade de formas de resistir e
existir, tornar possível a reflexão sobre a
multiplicidade de aspirações políticas, é se
enredar em práticas para fazer emergir
horizontes de sentido, por vezes, claros e
expressivos, por vezes, em vias de
construção.
Da obediência colonial à desobediência
epistêmica
A educação forma e transforma
sujeitos, isto é ponto de consenso.
Entretanto, a ação de formar geralmente
toma como elemento fundante um saber-
sem-lugar, sem nome e sem corpo. Mesmo
que o lugar dos educandos seja
considerado como o ponto de partida para
a dinâmica de ensino-aprendizagem, na
maioria das vezes, esses lugares apenas
servem de âncora para os saberes
construídos de lugar nenhum. Inserir a
realidade do educando no processo de
ensino-aprendizagem não significa,
portanto, descolonizar a dinâmica de
produzir conhecimento, pois tal inserção
pode ser, muito mais, a vontade de
domínio de um saber que descobre um
outro saber sempre como o resultado do
que já se sabia.
Essa relação opera por uma dialética
da totalidade, descrita por Dussel (1973)
como um processo de conhecimento em
que o rosto do outro se manifesta no
mundo dele mesmo, como um ente, porque
não se pode estabelecer nenhum sentido
fora do que já está pressuposto. O outro
que produz saber, portanto, não é um modo
de compreensão, mas de incompreensão,
ou como define Bhabha (2003, p. 110):
“Há nessas leituras uma vontade de poder e
de conhecimento que, ao deixar de
especificar os limites de seu próprio campo
de enunciação e eficácia, passa a
individualizar a alteridade como a
descoberta de suas próprias
pressuposições”.
Os movimentos sociais desmontam
essa gica, pois a politizam. Não
demonstram apenas que os saberes
possuem seus lugares de enunciação, mas
que as lutas, além de políticas, são
epistêmicas.
Pensar a educação a partir das lutas é
politizar os lugares de produção do saber, é
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pensar que o conhecimento ganha e
sentido às relações de poder, como alerta
Foucault (1990). É não falar de modo
abstrato na formação humana e, sim, entrar
no jogo incerto das lutas, no acaso das
estratégias e táticas; é, também, descortinar
horizontes de sentidos, memórias coletivas
que acendem os processos político e
epistêmico de insubordinação. É, enfim,
não fazer falar dos conflitos, mas
recuperar os sentidos da vida perdidos ou
politizados a partir daí.
Neste sentido, parece importante,
antes de qualquer coisa, pensar que a
construção do curso que aqui estamos
relatando é substanciada pelo
questionamento do paradigma dominante
da ciência moderna, não por capricho, mas
por necessidade de ouvir as vozes e saberes
fundamentais nas práticas pedagógicas
construídas. Segundo Sousa Santos (2007),
a razão indolente, que muitas vezes
estrutura a lógica dos nossos currículos, é a
negação do caráter racional de todas as
formas de conhecimento que não se
pautam pelos seus princípios
epistemológicos e regras metodológicas.
Os cursos tentaram contrariar a gica de
produção de não existência dessa razão
metonímica, que fala de um lugar querendo
falar para o mundo e, assim, esquece-se da
diversidade epistemológica que compõe o
mundo de muitos mundos.
É claramente a essa forma de pensar
(o conhecimento), que torna histórias
locais em projetos globais pela geopolítica
do conhecimento (Mignolo, 2003), que a
prática pedagógica nos distanciou.
Caminhamos para uma necessidade de se
fazer uma opção decolonial, no sentido de
reconhecer as formas de negação da
possibilidade de agenciamento epistêmico
a sujeitos individuais e coletivos
subalternizados e, a partir desse
reconhecimento, considerar a necessidade
de desobediência epistêmica (Mignolo,
2008), para não corrermos o risco de ficar,
como enfoca Quijano (1992), no domínio
da oposição interna aos conceitos
modernos e eurocêntricos, enraizados em
experiências sociais distantes.
