v. 11 n. 2 (2019): "Trampas" do (des)envolvimento

Trampas do (des)envolvimento

A articulação entre desenvolvimentismo e sustentabilidade foi apresentada como basilar à transformação das relações desiguais no planeta e se canonizou no documento referencial conhecido como Relatório Bruntdland, de 1974. A fusão dos princípios na prática do desenvolvimento sustentável traria consigo um paradigma que orientaria políticas públicas e consensos internacionais, mediados pelo Organização das Nações Unidas (ESCHENHAGEN, 2015; MACHADO, 2013).

Reconhecera-se a necessidade em refletir acerca dos efeitos do uso inconspícuo e predatório dos recursos naturais, porém, simultaneamente, era reafirmada a premissa de que a prosperidade e a infalibilidade da ciência tornariam possíveis suster os desejos de consumo desta geração e garantir a das próximas. Divulgou-se, ainda, a potencialidade de um efeito derrame, em relação à acumulação material: que as benesses do progresso se espalhariam àqueles que não dispusessem das condições políticas, econômicas e culturais para alcançá-lo.

A obsessão pelo crescimento converteu-se na profissionalização, com todo o arcabouço de expertises, produzidos e legitimados pelas universidades e espaços concedidos na organização estatal e paraestatal, e na institucionalização do desenvolvimento, dos quais é relevante destacar os papéis do Banco Mundial e Interamericano de Desenvolvimento, que continuariam exigindo políticas econômicas austeras e comportamentos mercadológicos liberais para o empréstimo de recursos para empreendimento de estruturas que, porsi, alimentariam a roda de sustentação do capitalismo (ESCOBAR, 2007). A América Latina incorporou a ânsia pelo desenvolvimentismo, a angústia em alcançar o padrão de um 1º Mundo que lhe doutrinava sobre o que aquela liberdade poderia ofertar em detrimento das involuídas e bárbaras constituições locais dos povos. Afastar-se das comunidades que seguiam por séculos, sem a necessidade de buscar uma felicidade fora de suas próprias ciências e relação com terra, era uma condição evolutiva.

Ao diagnosticar essas afinidades e reconhecer o desenvolvimento associado a sustentar o padrão de civilização consumidora como mais uma estratégia incorporada aos repertórios manifestos na colonialidade, propomos, nessa coletânea, a re-existência (WALSH, 2014), o que resiste e sobra ao projeto de uniformização e agenciamento dos desejos.

Esse encontro nasceu de um debate promovido pelo Programa Interdisciplinar de Pós-Graduação em Direitos Humanos da Universidade Federal de Goiás, convertido num curso aberto à participação de outros programas de mestrado e doutorado, dentro e fora de Goiás. Conduzido pela professora Dra. Maria Luísa Eschenhagen e pelo professor Dr. Ricardo Barbosa de Lima, o curso estendeu-se à participação de grupos de pesquisa e iniciativas de investigação no Tocantins, Pará, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Organizam como convidados, além da prof. Eschenhagen e Barbosa de Lima, a prof. Vilma de Fátima Machado e Dernival Venâncio Ramos Júnior

As atividades do Econuvem – Co-inspiração Ecopedagógica (@econuvem) e do Programa de Pós-Graduação Em Estudos de Cultura e Território (PPGCULT), sob a bença da Neuza e suas opções como espaço para permitir envolvimentos e rupturas tornaram ainda mais potentes e inevitáveis essas aproximações. As interpretações visuais são do Ciro Gonçalves (@cirocireca).

Publicado: 2020-04-17