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Dado  que  Lourival,  mesmo  sem  ter 
tido condições de estudar, não deixa  uma 
criança do assentamento que coordena sem 
ir para a escola, lhe foi perguntado se ele 
achava a educação importante para a vida. 
Ele  respondeu  que  a  “Educação  é  igual 
dinheiro, se  usar bem  é boa,  mas se  usar 
mal é ruim”. (entrevista em 10/10/19). 
Mais uma resposta sábia do pensador 
semianalfabeto  para  a  burocracia 
educacional,  e  profunda  para  um 
autodidata  formado  pela  universidade  da 
vida. Para além da grafia da fala, devemos 
percorrer a trajetória de vida e valorizar as 
experiências  práticas  vivenciadas  por 
Lourival  ao  longo  de  sua  militância 
política.  Ele  não  tem  dúvidas  quanto  à 
importância  de  uma  educação 
humanizadora,  amorosa,  participativa,  de 
qualidade,  especialmente  para  os 
excluídos.  No  entanto, em  sua militância, 
conviveu  com  tantos  intelectuais, 
acadêmicos,  políticos,  gestores  públicos, 
juízes,  com  os  mais  altos  níveis 
universitários,  que  utilizavam  seus 
conhecimentos  técnicos  e  científicos  para 
proveito  próprio,  em  benefício  das  elites 
em detrimento dos pobres. Ele acha que a 
educação em seu sentido filosófico poderia 
ser mais bem utilizada para a melhoria da 
vida, das pessoas e do meio ambiente. Isso 
revela  que,  para  Lourival,  a  educação 
formal  é  semelhante  à  racionalidade 
voltada para fins, ou seja, um instrumento 
que, se utilizado como fim em si mesmo, 
perde  o  sentido  e,  por  isso,  precisa  de 
meios  e  valores  que  sejam  significativos 
para a vida pessoal e social dos indivíduos 
e para o bem do espaço onde vivem. 
O  meio  ambiente  é  um  bem,  ou 
melhor,  um  espaço  de  vida  muito 
valorizado  por  Lourival.  Uma  área 
considerável de seu lote é preservada com 
uma  reserva  de  mata,  de  onde  ele  não 
permite  que  se  tire  madeira.  Para  quem 
pede,  ele  diz  “os  paus  são  de  Deus, 
ninguém pode cortar”. No fundo, o terreno 
tem  um  brejo  que  antecede  um  córrego. 
Toda  essa  área  é  mantida  como  área  de 
preservação  permanente  e  fica  intocada, 
sem exploração econômica. 
Ao  considerar  as  dificuldades 
enfrentadas  na  vida  desde  a  migração  do 
nordeste,  o  impedimento  de  estudar,  o 
trabalho  rural  árduo,  explorado  ou  mal 
remunerado,  e  a  luta  contra  o  sistema 
político injusto, lhe foi indagado se ele se 
considerava  uma  pessoa  realizada. 
Respondeu de  imediato: “Individualmente 
sim,  coletivamente  não”.  (entrevista  em 
10/10/19). 
É  digno  de  nota  que  essa  resposta 
instantânea  e  espontânea,  apesar  de  uma 
frase  curta,  traz  em  seu  interior  uma 
profundidade  de  conteúdo  que  parece 
resultar  de  algo  já  longamente  refletido.