Percorremos caminhos que, de
alguma maneira, construíram uma opção
decolonial: a definição dos processos
seletivos das turmas pelos próprios
movimentos sociais, a definição da
comissão político-pedagógica do curso
com membros da universidade e dos
movimentos, que tencionou estruturas e
garantiu que vozes não fossem silenciadas,
a realização do curso no espaço do
assentamento Palmares II e a dinâmica
metodológica que aproximou as atividades
da realidade do assentamento. Outro
exemplo contundente desta opção foi a
consolidação do conselho dos sábios
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(formado por agricultores que tinham
experiências que poderiam ser tomadas
como alternativas à produção nos
assentamentos), para o qual o IALA-
amazônico se tornou espaço de encontro e
socialização e, assim, trouxe outros
sujeitos, outras relações, vozes e outros
saberes para os processos formativos. A
dinâmica pedagógica, ao tentar se deslocar
dos conteúdos previamente
esquematizados para os conteúdos
definidos a partir dos campos de
problematização sugeridos pelas
experiências de conflito, também parece
ter sido um passo para a não utilização de
formas interpretativas distantes dos
problemas reais.
Definitivamente, não obedecemos
aos cânones coloniais, o porque as
concepções de ciência e educação do
conjunto de professores e até mesmo dos
educandos não tivessem uma rigidez e uma
dureza inscritas numa formação colonial;
mas por permitir que a prática pedagógica
se encontrasse com a realidade das lutas
sociais. Encontrar-se em movimento
significa “desaprender o aprendido para
voltar a aprender” (Walsh, 2008, p. 12),
ou, como demonstra Mignolo (2008, p.
290) acerca da opção decolonial,
“simplesmente aprender a desaprender”.
É nesse sentido que concordamos
que:
Las pedagogías decoloniales, así, no
remiten a la lectura de un panteón de
autores; tampoco se proclaman como
nuevo campo de estudio o paradigma
crítico. Se construyen en distintas
formas dentro de las luchas mismas,
como necesidad para críticamente
apuntalar y entender lo que se
enfrenta, contra qué se debe resistir,
levantar y actuar, con qué visiones y
horizontes distintos, y con qué
prácticas e insurgencias propositivas
de intervención, construcción,
creación y liberación. (Walsh, 2013,
p. 63-64).
O IALA-Amazônico, nestes termos,
não sugere a constituição de nenhum
modelo, muito menos de um paradigma,
apenas uma experiência de encontro de
saberes em uma situação de politização da
vida que politizou os sentidos dos
processos educativos. O sentido decolonial
está menos na noção instrumental de
querer mudar abordagens e mais no
mergulho nas experiências que carregam as
forças sociais capazes de mudar o nosso
pensar/agir.
Da institucionalização a uma confusão
proposital
Um dos principais problemas dos
processos pedagógicos da Educação do
Campo, e o curso que aqui nos serve de
parâmetro de reflexão não se distancia
desse problema, são os processos de
institucionalização. A estrutura do campo
acadêmico, como bem adverte Bourdieu
(2004), é feita de um constante jogo com
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as regras estabelecidas, em que agentes
participam disputando posições e ganhos.
O processo de institucionalização
tende a provocar um distanciamento dos
movimentos sociais, uma vez que significa
aderir a um campo de disputas e a algumas
regras particulares, bastante distintas das
formas organizativas dos movimentos.
Além disso, a própria organização das
instituições de ensino superior no Brasil
nos impõe limites inscritos em várias
dimensões: a epistemológica, uma vez que
as instituições, em geral, organizam-se de
forma disciplinar, não considerando outras
formas de saber, o que gera um
estranhamento e uma falta de legitimidade
enunciativa dos cursos, como o aqui
descrito, nos espaços de decisão
acadêmica; a administrativa, pois os
sistemas de informação muitas vezes não
reconhecem as particularidades das formas
de organização curricular desses cursos; e
a pedagógica, principalmente pela
dificuldade das instituições de entenderem
e aderirem à perspectiva metodológica da
alternância pedagógica (Malheiro &
Ribeiro, 2014).
Esse processo de institucionalização,
ou mesmo a adesão à lógica estatal, sempre
é, em si, um mecanismo de adesão para a:
construção de um transcendental
histórico comum imanente a todos os
seus sujeitos. Através do
enquadramento que impõe às
práticas, o Estado instaura e inculca
formas e categorias de percepção e
pensamento comuns, quadros sociais
da percepção, da compreensão ou da
memória, estruturas mentais, formas
estatais de classificação. (Bourdieu,
1996, p. 116).
Um curso, ao se tornar um título,
começa a fazer parte da estrutura
hierárquica de distribuição dos ganhos em
um campo burocrático. Em vista disso,
uma dúvida pairou nas discussões ao longo
das turmas: seria necessário construir uma
institucionalidade nomeada e consagrada
pelo Estado ao IALA-amazônico?
A situação concreta era a seguinte: o
curso tinha uma institucionalização
vinculada à UNIFESSPA. Por ser um curso
de especialização, a autonomia na
construção do currículo e da condução dos
processos metodológicos era bem maior
que em cursos de graduação, por exemplo.
Deste modo, o funcionamento em um
assentamento ligado ao MST, a construção
de uma Comissão Político-Pedagógica com
membros dos movimentos e a abertura
para diferentes linguagens nos trabalhos
realizados pelos educandos tornaram-se
conquistas realizadas dentro da
institucionalidade.
Por outro lado, o espaço do IALA-
amazônico não foi incorporado na
universidade e permaneceu como espaço
de formação, convergência, discussão e
proposição da Via Campesina. Os cursos,
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portanto, animaram as discussões do
IALA, que, em sua dinâmica, era muito
mais do que eles. Essa não
institucionalização, embora necessite de
uma grande energia dos movimentos para
conseguir manter o espaço em todos os
aspectos, revelou-se como potente para se
conseguir realizar atividades não inscritas
num receituário curricular formalizado
pelo Estado.
Assim, a confusão proposital em um
curso institucionalizado que faz funcionar
um espaço que é bem mais que o curso em
si, também por não se restringir à dinâmica
burocrática que a institucionalização
incide, parece ter sido um deslocamento
interessante para garantir que o diálogo de
saberes ultrapassasse a dimensão
institucional de princípio e se tornasse uma
prática efetiva.
Da linguagem acadêmica às múltiplas
formas de circulação do saber
Entre pesquisas individuais e
coletivas, trabalhos de campo e momentos
de trabalho no espaço do IALA-
amazônico, foram realizadas algumas
oficinas com os educandos para que eles se
apropriassem de diferentes linguagens:
oficinas de produção de textos acadêmicos,
oficinas de produção de textos
jornalísticos, oficinas de fotografia e de
produção audiovisual. Os diferentes
produtos resultantes dos trabalhos
realizados assumiram múltiplas formas e
circularam também por diferentes campos,
de distintas maneiras.
A preocupação com as linguagens e
as formas de dizer e definir as atividades,
bem como com os próprios sentidos
construídos por intermédio dos trabalhos
no IALA, justificava-se pela clareza de
que:
O conhecimento do mundo social e,
mais precisamente, as categorias que
o tornam possível, são o que está, por
excelência, em jogo na luta política,
luta ao mesmo tempo teórica e
prática pelo poder de conservar ou de
transformar o mundo social
conservando ou transformando as
categorias de percepção desse
mundo. (Bourdieu, 1989, p. 142).
A ideia fundamental era fazer
circular o conhecimento produzido a partir
da experiência do IALA e interferir no
mundo também pelas definições do
mundo. Assim, com esse objetivo, foram
construídos Boletins Informativos
(chamados de “Manda- Notícias”) e
algumas cartilhas que relatavam as
atividades concretas no espaço, desde, por
exemplo, a construção de uma fossa
séptica até a construção da horta. Além
desses produtos com linguagem
jornalística que circularam no
assentamento e em espaços políticos e
acadêmicos, alguns documentários foram
produzidos, fazendo circular, por meio do
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audiovisual, formas de ver e entender o
mundo de maneira distinta e formas
enraizadas nas práticas e narrativas de
diferentes sujeitos em processos de luta. Os
textos acadêmicos, portanto, foram apenas
mais uma das várias formas encontradas
para fazer circular o saber.
A necessidade de apropriação técnica
e estética de linguagens não teve o objetivo
circunscrito de apenas fazer circular
argumentos, reflexões e experiências, mas
também de pôr em diálogo saberes
distintos, que, muitas vezes, possuem
manifestações distintas. Neste sentido, e
mediante o audiovisual, uma narrativa
histórica ganha sentido e potência
diferentes do que as expressas em um
artigo acadêmico. Do mesmo modo, em
boletins informativos e cartilhas, as
atividades práticas de trabalho ganham
uma expressividade ímpar, que garante que
sejam mais bem compreendidas. O sentido
da apropriação técnica e estética de
distintas linguagens foi, portanto, de
potencializar o diálogo entre distintos
saberes e fazer com que o conhecimento
saltasse escalas e circulasse com maior
aderência em outros espaços para além do
acadêmico.
Dos saberes universais ao diálogo de
saberes
Ao longo de todas as discussões no
interior do curso, acerca da maneira como
consolidaríamos alguns princípios e
sentidos claros para a edificação política e
epistêmica do IALA-amazônico, um
reconhecimento por parte dos movimentos
sociais sempre esteve presente: a
necessidade de não apenas enfrentar os
processos de expansão capitalista em suas
múltiplas formas, mas, fundamentalmente,
construir alternativas no interior dos
territórios conquistados a esses processos.
A agroecologia surge como uma
resposta satisfatória, um modelo
contraposto ao agronegócio capaz de
impulsionar articulações políticas em
projetos produtivos concretos. Entretanto,
logo a certeza transformar-se-ia em dúvida
e a ideia de construir um grande instituto,
capaz de disseminar tecnologicamente uma
alternativa agroecológica, foi cedendo
espaço a um caminhar pelo chão dos
territórios, a fim de potencializar o que
realmente se é e se pode ser.
A construção do conselho de sábios,
relatada brevemente aqui, as viagens de
campo para conhecer experiências de
agricultores de movimentos integrantes da
Via Campesina, bem como de
comunidades e mobilizações não ligadas
diretamente ao movimento, as pesquisas-
ação coletivas dos estudantes em
acampamentos ou no próprio assentamento
Palmares II, que tinham a perspectiva de
envolver a comunidade desde a
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problematização à intervenção, enfim,
deram uma dinâmica ao espaço do IALA e
o sentido de agroecologia não foi ampliado
apenas com base em discussões teóricas,
mas, sobretudo, mediante práticas
pedagógicas e escolhas políticas.
O IALA passou a ser mais espaço de
convergência do que propriamente de
difusão, logicamente impulsionado pela
dinâmica pedagógica dos cursos. Uma
metamorfose de sentidos reconduzia a
relação entre universidade e movimentos
sociais. A princípio, ainda parecia que a
universidade assumiria um papel apenas
técnico, mas, pelo desenrolar dos cursos e
pela relação de mão dupla, a ideia de
difusão de um projeto agroecológico, o
qual ainda restringia a terra ao seu sentido
produtivo em si e, em consequência, a
agroecologia a uma técnica ou ferramenta,
foi cedendo espaço à finalidade de se
conhecer, convergir experiências e
potencializá-las. A universidade saía do
seu pedestal de produzir soluções
científicas e os movimentos sociais
também saíam do conforto de demandar
essas saídas. Assim, por meio de
contradições, divergências e, também, de
um reconhecimento mútuo, o caminho
trilhado se desloca de saberes universais
para um diálogo de saberes.
Dentre os movimentos aos quais
pertenciam os educandos, o MST se
destacava, tanto por ter um número maior
de estudantes, como por ser em um
assentamento ligado a esse movimento que
o curso funcionava. Nestes termos, não
podemos imaginar que o consenso sempre
prevalecia, até porque, em geral, a
organização política do MST tem como
princípio básico a produção de um
movimento de massas e, para tanto, existe
a necessidade de consolidação de uma
vanguarda política que tenha clareza dos
rumos e estratégias a trilhar.
Entre as estratégias claras e o
emergir por experiências sociais, que, por
vezes, distorcem a clareza das estratégias,
caminhamos entre contradições que,
logicamente, materializaram-se bastante
durante os cursos. Entretanto, foi este o
caminho trilhado e ele desenha alguns
elementos de compreensão que não se
consubstanciaram nas pesquisas dos
educandos, mas também na organização
curricular.
O reconhecimento de que, no
contexto de expansão das commodities
agrícolas e minerais, era necessário não
apenas construir formas de acesso a terra,
mas defender os territórios, de modo a
questionar os meios pelos quais as
empresas se apropriavam dos recursos,
levou à necessidade de se pensar que o que
estava em jogo era muito mais que o
choque entre modelos produtivos, mas
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também o encontro de lógicas distintas de
relação com a natureza.
Como demonstra Alier (2007), os
conflitos ambientais não demonstram
apenas uma distinção em linguagem
monetária, eles também colocam em
questão o próprio sistema de valorização e
suas distintas linguagens de valorização.
Entretanto, perceber que os conflitos
existem também pelo sentido que se à
própria natureza não significa dizer que as
outras formas de relação com a natureza,
distintas dos grandes empreendimentos
econômicos, estão sempre previamente
estabelecidas pelos movimentos sociais e
pelas comunidades em conflito. Isto
porque, muitas vezes, essas outras
sensibilidades estão em construção, uma
vez que resistir não é sempre r-existir.
De um lado, parte das pesquisas
individuais, ao tentarem restituir às
organizações experiências sociais de
produção ainda presentes em espaços de
comunidades, ressaltavam os saberes em
sua forma técnica, igualmente em seus
sentidos políticos capazes de construir
horizontes distintos daqueles inscritos
pelas lógicas de mercantilização da
natureza. Por outro lado, estar a mais ou
menos 50 quilômetros da maior mina de
ferro a céu aberto do mundo, na Serra dos
Carajás, envolvida em uma estratégia
neocolonial que empreende novas formas
de saque, subalternizando populações,
recursos e territórios à finalidade de
reorganização desigual da natureza para
manter uma dinâmica de acumulação em
escala global (Aráoz, 2010), deixava claro
a magnitude do que se enfrentava e ainda
se enfrenta, e, além do mais, estabelecia
um parâmetro distintivo politicamente
importante para os saberes que se
encontravam no espaço do IALA.
Múltiplas experiências que dizem
não à lógica de mercantilização da
natureza emergiram pelas vivências dos
educandos e pelas pesquisas individuais e
coletivas nos trabalhos de campo. Assim,
foi na imersão e na tensão entre distintas
sensibilidades e maneiras de pensar e
produzir que as práticas pedagógicas se
construíram.
À guisa de conclusão: Educação do
Campo e opção decolonial
Os deslocamentos analíticos tomados
até aqui convergem para uma ideia-força:
pensar uma opção decolonial para a
educação é, antes de tudo, conectar-se
política e epistemologicamente às lutas
sociais concretas e aos seus territórios em
disputa.
A opção decolonial em educação
exige, portanto, fincar os pés nas
experiências de insubordinação para
construir processos educativos na imersão
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de lutas sociais concretas. Dessa forma, o
contexto não é mais complemento de um
tipo de educação específica, senão o lugar
de realização dos processos educativos, ao
se colocar em relevo uma dinâmica de
auto(trans)formação dos sujeitos mediante
a reflexão de suas experiências de
conflitos, torna-se parte integrante dos
processos de subjetivação política.
Construir uma educação em
movimento é, definitivamente,
desobedecer aos cânones coloniais para se
permitir encontrar com a realidade das
lutas sociais. É, enfim, reconhecer as
formas de negação das possibilidades de
agenciamento epistêmico a sujeitos
individuais e coletivos subalternizados e
optar pela desobediência epistêmica, para
restituir ao campo do saber essas
experiências desperdiçadas.
Entretanto, construir experiências
pedagógicas entre o campo da universidade
e o campo dos movimentos sociais é, por
um lado, não abdicar por inteiro da
institucionalidade, uma vez que ela garante
algumas condições objetivas para a
realização dos processos pedagógicos. Por
outro lado, também significa levá-la ao
limite para não nos restringir às formas e
às relações inscritas e prescritas pelo
Estado e, assim, garantir que o diálogo de
saberes ultrapassasse a dimensão
institucional de princípio e se tornasse
prática efetiva.
Quando sujeitos, estratégias, práticas,
discursos, enfim, quando saberes distintos
inseridos em dinâmicas de conflito entram
em contato, parece necessário que a
dinâmica pedagógica o se limite a uma
única forma de dizer ou expressar o
conhecimento, mas que se abra à
apropriação técnica e estética de distintas
linguagens para potencializar o diálogo
entre distintos saberes e sua circulação.
Deslocar-se dos saberes universais ao
diálogo de saberes, parece, então, uma
necessidade quando se insere os processos
pedagógicos nas dinâmicas de luta. E,
nesse processo, abertura e flexibilidade
parecem atitudes virtuosas, uma vez que é
preciso formar de maneira diferente do que
se foi formado, pois formação é
autoformação a partir do contato/confronto
com saberes distintos. Participar dos
processos de subjetivação política é,
também, reconhecer-se nos processos de
transformação social e, fundamentalmente,
tornar-se sujeito político nesse processo.
Em uma educação com fins de
transformação social, inserida na dinâmica
das lutas, a organização curricular é, antes
de tudo, uma imersão para a interpretação
(sempre provisória e a partir das
experiências dos conflitos) da gramática
das lutas sociais. Assim, caminhamos pela
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ontologia política para pensar o papel dos
movimentos e organizações, demarcando
formas específicas de subjetivação política,
partindo de distintos modos de politização
da vida. Mas nós também trilhamos pela
epistemologia política como uma resposta
à definição, pelos movimentos sociais, da
educação como demanda política para a
construção de uma forma não
hierarquizada de produção do
conhecimento, da mesma maneira que
chegamos à ecologia política, isto é, pela
necessidade de enfrentar as dificuldades de
pensar formas de produção e práticas de
relação com a natureza distinta das práticas
e relações inscritas nos processos
hegemônicos.
Esses caminhos não desenham um
modelo ou mesmo um guia, apenas
expõem uma possibilidade de percurso.
Outras possibilidades revelar-se-ão quando
a educação for construída pela tentativa de
uma relação não hierárquica entre saberes
acadêmicos e subjetividades, histórias,
estratégias, lutas, enfim, entre os saberes
dos povos.
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i
A Via Campesina, reunião de movimentos nascida
em 1993, é um movimento internacional que reúne
camponeses, pequenos e médios agricultores, sem-
terra, mulheres e jovens rurais, indígenas, migrantes
e trabalhadores agrícolas de todo o mundo. É
composta por 182 organizações em 81 países da
África, Ásia, Europa e Américas.
ii
O programa Residência Agrária é resultante de
uma parceria entre o INCRA, por meio do
Programa Nacional de Educação na Reforma
Agrária, o, então, Ministério do Desenvolvimento
Agrário (MDA), além do CNPq, que resultou em 36
Malheiro, B. C. P. (2021). A Educação do Campo como opção decolonial: a experiência de construção do Instituto de Agroecologia Latino-Americano (IALA-
amazônico)...
Tocantinópolis/Brasil
v. 6
e8488
10.20873/uft.rbec.e8488
2021
ISSN: 2525-4863
23
projetos contratados, voltados à formação de 1,6
mil alunos em 28 universidades (Instituto Brasileiro
de Colonização e Reforma Agrária [INCRA],
2014).
iii
As turmas foram compostas por militantes de
movimentos e entidades ligadas à Via Campesina
na Amazônia brasileira e internacional, além de
outros coletivos e movimentos sociais, sendo os
processos seletivos também realizados pelos
movimentos, com algumas exigências documentais
da universidade. Dos 45 estudantes das duas
turmas, 33 participavam em organizações
integrantes da Via Campesina, sendo 26 em
movimentos sociais nacionais (MST, MAB, CPT e
MMC) e 7 em movimentos estudantis nacionais
(FEAB e ABEEF). Além desses, quatro educandos
tinham experiência com trabalho de assessoria
técnica ou educacional junto a ATER ou CFR, três
eram militantes de um coletivo com atuação
regional no Sudeste paraense (Coletivo Debate e
Ação), um educando ligado à FETAGRI PA, uma
estudante ligada à associação de mulheres
(Associação de Mulheres do Assentamento 1º de
Março em São João do Araguaia PA), um com
atuação no movimento estudantil em Parauapebas
PA e dois sem vínculo com movimentos.
iv
O IALA-Amazônico fundado em 2009 se insere
na perspectiva desenhada pela Via Campesina de
constituir uma rede de escolas de agroecologia na
América do Sul, como a Escola Latino Americana
de Agroecologia (ELAA) no Paraná (2005), o
IALA Paulo Freire na Venezuela (2006) e o IALA
Guarani no Paraguai (2008). O propósito central do
IALA Amazônico é articular universidades,
pesquisadores, movimentos sociais e camponeses
em trocas de experiências com ênfase nos
princípios da agroecologia.
v
Foram ofertadas duas turmas de especialização em
Residência Agrária. Ambas tiveram o apoio do
PRONERA e do CNPq: uma turma
autodenominada “Índia Tuíra”, com formação entre
2011 e 2012, e a outra turma, autodenominada “Seu
Sabá”, com formação entre 2013 e 2015. Dos 45
estudantes das duas turmas, 29 educandos vieram
de diferentes regiões do Pará, cinco educandos do
Maranhão, três educandos do Mato Grosso, três do
Tocantins e dois de Rondônia. Além desses, dois
educandos vieram do Paraná, em função de sua
militância nacional na FEAB, um veio de São Paulo
e uma educanda veio do Equador.
vi
Arturo Escobar (2014) afirma que a cultura tem
sido pensada, colonialmente, como uma estrutura
simbólica a ser interpretada, sendo necessário
pensá-la, a partir dos processos de luta na América
Latina, como diferença radical, para produzir uma
noção de ontologia relacional a partir da noção de
“pluriverso”, não mais de universo.
Informações do Artigo / Article Information
Recebido em : 19/02/2020
Aprovado em: 01/08/2020
Publicado em: 28/04/2021
Received on February 19th, 2020
Accepted on August 1st, 2020
Published on April, 28th, 2021
Contribuições no Artigo: O autor foi o responsável por
todas as etapas e resultados da pesquisa, a
saber: elaboração, análise e interpretação dos dados;
escrita e revisão do conteúdo do manuscrito e; aprovação
da versão final publicada.
Author Contributions: The author was responsible for the
designing, delineating, analyzing and interpreting the data,
production of the manuscript, critical revision of the content
and approval of the final version published.
Conflitos de Interesse: O autor declarou não haver
nenhum conflito de interesse referente a este artigo.
Conflict of Interest: None reported.
Avaliação do artigo
Artigo avaliado por pares.
Article Peer Review
Double review.
Agência de Fomento
Não tem.
Funding
No funding.
Como citar este artigo / How to cite this article
APA
Malheiro, B. C. P. (2021). A Educação do Campo como
opção decolonial: a experiência de construção do Instituto
de Agroecologia Latino-Americano (IALA-amazônico).
Rev. Bras. Educ. Camp., 6, e8488.
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e8488
ABNT
MALHEIRO, B. C. P. A Educação do Campo como opção
decolonial: a experiência de construção do Instituto de
Agroecologia Latino-Americano (IALA-amazônico). Rev.
Bras. Educ. Camp., Tocantinópolis, v. 6, e8488, 2021.
http://dx.doi.org/10.20873/uft.rbec.e8488